quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Em outros tempos bicudos, não tão distantes desses que aí estão, celebrado poeta popular lançou a profecia de que, no andar da carruagem em que nos encontrávamos, iríamos tornar-nos um imenso Portugal. A predição não se cumpriu. Aliás, Portugal está muito bem, e as reviravoltas do destino nos conduziram a um lugar de fato maligno, convertendo-nos num imenso tribunal. Vítimas da nossa própria imprevidência, testemunhamos sem reagir a lenta degradação do nosso sistema político – salvo quando o Parlamento introduziu uma cláusula de barreira a fim de evitar uma malsã proliferação de partidos, a maior parte deles destituída de ideias e de alma, barrada por uma intervenção de fundo populista por parte do Supremo Tribunal”.

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Luiz Werneck Vianna é sociólogo e professor da PUC-RJ, “Um imenso tribunal”, O Estado de S. Paulo, domingo, 1 de outubro de 2017.

Senado aprova fim de coligações para 2020

Já a cláusula de barreira poderá valer na eleição de 2018, se for promulgada ainda nesta semana

Thiago Faria e Felipe Frazão, O Estado de S.Paulo

Em votação relâmpago, o Senado aprovou na terça-feira, 3, o fim das coligações em eleições proporcionais a partir de 2020. Também foi aprovada uma cláusula de desempenho aos partidos que, caso promulgada pelo Congresso até o fim desta semana, já poderá ser aplicada na disputa do próximo ano.

Um dos poucos itens de consenso entre os parlamentares, as medidas foram as primeiras a terem votação concluída no pacote da reforma política em discussão no Congresso. O placar no Senado, que não modificou o texto aprovado pela Câmara na semana passada, foi unânime nos dois turnos: 62 a zero no primeiro e 58 a zero no segundo.

O texto da proposta de emenda à Constituição (PEC) já havia sido aprovado pelos senadores em novembro, mas, como foi modificado pela Câmara, precisou passar por nova votação no Senado. Deputados incluíram a permissão para que partidos pudessem formar as chamadas “federações”.

“Hoje acabamos com essa coisa esdrúxula chamada coligações partidárias proporcionais e criamos a cláusula de desempenho que vai moralizar a vida pública brasileira diminuindo a quantidade de partidos”, disse o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). A previsão de Eunício é de que o texto seja promulgado até amanhã.

A PEC foi aprovada na mesma sessão em que os senadores decidiram adiar a votação que poderia derrubar as restrições impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ao senador Aécio Neves (PSDB-MG), um dos autores da proposta ao lado de Ricardo Ferraço (PSDB-ES). Na Câmara, foi relatada pela deputada Shéridan (PSDB-RR).

Eleições. Como o fim das coligações valerá a partir de 2020, a única medida que pode ter impacto em 2018 é a cláusula de desempenho, também chamada “de barreira”. Pela proposta da Câmara, o patamar mínimo para que um partido tenha acesso ao Fundo Partidário e tempo de rádio e TV no horário eleitoral cresce progressivamente.

Em 2018, será de 1,5% dos votos válidos para deputado federal, distribuídos em pelo menos um terço dos Estados. Em 2030, o porcentual será de 3% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço dos Estados, com um mínimo de 2% em cada um deles.

Senado aprova fim das coligações e cria cláusula de barreira

Talita Fernandes | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O plenário do Senado aprovou nesta terça-feira (3) a votação de um projeto que acaba com as coligações para a eleição do Legislativo e cria regras para barrar legendas com baixo desempenho nas urnas.

O texto foi aceito por unanimidade dos senadores presentes, com 58 votos, e segue agora para promulgação.

Depois de vários meses de impasse sobre o tema, o projeto foi aprovado em dois turnos de forma expressa, em menos de 30 minutos.

Pelo texto, a cláusula de barreira passa a ser aplicada já a partir das eleições do ano que vem. Já o fim das coligações é previsto apenas para 2020.

A autoria inicial da PEC (proposta de emenda à Constituição) é dos senadores tucanos Ricardo Ferraço (ES) e Aécio Neves (MG). Na Câmara, a relatora foi a deputada Shéridan (PSDB-RR).

O texto havia sido aprovado em novembro de 2016 pelo Senado, mas a apreciação só foi concluída na semana passada pela Câmara, no limite do prazo para ter validade em 2018. Como sofreu alterações pelos deputados, a PEC teve de passar por novo crivo dos senadores.

Senado aprova em dois turnos PEC da cláusula de barreira para 2018

Senadores autorizam quebra de prazos para fazer regra valer nas eleições do ano que vem

Maria Lima | O Globo

BRASÍLIA — Em cerca de meia hora, na mesma sessão, o plenário do Senado aprovou em dois turnos, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma política que define cláusulas de barreira para criação de partidos e acaba com as coligações proporcionais a partir da eleição de 2020. Foi necessário autorizar um requerimento de urgência para quebra de prazos. O Senado correu contra o tempo para aprovar o substitutivo encaminhado pela Câmara, de autoria da deputada Shéridan (PSDB-RR), antes do próximo sábado, quando encerra o prazo para mudanças nas regras eleitorais para as eleições de 2018.

Com pouca discussão, a PEC foi aprovada por unanimidade. No primeiro turno, foram 62 votos a favor, nenhum contra. No segundo turno, 58 senadores votaram sim; mais uma vez, nenhum votou contra.

