terça-feira, 17 de maio de 2016

Opinião do dia – Zander Navarro

A espetacular e quase inacreditável derrocada do campo petista reduz fortemente o sonho de concretizar uma sociedade mais justa no Brasil, pois nenhuma sociedade democrática se afirmará jamais sem pujantes forças políticas opositoras e progressistas que animem o dissenso. No poder, o PT ignorou seu passado e se apequenou. Quem sabe na oposição se reconstitua eticamente e exerça o papel para o qual fora formado.

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*Zander Navarro é sociólogo e pesquisador em Ciências Sociais. ‘O relato da História’. O Estado de S. Paulo, 17/5/2016

Maria Silvia, ex-CSN, vai comandar o BNDES; Meirelles anuncia equipe nesta terça-feira

• Executiva Maria Sílvia Bastos substituirá Luciano Coutinho no comando do banco de fomento

Gustavo Porto e Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O nome da executiva Maria Silvia Bastos Marques foi confirmado nesta segunda-feira para a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em substituição a Luciano Coutinho. O anúncio foi feito à tarde, em comunicado distribuído pela Presidência da República. Após as críticas que o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) sofreu por não ter nomeado mulheres para o Ministério, a primeira confirmação de indicação feminina veio para o principal instrumento de crédito do governo ao setor produtivo.

“O presidente Michel Temer a escolheu pela sua competência”, disse o ministro do Planejamento, Romero Jucá. Será a Jucá que Maria Silvia se reportará, depois da mudança administrativa que transferiu o BNDES do Ministério do Desenvolvimento para o Planejamento. Jucá preferiu não alimentar a polêmica sobre a representatividade feminina no governo. “É um convite para alguém competente e experiente para fazer um bom trabalho”, desconversou.
Jucá participa nesta terça-feira de simpósio na sede do BNDES, no Rio de Janeiro.

Para o evento estava prevista a participação de Coutinho. O ministro não soube dizer se Maria Silvia, que estava com viagem marcada ao exterior, comparecerá. A executiva retorna ao banco onde atuou como diretora de 1991 a 92, durante o governo Collor, quando Eduardo Modiano presidia a instituição. Sua carreira inclui também a presidência da siderúrgica CSN e da Icatu Seguros.

A escolha para o BNDES é mais um capítulo na definição da equipe econômica do governo. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, havia previsto para esta segunda-feira o anúncio de sua equipe, mas transferiu para terça-feira a divulgação. Por enquanto, o único nome confirmado por Meirelles no ministério foi o de seu “número dois”, Tarcisio Godoy, secretário executivo.

Segunda-feira, Meirelles foi ao Banco Central, onde se reuniu com Alexandre Tombini. Ao retornar à Fazenda, disse laconicamente que a conversa com o presidente do BC “foi muito boa”. A substituição de Tombini – que deve ficar ao menos até junho à frente do banco – é uma das questões acompanhadas mais de perto pelo mercado financeiro. O nome mais cotado para assumir o cargo continua sendo o do economista Ilan Goldfajn, atualmente no Itaú.

“O anúncio era o que de mais relevante havia para acontecer hoje (segunda-feira)”, disse a economista-chefe da gestora ARX Investimentos, Solange Srour, que destacou o desconforto do mercado com a demora da divulgação dos principais nomes, que analistas entendiam como certos. Mansueto Almeida era um deles, mas o economista não deve assumir o Tesouro, como se cogitava. Deve assumir uma secretaria extraordinária.

BB e Caixa. Os nomes dos presidentes dos bancos públicos podem não ser anunciados nesta terça-feira. Funcionário de carreira da Caixa, Gilberto Occhi foi indicado pelo PP e estava praticamente certo na presidência da instituição. Mas pode não ser oficializado nesta terça-feira.

No Banco do Brasil, Alexandre Abreu, que nas primeiras informações estava cotado para permanecer ao menos por mais algum tempo na presidência, deve ceder lugar para Gustavo do Vale, atualmente presidente da Infraero. Ex-diretor e funcionário de carreira do BC, Valle foi indicado pelo próprio PMDB, mas o martelo também não foi batido ainda.

