quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Rosângela Bittar: O silêncio técnico

- Valor Econômico

Aforismo de Alckmin é devagar se vai ao longe

O governador Geraldo Alckmin não está negligente, nem abúlico, nem indiferente a uma campanha política mais objetiva para pleitear novamente a Presidência da República, dizem os especialistas da sua equipe. Ele está intencionalmente mais discreto, por uma razão, que poderia ser classificada como técnica.

O apresentador Luciano Huck não desistiu do sonho de ser candidato a presidente da República, o que ele fez foi desistir da articulação explícita neste momento, inclusive de dizer, mesmo na intimidade, que é candidato. Isso estava lhe trazendo problemas desnecessários e insolúveis por enquanto. O que não significa que não seja candidato, quem sabe num dia não muito distante.

O que se destaca nas articulações políticas atuais é que os candidatos possíveis estão se adaptando às evidências produzidas pelo eleitorado: quem se lançar agora não chegará ao fim, ou terá dificuldades adicionais de sucesso. Há muitos já ficando pelo caminho e, teoricamente, estaria cedo para isso. Ciro Gomes esconde-se, dando maior peso à sua campanha em rede social, na internet, para evitar chamuscar-se em declarações sob pilotis. Jair Bolsonaro já esteve mais exposto, agora tem colocado seu coordenador de programa como escudo de celeuma. Marina Silva some do cenário como tragada pela ausência de discurso e proposta. Luiz Inácio Lula da Silva continua a falar muito, mas inegavelmente menos do que antes de ter sua candidatura pendurada na Justiça.

Esses candidatos devem ter constatado que a eleição de 2018 não começou para valer. E quem lhes informou disso foram as pesquisas, segundo as quais o eleitor ainda não está interessado no que esses políticos têm a dizer.

Uma maioria, 65% dos consultados, são contra todos os candidatos no cenário da campanha. Portanto, o candidato Lula teria 37% não do eleitorado, mas dos 35% que já admitiram ter uma preferência. Ou seja, Lula tem 9% de eleitores que estão com ele ficando solto, sendo preso, ou em qualquer outra situação.

Bolsonaro tem 15% dos 35% decididos, ou seja, tem 4% do eleitorado que votariam nele também em qualquer circunstância. Os 65% de indecisos ainda não participam dessa eleição. Portanto, quem tiver juízo não acelera sua campanha agora.

Alckmin não é adequado nem tem temperamento para uma campanha definida como atlética, barulhenta, tal como a de Lula, de Bolsonaro, de Ciro Gomes, como seria a de Arthur Virgílio se com ele disputasse a prévia do PSDB. Ele não é de luta livre, e assim dá a impressão de estar sem apetite, mas na verdade está educadamente contido, silencioso.

Merval Pereira: Integração contra o crime

- O Globo

O plano de segurança integrado que está sendo feito para o Rio deverá ser nacional. A demissão do diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, como primeiro ato de Raul Jungmann na encarnação de ministro da Segurança Pública tem a importância simbólica de garantir a autonomia de ações da corporação, diante das diversas iniciativas que sinalizavam a vontade de interferir nas investigações sobre o presidente Michel Temer e seu entorno, mas está longe de ser o fato mais importante do começo do novo ministério.

As coisas começam a fazer sentido quando se une a visão de Estado democrático de Jungmann com a visão estratégica do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas. Ao tomar posse como ministro extraordinário da Segurança Pública, Jungmann disse que está havendo uma banalização da intervenção das Forças Armadas na Segurança Pública, que não deve ser resolvida dentro dos parâmetros da Defesa.

Para ele, é preciso combater o crime organizado “sem jamais desconsiderar a lei e os direitos humanos”, pois “(...) O Estado e a sociedade não podem se equiparar ao crime organizado, sob pena de a ele se igualar”. O comandante do Exército, que já se queixara anteriormente sobre os constantes pedidos de intervenção militar nos Estados para combate ao crime organizado, disse que o período de nove meses para a intervenção na Segurança Pública do Rio “é insuficiente para que se possa atingir com profundidade as causas que levaram a esse estado de coisas”.

Vera Magalhães: Que tiro foi esse?

- O Estado de S.Paulo

Pela primeira vez desde a decretação da intervenção federal no Rio de Janeiro, há dez dias, um auxiliar de Michel Temer que participou das negociações reconheceu ontem que uma das variáveis levadas em conta na decisão, e na subsequente criação do Ministério da Segurança Pública, foi o medo do crescimento do apelo do “discurso reacionário e antidemocrático” na população do Rio.

Em resumo: o governo Michel Temer se pautou, entre outros fatores, pela necessidade de conter o apelo da candidatura de Jair Bolsonaro, calcada sobretudo na ideia de ordem, ao decidir pela intervenção e concentrá-la apenas na área da segurança – tornada uma prioridade da gestão.

A avaliação no Planalto é de que, num primeiro momento, a tática surtiu efeito. A prova seria a forma “desorganizada” com que o deputado e pré-candidato à Presidência reagiu à intervenção – sem apoiá-la de maneira clara em suas falas, mas votando favoravelmente na Câmara.

Aliados de Temer admitem, no entanto, que é cedo para que o governo possa comemorar como bem-sucedida a transformação da segurança em bandeira do presidente. Consideram que os passos dados até aqui são coerentes e mostram a disposição de lidar com o problema, mas serão necessários ao menos dois meses para que isso resulte em dados concretos.

Até lá, a ordem em Brasília é receber, mas represar, pedidos de ações em outros Estados. O instituto da intervenção é inédito e, como tal, não deve ser banalizado, afirma um auxiliar direto de Temer, que admite que isso poderia fazer o tiro sair pela culatra.

Bruno Boghossian: Zerar o jogo

- Folha de S. Paulo

Escalado por Michel Temer no comando da Polícia Federal para controlar a Lava Jato, o delegado Fernando Segovia se transformou, nos últimos 110 dias, em um risco que precisava ser eliminado.

O presidente, que esperava estancar a sangria no momento em que a operação se aproximava dele de maneira crítica, percebeu que as declarações desavergonhadas do diretor da PF em sua defesa começavam a provocar o efeito contrário.

As inúmeras tentativas de Segovia de desmerecer o trabalho de investigadores que confrontavam Temer produziram um ambiente de hostilidade e provocaram reações enérgicas na Polícia Federal, na Procuradoria-Geral da República e no STF.

O governo passou a enxergar, por exemplo, uma ameaça de insurgência dos agentes da PF que cuidam do principal inquérito que envolve Temer, suspeito de favorecer empresas que atuam no porto de Santos.

Bernardo Mello Franco: O delegado que morreu pela boca

- O Globo

No primeiro dia, ele já disse a que veio. Minutos depois de assumir o comando da Polícia Federal, Fernando Segovia saiu em defesa do chefe. Ele sugeriu que as investigações contra Michel Temer não teriam reunido provas suficientes para denunciá-lo.

“Uma única mala talvez não desse toda a materialidade criminosa de que a gente necessitaria”, disse. O delegado se referia a um flagrante de corrupção explícita: a entrega de R$ 500 mil a Rodrigo Rocha Loures, ex-assessor do presidente.

Segovia ascendeu na polícia com a ajuda da política. Sua nomeação teve as digitais de José Sarney, Eliseu Padilha e Augusto Nardes. Em comum, todos enrolados em delações da Lava-Jato.

Os padrinhos não tiveram motivo para se arrepender. Sob nova direção, a PF reduziu o ritmo de operações contra aliados do governo. A temporada de sustos ficou para trás. Figurões em apuros, como Aécio Neves, sumiram discretamente do noticiário de escândalos.

Ricardo Noblat: Sorte de Lula ficará para ser definida mais tarde

- Blog do Noblat

STJ está pronto para negar pedido de habeas corpus para o ex-presidente

Amanhã, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deverá desconhecer o pedido de habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Lula para evitar que ele seja preso de imediato caso o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), de Porto Alegre, confirme a sentença que o condenou a 12 anos e um mês cadeia.