Como se trata de uma emenda constitucional, a proposta agora precisa ser promulgada pelo presidente do Congresso, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), até o próximo dia 7 de outubro. As regras eleitorais precisam ser aprovadas até um ano antes das eleições, que serão em outubro de 2018.

CLÁUSULA DE BARREIRA GRADATIVA
Pela regra aprovada, a cláusula de barreira será gradativa: começa a ser adotada em 2018, com a exigência de que os partidos atinjam a votação mínima de 1,5% em pelo menos nove estados, e chega ao requisito de 3% dos votos em 2030. Com isso, as siglas que não alcançarem esse patamar não terão direito a recursos do fundo partidário, nem a tempo de rádio e TV. Com a vedação das doações empresariais nas eleições do ano passado, o fundo partidário foi a principal fonte de financiamento para muitos candidatos.

Em 2º turno, Senado aprova cláusula de desempenho e fim das coligações

Fabio Murakawa e Vandson Lima | Valor Econômico

BRASÍLIA - Em uma votação relâmpago, o Senado concluiu ontem a votação da Proposta de Emenda Constituicional (PEC) que acaba com as coligações em eleições proporcionais a partir de 2020 e cria uma cláusula de desempenho para que os partidos tenham acesso ao fundo partidário e a espaço na propaganda de rádio e TV.

A proposta foi aprovada em dois turnos em um intervalo de pouco mais de dez minutos, diante do prazo apertado para que algumas das mudanças passem a valer já para a eleição do ano que vem. Para tal, é preciso que o presidente Michel Temer sancione a matéria até o próximo sábado, dia 7.

A cláusula de barreira começará a ser gradualmente implementada a partir do ano que vem, quando os partidos terão de atingir uma votação mínima de 1,55% do eleitorado em ao menos nove Estados. Esse índice terá que chegar a pelo menos 3% em 2020.

As legendas que não atingirem esse desempenho não terão acesso aos recursos do fundo partidário nem o direito a participar da propaganda política gratuita de rádio e TV.

STF julga validade de candidaturas avulsas em eleição

Se aprovada, medida permitirá que pessoas não filiadas a partidos concorram já em 2018 A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enviou ao STF parecer favorável às candidaturas avulsas, mas considera ação apresentada inadequada

André de Souza | O Globo

-BRASÍLIA- Na pauta de hoje do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), há uma ação que poderá levar à autorização de candidaturas avulsas no sistema eleitoral brasileiro. Caso a Corte aceite esse tipo de candidatura, pessoas que não são filiadas a partidos políticos poderão disputar eleições a partir do ano que vem.

O tema está na pauta de julgamento do STF a partir do caso do advogado Rodrigo Mezzorno, que tentou ser candidato a prefeito do Rio de Janeiro, em 2016, mas teve registro negado porque não tinha filiação partidária.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enviou ao STF um parecer favorável às candidaturas avulsas, mas considera que o tipo de ação apresentada, um recurso extraordinário, não é adequado para questionar o tema. 

PACTO DE SÃO JOSÉ 
A PGR avalia que esse tipo de candidatura é previsto no Pacto de São José, um acordo internacional ratificado pelo Brasil, mas entende que, por questões técnicas, deve ser negado o pedido que será levado a julgamento.

Gilmar Mendes critica candidatura política sem partido

Letícia Casado | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), disse nesta terça-feira (3) que existem "vários problemas" na possibilidade de candidatos concorrerem a uma eleição sem fazer parte de um partido político.

Nesta quarta-feira (4), o Supremo vai julgar uma ação que trata sobre candidatura avulsa, ou seja, se pessoas que não são filiadas a uma legenda política podem concorrer a algum cargo. O caso chegou ao Supremo em junho de 2017 por meio de um advogado que tentou se candidatar na eleição de 2016 para a Prefeitura do Rio, mas teve o registro indeferido.

O ministro Gilmar, que preside o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), indicou que é contra.

"Pedi um estudo ao TSE e estamos remitindo este estudo à presidente [do Supremo] Cármen Lúcia para mostrar os problemas que há neste tipo de propósito", disse a jornalistas antes de participar de sessão no STF.

"Vários problemas, inclusive no que diz respeito a toda legislação e distribuição de fundo partidário."

Ele afirmou que o material deve ser entregue até a manhã de quarta à presidente.

Candidaturas avulsas são uma péssima ideia para nosso jabuticabal da política

Igor Gielow | Folha de S. Paulo

Entre um ensaio de crise institucional e outro, o Supremo Tribunal Federal deverá analisar nesta quarta (4) a possibilidade de haver candidaturas avulsas nas eleições do ano que vem. É uma quimera bem intencionada, mas ainda assim uma quimera.

Baseada numa consulta feita à corte, a ideia tem um embasamento nobre, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e a Convenção Americana dos Direitos Humanos (1969). Sustenta que todos podem votar e se eleger, ideia secundada pela Procuradoria-Geral da República.

Bonito e inócuo, a começar pelas incongruências processuais inerentes à proposta. Só para começar, como é que um "avulso" vai se financiar? O sistema eleitoral brasileiro está manco desde que o mesmo Supremo, num dos seus arroubos ativistas e demagógicos, proibiu doações feitas por empresas em 2015.

OK, vivemos no reino do caixa dois e o petrolão está aí para demonstrar a podridão, mas em vez de consertar o carro, os ministros o enviaram ao ferro-velho sem deixar opções ordenadas no lugar. Em vez de, por exemplo, regular doações privadas, proibindo o "um pouco para cada um" e correlações empresas/contratos governamentais, optou-se pelo financiamento público.