O secretário do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira, será mantido no cargo. Jorge Rachid também permanecerá no comando da Receita Federal. A Secretaria de Política Econômica ficará sob o comando de Carlos Hamilton, ex-diretor do BC. O procurador-geral da Fazenda Nacional, Fabrício Da Soller, também deverá ficar no cargo.

Temer forma grupo com sindicalistas e governo para proposta para a Previdência

• Grupo será formado por dois representantes de centrais sindicais, representantes do governo e coordenado por Eliseu Padilha, segundo o presidente da Força Sindical, deputado federal Paulinho da Força (SD-SP)

Gustavo Porto e Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente em exercício Michel Temer (PMDB) montou nesta segunda-feira, 16, um grupo de trabalho com representantes de centrais sindicais e do governo federal para discutir e elaborar, em até 30 dias, uma proposta de alteração na Previdência Social. A proposta foi apresentada por Temer para sindicalistas em uma reunião no Palácio do Planalto, da qual participaram ainda os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil), Henrique Meirelles (Fazenda) e Ronaldo Nogueira (Trabalho).

Segundo o presidente da Força Sindical, deputado federal Paulinho da Força (SD-SP), o grupo será formado por dois representantes de centrais sindicais, representantes do governo e coordenado por Padilha. Além da Força Sindical, indicarão nomes as Centrais Sindicais Brasileiras (CSB), União Geral dos Trabalhadores (UGT) e Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST).

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) não participaram do encontro por serem contrárias ao governo Temer, mas também poderão indicar nomes ao grupo trabalho, se quiserem.

"O presidente disse que tem urgência em resolver essa questão da Previdência. A primeira reunião de grupo de trabalho da Previdência será na quarta-feira, às 9h", explicou Paulinho. De acordo com o deputado federal, Temer abriu a reunião dizendo que o modelo do governo dele é de negociação e discussão e, portanto, não abriu espaço para ministros expressarem opiniões pessoais sobre o tema.

"Não daria para (o ministro da Fazenda, Henrique) Meirelles falar nada de diferente dele (Temer)", afirmou Paulinho, numa referência às declarações do ministro sobre a necessidade de uma reforma previdência. "Não vamos aceitar mudanças nos direitos adquiridos de quem está no mercado de trabalho. Podemos discutir mudanças na Previdência para os que chegam ao mercado de trabalho", admitiu Paulinho.

Indagado se uma reforma trabalhista seria discutida no grupo de trabalho, Paulinho praticamente descartou o tema. "Em 30 dias não dá para discutir Reforma Trabalhista que é bem mais complicada", concluiu.

PT não se compromete com pautas antes defendidas no governo Dilma

• Senador Humberto Costa, que foi líder da gestão da presidente afastada, colocou sob dúvida o apoio à revisão da meta fiscal, à reforma da Previdência, entre outros projetos

Isabela Bonfim - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O senador Humberto Costa (PT-PE), que foi o líder do governo da presidente afastada Dilma Rousseff, não sinalizou qualquer compromisso com pautas que foram defendidas durante a gestão petista e que agora se tornaram prioritárias também na administração de Michel Temer. Ele colocou sob dúvida o apoio à revisão da meta fiscal, à reforma da Previdência, entre outros projetos.

"Temos uma reunião marcada com o partido, com a nossa bancada e outros partidos que vão compor agora a oposição. Vamos discutir de que maneira vamos lidar com cada um desses problemas. Não há consenso", disse em relação ao projeto de revisão da meta fiscal, que foi enviado ao Legislativo pelo governo Dilma, autorizando um déficit superior a R$ 96 bilhões. A proposta foi enumerada pela equipe de Temer como a primeira a ser aprovada pelo Congresso.

