segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Opinião do dia – Marcus André Melo

"A hiperfragmentação do sistema partidário sob os governos do PT e práticas agressivas de formação de coalizões superdimensionadas e com fortíssima heterogeneidade ideológica produziram um quadro de cinismo cívico generalizado. A malaise institucional que levou às manifestações de 2013 – portanto antes que a crise recente tivesse se instalado – já prenunciava esse quadro. A prática de ampla cooptação de forças políticas levou a alianças de baixa inteligibilidade para setores importantes do eleitorado – o acordo com Paulo Maluf nas eleições municipais de 2012 é exemplar a esse respeito. Na formação de gabinetes sob os governos do PT, as práticas de montagem de amplas coalizões – que envolveram partidos de direita e extrema direita como o PSC, PR e PP – e a busca pela redução da PMDB-dependência através do patrocínio da criação de novos partidos de centro provocaram impactos importantes sobre a legitimidade democrática dos governos."


---------------------------
Marcus André Melo - é professor titular de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Ph.D em ciência política pela Sussex University, no Reino Unido, fez o pós-doutorado no Massachusets Institute of Technology, ‘A malaise política no Brasil: causas reais e imaginárias’, Journal of Democracy em Português, outubro, 2017.

A diplomacia do biofuturo | *Aloysio Nunes Ferreira

- O Estado de S. Paulo

Iniciativa multilateral afirmará a posição de vanguarda do Brasil em energia limpa

Até 2030 a bioenergia precisará ter sua participação duplicada na matriz energética global e seu uso triplicado nos meios de transportes. Projeções elaboradas pela Agência Internacional de Energia Renovável e pela Agência Internacional de Energia indicam que ela será necessária em larga escala, mesmo considerando outras soluções concomitantes, como eficiência energética, energia solar e eólica, eletrificação dos transportes, cidades sustentáveis e maior uso do transporte público.

O setor de transportes – responsável por cerca de um quarto das emissões globais de dióxido de carbono (CO2) – figura entre os principais desafios para a construção de matriz energética mais sustentável nas próximas décadas. E uma das soluções mais eficazes e de mais rápida implementação para esse setor é a ampliação do uso de biocombustíveis, que produz resultados imediatos na redução da emissão de gases de efeito estufa mesmo em mistura parcial com combustíveis fósseis.

Obstáculos políticos e econômicos, porém, têm dificultado a transição para economia mais limpa no que diz respeito à bioenergia. A difusão de falsa dicotomia entre produção de alimentos e de combustíveis – além da insistente prática do protecionismo agrícola – tem impedido a constituição de mercado internacional para biocombustíveis e sua transformação em commodity global.

Riqueza ambiental | Michel Temer

- Folha de S. Paulo

Assinei no último fim de semana, durante visita ao nosso belíssimo Pantanal, patrimônio nacional e da humanidade, a maior e mais inovadora iniciativa ambiental do governo -a conversão de multas na preservação da natureza.

No curto prazo, cerca de R$ 4,5 bilhões devidos aos cofres públicos poderão ser diretamente aplicados em ações efetivas de recuperação ambiental.

Tal volume de recursos, que não dependerá do Tesouro Nacional, é uma verdadeira revolução para o setor. Hoje, a maior parte das multas não é paga, sendo alvo de litígio durante anos nos tribunais.

Agora, mediante desconto e sob critérios do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), as multas se transformarão em investimentos ecológicos em todo o país.

Já temos parceiros —a começar por órgãos públicos e estatais— interessados em aplicar cerca de R$ 1 bilhão em projetos nas bacias do São Francisco, Iguaçu e Alto Paraguai.

Além de proteger as nascentes e os cursos d' água, essa primeira iniciativa vai garantir ocupação e renda para as populações ribeirinhas -engajadas em programas de reflorestamento de matas ciliares com o sugestivo nome de "Plantadores de Rios".

O preço de manter Temer | Ricardo Noblat

- O Globo

“As pessoas precisam de três coisas: prudência no ânimo, silêncio na língua e vergonha na cara.”
Sócrates, filósofo grego

Tão cedo saberemos quanto custará ao país a decisão a ser tomada, depois de amanhã, pela Câmara dos Deputados de arquivar a segunda denúncia de corrupção contra o presidente Michel Temer. Partes do custo poderão ser mensuráveis desde logo. Exemplo: o volume de dinheiro liberado pelo governo para a construção de pequenas obras nos currais eleitorais dos que votaram a favor do arquivamento da denúncia.