Como se viu quando a questão foi parar no Congresso, deu errado. Nossos probos representantes tentaram espetar um fundo bilionário -ressaltando aqui que o valor debatido lá atrás, de R$ 3,6 bilhões, não daria nem para começar o jogo. O caixa dois, ainda que algo coibido pela pressão da Lava Jato, vai prosperar.

"As campanhas têm de ser mais baratas!", gritam as pessoas "do bem". De acordo, mas me conte como. Desde a repaginação de Paulo Maluf por Duda Mendonça em 1992 até o estelionato Dilma Rousseff "by" João Santana em 2014, a espiral de custos tornou-se um negócio em si, eivado de ilícitos como se sabe bem. Retomar a Lei Falcão na TV e ignorar os outros gastos entregam uma equação que não se fecha. Um candidato ao Palácio do Bandeirantes pode contar com R$ 3 milhões só em gasto com jatinhos em 2018.

Esse voluntarismo inconsequente faz sucesso. A dupla dinâmica Marina Silva e Joaquim Barbosa sempre foi entusiasta do "avulso". A argumentação em favor do instituto, feito pela procuradora-geral, Raquel Dodge, relaciona o financiamento partidário à corrupção, como se "outsiders" fossem puros por definição.

Não é só o dinheiro. Se o país demorou anos para se recuperar da aventura Fernando Collor, o que dizer de candidatos com apelo midiático e capacidades inauditas de gestão pública? Vão governar baseados em quê? Mantras? Incenso e oração? O Congresso pode ser medonho, mas é com ele que se governa. A ideia de deslegitimar de vez a política partidária é tentadora dado o estado das coisas, mas é mesmo a melhor saída? Não parece.

Só a ideia de uma liderança nacional envergando virtudes demiúrgicas para driblar a modorra de Brasília deveria dar calafrios nesse pessoal que qualifica quem não pensa igual a eles de "fascista", aspas obrigatórias até porque a ignorância histórica sobre o tema impera.

"Tem de haver reforma política!", esbravejam então. De acordo, mas me conte qual. Cada vez que a palavra mágica surge, o diabo se assusta; o debate que quase empurrou o aberrante distritão goela abaixo do eleitor é um exemplo.

O ambiente então fica fértil para bruxarias. De um ano para cá, várias "start-ups" políticas surgiram. Nenhuma chegou a virar um Movimento Brasil Livre, que quando não está esperneando pela moral e os bons costumes está preparando candidatos competitivos que miram um eleitorado fora do radar da gente "do bem" -por serem conservadores, basicamente. Para pular os obstáculos de realidade, o MBL acopla seus nomes a partidos como o DEM e PSDB.

Mas agora surge outro atalho, na forma do RenovaBR, uma brincadeira de endinheirados que também querem ter uma bancada parlamentar para chamar de sua. Um fundo bancaria a "formação", algo meio difuso, de "lideranças" potenciais. O celeiro inicial é o movimento Agora, que busca ter até 30 nomes "competitivos" para a Câmara, nas palavras de seu colíder Leandro Machado.

Ele nega ter relação como o fundo em si, que é bolado pelo sócio da Tarpon Investimentos Eduardo Mufarej, seu amigo e fundador do Agora, além de ter ligações com o Partido Novo e o Centro de Políticas Públicas do pré-candidato a governador Luiz Felipe D´Ávila (PSDB). "Só entraremos nessa se for tudo 100% legal", disse. Vai ser difícil convencer a Justiça Eleitoral de que o fundo não é campanha antecipada e financiamento ilegal de candidatos.

Os nomes chamativos associados ao projeto, como Luciano Huck, Abílio Diniz e Bernardinho, dão um ar novidadeiro ao negócio. Pode ser, para quem acredita nisso, mas de todo modo a política tradicional irá resistir -a PGR foi instada a pronunciar-se a pedido do PT, aquela sigla que a acusa de parcialidade no resto do tempo, sobre o tema.

A possibilidade de o Senado aprovar emenda limitando o financiamento de pessoas físicas a 10 salários mínimos também atinge esse pessoal descolado. João Amoêdo, do Novo, já contava com um cofrinho mais gordo de gente como Armínio Fraga e ele mesmo. Como a eleição fora de hora do Amazonas demonstrou, na hora H as velhas estruturas tendem a modular o padrão de jogo, sob o risco da ilegitimidade da alta abstenção.

Assim, resta esperar os discursos da ala que se chama progressista do Supremo e torcer para que ao fim não adubem ainda mais a jabuticabeira da política nacional.

Senado recua no caso Aécio e evita confronto com STF

Votação que poderia barrar afastamento e recolhimento noturno do tucano, determinados pelo Supremo, é adiada

Thiago Faria, Felipe Frazão | O Estado de S. Paulo.

BRASÍLIA - O Senado recuou e adiou a votação que poderia barrar o afastamento e o recolhimento domiciliar noturno do senador Aécio Neves (PSDB-MG) impostos pela 1.ª Turma do Supremo Tribunal Federal. O adiamento foi aprovado por 50 votos a 21. A decisão de postergar a votação evitou o acirramento da crise entre os Poderes e ocorreu após o ministro Edson Fachin, do STF, negar liminar da defesa de Aécio para suspender as restrições ao tucano. Na próxima semana, o plenário do Supremo julgará ação que discute se o Senado pode ou não dar a palavra final em caso de medidas cautelares – entre elas afasta- mento e recolhimento noturno – contra parlamentares impostas pela Corte. O Senado, porém, manterá o STF sob pressão: se o julgamento não terminar até o dia 17, o que pode ocorrer caso algum ministro peça prazo para analisar o processo, os senadores votarão o caso de Aécio.