O pedido de habeas corpus foi negado de maneira provisória pelo STJ em 30 de janeiro último. Há prazos para que os advogados de Lula apresentem recursos contra uma eventual confirmação da sentença pelo TRF4. E enquanto não se esgotarem tais recursos, não haveria por que conceder-lhe um habeas corpus.

Se esse for de fato o entendimento da Quinta Turma, a esperança da defesa de Lula de livrá-lo da prisão se transferirá para o Supremo Tribunal Federal (STF). Ali, a ministra Cármen Lúcia, presidente do tribunal, está sob a pressão de alguns dos seus pares interessados em revogar o direito da 2ª. instância da Justiça de mandar prender um condenado por ela.

A ministra já disse que essa questão não deverá tão cedo ser reexaminada pelo plenário de 11 ministros do STF. Da última vez que foi, há dois anos, o STF decidiu por seis votos contra cinco que a Justiça de 2ª instância pode, sim, determinar o início do cumprimento de pena. O ministro Gilmar Mendes, que votou a favor, desta vez votaria contra.

Luiz Carlos Azedo: Canetada decisiva

- Correio Braziliense

Raul Jungmann assumiu o Ministério da Segurança Pública e logo demitiu o diretor da Polícia Federal, Fernando Segóvia. Foi uma demonstração de força, antes que se organizassem resistências às mudanças decorrentes da criação da pasta. Segóvia já estava no pelourinho, por sua atuação desastrada, mas ninguém esperava uma medida tão imediata e de tamanho impacto na estrutura que pretende comandar como ministro extraordinário. O demitido despachava diretamente com o presidente Michel Temer e tem amplo relacionamento político, principalmente junto à cúpula do Senado.

Vários problemas foram resolvidos com a canetada: primeiro, Jungmann assegurou o monopólio da interlocução com Temer; segundo, apaziguou a relação da PF com o ministro Luís Barroso, do Supremo Tribunal Federal, relator de inquérito que investiga o presidente da República; terceiro, limpou a área com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que andava indignada com o diretor da PF por causa das tentativas de monitorar as investigações da Operação Lava-Jato; quarto, aproximou a nova pasta do ministro da Justiça, Torquato Jardim, ao nomear para o lugar de Segóvia o delegado Rogério Garollo, que o assessorava como secretário de Justiça; finalmente, acenou para os delegados da PF que a autonomia na condução das investigações não sofrerá interferência.

Segóvia era um fio desencapado, em quatro meses no cargo abriu várias frentes de conflito. Por ser relacionado com a cúpula do MDB, se movimentou com açodamento na política, o que foi seu maior erro. Sua intenção era mostrar serviço para o Palácio do Planalto, mas acabou virando uma presença incômoda na equipe do governo, como é comum acontecer quando o sujeito começa a ser chamado de macaco em casa de louças. Quando Jungmann tomou posse, a demissão já havia sido decidida. Temer estava sendo responsabilizado pelas ações de Segóvia.

Garollo era o candidato do ex-diretor-geral da Polícia Federal Leandro Daiello à sua própria sucessão. Apesar do apoio do ministro Torquato Jardim, teve a nomeação barrada pela cúpula do MDB, que via em Segóvia um delegado amigo e capaz de dar um freio de arrumação na Operação Lava-Jato. Garollo atuou no Comitê Executivo da Interpol, foi adido em Washington, diretor-executivo, diretor de Administração e Logística, superintendente em Goiás, além de chefe-adjunto em Pernambuco e da Divisão de Passaportes. Também chefiou o grupo de inteligência policial e fiscalização de drogas do estado de São Paulo, o que está em sintonia com a nova prioridade do governo.

Fábio Alves: A inflação sumiu!

- O Estado de S.Paulo

Taxa acumulada em 12 meses deve voltar a subir, mas sem fôlego para assustar o BC

Após a divulgação do IPCA de setembro do ano passado, quando o índice oficial de inflação acumulou alta de 2,54% em 12 meses ante a taxa anualizada de 2,46% em agosto, os analistas foram unânimes em dizer que o vale nos preços ao consumidor havia ficado para trás e que, dali em diante, a aceleração do IPCA poderia acender um sinal amarelo no Banco Central e antecipar o fim do atual ciclo de corte de juros.

Naquela ocasião, temia-se que os preços dos alimentos voltariam a subir, após terem registrado deflação na esteira de uma safra agrícola recorde, em ritmo mais acelerado e que a recuperação da economia brasileira aqueceria a demanda de consumidores e, por tabela, os preços de bens e serviços.

Não foi o que aconteceu. Mais ainda: está em curso uma inércia inflacionária “benigna”, a qual poderá amplificar os efeitos dos preços baixos ao desestimular os vários agentes da economia a reajustar com mais força os valores cobrados por bens e serviços.

Monica de Bolle*: ‘Não mexa na minha inflação’

- O Estado de S.Paulo

Nem mesmo Meirelles e sua equipe foram capazes de dar novo rumo à política fiscal brasileira como pretendiam

Tão logo o governo ressuscitou o debate sobre a necessária autonomia do Banco Central depois do enterro da reforma da Previdência, eis que surgiram propostas de políticos clamando pela expansão do mandato do Banco Central. As propostas são oportunistas por razões diversas, inclusive porque há hoje no mundo intensa discussão sobre a abrangência dos mandatos das instituições responsáveis pela política monetária. Há quem argumente de forma rigorosa que o estreito mandato da estabilidade de preços não mais se adequa a determinadas situações que emergiram da crise de 2008. Outros defendem a manutenção da estabilidade de preços como mandato único por razões igualmente válidas. A verdade, como sempre, está nos detalhes e no contexto histórico de cada país.

Para os países que sofreram diretamente os efeitos da crise de 2008 – praticamente todas as grandes economias avançadas –, as surpresas foram grandes. Muitos esperavam que as medidas excepcionais de expansão monetária levariam eventualmente a uma expressiva alta dos preços logo que a retomada da atividade se consolidasse. Em jargão de economista, achava-se que a crise não havia influenciado o conhecido trade-off entre inflação e desemprego: quanto mais baixo o desemprego, mais alta a inflação.

Contas públicas têm em janeiro melhor resultado em 22 anos

Superávit de R$ 31 bi foi puxado por Refis, e quadro fiscal ainda é de desafios

Bárbara Nascimento e Marcello Corrêa | O Globo

-BRASÍLIA E RIO- As contas públicas encerraram janeiro com o melhor resultado em 22 anos, desde o início da série histórica, informou ontem o Tesouro Nacional. No mês passado, o governo central, formado por Tesouro, Previdência Social e Banco Central, registrou superávit primário de R$ 31,07 bilhões. O número foi divulgado um dia após relatório da Receita Federal mostrar que a arrecadação federal teve em janeiro o melhor desempenho para o mês desde 2014. Apesar dos dados positivos, especialistas alertam que o quadro fiscal ainda é de desafios no longo prazo, principalmente em relação à reforma da Previdência, que o governo acabou abandonando. Em 12 meses, as contas públicas continuam deficitárias em R$ 111,2 bilhões.

Normalmente, janeiro é mês de resultados positivos, por fatores sazonais. Os dados divulgados ontem, no entanto, são considerados fora da curva. O superávit do mês passado representa uma alta real (já descontada a inflação) de 67,8% em relação a janeiro de 2017, quando o superávit foi de R$ 18 bilhões.

Isso foi possível porque as receitas cresceram muito mais que as despesas. Enquanto o gasto teve alta de 1,6%, as receitas líquidas registraram aumento de 11,7%. O Tesouro explicou que o resultado positivo tem relação com três fatores principais: as receitas do Refis (programa de regularização tributária), o aumento do PIS/Cofins sobre combustíveis e a retomada da atividade econômica.

Vinicius Torres Freire: Mudanças históricas, juros histéricos

- Folha de S. Paulo

Situação do crédito melhora, continua desmanche da banca estatal e juros roubam poder de consumo

Cheque especial e cartão continuam arapucas assassinas mesmo depois da conversa de mudanças do BC e dos bancos. No entanto, a situação geral do crédito no país continuava a melhorar em janeiro, apesar do noticiário pessimista sobre o balanço dos empréstimos bancários, divulgado nesta terça (27).