O antigo líder também rechaçou a proposta de reforma da Previdência, que era também uma bandeira da gestão Dilma. "Queremos fazer a reforma. Mas ela não poderia representar perda de direitos para os trabalhadores, deveria ser feita em um momento adequado, no mínimo daqui a quatro anos, e teria que ser uma reforma discutida com os setores sociais. Essas condições não estão atendidas na proposta deste governo", afirmou em referência à proposta anunciada pela equipe de Michel Temer.

O senador disse ainda que a reforma da Previdência exige participação de movimentos sociais, mas, no momento, as principais centrais sindicais não aceitaram negociar com o governo provisório por considerá-lo "ilegítimo".

DRU. Costa também não quis se comprometer com nenhum apoio ao projeto já inscrito na pauta de votação do Senado que prorroga a Desvinculação de Receitas da União (DRU). A proposta flexibiliza que 25% das receitas atreladas a setores como educação e saúde possam ser usados em outras áreas. 

A votação da DRU foi uma das grandes batalhas do governo Dilma, uma das principais pautas do chamado "ajuste fiscal". Sem sucesso, o projeto ainda continua tramitando, mas será considerado fundamental pelos apoiadores do governo Temer.

De acordo com Humberto Costa, é preciso que o Congresso reconheça que o governo Dilma estava "correto" ao trazer projetos de oficialização do déficit fiscal e criação de novos impostos. "Todos aqui diziam que essa proposta para mudar a meta era um absurdo e agora vão lançar mão de uma série de coisas. A mesma questão é a CPMF, vimos tanta gente aqui bradar que não aceitaria o aumento de impostos, vamos ver o que vão dizer agora."

Oposição. Pela primeira vez, o ex-líder do governo se referiu ao PT já como oposição. Ele anunciou ainda que os blocos terão de ser refeitos e que um novo bloco de oposição será criado, com a participação de PT, PC do B e PDT. "Temos um gabinete de oposição, um gabinete da minoria, que será transformado em um bloco de oposição. Teremos um líder, claro, que não precisa ser necessariamente eu", esclareceu.

Dilma critica posicionamento do Itamaraty em relação a países latino-americanos

• Presidente afastada diz que recentes reações de países vizinhos 'expressa a indignação internacional diante da farsa jurídica aqui montada'

- O Estado de S. Paulo

A presidente afastada Dilma Rousseff usou as redes sociais nesta segunda-feira, 16, para se manifestar contra as acusações do Itamaraty a países latino-americanos e à União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Na sexta-feira passada, a pasta divulgou notas em que critica ambos por "propagação de falsidades" sobre o processo político no Brasil. Naquele dia, com o início do governo Temer, o Itamaraty passou a ser comandado pelo tucano José Serra (SP).

Também na sexta-feira, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou, durante a reunião do Conselho de Ministros, que solicitou o retorno a Caracas do embaixador venezuelano no Brasil, Alberto Castellar. O motivo foi o afastamento de Dilma Rousseff.

Depois, outros países vizinhos tomaram decisões semelhantes. El Salvador, por exemplo, suspendeu contratos oficiais com o Brasil. A decisão do país também foi criticada em nota expedida nesta segunda pelo Ministério das Relações Exteriores.

No texto publicado nesta segunda, a presidente afastada afirmou que essa reação "expressa a indignação internacional diante da farsa jurídica aqui montada". Segundo a presidente afastada, o posicionamento dos países "revela a preocupação de que essas práticas, travestidas de legalidade, possam se espalhar por outras partes do mundo".

Os fatos políticos recentes no País podem, de acordo com Dilma, promover "a desestabilização de governos legítimos e revertendo as grandes conquistas sociais e democráticas alcançadas nos últimos 15 anos".

"Governos e povos da América Latina estão também preocupados com as ameaças que o novo ministro recorrentemente fez ao Mercosul e com sua disposição de estabelecer acordos econômicos e comerciais profundamente lesivos ao interesse nacional", diz a nota.