O Senado recuou ontem e adiou a votação que poderia barrar o afastamento e o recolhimento domiciliar noturno do senador Aécio Neves (PSDB-MG) impostos pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. O adiamento foi aprovado por 50 votos a 21. A decisão de postergar a votação evitou o acirramento de uma crise institucional entre os Poderes Legislativo e Judiciário e ocorreu após o ministro Edson Fachin, do STF, negar pedido da defesa de Aécio para suspender as restrições ao tucano.

Consequências serão graves se crise não for superada

Marco Antônio Teixeira | O Estado de S. Paulo.

O afastamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG) por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) ganhou uma dimensão maior (e diferente) de outros casos porque representa o risco de um dano conjunto à parcela significativa dos senadores. Mas o choque entre os Poderes já estava posto desde o pedido de prisão, em 2015, do então senador Delcídio Amaral, àquela altura no PT. O embate entre Judiciário e Legislativo continuaria com a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, em 2016, de afastar Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado.

Se com Delcídio, em 2015, havia uma forte polarização política entre PT e PSDB, hoje, nesse caso específico, ela não mais existe. O problema de Aécio é visto como um imbróglio em que parte do Senado pode ser atingida diretamente. Compreende-se a decisão do Senado de enfrentar o Supremo, mas ela parece tardia. Poderia ter vindo com o episódio de Delcídio, contudo as fissuras políticas do processo de impeachment de Dilma Rousseff em curso não permitiram.

Suplantada a polarização, a reação virou uma questão de defesa corporativa da Casa e pode soar até como oportunista. As declarações enfáticas de senadores, como se fossem uma defesa da Casa, é um erro de timing dos parlamentares.

Quando o Judiciário joga o jogo da política, a tendência é perder

Luiz Guilherme Arcaro Conci | O Estado de S. Paulo.

Nós carregamos conosco uma percepção a respeito da separação dos Poderes que nos faz acreditar intuitivamente que cada um tem seu espaço. De costume, pensamos que a função do Judiciário se resume a intermediar conflitos e que a decisão é obra de técnicos, os que “conhecem” o direito. Isso funciona bem em campos que afetam pessoas. Mas, a partir do momento que trata do Estado, gera ruído entre as instituições, principalmente quando algumas delas são formadas a partir do voto, da escolha popular.

Quando o Judiciário tenta jogar o jogo da política, a tendência é que perca. Na última semana, depois de o STF decidir, liminarmente, sem condenação definitiva, afastar Aécio Neves (PSDB-MG) de seu mandato e determinar o recolhimento noturno, houve uma enorme reação não apenas de seus pares, mas da comunidade jurídica.

Nessa confusão entre o direito e a política, o Judiciário vem adotando um voluntarismo excessivo, que afronta a técnica. A ausência de reconhecimento pela própria comunidade de juristas dá combustível para o Senado questionar a decisão, pois os “técnicos” discordam entre si.

Senado adia novamente votação que pode reverter afastamento de Aécio

Talita Fernandes | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O Senado adiou novamente a análise de um ofício que pode reverter medidas cautelares impostas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) a Aécio Neves (PSDB-MG).

Por determinação da primeira turma do tribunal, o tucano está afastado do mandato e cumprindo recolhimento noturno em casa desde a última semana.

A análise do caso estava prevista para esta terça-feira (3), mas foi postergada após o plenário aprovar requerimento marcando a votação para o próximo dia 17.

"Aprovado o requerimento estaremos dando uma oportunidade para que a Suprema Corte revise por meio do pleno uma decisão tomada por uma de suas turmas ou o Senado poderá lançar mão de suas prerrogativas para equilibrar freios e contrapesos [da nossa democracia]", disse o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).

O adiamento foi confirmado após aprovação de requerimento apresentado pelo senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), que contou com apoio de 50 senadores e rejeição de outros 21.

A decisão de não votar nesta terça se deu para que o caso possa ser resolvido pelo próprio Judiciário.

STF
Na próxima quarta-feira (11), os 11 ministros do STF analisam uma ação direta de inconstitucionalidade que pede que as sanções contra parlamentares –como afastamento de função pública, por exemplo– sejam submetidas ao Congresso. O julgamento tem impacto direto no caso de Aécio.

Senado adia a decisão sobre Aécio

Após horas de debate, o Senado recuou e, por 50 votos a 21, deixou para o próximo dia 17 sua decisão sobre o afastamento de Aécio Neves do mandato, determinado pelo STF. Confirmado como relator dos recursos do tucano no Supremo, o ministro Fachin manteve o mandato de Aécio suspenso. 

Dia de derrotas para Aécio

Fachin nega volta de tucano ao mandato, e Senado vai aguardar decisão do Supremo

Maria Lima, André Souza, Renata Mariz e Tatyane Mendes* | O Globo

-BRASÍLIA- À beira de uma crise institucional com o Supremo Tribunal Federal (STF), o Senado decidiu ontem recolher suas armas. Em um só dia, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) sofreu três derrotas e viu ser mantida a decisão que o afasta temporariamente do mandato e determina seu recolhimento noturno.