SE O CUSTO SE LIMITASSE a isso, tudo bem. Por lei, o governo é obrigado a pagar emendas parlamentares ao Orçamento da União que destinam pequenas verbas para isso e aquilo. É fato que ele o faz ao seu gosto, premiando aliados e punindo adversários. Ocorre que a operação de salvamento de um presidente encurralado inclui despesas de maior valor, algumas incalculáveis, outras manifestamente imorais. Aí está o busílis.

EM AGOSTO ÚLTIMO, o governo anunciou a privatização de 14 aeroportos, entre eles o de Congonhas, em São Paulo. Com a venda, esperava arrecadar R$ 6 bilhões a serem aplicados em novos investimentos. Sob a pressão do PR, dono de 38 votos na Câmara, o governo desistiu de privatizar Congonhas e avalia a reabertura do aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, para voos de longa distância.

Vitória enfraquecida | Leandro Colon

- Folha de S. Paulo

A Câmara deve barrar a segunda denúncia da PGR contra Michel Temer nesta quarta (25).

A votação representará politicamente o fim de um ciclo sem precedentes. Em menos de três meses, os deputados terão barrado duas acusações criminais contra o presidente.

Gravado em uma conversa espúria com um dos empresários mais ricos e influentes do país, Temer quase renunciou. Segurou-se no cargo pela falta de alternativas de poder e sobretudo por causa das fragilidades na delação da JBS, que já eram evidentes naquele mês de maio.

Ele contou ainda com a benevolência do TSE, que, em meio à crise do episódio de Joesley Batista, ignorou as provas de abuso de poder econômico da chapa Dilma-Temer, vencedora na disputa de 2014.

Huck, Lula e o dono do pudim | Jose Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Não deixa de ser astuto: incapaz de prender quem organiza o crime, promove quem já está preso a chefe da organização. De quebra, desestimula o preso a delatar porque “o cabeça” não pode ser premiado. Não é original, mas funciona. Policiais fazem com narcotraficantes; governos, com terroristas. Se já prendeu o chefe, para que continuar investigando? Esquece-se a rede e projeta-se um PowerPoint com setas apontadas para um nome só.

Quem merece comemorar a notícia, com uma dose extra de pudim, é o resto da turma, que continuará desfrutando a iguaria. Só reclamou quem não é mais convidado para sentar à mesa da confraria. “Engraçado… Nunca soube que Geddel era o Chefe. Para mim, o chefe dele era ouTro (sic)”, tuitou um ex-confrade, após a Procuradoria da República inflar Geddel Vieira Lima.

Renan Calheiros tuíta com conhecimento de causa. Por 25 anos, fez parte da Turma do Pudim, o conselho informal que administrava interesses do PMDB junto a governos – de Itamar a Dilma, de FHC a Lula. Era mesa sem cabeceira, onde todos dividiriam a conta, se ela não fosse paga por você. Hoje, os integrantes da turma que não foram para a cadeia estão no Planalto ou no Senado. E, tudo indica, lá deverão continuar.

Mas e as ordens de pagamento para “Fodão” encontradas pela Lava Jato nas planilhas da Odebrecht? E os R$ 500 mil do deputado carregador de malas? E o porto de Santos? O Congresso cuida dos seus, com as bênçãos do ex-Supremo.

Os três patéticos | Fernando Limongi

- Valor Econômico

Temer, Gilmar e Aécio formam triunvirato irresponsável

Foi manchete da "New Yorker": "Conversa franca de um golpe militar desestabiliza o Brasil". Os gringos continuam com dificuldades para entender o país. Que se tenha notícia, ninguém achou que o pronunciamento do General Antônio Hamilton Martins de Mourão seria a senha para pôr tropas nas ruas. O sintomático, o que gringo algum consegue entender, é que o presidente em exercício tenha anunciado aos quatro ventos que há uma conspiração em marcha, que querem derrubá-lo a qualquer custo, mas não tenha censurado o General Mourão.