Temer troca comando de BNDES, Petrobras e BB

• Maria Silvia Bastos Marques será presidente do banco de fomento

Petrolífera também terá nova liderança, e Pedro Parente, que foi ministro da Casa Civil de Fernando Henrique Cardoso, é cotado para o cargo. Gustavo do Vale, ex-Infraero, assumirá o Banco do Brasil

O presidente interino, Michel Temer, começou a mudar o comando dos principais bancos estatais. A economista Maria Silvia Bastos Marques, que foi presidente da CSN e da Empresa Olímpica Municipal, vai comandar o BNDES. Temer fora criticado pela ausência feminina em cargos de primeiro escalão. A escolha de Maria Silvia, primeira mulher na presidência do banco, agradou a empresários, que destacaram seu perfil técnico e a experiência nos setores público e privado. Temer também já decidiu trocar o comando da Petrobras, e o mais cotado para o cargo é Pedro Parente, que foi ministro da Casa Civil no governo Fernando Henrique. Para a presidência do Banco do Brasil, com o aval do ministro Henrique Meirelles (Fazenda), o escolhido é Gustavo do Vale, atual presidente da Infraero. O nome de consenso para a Caixa Econômica Federal é Gilberto Occhi, ex-ministro da Integração e das Cidades. –

Pioneira à frente do BNDES

• Maria Silvia Bastos Marques, primeira mulher a presidir a CSN, assumirá banco de fomento

Catarina Alencastro, Júnia Gama, Martha Beck, Glauce Cavalcanti, Bruno Rosa e Roberta Scrivano - O Globo


BRASÍLIA, RIO E SÃO PAULO- A economista Maria Silvia Bastos Marques será a nova presidente do BNDES, uma das maiores instituições de fomento do mundo. A escolha foi confirmada ontem pelo gabinete do presidente interino, Michel Temer, que desde a semana passada está sob forte crítica pela ausência feminina em seu primeiro escalão. Maria Silvia, que substituirá Luciano Coutinho, será a primeira mulher a comandar a instituição. Seu nome agradou a empresários, principais clientes do banco, por sua ampla experiência nos setores público e privado. Maria Silvia conversou ontem com Temer e os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Romero Jucá.

Aos 59 anos, mãe de uma casal de gêmeos de 19 anos, Maria Silvia está acostumada ao papel de pioneira. Foi a primeira mulher a integrar a diretoria do próprio BNDES — cuidou das áreas Financeira e Internacional e de Planejamento, nos anos 1990 —, a dirigir a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a comandar as Finanças da cidade do Rio, durante a gestão do exprefeito Cesar Maia.

Ela também presidiu a Icatu Seguros e a Empresa Olímpica Municipal, órgão da prefeitura do Rio que coordena e executa os projetos e as atividades relacionados aos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016. Ela assumiu a presidência do órgão em 2014 e passou a atuar como assessora especial das Olimpíadas junto à prefeitura. Na semana passada, deixou a função.

Formada em administração pública e com mestrado e doutorado em Economia, Maria Silvia ganhou o respeito do mercado por entregar resultados sólidos de caixa. Fez isso na secretaria de Fazenda do Rio, entre 1993 e 1996. No lado privado, alavancou o faturamento da CSN, período durante o qual foi considerada umas das executivas mais influentes do mundo.

Empresários elogiam escolha
Colocar finanças no azul é habilidade importante em um momento em que o país enfrenta os desafios da recessão econômica, e o BNDES, principal fonte de financiamento da infraestrutura nacional, tem capacidade limitada de levantar novos recursos.

O banco, apesar de ter registrado lucro de R$ 1,5 bilhão no primeiro trimestre deste ano, viu seu braço de investimento, o BNDESPar, amargar prejuízo de R$ 1,8 bilhão no período, ante perda de R$ 900 milhões em igual período do ano passado. O desempenho foi efeito direto do resultado das baixas contábeis na Petrobras, de R$ 2,6 bilhões.

Outra contribuição esperada de Maria Silvia é aos programas de concessão e venda de ativos de empresas públicas, parte importante do projeto econômico de Michel Temer. Ela já trabalhou com o tema em profundidade, quando era assessora especial para Assuntos de Desestatização do BNDES. Só a BNDESPar, tem em carteira R$ 44,5 bilhões em 116 empresas de diversos setores.