Cheque especial e cartão de crédito rotativo ou parcelado levam menos de 3% do total do dinheiro emprestado pelos bancos. Desgraçam a vida de muita gente, mas não dizem muito sobre o crédito e a economia.

Em ritmo ainda lerdo, mas acelerando, aumenta o total de dinheiro novo emprestado. De maio de 2014 até meados do ano passado, a concessão de crédito diminuía. No início deste 2018, crescia 4,5% em relação ao ano passado (média trimestral, em relação ao mesmo período de 2017; crescimento real). Os novos empréstimos de janeiro ainda são menores que os de 2015, uma miséria, mas estamos saindo do buraco.

A despesa mensal das famílias com o pagamento de suas dívidas (o serviço da dívida) baixou ao menor nível médio desde fevereiro de 2011. O gasto com amortização é o menor desde 2005, pelo menos.

Roberto DaMatta: Intervenção e revolução

- O Estado de S.Paulo

O século passado está permeado das carcaças de revoluções fracassadas

São conceitos originários do triunfo do campo político e econômico e, não por acaso, dominam o nosso pensamento e permeiam os valores da chamada “modernidade ocidental”, hoje globalizada. Aprimorados sob a égide do indivíduo-cidadão como motor da vida social, o político e o econômico estão interligados. Vale observar, porém, como “intervenção” e “revolução” estão ausentes ou são raros no campo religioso. Essa esfera que, ao lado da economia e da política, possui primazia na nossa visão de mundo.

Fizemos muito mais revoluções (e intervenções) políticas e econômicas do que religiosas, um campo no qual – no nosso sistema cultural – predominam as “reformas”. Reformar é promover uma modificação relativa situada aquém daquilo que a nossa cosmologia ainda figura no espaço de redentoras transformações sociais. De um certo ponto de vista, a ideia de revolução com “R” maiúsculo, enfeixaria todos os campos sociais menos, é óbvio, o do paradoxal interesse ou vontade popular de realizá-la e dirigi-la. Seriam as revoluções alérgicas ao religioso porque prometem uma transcendência histórica enquanto a religião garante uma eterna salvação? Ou revolução e religião não combinam também porque o ponto de partida revolucionário seria construir (ou reconstituir, como queriam os pensadores radicais vitorianos) um paraíso neste mundo e não no outro? 

O materialismo iluminista e burguês afirma que tudo (inclusive as ideias) vêm da realidade física e biológica. Neste universo sem ironia, paradoxo, liminaridade, ambiguidade e incoerência, o elo entre a matéria e o espírito é de ordem mecânica – menos, é claro – a utopia revolucionária a qual promove sem saber um inconsciente retorno ao religioso.

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O século passado – como diz o harvardiano Nur Yalman – está permeado das carcaças de revoluções fracassadas. Lenin, Stalin, Mao, Mussolini e Hitler tentaram todos controlar a modernidade – para detê-la ou acelerá-la – e falharam. Mustafa Kemal Pasha, o famoso Atatürk tendo como inspiração o materialismo burguês, buscou acomodar soberania popular com islamismo nas décadas de 20 e 30 do século passado, mas, como diz Yalman (que é turco), tal tentativa fracassou no atual regime de Erdogan.

Fizemos muito mais revoluções políticas e econômicas do que religiosas e, no entanto, a Reforma que, pelo credo revolucionário, seria uma mera rebelião, agenciou uma irônica mudança sem precedentes. A crer em Max Weber e Karl Polanyi, ela estilhaçou o centralismo, reinventou a racionalidade, o capitalismo e o mercado...

Tivemos também o nosso momento revolucionário com Getúlio Vargas, em 1930, e até hoje persiste dúvida na classificação do movimento militar ocorrido em 1964. Para quem diz que o movimento ocorreu no dia 1.º de abril, todo mundo caiu num golpe. Para quem se refere a um romano fim de março, teria sido revolução.

A intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro, determinada por imoralidade administrativa, a perda de controle da rotina tomada por bandidos e a mais absoluta ausência de competência têm suscitado reações.

A missão do Ministério da Segurança Pública: Editorial | O Globo

Mesmo com suspeições em torno da nova pasta, devido ao governo Temer, ela pode servir para a tão reivindicada integração no combate ao crime

Apoio comunitário a policiais é opção para crise na segurança. Cercado de suspeições por se originar do governo Michel Temer e seu grupo no MDB, o Ministério Extraordinário da Segurança Pública está criado, entregue a Raul Jungmann, que saiu da Defesa tendo acumulado quilometragem no relacionamento com militares, essenciais no combate ao crime no estágio a que chegou no país. Espera-se que faça o que é imprescindível ser feito.

Há, neste ato, o aspecto positivo de ser o primeiro passo efetivo da União para, enfim, formalizar sua participação, junto com os demais entes federativos, no enfrentamento constante da séria crise de segurança pública que atinge o país, e há tempos. Desde a redemocratização, institucionalizada pela Constituição de 1988, nenhum presidente da República quis assumir o ônus de levar para o terceiro andar do Planalto o problema da segurança pública, embora fosse necessário.

No primeiro governo Lula, um então poderoso ministro esvaziou pertinente programa feito para integrar União, estados e municípios no combate ao crime, com o argumento meramente político-eleitoral de que era um erro permitir que cadáveres fossem depositados na porta do gabinete presidencial.

Os juros do Fed: Editorial | O Estado de S. Paulo

Com a economia em recuperação, desemprego ainda elevado e reformas emperradas, o Brasil é especialmente vulnerável a um aperto mais forte na política de juros do banco central americano, o Federal Reserve (Fed), o mais poderoso do mundo, capaz de afetar o mercado internacional de financiamentos e investimentos. Mas o aperto deve continuar gradual, como tem sido até agora, segundo indicou ontem o novo presidente do Fed, Jerome Powell, em seu primeiro depoimento na Câmara de Representantes dos Estados Unidos. A ideia, segundo ele, é manter a estratégia seguida com sucesso pela antecessora, Janet Yellen: tornar as condições de crédito menos frouxas, mas com muito cuidado até a inflação atingir a meta de longo prazo de 2% ao ano. Tranquilizador, o recado chegou, no entanto, com a ressalva habitual e hoje mais importante que nas fases anteriores: o rumo das decisões dependerá, como sempre, das perspectivas indicadas pelas novas informações.

A expectativa de três aumentos de juros neste ano foi reafirmada pela maior parte dos especialistas ouvidos pela imprensa, depois da apresentação. Alguns mantiveram, no entanto, a previsão de quatro aumentos, levando em conta o firme crescimento da economia americana, a multiplicação de empregos e a possível intensificação das pressões inflacionárias. Nenhuma frase de Jerome Powell favoreceu diretamente essa avaliação, embora sua descrição inicial do quadro econômico tenha sido quase entusiástica.

O reinado de Xi: Editorial | Folha de S. Paulo

O ambicioso líder chinês está perto de obter autorização para se perpetuar no posto

Por 25 anos a China foi uma ditadura praticamente sem rosto, conduzida pela burocracia opulenta do Partido Comunista e sem maior traço de ambições personalistas.

Esse ciclo terminou no domingo (25), quando o Comitê Central do Partido Comunista chinês propôs abolir da Constituição a cláusula que limita a dois os mandatos consecutivos do presidente.

Não que restasse grande dúvida sobre as aspirações de Xi Jinping, o ocupante do cargo desde 2013 e, desde o ano anterior, secretário-geral do partido, como é a praxe.

Com a mudança, que acrescenta algo de bolivariano ao regime, ele poderá se perpetuar no poder além de 2023, prazo final de seu segundo mandato. É algo inédito desde a saída de Deng Xiaoping, o herdeiro de Mao Tse-tung, em 1992.

A onipresença do sorriso de Xi em pôsteres, grafites e souvenirs nas grandes cidades já alimentava especulações sobre um papel que se anunciava maior do que o de seus últimos antecessores.