Nesta hora, impossível não evocar a boutade de Ulysses Guimarães quando outro vice em exercício quis se valer da expansão verbal de generais para calar a oposição. No cenário atual, falta alguém com a mesma autoridade para gritar: "Chega de patetices". Hoje, o Brasil está nas mãos de triunvirato tão irresponsável quanto o que levou Ulysses a se lembrar de Moe, Larry e Curly.

Outra frase famosa de Ulysses - "Impeachment é como a bomba atômica, serve para dissuadir, não para ser usada" -, recuperada no início da crise, acabou esquecida até por quem a lembrou. Ulysses, uma vez mais, estava certo. Decisões têm consequências. O que os gringos de fato estão dizendo é o seguinte: o Brasil virou uma República de Banana. Para os mais jovens, a expressão talvez não faça grande sentido. Ninguém mais se lembra da United Fruits. A referência, na verdade, é inadequada porque não há intervenção externa. Agora a bagunça é toda 'made in Brazil". Dispensamos o imperialismo.

A MP 789 e a nova política para o setor mineral | Marcus Pestana

- O Tempo (MG)

Minas Gerais é a única unidade da Federação que carrega no nome a vocação e a tradição da produção mineral. Minério, como já disse o velho líder político, “só dá uma safra”. A atividade mineradora é essencial para a economia. Fazer da mineração uma semente de desenvolvimento sustentado e sustentável depende de uma política pública competente e qualificada. Planejamento, visão de futuro, novas tecnologias, segurança ambiental, diversificação econômica precisam estar presentes na ação governamental.

Na última quarta-feira apresentei meu relatório à Comissão Mista que analisa a Medida Provisória 789/2017. Ele será discutido e votado nesta semana. A grande atividade mineradora está concentrada em Minas Gerais e no Pará, coadjuvados por Goiás e Bahia. Mas quase todos os municípios têm atividade mineradora, principalmente associada aos agregados da construção civil (areia, brita etc.). Portanto, em boa hora, o governo federal propôs ao Congresso a nova política para o setor.

Em meu relatório procurei equilibrar a justa compensação a Estados e municípios mineradores com a competitividade de nossas empresas mineradoras. O escopo da MP 789 é razoavelmente singelo, envolvendo duas variáveis: base de cálculo e alíquotas.

Supremas fraturas | Marcus Melo

- Folha de S. Paulo

A referência jocosa aos nossos "11 supremos" tornou-se um mantra. E a crítica é ainda mais dura ao STF quando se trata de decisões controversas com placar apertado. O dissenso, no entanto, tem suas virtudes.

Nos EUA, também tem se falado muito de "nove tribunais separados". A expressão é de Cass Sunstein, de Harvard. Mas, enquanto lá o dissenso é entendido frequentemente em registro positivo, aqui parece existir unanimidade em prol de decisões unânimes.

Os dois casos não são exatamente comparáveis: são tradições legais distintas ("civil law" versus "common law"), e há diferenças no formato institucional (a corte americana desde 1925 escolhe o seu "docket", isto é, os casos que julga, que não chegam a cem por ano, ante quase 100 mil do STF). Os ministros brasileiros detêm enorme poder em decisões monocráticas que são fonte perene de crise e pedidos de vista etc. Mas as críticas se assemelham e o contraste entre as duas interpretações pode iluminar aspectos relevantes das consequências políticas do dissenso.

Não procure coerência | Vinicius Mota

- Folha de S. Paulo

Pense em dois extremos teóricos para explicar a formação dos grupos de opinião que se atritam na sociedade. Caminha-se de um polo ao outro conforme a influência das ideias na atração dos militantes vá desaparecendo. A coerência lógica do ideário faz o mesmo percurso: é perfeita na saída e aleatória na chegada.

Ao observador cético desses choques já está claro, faz tempo, que estamos bem mais próximos do segundo limite que do primeiro. Não lhe causa estranheza que grupos emergentes de jovens autodeclarados liberais se engalfinhem em cruzadas carolas contra exposições artísticas.

Do outro lado, sugere-se um riso cínico como reação contra quem se agarra ao princípio da liberdade de expressão para se defender. Esse flanco também professa o "controle social da mídia" no Brasil, cala sobre o liberticídio em Cuba e na Venezuela e coonesta o dirigismo estatal na cultura se a turma certa estiver no poder.