O primeiro revés do tucano ocorreu ainda pela manhã, quando a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, entendeu que os recursos apresentados na véspera por Aécio e pelo PSDB deveriam continuar com relatoria do ministro Edson Fachin — contrariando o pedido que fossem redistribuídos. Horas depois foi a vez de Fachin rejeitar recursos que pediam a suspensão da decisão de afastá-lo do mandato com o recolhimento.

A decisão provocou alvoroço em parte do Senado, mas a ampla maioria da Casa, por 50 votos a 21, decidiu recuar e esperar o julgamento no STF, no próximo dia 11, da ação que vai delimitar as prerrogativas do Legislativo de avalizar ou não medidas cautelares impostas a parlamentares pelo Supremo. A frase mais ouvida nos discursos foi: “Não estamos aqui para julgar Aécio”.

Gilmar, agora como bombeiro

Em meio à discussão entre Senado e Supremo, ministro afirma que não é ‘hora de acender o fósforo para saber ou querer saber se há gasolina no tanque’

Renata Mariz e André de Souza | O Globo

BRASÍLIA--Em meio ao impasse entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e Senado em decorrência do afastamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG), o ministro da Corte Gilmar Mendes afirmou ontem “que não se deve acender fósforo” diante do momento que é “bastante delicado”.

Gilmar evitou comentar a intenção dos senadores de apreciar as medidas cautelares impostas a Aécio antes de o plenário do STF julgar, em sessão marcada para a semana que vem, uma ação que discute exatamente se o parlamento pode ou não deliberar sobre restrições impostas a parlamentares diversas da prisão.

— Cada Poder terá seus critérios, não me cabe fazer esse tipo de encaminhamento. O importante é que nós saibamos que estamos vivendo um momento bastante delicado e a gente não deve acender fósforo para saber ou querer saber se há gasolina no tanque — afirmou Gilmar, que, nos últimos meses, protagonizou trocas de ofensas com o agora ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot.

Segundo o ministro, o Supremo e o Senado não podem perder de vista fundamentos constitucionais como a “harmonia e independência dos Poderes”:

— Precisamos ter todo o cuidado em lidar com esses temas que são sensíveis do ponto de vista institucional. Um dos fundamentos da República Federativa brasileira é a harmonia e independência dos poderes. É importante que todos nós, do Judiciário e os legisladores, prestemos atenção a esse postulado. O ministro lembrou que o Supremo fará sessão para analisar ação direta de inconstitucionalidade sobre regras de afastamento de parlamentares e outras medidas cautelares diferentes da prisão. Ele defendeu que é preciso pensar no sistema como um todo e não em casos pontuais. Gilmar fez as declarações ao sair de evento sobre segurança do processo eletrônico de votação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), do qual é presidente. Mais tarde, no STF, ele voltou a criticar ações da Corte que avancem sobre o Legislativo. Também falou sobre a pauta do Supremo, que, segundo ele, deve ser a da sociedade.

A política como caminho – Editorial | O Estado de S. Paulo

Os salutares efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal de proibir as doações empresariais a políticos em campanha, em 2015, começam a se fazer sentir também entre os empresários. Se antes havia empreendedores que financiavam candidatos apenas para que estes, uma vez eleitos, devolvessem esse investimento na forma de contratos e favores, há hoje no mundo empresarial quem se disponha a tentar influenciar os rumos do País não para obter ganhos particulares, mas para promover um desenvolvimento econômico que sirva a todos, e não somente a um punhado de “campeões nacionais”. E o caminho para isso, conforme mostrou recente reportagem do Estado, é a participação ativa desses empresários no debate político.

Decerto a imagem do poderoso empreiteiro Marcelo Odebrecht preso colaborou bastante para deflagrar esse processo de mudança do comportamento dos empresários em relação ao mundo político. Logo ficou claro que o País vive um novo tempo, em que a promiscuidade entre empresários e políticos passou a ser objeto de implacável escrutínio da Justiça e de grande aversão dos eleitores, sem poupar nem mesmo aqueles que, de tão poderosos, se julgavam acima da lei.

Empresas não são eleitores, conforme decidiu, sabiamente, o Supremo, mas os empresários, como cidadãos, têm todo o direito – senão o dever – de reivindicar um espaço no debate político. A visão do setor produtivo sobre o País obviamente deve ser levada em conta por aqueles que, legitimados pelo voto, tomarão as decisões que afetarão a todos.

O STF diante do equívoco das candidaturas avulsas - Editorial | O Globo

Julgamento pode permitir a eleição de candidatos salvacionistas, sem compromisso com partidos, que devem ser fortalecidos e não enfraquecidos, como aconteceria

Está previsto para hoje no Supremo o julgamento das candidaturas avulsas, criadas à margem dos partidos, marcado para avaliar arguição feita pelo advogado Rodrigo Mezzono, que tentou se lançar para prefeito do Rio, em 2016, sem legenda, teve a candidatura negada, recorreu, e o caso chegou às mãos do ministro Luís Roberto Barroso, relator do processo.

Temos, então, mais um exemplo dos estragos que podem causar espíritos criativos, até bem intencionados, que tentam resolver crises intrincadas com soluções simples, numa absoluta incongruência. Doenças graves requerem remédios adequados, de eficácia comprovada. Não terapias alternativas.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, encaminhou seu voto favorável a essas candidaturas. Entre os argumentos, registra que o Pacto de São José da Costa Rica, de 1992, do qual o Brasil é signatário, estabelece que os cidadãos têm direito de participar da vida pública “diretamente ou por meio de representantes livremente eleitos”. Além disso, a exigência de filiação partidária, por não ser uma cláusula pétrea, pode ser alterada.