Discursos recentes do líder em fóruns internacionais, que delineiam com cada vez mais nitidez as pretensões globais de Pequim e de seu dirigente máximo num momento de vácuo global de estadistas, também se mostram novidade.

PC chinês muda de rumo e entrega todo o poder a Xi: Editorial | Valor Econômico

Desde 2012, quando foi elevado à máxima instância decisória do Partido Comunista da China, Xi Jinping dedicou-se a concentrar poder em suas mãos. Está prestes a dar seu último passo: eliminar os limites fixados pela Constituição de 1982, de dois mandatos, e se perpetuar no poder. Xi Jinping quebrou a regra instituída por Deng Xiaoping após os tumultos da Revolução Cultural de Mao Tsetung, que garantiu paz suficiente no estreito círculo de poder da ditadura para a surpreendente arrancada econômica de mais de duas décadas. A era da relativa estabilidade política na China começa a acabar agora.

O anúncio da mudança pretendida pela imprensa oficial chinesa foi emblemática. A quebra da tradição da direção colegiada apareceu sem destaque em meio a outros pontos que serão aprovados na reunião anual do Congresso Nacional do Povo, órgão pseudo-legislativo que apenas sanciona os desejos da direção do PC. Aos primeiros sinais de oposição, o governo usou sua "Grande Muralha" nas comunicações para impedir sua propagação. Ao Congresso caberá não só sagrar o poder definitivo de Xi como sancionar as metas econômicas para os próximos anos.

Algumas palavras voltaram a ganhar força nos órgãos de propaganda oficiais - lealdade é uma delas. Xi quer reforçar seu poder, identificando sua vontade absoluta com a do partido, como na URSS do velho Stalin. O trabalho interno de reconstrução do partido, ou "rejuvenescimento" como prefere o presidente, está em estado muito adiantado após os expurgos massivos e prisões resultantes da campanha anti-corrupção.

Alckmin faz evento sobre segurança perto do Rio

Presidenciável tucano estará com forças da polícia no vale do Paraíba

Igor Gielow | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Pressionado por aliados a não deixar o debate sobre a segurança pública como monopólio do governo Michel Temer (MDB), o presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB) deverá fazer nesta quarta (28) discurso durante uma grande mobilização policial para marcar sua posição.

Segundo o plano até a noite de terça, o governador paulista estará em uma cidade do vale do Paraíba acompanhado de aparato da Polícia Militar —helicópteros e cavalaria devem emoldurar sua fala, que, além de sinalizar disposição de combate ao crime, poderá ofertar ajuda ao Rio.

A região é a ponte entre o Estado e o vizinho, que está sob intervenção federal na segurança desde o dia 16.

Há dois cálculos envolvidos. Primeiro, conter a primazia de Temer, que interveio no Rio e nesta terça (27) catapultou Raul Jungmann do Ministério da Defesa à recém-criada pasta da Segurança.

Não que os estrategistas tucanos temam, a essa altura, o robustecimento de uma candidatura apoiada pelo governo —já se coloca na pista, por exemplo e apesar de diversas dificuldades, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD).

Nos meios políticos, o protagonismo que Jungmann vem ganhando com o apoio de Temer também tem chamado a atenção.

Jungmann assume e já troca comando da PF

Troca de comando faz policiais federais reclamarem de instabilidade

Presidente de associação de delegados fala de possíveis mudanças em todo o comando da PF

Rubens Valente | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A segunda substituição no comando da Polícia Federal em apenas 110 dias causou preocupação entre policiais federais pela instabilidade no órgão. Eles preveem uma terceira troca até o fim do ano, caso Temer não consiga se reeleger ou eleger um sucessor.

Fernando Segovia assumiu o cargo em 20 de novembro passado e foi substituído nesta terça-feira (27) por decisão do novo ministro extraordinário da Segurança Pública, Raul Jungmann.

Para Edvandir Paiva, presidente da ADPF (Associação dos Delegados da Polícia Federal), a principal repercussão entre os policiais é a sensação de instabilidade na corporação. Quando um diretor-geral assume, tem por hábito substituir os responsáveis pelas seis diretorias que formam o comando da PF.

Como efeito em cadeia, superintendentes regionais podem ser substituídos para acomodar aliados do novo diretor-geral de forma a alinhar os gestores do segundo escalão com o comando em Brasília.

"A instabilidade, para a instituição, é muito ruim. Eu acho queprecisamos ter previsibilidade, não passar por tantas alterações. Essas mudanças são muito prejudiciais para uma Polícia Federal que tem tantos trabalhos em andamento", disse o presidente da ADPF.

Paiva afirmou que suas críticas não se dirigem a Galloro, que é considerado um delegado capaz, está na PF desde 1995 e desempenhou diversas funções no órgão, mas sim às "constantes trocas". Para ele, a instabilidade administrativa poderá afetar os diversos inquéritos mais sensíveis e que demandam mais gastos.

Desgastado por inquérito sobre Temer, diretor da PF é demitido

Anunciada por Jungmann, queda estava decidida há duas semanas

Raquel Dodge pede ao Supremo que presidente seja incluído em investigação a respeito do suposto recebimento de propina da Odebrecht em troca de vantagens na Secretaria de Aviação Civil

A demissão do diretor da PF, Fernando Segovia, determinada pelo ministro Jungmann (Segurança Pública), já estava decidida pelo governo há duas semanas, diante da repercussão da entrevista em que o delegado sugeriu o arquivamento de inquérito sobre Temer. Em 111 dias, Segovia se envolveu em polêmicas e provocou rebelião na PF. O substituto será Rogério Galloro, atual secretário nacional de Justiça. A procuradora Raquel Dodge pediu ao Supremo que Temer seja investigado em inquérito que apura pagamento de propina pela Odebrecht em troca de benefícios na Secretaria de Aviação Civil.

Passagem relâmpago

Temer demite diretor-geral da PF após três meses de gestão marcada por fortes críticas

Jailton de Carvalho e Catarina Alencastro | O Globo

-BRASÍLIA- No primeiro ato depois de tomar posse, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungman, demitiu o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia e, no mesmo instante, nomeou o atual secretário Nacional de Justiça, Rogério Galloro, para comandar a instituição. Segovia reagiu com perplexidade à notícia da demissão. Pouco antes da divulgação da informação, o agora ex-diretor tinha participado de uma reunião de quase duas horas com Jungmann, Galloro e outros dirigentes de setores a serem transferidos da pasta da Justiça para o novo ministério.

A troca fez parte de um pacote acertado pelo Palácio do Planalto a partir da definição sobre a criação da nova pasta. Desde que o governo começou a gestar o decreto de intervenção no Rio, na semana retrasada, já era dada como inevitável na equipe mais próxima de Michel Temer a saída do diretor-geral, alvo de inúmeras críticas. O fato determinante foi a repercussão, principalmente jurídica, das declarações dadas por ele sugerindo um arquivamento da investigação contra o presidente. Faltava resolver o melhor momento para demiti-lo, de modo a não chamar ainda mais atenção para o episódio.

Jungmann demite Segovia da chefia da Polícia Federal

Desgastado e apenas três meses após ter assumido o cargo, delegado será substituído por Rogério Galloro

Depois de ter se envolvido em polêmicas nos pouco mais de três meses em que permaneceu no cargo, o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, foi demitido ontem pelo ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann. O pedido para tirá-lo da função teria sido feito anteontem por Jungmann ao presidente Michel Temer. Segovia deve exercer a função de adido da PF nos EUA.

O fator de desgaste do agora ex-diretor da PF foi uma entrevista, concedida durante o carnaval, em que indicou a tendência pelo arquivamento de inquérito contra Temer relacionado ao Decreto dos Portos. Antes, ele já havia declarado que uma só mala não era prova suficiente de crime de corrupção – sobre a ação que flagrou o ex-assessor da Presidência Rodrigo Rocha Loures com R$ 500 mil. Segovia será substituído pelo delegado Rogério Galloro, que já foi o “número 2” da corporação.