Caminho acidentado | Cida Damasco

- O Estado de S. Paulo

Emprego melhora, mas agenda de ‘modernização’ trabalhista empaca

Se para os especialistas a saída da recessão já é assunto superado, para a percepção dos cidadãos comuns ainda falta o essencial: uma melhora robusta no mercado de trabalho. Por melhora robusta entenda-se a perspectiva de arrumar emprego em um período razoável, com salários e outras condições igualmente razoáveis, e o fim da “condenação” de se agarrar a um posto de trabalho considerado insatisfatório, simplesmente pela falta de mobilidade do mercado. Os mais otimistas acreditam que esse cenário não é uma ficção e pode ser confirmado em breve, mas convém manter um pé atrás. Pecam pelo exagero nas avaliações sobre a evolução do emprego no Brasil, assim como acontece no caso do desempenho do PIB. Tanto no curto como no médio e longo prazo.

Que a situação já esteve bem pior, é evidente. Mas que está numa trajetória firme e rápida de recuperação, ainda há dúvidas. A criação de vagas com carteira assinada, segundo o Caged, fechou no azul pelo sexto mês seguido e o saldo de postos abertos de janeiro a setembro chegou perto de 209 mil, ampliando as chances de um resultado positivo no ano. A taxa de desemprego, medida pelo IBGE, caiu no trimestre de junho a agosto para 12,6% da população economicamente ativa, menor nível desde o trimestre encerrado em janeiro, e essa queda já aparece em vários setores e vem acompanhada por uma estabilidade na renda – embora ainda haja um contingente de 13,1 milhões de pessoas sem ocupação.

Temer e Copom não ofuscam os bancos | Angela Bittencourt

- Valor Econômico

BNDES, BB e Caixa são parentes em família encrencada

A votação da denúncia no plenário da Câmara dos Deputados contra o presidente Michel Temer e os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria-Geral, Moreira Franco, na quarta-feira, é o ponto alto da agenda política da última semana de outubro. Ao menos por ora. Na economia, o ponto alto é a penúltima reunião deste ano do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que anuncia, também na quarta, a próxima Selic, que deverá cair de 8,25% para 7,50%. Pesquisa do Valor com 33 economistas de bancos e consultorias mostra que 32 projetam Selic a 7% em dezembro. Para o encerramento de 2018, parcela dos entrevistados vê a taxa abaixo de 7%. A mínima histórica, 7,25%, foi observada há cinco anos.

A queda do juro à metade desde outubro do ano passado, viabilizada por recuo ainda mais expressivo da inflação, tem ao menos dois efeitos relevantes após momentos críticos da Lava-Jato e pré-eleição presidencial de 2018: aumentar o consumo e melhorar o resultado dos bancos. Esse binômio merece atenção, uma vez que as famílias reduziram há pouco seu endividamento com o dinheiro que saiu do FGTS e não por aumento de renda em função de mais emprego. O desemprego cai, mas ainda está em níveis altíssimos.

Respeitar a República – Editorial | O Estado de S. Paulo

É cada vez mais frequente ouvir reivindicações de maior liberdade na hora de interpretar e aplicar a lei por parte de juízes e de membros do Ministério Público. Essas vozes sustentam que uma atuação profissional que ficasse restrita a aplicar a lei em seu sentido literal seria incompatível com o alto papel institucional da Magistratura e do Ministério Público. Nessa visão, a função social da Justiça estaria justamente em assegurar um sentido mais justo e socialmente mais adequado para uma legislação frequentemente frágil e imperfeita, fruto de um Poder Legislativo disfuncional e muitas vezes vulnerável a pressões ilegítimas. Seria indigno, portanto, fechar os olhos às imperfeições da lei e, especialmente depois da Constituição de 1988, à adoção de certos princípios que ampliam os caminhos do Direito além das estreitas margens interpretativas das regras. Ou seja, seria imperativo para juízes e procuradores não se aterem à letra da lei. Sua principal tarefa, dizem, seria desvelar o verdadeiro sentido da norma, oculto a quem simplesmente lê o que diz a lei.