Empresas ainda são o ponto fraco da retomada do crédito – Editorial | Valor Econômico

O aumento da oferta de crédito para as empresas em agosto deu um novo alento à expectativa de retomada da economia. Depois de 25 meses de quedas consecutivas, as concessões de empréstimos às pessoas jurídicas voltaram a crescer e registraram expansão de 15,9% na comparação com julho, para R$ 119 bilhões, puxadas pelo financiamento à exportação, de acordo com os dados do Banco Central (BC). As concessões para as famílias, que já vinham em recuperação, avançaram mais 4,3% para R$ 161,5 bilhões; e, levando em conta as duas modalidades, a expansão foi de 8,9%, somando R$ 281 bilhões.

A sinalização é positiva, mas não indica ainda a reação do crédito. Na melhor das hipóteses, as operações com as empresas encontraram o fundo do poço e pararam de encolher. Os números estão longe dos melhores momentos. Em comparação com o pico de dezembro de 2015, quando o estoque total de crédito atingiu R$ 3,2 trilhões, o equivalente a 53,65% do Produto Interno Bruto (PIB), a queda chega a 6,5 pontos do PIB, para o patamar atual de R$ 3,1 trilhões, ou 47,1% do PIB. Segundo o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), os empréstimos para empresas ainda estão no nível de 2009. Já os financiamentos para as famílias estão em recuperação há dez meses.

Tragédia à americana – Editorial | Folha de S. Paulo

Horror e consternação tomaram conta dos Estados Unidos após o ataque a tiros que deixou ao menos 59 mortos e mais de 500 feridos em um festival de música em Las Vegas —o mais mortífero do gênero na história do país.

Também perturbadores se revelam os percalços das autoridades para descobrir o que teria levado o aposentado Stephen Paddock, 64, a disparar, do alto de um hotel, contra centenas de pessoas.

Até onde as primeiras investigações avançavam, não havia indício de que ele tivesse vínculo com organizações terroristas ou extremistas, internacionais ou domésticas. Paddock não era conhecido da polícia nem do serviço secreto. Tudo leva a crer que se tratava de um cidadão comum.

Se a aparente ausência de motivação causa perplexidade, há nesse crime um aspecto em relação ao qual a sociedade americana não se pode considerar surpresa. A saber, a facilidade do atirador para adquirir e se deslocar com um arsenal –havia no quarto que ocupava nada menos que 23 armas.

Venceu a sensatez! | Ricardo Noblat

- O Globo

A decisão do Senado de não peitar, por ora, o Supremo Tribunal Federal (STF) no caso da punição imposta ao senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) foi a vitória da sensatez. O Legislativo existe para legislar, o Executivo para governar, e o STF para aplicar a Constituição e interpretá-la.

A Primeira Turma do STF afastou Aécio do mandato e obrigou-o a se recolher em casa todas as noites em função de ter sido flagrado pedindo e recebendo propina do empresário Joesley Batista. No próximo dia 11, o plenário do STF endossará ou revogará a decisão.

Se endossar, só caberá ao Senado obedecer. Nada mais. Como obedeceu quando o STF mandou prender, no ano passado, o ex-senador Delcídio Amaral, flagrado oferecendo dinheiro e proteção para que um dos delatores da LavaJato fugisse do país.

Na época, Renan Calheiros (PMDB-AL), então presidente do Senado, tudo fez para salvar Delcídio. Não só ele, mas as figurinhas carimbadas de sempre — entre elas, Romero Jucá (PMDB-RR), Jader Barbalho (PMDB-PA) e Fernando Collor (PTC-AL).

Renan e sua turma perderam. Como, agora, perderam outra vez. O temor dessa gente é ser Delcídio ou Aécio amanhã. Renan responde a mais de 15 processos no STF. Jucá, a pelo menos uma dezena de processos. Por ora, o campeão, ali, é Aécio Neves.

O Brasil velho de guerra estrebucha, enquanto o novo tenta nascer.

Esquizofrenia eleitoral | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

Numa das mais malucas e controversas hipóteses da psicologia, Julian Jaynes propôs que, até uns 3.000 anos atrás, a mente humana funcionava de modo repartido (bicameral), no qual as memórias e experiências de um hemisfério cerebral eram transmitidas ao outro através de alucinações auditivas.

Nesse mundo bicameral, a consciência ainda não existia e a própria volição assumia a forma de comandos divinos. O que hoje classificaríamos como sintomas de esquizofrenia era o modo ordinário de pensar.

Jaynes me veio à mente ao ler os resultados da última pesquisa Datafolha. A maioria dos brasileiros quer Lula preso (54%), mas é ele que aparece como líder em todos os cenários eleitorais. A maioria dos brasileiros diz buscar um candidato que nunca tenha se envolvido em casos de corrupção (87%) e que tenha experiência administrativa (79%), mas os dois favoritos são um condenado em primeira instância por corrupção e um ex-militar que nunca teve cargo no Executivo.

Lula lidera, mas saída política e jurídica fica cada vez mais difícil | Murillo de Aragão

- Diário do Poder

Apesar de o ex-presidente Lula (PT) liderar as pesquisas de intenções de voto para as eleições de 2018, sua fragilidade jurídica e política continua crescendo. Fora o risco de ele ser condenado em segunda instância – o que o tiraria da disputa –, sua imagem ficou ainda mais abalada após as recentes revelações feitas pelo ex-ministro Antonio Palocci (PT-SP).