Rogério Galloro deve trocar a cúpula da corporação o. Inteligência e investigação e combate ao crime organizado estariam na mira.

Jungmann tira Segovia da chefia da Polícia Federal

Tânia Monteiro Carla Araújo Fabio Serapião | O Estado de S. Paulo.

BRASÍLIA - Empossado ontem como ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, em seu primeiro ato na nova pasta, demitiu o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia. O delegado será substituído por Rogério Galloro, que já ocupou o cargo de diretor executivo, uma espécie de número dois da corporação, na gestão de Leandro Daiello, antecessor de Segovia no cargo.

A mudança ocorre na esteira da criação do ministério, que ficará responsável pela PF. Segundo apurou o Estado, Jungmann fez o pedido anteontem à noite ao presidente Michel Temer, que concordou. Ao assumir o cargo, o novo ministro ganhou liberdade para montar sua equipe. De acordo com um interlocutor, Temer quis saber qual seria o destino de Segovia, que deverá exercer a função de adido da PF nos Estados Unidos.

A decisão pela troca não tem relação com um episódio específico, mas levou em conta o desgaste de Segovia no cargo. Sua nomeação, em novembro passado, foi cercada de desconfiança e atribuída à indicação de emedebistas investigados.

Nos pouco mais de três meses que ficou no comando da PF, acumulou episódios polêmicos (mais informações nesta página). Logo na posse, disse que só uma mala de dinheiro não era suficiente para provar crime de corrupção no caso envolvendo a mala com R$ 500 mil recebida pelo ex-assessor da Presidência Rodrigo Rocha Loures.

Um dia antes da demissão, PGR pede “ordem judicial” para que Segovia não comente inquéritos, sob pena de afastamento do cargo. ao chamado Decreto dos Portos. As declarações resultaram em uma forte reação de associações de delegados, um pedido de esclarecimento do ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, além de uma petição da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para que ele se abstivesse de “qualquer ato de ingerência” sobre investigação em curso, sob pena de afastamento do cargo.

Ontem, em outro episódio que demonstrou seu enfraquecimento no cargo, Segovia voltou atrás em um pedido para que delegados fornecessem o número do inquérito ao solicitar reforço para operações. Internamente, a norma é vista como praxe. Mas a crise de confiança envolvendo Segovia já era grande e a versão de que isso seria mais uma forma de intervir nas investigações ganhou força, resultando no recuo.

Cerimônia. Antes de ser demitido, Segovia prestigiou a posse de Jungmann, no Palácio do Planalto. Na terceira fileira, foi um dos puxadores de palmas após o discurso do novo ministro. Abordado por jornalistas, Segovia afirmou que não poderia falar sobre investigações porque a Justiça havia proibido suas manifestações. Após a cerimônia, ainda se reuniu com Jungmann. Pouco tempo depois, foi informado sobre sua demissão.

Ex-braço direito de Daiello no comando da PF, Galloro era o favorito para chefiar a corporação em novembro passado, quando foi preterido por Segovia. Seu nome era defendido pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim, que, segundo relatos, comemorou a troca. Questionado pelo Estado, no entanto, Torquato negou ter influenciado na substituição. “Não há vencidos nem vencedores.”

Internamente, a nomeação de Galloro é considerada uma retomada do estilo de gestão de Daiello, que comandou a PF por quase sete anos. Galloro ingressou na corporação em 1995. Tem mais de 22 anos de carreira e foi adido da PF nos Estados Unidos. Também foi superintendente regional em Goiás. Para assumir o posto, deixa o cargo de secretário nacional de Justiça.

Colaboraram Naira Trindade e Vera Rosa

'Quem for o candidato do mercado vai perder', diz FHC

Ex-presidente afirma no Fórum Estadão que o País não é composto 'só de mercado'

Daniel Weterman e Marcelo Osakabe | O Estado de S.Paulo

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que um candidato que defenda apenas bandeiras do mercado vai perder as eleições para presidente da República. "O País não é composto de mercado só. Quem for o candidato de mercado vai perder (as eleições)", disse FHC durante o primeiro evento da série 'A Reconstrução do Brasil' do Fórum Estadão realizado nesta terça-feira, 27, em São Paulo.

"É preciso candidato que mostre que a vida será melhor e mais segura. É preciso ter discurso, mas não é só discurso que convence", afirmou o ex-presidente. "O povo não sentiu melhorias do governo Temer."

FHC defendeu a candidatura do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), à Presidência. Segundo ele, o pré-candidato tucano ao Planalto pode reunir condições para se tornar um líder estadista, mas que ele terá de encontrar "a mensagem" para passar ao eleitor. "A incerteza é tanta que um pouco de certeza pode ser positivo’, diz FHC sobre Alckmin. "O Brasil precisa de reconstruir a confiança, quer segurança, emprego e renda. O País precisa de coisas simples."

O ex-presidente negou que tenha "lançado" outros candidatos à Presidência, em referência ao apresentador e empresário Luciano Huck. "Parece que lancei quatro candidatos nas últimas semanas, mas não lancei", disse. "O Luciano é meu amigo, mas não lancei." Depois de muita especulação, apresentador desistiu de disputar as eleições para presidente.

Não vejo um candidato novo, diz ex-presidente
Após Huck anunciar que não pretende concorrer ao Planalto, FHC declarou que não vê mais nenhum nome que represente o "novo" na política e tenha condições de ser eleito neste ano. "Eu francamente não vejo idealmente um candidato (nesse campo)", disse o ex-presidente. Ele afirmou que um candidato novo teria dificuldade em estruturar uma aliança de partidos e tempo de propaganda suficientes para ganhar o pleito. "O novo, sem nada disso, é só uma ideia, não é uma compreensão política."

Para ele, a sociedade está "tateando" alguém novo na eleição, mas é preciso "jogar com as cartas que estão aí". Ele negou, mais uma vez, qualquer intenção em concorrer novamente à Presidência da República. "Eu tenho 86 anos, eu tenho e quero fazer outras coisas."

Governos que não são fortes apelam aos militares
Ao ser questionado sobre escolha de um general da reserva do Exército para ocupar o cargo de ministro da Defesa, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso afirmou que na América Latina há casos de governos que utilizaram os militares para se fortalecer.

Supremo se transformou em grande espetáculo televisivo, diz ex-ministro

Segundo ex-ministro, a Constituição de 1988 é extensa demais e isso faz com que o STF se torne efetivamente uma quarta instância dos processos

Daniel Weterman e Marcelo Osakabe | O Estado de S.Paulo

O Supremo Tribunal Federal se transformou em um grande espetáculo televisivo, o que traz um problema de necessidade de protagonismo, afirmou Eros Grau, ex-ministro da Corte, durante Fórum Estadão realizado nesta terça-feira em São Paulo. O jurista citou uma pesquisa recente mostrando que 51% das decisões tomadas no Tribunal foram feitas monocraticamente, contrariando o espírito colegiado da última instância.

Segundo Eros, o STF virou um tribunal monocrático em que os interesses a visões indivuduais se sobrepõem ao plenário. Isso fez com que STF se tornasse efetivamente uma quarta instância dos processo. "Para evitar isso, bastava aplicar a lei efetivamente", disse Eros.

A tese foi defendida também pelo ex-presidente da Corte Nelson Jobim, que citou as liminares derrubando a decisão de prisão em segunda instância como exemplo da individualização da Corte. Para Jobim, um dos problemas desse protagonismo dos membros do Supremo acaba sendo a necessidade de alguns de "construir sua biografia".

"Há um problema na origem da indicação ao Supremo. Temos dois tipos de indicação, aqueles que tiveram ou passaram a ter relação direta com o presidente que indicou em consequência de sua biografia e outros que não tinham biografia antes de chegar à Corte. Quando chegam ao STF, os que não tinham biografia passam a diferir na Corte para construir seu individualismo, sua biografia."