Em muitas áreas do Direito, esse modo particular de entender o papel da Justiça tornou-se majoritário. O fenômeno é visto, por exemplo, na Justiça do Trabalho e em várias atuações do Ministério Público: é o juiz dizendo que não aplicará a reforma trabalhista aprovada pelo Congresso ou promotores que se recusam a reconhecer a vigência do novo Código Florestal, em vigor desde maio de 2012.

Ainda que defendida com belas palavras, essa independência de juízes e promotores em relação à lei é perigosíssima para a democracia, pois coloca em segundo plano a vontade popular manifestada no Legislativo. O poder de legislar já não estaria nas mãos do Congresso, e sim nas dos juízes e membros do Ministério Público. Em última análise, seriam eles a determinar o que é o Direito.

Regressão ao mínimo – Editorial | Folha de S. Paulo

Há apenas dois meses, o governo Michel Temer (PMDB) anunciava um grande pacote de privatizações a fim de reafirmar seus propósitos reformistas. O plano ambicioso surgiu depois da notícia de que o deficit das contas públicas ultrapassaria as previsões, exigindo novas medidas de corte de gastos e elevação de receitas.

Nestes dias que antecedem a votação da segunda denúncia contra o presidente, contudo, o programa de desestatização se esfarela —e há grande risco de o rombo orçamentário ser ainda maior.

Em troca de precária sobrevivência política, o presidente deve reduzir as metas de concessão de aeroportos a mera sugestão para o próximo governo. É incerto o destino das demais privatizações.

Quanto às contas do Tesouro Nacional, parlamentares governistas declaram que dificilmente serão aprovadas propostas centrais do Executivo como o adiamento do reajuste salarial de servidores, o aumento de alíquota de contribuição previdenciária do funcionalismo e altas pontuais de tributos.

Dessa maneira, o ímpeto reformista vai dando lugar ao mínimo comum da política e da administração brasileira. Em seus achaques de fisiologia, o governo promete manter os cabides estatais para seus aliados, de aeroportos a empresas do setor elétrico.

Governo joga carta decisiva para chegar vivo a 2018 – Editorial | Valor Econômico

O presidente Michel Temer não perde uma votação importante no Congresso desde que assumiu o posto, no impeachment de Dilma Rousseff. Semana passada não foi diferente. Por 39 a 26 votos, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados recomendou ao plenário a rejeição do pedido do Ministério Público Federal para o Supremo Tribunal Federal (STF) investigar e processar o presidente pelos crimes de obstrução de justiça e formação de organização criminosa. A expectativa é que o plenário confirme a decisão da CCJ, embora com uma vantagem inferior àquela conferida pela maioria por ocasião da votação da primeira denúncia.

Na votação da CCJ, Temer perdeu dois votos em relação à votação anterior, mas venceu ainda por expressiva maioria (59% dos votantes). Se a tendência se mantiver na votação em plenário, Temer pode até não sair com a maioria absoluta dos 513 votos da Câmara, como aconteceu da vez anterior, quando teve o apoio de 263 deputados, mas ainda assim sairia com algo em torno de 250 votos, número mais que suficiente para o governo tentar arrematar o processo de aprovação de reformas a que se propôs. É difícil, mas será ainda mais complicado se o presidente vier a perder algo entre 30 e 40 votos sobre a primeira denúncia, conforme previsões mais alarmistas.

Trata-se, portanto, de uma cartada decisiva para o governo e o presidente, que a partir de agora joga todas as suas fichas na recuperação da economia, a fim de poder influir na própria sucessão e quem sabe até reverter em alguma medida a aprovação de Michel Temer, o chefe de governo mais impopular desde que o poder civil retornou ao Palácio do Planalto, nos idos de 1985. Para tanto, o governo terá de aprovar a reforma da Previdência, mesmo desidratada em relação à proposta original, e as medidas do pacote fiscal de agosto que ainda esperam por bom tempo no Congresso para serem enviadas.