A estratégia de Lula baseia-se em alguns princípios. O primeiro é o de que ele precisa aglutinar sua base original: aqueles petistas e lulistas de sempre, que lhe garantiram um piso de votos importante. Para tal, Lula esconde o “Lulinha, paz e amor” de eleições anteriores e apresenta o Lula guerreiro do povo pobre do país, vítima de uma grande perseguição política engendrada por uma coalizão liderada pelo juiz Sergio Moro, pelos tucanos e o capitalismo internacional.

Na sexta-feira passada, o chanceler cubano Bruno Rodríguez Parrilla, em discurso na Assembleia Geral da ONU, disse que Lula estaria sendo vítima de uma perseguição judicial com vistas a impedir sua candidatura. Para animar a militância, o ex-presidente realizou também uma caravana pelo Nordeste, com resultados modestos. Agora, de olho no julgamento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Porto Alegre), fará uma caravana pelo Sul do país.

A narrativa de Lula apresenta sérios pontos fracos. Ele está em apuros na esfera judicial: já está condenado a nove anos e seis meses de prisão, é réu em seis processos e denunciado em outros dois. Enfim, é suspeito de crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de influência e obstrução à Justiça. É uma carga pesada.

E seus ataques à Justiça só fazem piorar sua situação. No mínimo, despertam o espírito de corpo do Judiciário. As chances de Lula ser considerado ficha-suja são grandes. Se for julgado culpado pelo TRF da 4ª Região, dificilmente escapará da inelegibilidade, ainda que recorra ao Superior Tribunal de Justiça, ao Tribunal Superior Eleitoral e ao Supremo Tribunal Federal.

Ter uma candidatura pendurada na Justiça não é nada bom para agregar aliados ao largo do círculo dos fanáticos e dos militantes de sempre. Daí haver intensa mobilização no próprio PT em busca de um plano B.

A segunda fragilidade da estratégia de Lula reside no fato de que o governo Michel Temer (PMDB) começa a empreender uma recuperação econômica que poderá, lentamente, desarmar o ambiente político.

A terceira fragilidade decorre do apoio do PT à Venezuela. O país vizinho se desmancha na mídia internacional, e o PT reitera manifestações de apoio às manobras do governo venezuelano para transformar o que já era um regime autoritário em uma ditadura.

A quarta fragilidade refere-se ao fato de Lula, aqui e acolá, ameaçar a mídia com uma regulamentação. Obviamente, a ameaça é uma retaliação ao que considera perseguição da mídia burguesa. Mas ele deve lembrar que, em 2002, foi recebido – ao vivo – no “Jornal Nacional”, da TV Globo, logo após ser eleito.

No entanto, não resta muito mais a ser feito. O ex-presidente força na narrativa para animar os fanáticos e iludir os incautos. O que dizer, então? Assumir os erros? Dizer que o que ele e o PT fizeram todos fizeram também? Que política é assim mesmo?

Assim sendo, forçar uma narrativa em que se coloca como vítima de perseguição é o caminho natural. Faz parte do discurso político, no qual a verdade é a primeira vítima antes do eleitor. Infelizmente, não poderia ser diferente.

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É cientista político

Meramente ilustrativas | Rosângela Bittar

- Valor Econômico

Se Alckmin e Doria se unirem, o PSDB lidera a disputa

Qualquer especialista que não seja dono de instituto de pesquisa dirá que qualquer pesquisa eleitoral feita hoje, tendo o objetivo de projetar 2018, apresenta um resultado sem registro de significado. Não são quantitativas, nem qualitativas, as pesquisas hoje são ilustrativas. Porém, são também uma atração fatal, tabuleiros lúdicos, onde não faltam os dados com os nomes de sempre a serem chacoalhados e jogados ao centro da mesa.

Como são inócuas, vale tudo, todos querem saber quem está melhor situado no ranking se fosse candidato, mesmo que candidato não seja. Não há regras eleitorais aprovadas, os partidos estão mudando de nome e de sigla, não sabem se estarão vivos ou mortos, os freios de arrumação não foram acionados. Nem para manipular eleições, como as pesquisas já foram acusadas várias vezes, servem neste momento, a uma distância de um ano do evento a ser forjado.

Quem sabe numa dessas rodadas de brincadeira não aparece uma indicação de rumo, não desponta um candidato em estágio avançado de gestação, em quem se possa votar e que não sejam os nomes sempre testados, em especial os que ganham traço na preferência do eleitorado. Na base do jogo, é possível colocar qualquer um na lista, até Deus, que deverá receber mais de 80%, embora não seja candidato. Quem se importa?

Aí está a natureza das enquetes atuais: perguntas aleatórias, em quantidade irrespondível, ou dirigidas com objetivo certo, num momento de desestrutura da política, dos partidos, das leis, para uma eleição que ainda não se sabe como será financiada ou se vai acontecer sob quais regras. Sem falar na dramática relação entre os responsáveis por conduzi-las, Poderes Legislativo e Judiciário, em cuja função se instalou uma disputa de morte em torno de todas as atribuições, um do outro, inclusive na área da regulamentação eleitoral.

Por que o Brasil é um país tão desigual? | José Anibal

- Blog do Noblat

Uma série de estudos recém-divulgados jogou luz à questão das desigualdades no Brasil. Sejam quais forem as metodologias e índices utilizados, a constatação é sempre a mesma: somos um país muito atrasado nesse quesito. O grande desafio de oferecer oportunidades e acesso a direitos e serviços públicos de qualidade em um nível mais equânime mostra-se ainda pertinente para a construção de um futuro mais próspero e promissor.