Para FH, intervenção expõe governo fraco e 'encurralado'

Segundo ex-presidente, é legítimo que Michel Temer

Silvia Amorim | O Globo

SÃO PAULO — Para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o governo federal decretou a intervenção na segurança do Rio de Janeiro porque está "encurralado". O tucano evitou se posicionar sobre a medida, alegando não ser especialista em segurança. Mas falou sobre efeitos que a intervenção poderá ter na eleição e defendeu ser "legítimo" que o presidente Michel Temer tire proveito político da ação.

— Não sei quais foram os motivos que levaram (à intervenção) a não ser mesmo a segurança. Tem outros? Pode tirar proveito? É legítimo tirar proveito. Acho que o governo fez porque está encurralado. Tem que fazer alguma coisa e governos que não são fortes apelam para o militar — disse FH.

A declaração foi feita durante entrevista nesta terça-feira no evento "Fórum Estadao". Perguntado como agiria se estivesse presidente da República, ele desconversou.

— Eu sei lá. Não sou especialista em segurança pública. Não sei qual é a solução.

FH disse apenas o que acredita ser o caminho a não ser seguido.

— Não pode ser (uma ação) de repente e espetacular. É um processo que precisa ter continuidade e perseverança. Tem que restabelecer a confiança da população com a autoridade.

Ele lembrou que na gestão dele ma Presidência houve pressão para decretar intervenções em alguns estados e citou como exemplo o Espírito Santo.

— Na época não fiz porque a intervenção paralisaria as reformas constitucionais.

FH atribuiu a situação menos problemática da segurança pública em São Paulo à existência de uma única facção criminosa no estado. Para ele, a polícia paulista também estaria sendo "eficiente".

Roberta Sá: Brigas nunca mais (Tom Jobim)

Carlos Drummond de Andrade: Canto ao homem do Povo - Charles Chaplin

(Trecho/parte II)
II

A noite banha tua roupa.
Mal a disfarças no colete mosqueado,
no gelado peitilho de baile,
de um impossível baile sem orquídeas.

És condenado ao negro. Tuas calças
confundem-se com a treva. Teus sapatos
inchados, no escuro do beco,
são cogumelos noturnos. A quase cartola,
sol negro, cobre tudo isto, sem raios.

Assim, noturno cidadão de uma república
enlutada, surges a nossos olhos
pessimistas, que te inspecionam e meditam:
Eis o tenebroso, o viúvo, o inconsolado,
o corvo, o nunca-mais, o chegado muito tarde
a um mundo muito velho.

E a lua pousa
em teu rosto. Branco, de morte caiado,
que sepulcros evoca mas que hastes
submarinas e álgidas e espelhos
e lírios que o tirano decepou, e faces
amortalhadas em farinha. O bigode
negro cresce em ti como um aviso
e logo se interrompe. É negro, curto,
espesso. O rosto branco, de lunar matéria,
face cortada em lençol, risco na parede,
caderno de infância, apenas imagem
entretanto os olhos são profundos e a boca vem de longe,
sozinha, experiente, calada vem a boca
sorrir, aurora, para todos.

E já não sentimos a noite,
e a morte nos evita, e diminuímos
como se ao contato de tua bengala mágica voltássemos
ao país secreto onde dormem os meninos.
Já não é o escritório e mil fichas,
nem a garagem, a universidade, o alarme,
é realmente a rua abolida, lojas repletas,
e vamos contigo arrebentar vidraças,
e vamos jogar o guarda no chão,
e na pessoa humana vamos redescobrir
aquele lugar - cuidado! - que atrai os pontapés: sentenças
de uma justiça não oficial.

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Aloysio Nunes Ferreira: Países mais próximos

- O Globo

Vemos no Oriente Médio nações vibrantes, terra de oportunidades

De hoje a 6 de março, visitarei Israel, Palestina, Jordânia e Líbano. Temos com a região laços históricos e afetivos, pelo papel exercido por imigrantes judeus, libaneses, palestinos e sírios no desenvolvimento nacional e na formação do tecido social brasileiro, e pela contribuição que damos à causa da paz na região, como demonstram nossa participação em operações de paz da ONU e a acolhida a refugiado sírios.

Em Israel, encontrarei o presidente Reuven Rivlin e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Israel é um país próspero, que se afirma como centro de tecnologia e inovação, com o qual, assim como com a Palestina, o Mercosul mantém acordo de livre comércio. Queremos explorar oportunidades comerciais e de investimento, sem descuidar de outras áreas, em particular a cooperação em defesa, ciência, tecnologia e inovação.

*Rubens Barbosa: Ressuscitando a Doutrina Monroe

- O Estado de S.Paulo

Superada a guerra fria, supremacia dos EUA na América Latina deixou de ser automática

O renascimento da Doutrina Monroe é a grande inovação do governo Trump na recém-anunciada política externa para a América Latina.

O presidente James Monroe, nos idos de 1823, anunciou que os EUA iriam proteger os países sul-americanos de ameaças de colonização vindas de países europeus: “A América para os americanos”. Posteriormente, em 1904, Theodore Roosevelt ampliou essa política para incluir a defesa de direitos de empresas norte-americanas na América Latina. Essas ações ficaram conhecidas como a Doutrina Monroe e seu corolário. No governo Obama, em pronunciamento feito na sede da Organização dos Estados Americanos, John Kerry, então secretário de Estado, afirmou, com grande ênfase, que a era da Doutrina Monroe tinha chegado ao fim.

Recentemente, em discurso na Universidade do Texas (US engagement in the Western Hemisphere), antes de seu passeio este mês pela América Latina, o secretário de Estado, Rex Tillerson, anunciou: “Tínhamos esquecido a importância da Doutrina Monroe e o que ela significou para o Hemisfério”. Em nome dessa doutrina, os EUA, à medida que seu poder aumentava, assumiram o papel de polícia da região e posteriormente do mundo. Na América Latina houve mais de dez intervenções sob a justificativa de defesa dos interesses das empresas norte-americanas e das ameaças aos valores, nem sempre coerentes com a democracia, defendidos por Washington. O retorno dessa percepção no atual governo não pode deixar de ser preocupante.

Sem outras inovações, como nos governos republicanos e democráticos de Clinton, Bush e Obama das últimas décadas, essa política está fundada nos mesmos três pilares: economia, segurança e democracia.

Daniel Aarão Reis: Novos movimentos, outros limites

- O Globo

Vertentes conservadoras são pouco estudadas. Dá-se preferência ao caráter épico das propostas revolucionárias

Nos anos 1960 do século XX, há 50 anos, surgiram concepções e movimentos que interpelaram tradições conservadoras de direita e de esquerda. O ano de 1968 foi especialmente quente, mas, como assinalou Marcelo Ridenti, os tremores que agitaram as sociedades nem sempre se deram com a mesma intensidade num ano preciso. Assim, os marcos cronológicos daquela época agitada ainda dividem os especialistas.

O epicentro do terremoto situouse nos EUA, porém, se estendeu com diferentes características por quase todo o mundo, alcançando a Europa, Ásia e América Latina.

Brotou o movimento das mulheres, questionando a autoridade masculina, reivindicando igualdade de direitos na economia e nas relações afetivas; exigindo o compartilhamento do trabalho doméstico e da educação dos filhos; o controle sobre a reprodução biológica e o direito de as mulheres interromperem por sua vontade a gravidez. Novas leis deveriam autorizar e proteger a emancipação feminina.

Apareceu o chamado poder jovem. Nas escolas e universidades, os jovens questionavam as autoridades consagradas. As relações hierárquicas foram desafiadas. Interdições insensatas, negadas. Proibições, inquiridas. Os estudantes recusavam a lógica excludente de um saber e de um poder esclerosados, incapazes de dar conta dos seus interesses e indagações. Nos EUA, já ninguém queria ser mutilado ou morrer nos arrozais vietnamitas. Na China, a supremacia do Partido Comunista foi posta em questão. Na Europa, no “maio francês” os estudantes armaram barricadas nas ruas. Logo depois, uma greve geral operária contestou a ordem do capital. O general De Gaulle murmurou: trata-se de um chienlit (bagunça). Bagunçada e injusta, gritaram os estudantes, é a desordem que seu governo representa e defende.