Mais tiroteios – Editorial | O Globo

Armar a Guarda seria um equívoco. Aumentaria o risco de tiroteios, balas perdidas e mortes

Sempre que os índices de criminalidade disparam e as políticas de segurança pública patinam, revelando-se insuficientes para contê-los, proliferam propostas polêmicas para enfrentar a violência, aproveitando o clima de insegurança, que, em geral, aumenta as chances de serem acolhidas pela sociedade. É o caso da ideia de se armar a Guarda Municipal do Rio. Em entrevista ao “Bom dia Rio”, da Rede Globo, no dia 16, o secretário municipal de Ordem Pública, coronel Paulo César Amendola, disse que o projeto deverá ser apresentado à Câmara dos Vereadores no início do ano que vem. Se aprovado, segundo ele, poderá ser colocado em prática já no segundo semestre de 2018.

Pela proposta, parte dos 7.500 guardas municipais do Rio passaria a andar armada — a princípio, os integrantes dos chamados grupamentos especiais da corporação. Amendola argumenta que a medida é necessária para proteção dos cidadãos e dos próprios guardas.

Heráclito, o bombeiro da crise política

Por Andrea Jubé | Valor Econômico

BRASÍLIA - Na semana mais difícil para o presidente Michel Temer em 17 meses de governo, um incêndio assolaria a Praça dos Três Poderes se o primeiro e o segundo nome na hierarquia do poder não voltassem a se falar. Na quarta-feira, Temer enviou um whatsapp ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, rompendo um gelo de mais de 20 dias, em plena discussão da segunda ação penal contra o pemedebista.

O artífice dessa reconciliação foi o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), que vestiu o uniforme de bombeiro e saiu a campo para conter as chamas e evitar o pior. Conhecido como "Boca Mole" nas planilhas da Odebrecht, Fortes é discreto, habilidoso, e como os craques da política, atua nos bastidores. Na sua casa, nos restaurantes, nas rodas reservadas, menos na tribuna.

O bombeiro que controla as chamas da crise política
Na semana mais difícil para o presidente Michel Temer, em 17 meses de governo, os termômetros marcaram 37 graus em Brasília, um recorde na capital federal e quase um prenúncio do incêndio que assolaria a Praça dos Três Poderes se o primeiro e o segundo nome na hierarquia do poder não voltassem a se falar.

Em meio à alta temperatura entre o presidente da República e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e na iminência do julgamento da segunda denúncia contra o chefe do Executivo, o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI) vestiu o uniforme de bombeiro e saiu a campo para conter as chamas e evitar o pior.

Amigo de Temer há mais de 30 anos e também de Cesar Maia, pai de Rodrigo, ele sentiu-se credenciado para mediar a reaproximação dos antigos aliados. A empreitada começou na noite da última segunda-feira, quando Heráclito jantou com Rodrigo Maia e sentiu faíscas pelo ar. Ele ainda retornou na terça-feira para o café da manhã com Maia.

Horas depois, recebeu Michel Temer e o ministro Moreira Franco, casado com a sogra de Maia, para um almoço em sua casa no Lago Sul. Nesse almoço, havia mais dois parlamentares do convívio íntimo do presidente da Câmara, Benito Gama (PTB-BA) e Alexandre Baldy (PODE-GO).

Na quarta-feira pela manhã, após nova rodada de conversas, convenceu Temer a procurar Maia. Foi quando o presidente da República enviou um whatsapp ao presidente da Câmara, rompendo o gelo de mais de 20 dias, em plena discussão da segunda ação penal contra o pemedebista.

Um whatsapp parece pouco, mas foi o suficiente para, ao menos, restaurar a comunicação entre os dois. "Eu disse a eles que se os dois primeiros nomes na hierarquia do poder não estão se entendendo, isso só poderia terminar em desastre", relata o deputado pelo Piauí.

A relação entre o chefe do Executivo e o do Legislativo azedou no final de setembro, quando o PMDB de Temer filiou o senador Fernando Bezerra Coelho (PE), dissidente do PSB. Havia dois meses, Maia articulava o ingresso do parlamentar e de seu filho - o ministro de Minas e Energia e deputado licenciado, Fernando Coelho Filho - ao novo partido que resultará da fusão do DEM com siglas menores e dissidentes do PSB. Temer tinha assegurado que o PMDB não atrapalharia os planos do DEM.

Ataques ao governo devem marcar nova caravana de Lula

Por Marcos de Moura e Souza | Valor Econômico

BELO HORIZONTE - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começa hoje uma viagem por 12 cidades de Minas Gerais como parte de seu projeto pré-eleitoral para 2018. Seus discursos deverão ser marcados por comparações entre governos petistas e o governo Michel Temer (PMDB). O roteiro inclui um encontro com o empresário Josué Gomes da Silva, da gigante têxtil Coteminas, filho de José Alencar, que foi vice-presidente nos dois mandatos de Lula.