Há diversas formas de se medir a desigualdade no Brasil. A questão, porém, não se restringe a contabilizar quanto ganham os mais ricos, os mais pobres e a grande massa intermediária. Claro que é importante buscar meios de incrementar a renda dos mais pobres e estimular a mobilidade social, mas o que é de fato fundamental é entender as causas, os fatores que levam o país às piores posições de quaisquer comparativos internacionais de desigualdade.

Homem a homem | Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

Temer tem votos suficientes para barrar a segunda denúncia da Lava-Jato na Câmara, mas está correndo risco de ter menos apoio do que na rejeição da primeira

O presidente Michel Temer adotou um sistema de marcação homem a homem para garantir a rejeição da segunda denúncia do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot pela Câmara, na qual é acusado, supostamente, de organização criminosa e obstrução de Justiça, com base na delação premiada do doleiro Lúcio Funaro. Ontem, quase 50 deputados foram recebidos oficialmente por Temer, em seu gabinete, em cerca de 20 audiências, depois de um fim de semana dedicado à discussão de sua estratégia de defesa.

Já não adianta terceirizar as negociações com os deputados da base do governo que negaceiam seu apoio, por diversos motivos, do não cumprimento de compromissos assumidos à ambição de ocupar mais espaços na Esplanada. Pelo Twitter, logo de manhã, Temer classificou a denúncia do ex-procurador Rodrigo Janot de “inepta e sem sentido” e anunciou que conversaria com os parlamentares da base para preservar “a harmonia entre os poderes”. Na verdade, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que foi seu esteio na rejeição da primeira denúncia, acendeu uma luz amarela no Palácio do Planalto ao se queixar da atuação da cúpula do PMDB e se defender das acusações de que está conspirando: disse que não teria o mesmo comportamento do PMDB, que articulou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff quando Temer era o vice-presidente da República.

O presidenciável Meirelles e o salário, ó | Vinicius Torres Freire

- Folha de S. Paulo

Um salário mínimo vale mais do que no ano passado, tuitou Henrique Meirelles nesta terça-feira. O ministro da Fazenda escreveu que o mínimo compra mais cesta básica do que em 2017, entre outros pios de campanha eleitoral.

É verdade. Mais do que isso: o valor real do mínimo nos últimos 12 meses é o mais alto desde o Plano Real, de 1994.

Os mais pobres são, no entanto, os brasileiros mais insatisfeitos com a situação econômica e os mais pessimistas com o futuro, indica o Datafolha da semana passada. Mais pobres, neste caso, são os entrevistados que declaram renda familiar inferior a dois salários mínimos.

De onde vem a dor? Do medo de ficar sem trabalho ou do desemprego, de parentes e amigos que foram para a rua. Do receio de que o tumulto da política provoque piora na economia, um clássico nas pesquisas de opinião.

Parece esquisito dizer que o mínimo está no valor mais alto desde o Real (trata-se aqui do valor real do salário mínimo nos últimos doze meses. Em suma, do salário anual). Mas é um fato, não muito difícil de compreender.

O 12 de outubro de Ernesto Geisel | Elio Gaspari

- O Globo

Em 1977 um general restabeleceu o poder republicano da Presidência. Em 2017, Temer, um civil, piscou

No próximo dia 12, completam-se 40 anos da manhã em que o presidente Ernesto Geisel convocou ao Palácio do Planalto o então ministro do Exército, general Sylvio Frota, e demitiu-o. Encerrava-se assim um período de 23 anos pontilhado por lances de anarquia militar. Geisel restabeleceu o poder do presidente da República sobre os generais. Durante 40 anos, com uns poucos solavancos, essa ordem foi respeitada. Coube a Michel Temer o papel trágico (e algo ridículo) de presidir o ressurgimento de surtos de anarquia militar.

O pronunciamento do general Antonio Mourão e a forma como ele foi absorvido pelo governo expuseram um renascimento da desordem. Há dois anos, durante o governo de Dilma Rousseff, o mesmo general falou de política e perdeu o Comando Sul, a mais poderosa guarnição do país. Dilma agiu, Temer piscou. Mourão passou incólume e recebeu até um elogio pessoal de seu comandante.

Na bagunça da finada ditadura atropelaram-se as Constituições de 1946 e a de 1967, patrocinada pelo próprio regime. Levantes (ou boatos de levantes) serviram para emparedar dois presidentes (Castello Branco e Costa e Silva). Impediu-se a posse do vice-presidente Pedro Aleixo, substituindo-o por um general, Emílio Médici — escolhido num processo caótico. Um ex-ministro da Marinha foi publicamente condenado ao silêncio. O ministro Lyra Tavares, do Exército, foi desafiado e ultrapassado por generais indisciplinados.

Noções | Cecília Meireles

Entre mim e mim, há vastidões bastantes
para a navegação dos meus desejos afligidos.

Descem pela água minhas naves revestidas de espelhos.
Cada lâmina arrisca um olhar, e investiga o elemento que
a atinge.

Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza,
só recolho o gosto infinito das respostas que não se
encontram.

Virei-me sobre a minha própria existência, e contemplei-a
Minha virtude era esta errância por mares contraditórios,
e este abandono para além da felicidade e da beleza.

Ó meu Deus, isto é a minha alma:
qualquer coisa que flutua sobre este corpo efêmero e
precário,
como o vento largo do oceano sobre a areia passiva e
inúmera...

Milton Nascimento - Travessia