*Joel Pinheiro da Fonseca: A utopia das redes sociais

- Folha de S. Paulo

É uma surpresa que o resultado dos megafones nas mãos dos indivíduos seja barulho e tribalismo?

Havia um sonho no início da internet: o sonho de uma humanidade mais unida. Com mais facilidade de comunicação, pessoas de lugares distantes interagiriam mais e derrubariam muros. Com um mar de informações disponível a um clique, quaisquer discordâncias seriam facilmente resolvidas. A tecnologia abria as portas para um mundo da união universal pautada pela ciência.

Infelizmente, não foi o que aconteceu. O contato entre pessoas distantes permitiu que aqueles que pensam igual troquem mais figurinhas e articulem ações conjuntas. Ao mesmo tempo, a abundância de informações permitiu que cada narrativa se servisse de dados e exemplos para reforçá-la e aumentar seu poder de persuasão junto a ouvintes indefesos.

Hoje, aquele sonho de internet (um espaço amplo, aberto e descentralizado) se foi; vivemos no enorme condomínio fechado do Facebook, que acelera a polarização. No início dos anos 2000, alguns poucos aficionados por política e cultura discutiam entre desconhecidos em fóruns online sob identidades anônimas. Hoje, as coisas se misturaram: seu manifesto político na rede te dá reputação (ou ódio) entre pessoas que te conhecem.

Eliane Cantanhêde: Fonte nova, mas velha

- O Estado de S.Paulo

Operação Cartão Vermelho atinge Jaques Wagner e falta time reserva para o PT

Se o Supremo arma o fim branco da Lava Jato, as operações da Polícia Federal contra poderosos e crimes de colarinho-branco vão de vento em popa, com uma peculiaridade: elas embicaram em 2018 para os dois partidos que polarizam a política desde 1994, o PSDB e o PT.

A primeira operação da PF direcionada para corrupção neste ano foi no Paraná, sólido reduto tucano. A segunda foi ontem na Bahia, onde o PT é campeão de votos. Assim, a guerra entre PSDB e PT pode deixar de ser apenas política e passar para a seara da polícia – e justamente no ano da sucessão presidencial.

No Paraná, as buscas e apreensões chegaram à Casa Civil, coração de qualquer governo, mas não diretamente ao governador tucano Beto Richa. Já na Bahia o alvo mais reluzente foi o ex-governador e líder petista Jaques Wagner. O efeito é demolidor.

Uma operação no Paraná aumenta o desânimo com a política e a percepção de que “todos são iguais”, principalmente por vir junto com a revelação de que o engenheiro Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, mantém R$ 113 milhões no exterior. Ele é apontado como “operador” dos tucanos paulistas.

Na Bahia, porém, a Operação Cartão Vermelho (um nome que diz tudo) atinge em cheio uma das últimas reservas do PT para a Presidência. Com a candidatura do ex-presidente Lula virtualmente inviabilizada pela Justiça, o partido só tem, ou tinha, duas alternativas: o baiano Wagner ou o paulista Fernando Haddad. E agora?

Bernardo Mello Franco: Um cartão vermelho para Wagner

- O Globo

Anova operação da Polícia Federal pôs mais uma pedra no caminho do PT. O partido já dava como certo que não conseguirá lançar Lula à Presidência. Agora pode ficar também sem seu plano B: o ex-ministro Jaques Wagner.

O petista foi acusado de embolsar R$ 82 milhões das empreiteiras Odebrecht e OAS. O dinheiro teria sido desviado das obras da Fonte Nova. Pelas contas da PF, o superfaturamento no estádio da Copa chegou a R$ 450 milhões.

Ontem a polícia amanheceu no apartamento de Wagner, numa torre com vista para a Baía de Todos os Santos e a Ilha de Itaparica. Apreendeu papéis, computador e 15 relógios de luxo. Não é a primeira vez que o ex-governador se vê em apuros pelo que ostenta no pulso.

Há dois anos, um lobista da Odebrecht contou ter presenteado Wagner com um relógio avaliado em US$ 20 mil. O petista reconheceu o mimo e se saiu com uma das piores desculpas da Lava-Jato. “Guardei e nunca usei, porque eu uso outro tipo de relógio”, esnobou.

Agora os investigadores também apuram outros tipos de regalo. Segundo a delegada Luciana Matutino, Wagner usou a casa da mãe, no Rio, para receber R$ 500 mil. O ex-ministro é carioca e estudou Engenharia na PUC. Radicou-se na Bahia para fugir da repressão na ditadura militar.

Ricardo Noblat: PT à procura de um plano D ou E

- Blog do Noblat

Quem substituirá Lula como candidato

A batida da Polícia Federal na casa, em Salvador, do ex-governador da Bahia Jaques Wagner, e a suspeita de que ele se beneficiou de dinheiro desviado da reforma do Estádio da Fonte Nova, obrigarão o PT a procurar um plano D ou E para candidato à sucessão do presidente Michel Temer.

Sem Lula, a eleição será uma fraude, repetem sem sucesso os caciques do PT. Mas, na prática, eles contavam com Wagner para substituir Lula como candidato. À sua revelia, Wagner era o Plano B. Ganhou duas vezes o governo da Bahia direto no primeiro turno.

Mais: elegeu no primeiro turno o atual governador, Rui Costa. A Bahia, hoje, talvez seja proporcionalmente o maior reduto eleitoral do PT. Wagner não queria ser candidato a presidente porque sabia que mais dia, menos dia, a Polícia Federal bateria à sua porta. Bateu.

Fernando Exman: Reação de políticos é risco à intervenção

- Valor Econômico

Apoio popular dependerá de resultados práticos

Passado o impacto político inicial do anúncio das medidas de combate à insegurança pública que assola o país, nova fase se inicia para o governo federal. Autoridades avaliam que a receptividade da população à intervenção no Rio de Janeiro e à criação do Ministério da Segurança Pública foi positiva. Mas, agora, cada uma das ações do Executivo passará por detalhado escrutínio. Inevitavelmente, políticos tentarão aproveitar para ganhar pontos com o eleitorado - sejam governistas ou de oposição - a poucos meses do início da campanha. Já o presidente da República não tem tanto tempo assim: tratando-se de um assunto que tem impacto direto na vida das pessoas, Temer logo começará a ser cobrado por resultados.

Sem possibilidades de aprovar a reforma da Previdência, o presidente agiu com rapidez para afastar a percepção de que seu governo entraria em fase terminal. Com a retomada da economia contratada, redirecionou os esforços para o combate ao crime organizado e à violência. Colocou com rapidez o tema da segurança pública no topo das suas prioridades, item sempre citado pela população como uma de suas principais preocupações nas pesquisas de opinião e área que, no Rio de Janeiro, chegou a uma situação inaceitável. Garantindo uma rápida e folgada aprovação do decreto de intervenção no Rio pelo Congresso, demonstrou que mantém uma maioria parlamentar - mesmo que a base governista não tenha sido, em relação especificamente à reforma da Previdência, tão aliada quanto gostariam os articuladores políticos do Palácio do Planalto.

Hélio Schwartsman: Procura-se um liberal de verdade

- Folha de S. Paulo

Faltam nomes fortes que proponham uma agenda econômica calcada na realidade

Há um engarrafamento de pré-candidatos no campo liberal conservador. Tentam trafegar nessa avenida nada menos do que Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Rodrigo Maia, além do próprio presidente Michel Temer. Por fora ainda corre Flávio Rocha, das Lojas Riachuelo. Como tudo o que não é vedado pelas leis da física pode acontecer, Luciano Huck ainda poderia mudar de ideia e concorrer.

Tal congestionamento contrasta com a virtual ausência de nomes fortes no campo que eu chamaria de genuinamente liberal, isto é, que proponha uma agenda econômica calcada na realidade e defenda uma pauta progressista nas questões sociais.