Inclui também um ato ao lado da ex-presidente Dilma Rousseff, que apareceu em primeiro lugar em duas pesquisas recentes sobre a disputa das vagas de Minas ao Senado no ano que vem.

Primeiro nas pesquisas de intenção de voto, Lula vai rodar por cidades que, em sua maioria, votaram no PT nas eleições dos últimos anos. Minas é atualmente o principal Estado governado pelo partido. Fernando Pimentel foi eleito em 2014 derrotando o grupo do senador Aécio Neves, após três governos seguidos de tucanos.

Lula prepara temas específicos para abordar em seus discursos em cada cidade. A primeira é Ipatinga, no Vale do Aço, região que é um hub mineiro da indústria siderúrgica e metalmecânica. A Usiminas é a principal siderúrgica do vale.

Pela programação, o ponto central de sua fala será a "defesa da soberania nacional". A região viu empresas encolherem ou fecharem as portas durante a recessão e sofreu também com os efeitos da Lava-Jato porque muitas pequenas e médias empresas da região vinham fornecendo peças para o setor de óleo e gás para a Petrobras.

Manifestantes preparam protesto contra Lula no Vale do Aço

Catia Seabra | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Declarando-se de direita, moradores de quatro cidades do Vale do Aço programam para esta segunda-feira (23) um protesto na cidade de Ipatinga, onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dará início a sua caravana pelo Estado de Minas.

Dirigentes dos movimentos intitulados "NasRuas" e "Direita Minas" –muitos deles defensores de intervenção militar no Brasil– estão convocando manifestantes para um ato no marco zero da cidade, na Praça dos Três Poderes.

É também lá que Lula dará partida à caravana que percorrerá sete regiões mineiras. O governador de Minas, Fernando Pimentel, e parlamentares mineiros, inclusive do PMDB, recepcionarão o ex-presidente.

De lá, Lula seguirá de ônibus em uma caravana de oito dias. Seus adversários divulgaram nas redes sociais uma faixa negra com a inscrição "Lula, o Vale do Aço te recebe de algemas abertas"

O Vale do Aço foi um dos berços do PT. Nesta segunda, o lançamento da caravana será marcado pelo ato "em defesa da soberania".

Depois da abertura, a caravana segue para o Vale do Rio Doce, Vale do Mucuri, Vale do Jequitinhonha, passa pelo Norte de Minas, Região Metropolitana de Belo Horizonte e termina na capital mineira, no dia 30 de outubro.

Disputa entre tucanos mobiliza o Congresso

Alckmin fez reuniões com líderes partidários, que cobraram do governador necessidade de pacificar São Paulo

Renan Truffi e Igor Gadelha | O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A disputa pela candidatura do PSDB à Presidência em 2018 já chegou ao Congresso Nacional. Em “guerra” para ser o candidato tucano ao Palácio do Planalto, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o prefeito da capital, João Doria, começaram a se movimentar nos últimos meses para ampliar a interlocução com parlamentares. O objetivo é ganhar capilaridade em outros partidos e nos Estados, onde precisarão de palanques regionais durante a campanha.

Alckmin já fez pelo menos três almoços ou reuniões com parlamentares e líderes políticos em São Paulo. O último ocorreu há uma semana. Entre os presentes estavam os deputados Benito Gama (PTB-BA), Rubens Bueno (PPS-PR), Heráclito Fortes (PSB-PI), José Carlos Aleluia (DEM-BA), Danilo Forte (PSB-CE), além do ex-senador Jorge Bornhausen (PSD-SC) e o ex-deputado Pimenta da Veiga (PSDB-MG).

No encontro, segundo relatos, foram discutidos não só possíveis palanques estaduais. Parlamentares ponderaram a necessidade de Alckmin “pacificar” São Paulo. No Estado, pelo menos três partidos ligados ao governador querem apoio para a disputa pelo governo: o PSB do vice-governador Márcio França; o DEM do secretário de Habitação, Rodrigo Garcia, e o próprio PSDB.

