domingo, 12 de fevereiro de 2017

A Lava-Jato precisa se proteger – Elio Gaspari

- O Globo

Soberba ajuda adversários da Lava-Jato. Na solene e medonha rotunda da universidade de Columbia, em Nova York, o juiz Sérgio Moro explicou sua estrondosa decisão de liberar o grampo de um telefonema de Dilma Rousseff para Lula, em março do ano passado. Os dois trataram da blindagem de Nosso Guia que havia sido nomeado chefe da Casa Civil. O efeito da divulgação do áudio foi devastador. Contudo, havia um problema. Às 11h12m Moro determinara o fim da escuta do telefone de Lula e a conversa ocorreu às 13h32m. Ainda assim, foi transcrita e anexada aos autos da Polícia Federal às 15h37m .

Falando para uma plateia relativamente leiga, Moro explicou sua conduta: “Nossa decisão foi a de não esconder nenhuma evidência nesses casos”. Meia verdade. Sua decisão foi a de expor uma tramoia na qual Dilma blindava Lula, mas a prova que usou era ilegal.

Confrontado à época, Moro disse que a questão dos horários não tinha relevância, porque as companhias telefônicas ainda não haviam sido notificadas. Conversa para boi dormir. Ele é que não deveria ter anexado o grampo feito fora do prazo legal.

Foi um golpe de mestre, mas custou a Moro uma repreensão vinda do ministro Teori Zavascki: “Não há como conceber a divulgação das conversações do modo como se operou”. Explicando-se, Moro disse o seguinte: “Compreendo que o entendimento então adotado possa ser considerado incorreto, ou mesmo sendo correto, possa ter trazido polêmicas e constrangimentos desnecessários. Jamais foi a intenção desse julgador (...) provocar tais efeitos e, por eles, solicito desde logo respeitosas escusas a este Egrégio Superior Tribunal Federal”.

Teori foi bonzinho aceitando esse pedido acrobático de desculpas, mas não passaria pela cabeça de Moro dizer ao Supremo o que disse em Nova York.

Lances de soberba ajudam os adversários da Lava-Jato. Afinal de contas, o ladrão sabe que é ladrão, o que ele precisa é que o policial faça uma besteira.

É o caso de se repetir: pode-se fazer tudo por Moro e pela Lava-Jato, menos papel de bobo.

Paulo Hartung deu uma aula de economia
Na noite de quinta-feira o governador licenciado Paulo Hartung, do Espírito Santo, deu uma entrevista à repórter Míriam Leitão. Foi uma magnífica aula de economia e Ciência Política. Defendeu a responsabilidade fiscal, açoitou a leviandade dos governantes do Rio e mostrou como o modelo de austeridade do governo capixaba deveria ser copiado por outros estados.

Depois de um motim da Polícia Militar, mais de cem pessoas haviam sido assassinadas no Espírito Santo, e as ruas de Vitória continuam patrulhadas pelas Forças Armadas. Hartung bateu duro no motim: “Movimento inconstitucional”, “intolerável”, “chantagem”. Contudo, a poucos quilômetros de distância, seu governo negociava uma saída para a crise com uma delegação de mulheres de amotinados. Noves fora a teatralidade do encontro, pois governo sério não negocia com amotinado, mas conversa com as mulheres dos amotinados, não houve acordo.

Em sua jeremiada, Paulo Hartung poderia ter evitado o clichê: “Se depender de mim, não ficará pedra sobre pedra”. Em 2005 Lula disse que apuraria as denúncias do mensalão, pois “não ficará pedra sobre pedra”. Em 2014 a então presidente da Petrobras Graça Foster anunciou que partiria para cima dos larápios: “Não fica pedra sobre pedra, não fica. Mas não fica, não fica”.

Depois de ter dito que reestruturará a PM do Espírito Santo, Hartung revelou uma providência concreta, imediata: criou um grupo de trabalho e ofereceu um acordo aos amotinados.

As pedras ficaram sobre pedras.

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