— É um convite para botar alguém competente, experiente e que tem toda condição de fazer um bom trabalho no BNDES. Portanto, o presidente Michel (Temer) entendeu de convidá-la. Eu acho uma ótima escolha — disse Romero Jucá.

Alberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), considerou a escolha de Maria Silvia para o BNDES “excelente”. Ele salientou a importância do banco para o setor industrial e para a reativação do fluxo de investimentos.

— É uma pessoa com experiência e que já mostrou competência em suas atuações anteriores. Certamente, foi uma escolha acertada. Ela conhece o setor empresarial e saberá conduzir bem esse órgão que é tão importante para o empresariado — disse.

O presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, também elogiou:

— A Maria Silvia é uma pessoa séria e sem dúvida prestará um bom serviço ao Brasil.

José Carlos Rodrigues Martins, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), considerou positiva a mudança no comando do BNDES. Segundo ele, Maria Silvia já conhece o funcionamento do banco, além de ter experiência nos setores público e privado, bem como em conselhos de administração de diversas empresas, como Petrobras, Vale, Souza Cruz e Estácio Participações.

— Novos investimentos demandam mais credibilidade. E Maria Silvia pode trazer essa confiança. Foi uma escolha inteligente, pois ela conhece o setor privado, o setor público e sabe como o banco funciona. Mas, claro, há desafios neste momento, como colocar de pé um modelo de financiamento que não fique restrito a poucas empresas. É preciso uma mudança de modelo que atenda a mais companhias e democratize o acesso a recursos — destacou Martins.

Em nota, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) disse que a escolha representa “mais um grande acerto na formação da equipe do novo governo”. Ao destacar sua trajetória, como a atuação no setor privado ao longo dos anos 1990, a entidade lembrou a experiência da economista com privatizações. “E a venda de ativos públicos é uma iniciativa essencial dentro de uma nova política para a questão fiscal, como alternativa ao aumento de impostos, que permite a geração de receita de forma mais rápida e contribui para reduzir o desequilíbrio das contas públicas”, destacou a Firjan.

Gustavo Vale vai para o comando do Banco do Brasil

• Integrantes da equipe econômica serão anunciados hoje. Ilan Goldfajn é dado como certo no BC

Gabriela Valente e Martha Beck - O Globo


-BRASÍLIA- O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, divulga hoje os nomes de sua equipe, incluindo o presidente do Banco Central e dirigentes dos principais bancos públicos. Até ontem à noite, era dada como certa a ida do atual presidente da Infraero para o comando do Banco do Brasil, no lugar de Alexandre Abreu. Gustavo do Vale é uma opção de consenso no governo e não desagradaria ao corpo técnico do BB. Tem ligações com PMDB, mas também foi vice-presidente de Tecnologia da instituição. Para a presidência da Caixa Econômica Federal, será nomeado Gilberto Occhi.

Com dificuldades para montar o time, Meirelles adiou o anúncio para hoje. Na Fazenda, a mudança significativa só deve ocorrer na Secretaria de Política Econômica (SPE). Ela será dividida entre o ex-diretor do Banco Central Carlos Hamilton Araújo e o especialista em contas públicas Mansueto Almeida.

Meirelles pretende manter boa parte do grupo que estava com o ex-ministro Nelson Barbosa. Os secretários da Receita Federal, Jorge Rachid, de Assuntos Internacionais, Luís Balduíno, e do Tesouro Nacional, Otávio Ladeira, devem permanecer. No BC, é dada como certa a escolha do economista-chefe do Itaú Ilan Goldfajn, mas a questão da autonomia do BC dificultou que o martelo fosse batido. Até mesmo a permanência de Alexandre Tombini chegou a ser considerada.