Aliados agora admitem Doria no governo de SP

Alguns dos mais próximos correligionários do prefeito passaram a defender essa hipótese, que conta com o apoio do governador Alckmin

Pedro Venceslau | O Estado de S. Paulo

ASSUNÇÃO - O grupo político do prefeito de São Paulo João Doria (PSDB) passou a admitir rerservamente a hipótese de o prefeito se candidatar em 2018 ao governo de São Paulo e não mais à Presidência da República. A hipótese que antes era descartada pelos correligionários mais próximos de Doria encontra apoio até do governador Geraldo Alckmin (PSDB), que vê a composição entre os dois como uma forma de pavimentar de vez sua candidatura ao Palácio do Planalto no próximo ano. Até o início deste mês, Doria e seus auxiliares diretos rechaçavam com veemência essa possibilidade.

Porém, integrantes do grupo de Doria resolveram aconselhar o prefeito a buscar a composição com Alckmin ao mesmo tempo que a popularidade do prefeito começou a sofrer desgaste conforme as mais recentes pesquisas. Doria deve ainda mudar de estratégia e reduzir o número de reuniões internas para intensificar agendas públicas na capital. Até agora, Doria só trabalhava com um cenário: a disputa pela Presidência da República no ano que vem.

A solução de uma aliança entre Alckmin e Doria teria a vantagem ainda de pacificar a legenda em São Paulo e consolidaria o nome do governador internamente no PSDB. Questionado sobre esse cenário, Doria deixa uma porta aberta. “Toda solicitação que venha do governador Geraldo Alckmin vai merecer meu respeito e atenção”, disse o prefeito ao Estado em entrevista publicada na semana passada.

Às vésperas da votação, favores ainda são cobrados

Planalto tem lista de pedidos por emendas e cargos para barrar denúncia

Geralda Doca, Patricia Cagni e Manoel Ventura | O Globo


BRASÍLIA - A dois dias da votação pela Câmara dos Deputados da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer e dois de seus ministros, apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o Palácio do Planalto precisa ainda resolver uma lista de 25 “pendências”, que vão de liberação de emendas parlamentares a cargos para integrantes da própria base. Parte da fatura se refere a promessas antigas, desde a época em que Temer era interino e que agora estão sendo cobradas, disse um interlocutor. Os atos vão influenciar a contagem de votos com a qual auxiliares de Temer trabalham — entre 250 e 270 favoráveis à derrubada da denúncia. A primeira acusação foi engavetada por 263 votos.

O Planalto tem que controlar, ainda, a crise no PSDB, que está rachado entre governistas e independentes, em função da cobrança pela renúncia do senador Aécio Neves (MG) da presidência do partido. Ele está licenciado e o interino, Tasso Jeiressati (CE), cobra sua saída definitiva. Essa queda de braço pode refletir na votação de quarta-feira. O líder da maioria da Câmara dos Deputados, Lelo Coimbra (PMDB-ES), disse que o presidente Temer está tranquilo, mas admitiu que há muita “inquietação” na base.

— Dependendo da forma como as pendências sejam resolvidas, o placar ficará mais próximo de 250 votos ou 270 votos — disse Lelo

O sertanejo falando | João Cabral de Melo Neto

A fala a nível do sertanejo engana:
as palavras dele vêm, como rebuçadas
(palavras confeito, pílula), na glace
de uma entonação lisa, de adocicada.
Enquanto que sob ela, dura e endurece
o caroço de pedra, a amêndoa pétrea,
dessa árvore pedrenta (o sertanejo)
incapaz de não se expressar em pedra.

Daí porque o sertanejo fala pouco:
as palavras de pedra ulceram a boca
e no idioma pedra se fala doloroso;
o natural desse idioma fala à força.
Daí também porque ele fala devagar:
tem de pegar as palavras com cuidado,
confeitá-la na língua, rebuçá-las;
pois toma tempo todo esse trabalho.
------------------------
– João Cabral de Melo Neto, in “Melhores Poemas de João Cabral de Melo Neto”. [Seleção Antônio Carlos Secchin], São Paulo: Global Editora, 8ª ed., 2001, pag. 184.

Katica Illényi - Hungarian Rhapsody No. 2. Franz Liszt