Pense num candidato que aceite o beabá da cartilha econômica —ideias bem básicas como a de que não se pode, por muito tempo, gastar mais do que se arrecada— e leve a sério a liberdade, sem medo de defender propostas impopulares como legalização das drogas, descriminalização do aborto, da eutanásia, abolição de delitos como desacato, apologia etc. Ou, pela negativa, alguém que não queira censurar museus, nem endurecer o direito penal e nem se perca em fazer agrados a igrejas.

Merval Pereira: Ventos policiais

- O Globo

Os palanques eleitorais para a eleição presidencial deste ano estão sendo montados aos trancos e barrancos, mais ao sabor dos ventos policiais do que dos políticos. E numa eleição casada, onde estarão em jogo nada menos que sete cargos eletivos — presidente da República, governadores, dois senadores, deputados estadual, distrital e federal —, quem tiver as melhores alianças partidárias terá o maior tempo de propaganda na televisão. Mas com o advento das redes sociais no mercado eleitoral, e o encurtamento da campanha oficial, não é possível garantir que o tempo de televisão seja mais importante.

Até que se prove o contrário, as alianças políticas regionais serão fundamentais para a captação de votos, mais até que o curto espaço que sobrará para a campanha de propaganda oficial de rádio e televisão, que terá a duração de apenas 35 dias, a partir de 31 de agosto.

A Bahia entrou ontem na lista dos estados que serão afetados pelas investigações da Operação LavaJato, que ao mesmo tempo em que dificultou a campanha regional do PT, atingiu em cheio a opção mais palatável eleitoralmente para substituir Lula como candidato presidencial.

O ex-governador e ex-ministro Jaques Wagner buscava na eleição quase certa para o Senado o foro especial que o protegeria justamente dessa investigação, que já fora arquivada no âmbito da Justiça Eleitoral local, normalmente mais exposta à influência do poder político incumbente. Mas era a melhor bala de prata petista para substituir Lula na campanha presidencial, apesar de não querer assumir essa missão.

Luiz Carlos Azedo: Mera coincidência

- Correio Braziliense

A ida de Jungman para o Ministério da Segurança Pública é uma solução natural, tipo “prata da casa”. Entretanto, não é natural um general como ministro da Defesa, pasta criada para o poder civil

No livro O 18 Brumário de Luís Bonaparte, já citado aqui a propósito da conjuntura eleitoral que vivemos, Marx se inspira no golpe de estado de Napoleão Bonaparte, em 9 de novembro de 1799, para descrever o golpe de seu sobrinho Luís Napoleão, 50 anos depois. Presidente em final de mandato, em 2 de dezembro de 1851 dissolveu a Assembleia e convocou um plebiscito que restituiu o Império; um ano depois se proclamou Napoleão III. O livro foi escrito entre dezembro de 1851 a março de 1852, em Londres, com o propósito de mostrar as circunstâncias nas quais “Napoleão, o pequeno”, como Victor Hugo o chamava, pôde desempenhar o papel de herói e tomar o poder.

Luís Bonaparte foi um reformador, admirador da modernidade britânica, e promoveu considerável desenvolvimento industrial, econômico e financeiro, mas seu maior legado foi a reforma urbana de Paris, sob comando do prefeito Georges-Eugene Hausmann, um dos símbolos da modernidade. Somente deixou o poder em setembro de 1870, quando surgiu a Terceira República, após a derrota francesa na batalha de Sedan, na Guerra Franco Prussiana. Depois de deposto, exilou-se na Inglaterra, onde morreu em 1873.

Uma das melhores reportagens políticas já escritas, nela Marx descreve o surgimento do partido social-democrata (Montanha): “Quebrou-se o aspecto revolucionário das reivindicações sociais do proletariado e deu-se a elas uma feição democrática; despiu-se a firma puramente política das reivindicações democráticas da pequena burguesia e ressaltou-se seu aspecto socialista. Assim surgiu a social-democracia”. E mostra também que legitimistas e orleanistas, frações monárquicas do Partido da Ordem, se uniram no regime parlamentar republicano porque cada uma dessas correntes considerava a república uma solução mais aceitável do que a opção monárquica preferida pela outra, uma espécie de jogo de perde-perde da aristocracia restauradora francesa.

Antonio Delfim Netto: O Brasil não é administrável

- Valor Econômico

É hora de colocar cada Poder e seus apêndices dentro das 'caixinhas'

Para um jejuno em direito constitucional como eu, viver a tumultuada gestação da Constituição de 1988 foi uma experiência inesquecível.

Primeiro, foi assistir à magnífica negação das leis da termodinâmica: do caos emergiu uma ordem! Segundo, foi aprender que, em geral, finíssimos argumentos jurídicos costumam esconder armadilhas para os incautos que não conhecem o poder infinito de uma vírgula. Terceiro, que a "ordem" construída embutia, afinal, uma lógica fechada sobre si mesma para a consecução do objetivo desejado: a construção de um "Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias" (preâmbulo da Constituição de 1988).

O Artigo 1º da Constituição determina que: "A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: 1) a soberania; 2) a cidadania; 3) a dignidade da pessoa humana; 4) os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Como se organizará a República está expresso no Artigo 2º: "São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário", que devem atingir "Artigo 3º...os objetivos da República Federativa do Brasil: 1) construir uma sociedade livre, justa e solidária; 2) garantir o desenvolvimento nacional; 3) erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; 4) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

Todos os Poderes têm controles internos e externos que respeitam a sua independência e exigem que respeitem a harmonia com os outros Poderes, ou seja, há limites para todos. O controle externo do Legislativo (Artigo 71) "será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União".

Além do desemprego: Editorial | O Estado de S. Paulo

O fato de que 12,3 milhões de brasileiros não conseguem encontrar o emprego que procuram com insistência mostra como ainda é grave o quadro do mercado de trabalho, a despeito dos sinais cada vez mais evidentes de melhora da situação econômica, inclusive com a abertura de postos de trabalho. Mas esse número, mesmo sendo por si só revelador do drama que assombra milhões de famílias, não resume todo o problema. Falta trabalho para 26,4 milhões de pessoas, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse número é mais do dobro do total de desempregados e deixa claro que políticas públicas voltadas para a geração de emprego não devem focar 12 milhões de pessoas, mas bem mais do que isso.

Para aferir a falta de trabalho, aos desempregados devem ser somados aqueles que estão subocupados por insuficiência de horas trabalhadas e aqueles que compõem o que os estatísticos chamam de força de trabalho potencial. Esse último contingente é formado por pessoas que gostariam de trabalhar, mas, por algum motivo, não procuraram emprego nos 30 dias que antecederam a pesquisa, além daqueles que não estavam disponíveis para trabalhar. Esses dados constam da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua referente ao quarto trimestre de 2017 que o IBGE acaba de divulgar.

Foco do Banco Central precisa ser a inflação: Editorial | O Globo

Não há maturidade para que o BC também se preocupe com o emprego, como acontece nos EUA, onde, apesar do duplo mandato, o Fed dá prioridade à defesa do dólar

O conjunto de 15 propostas apresentadas pelo governo como forma de compensar a frustração da derrota na tentativa de votar na Câmara o projeto de reforma da Previdência inclui a formalização da autonomia do Banco Central, ideia antiga sem maior trânsito junto aos políticos.

O conjunto de medidas, por ter sido uma simples e tosca manobra do Planalto para desviar a atenção do engavetamento da emenda constitucional da Previdência, não foi levado a sério, mas pelo menos a questão do BC merece ser avaliada.

Não apenas porque se trata de uma equiparação da autoridade monetária brasileira à de outros países, mais desenvolvidos — ou seja, é um modelo exitoso —, mas também porque o senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo na Casa, acrescentou à concessão de autonomia operacional do BC mais um objetivo a ser atingido pela diretoria da instituição: além da clássica defesa da moeda, o emprego.

Há nisso a intenção política de reduzir resistências no Congresso à maior liberdade de trabalho para a diretoria do BC, que compõe o Conselho de Política Monetária (Copom), responsável pelos juros. Acabaria, ou reduziria o temor primário, de fundamentação ideológica, de que os bancos centrais tenderiam sempre a elevar os juros, para ajudar “rentistas” e o setor financeiro.