O ministro do Planejamento, Romero Jucá, já definiu sua nova equipe: a secretaria-executiva da pasta será comandada por Dyogo Oliveira, que ocupava o mesmo cargo no Ministério da Fazenda na gestão do ex-ministro Nelson Barbosa; o Ipea passará a ser presidido por Manoel Pires, que também era da equipe de Barbosa; Wasmália Bivar continuará presidente do IBGE. Na Secretaria de Orçamento Federal, George Aguiar Soares, funcionário de carreira assumirá o comando. Na Secretaria de Planejamento e Investimento, será nomeado Francisco Franco, que era titular da SOF até agora.

Pedro Parente, ex-ministro de FH, deve assumir presidência da Petrobras

• Engenheiro coordenou programa de racionamento de energia em 2001

Gabriela Valente, Ramona Ordoñez - O Globo

-BRASÍLIA E RIO- Ministro em três diferentes ocasiões no governo Fernando Henrique Cardoso, Pedro Parente deve ser anunciado como o novo presidente da Petrobras. Se confirmado, substituirá o atual comandante da empresa, Aldemir Bendine, com a missão de melhorar a imagem da companhia no mercado financeiro. Segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, a decisão teria sido tomada na tarde de ontem pelo presidente interino Michel Temer. A assessoria diz oficialmente que ainda não houve nenhuma definição, mas não descarta o nome.

Temer decidiu trocar logo o comando da estatal. A escolha de Parente para a Petrobras já circulava também no setor privado, entre fontes do setor elétrico.

Engenheiro formado pela Universidade de Brasília (UnB), Pedro Parente foi três vezes ministro no governo Fernando Henrique Cardoso. Comandou o Planejamento, Minas e Energia e a Casa Civil. Tem experiência com grandes crises. Coordenou o comitê responsável por administrar a crise de energia elétrica e organizar as regras do racionamento de 2001.

Em 2001, Petrobras foi chave
Depois que saiu do governo, Pedro Parente foi vice-presidente executivo do grupo RBS, onde coordenou sua reestruturação financeira. Também foi presidente da Bunge.

No racionamento de 2001, lembra um executivo do setor elétrico, Parente baseou o programa nas térmicas a gás natural da Petrobras, deixando de lado a Eletrobras. Na ocasião, a estatal do setor elétrico passava por dificuldades por estar proibida pelo governo de investir em novos projetos de expansão do sistema, pois suas subsidiárias (Chesf, Furnas, Eletronorte e Eletrosul) estavam sendo preparadas para serem privatizadas.

Justamente por essa experiência na condução do racionamento de energia em 2001 e pelos anos que passou no setor privado desde que deixou o governo, Pedro Parente é visto como um nome que pode recuperar a empresa, que está em crise por causa do escândalo de corrupção apurado pela Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. O quadro se agravou diante de um cenário desfavorável do mercado, com a alta no preço do petróleo no mercado internacional e a recessão no Brasil.

A possível mudança no comando da Petrobras surpreendeu a direção da estatal, que está em plena elaboração do novo Plano de Negócios 2016/ 2017. Hoje, tem reunião de diretoria da Petrobras.

Novo governo revê atos na Educação e Bolsa Família

Pente-fino na área social

• Corte no Bolsa Família pode chegar a 10% dos beneficiários; atos na Educação serão revistos

Renata Mariz - O Globo

-BRASÍLIA- Mais duas pastas da área social do novo governo vão rever programas e atos da gestão petista. No Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, um pente-fino no Bolsa Família poderá levar ao desligamento de até 10% dos beneficiários, segundo projeção feita pelo ministro Osmar Terra ao GLOBO. No Ministério da Educação e Cultura (MEC), a ordem foi revisar todas as deliberações publicadas nos últimos 30 dias. Além da legalidade das medidas do ex-ministro Aloizio Mercadante e sua equipe, o novo ministro da pasta, Mendonça Filho, vai avaliar o mérito dos atos, podendo revogá-los.

As mudanças no Bolsa Família, segundo Terra, incluem um aprimoramento na fiscalização do programa, com cruzamento de diversas bases de dados do governo, para checar se as cerca de 14 milhões de famílias beneficiárias cumprem a condição de baixa renda exigida. Estudos feitos desde a elaboração do Travessia Social, programa de governo do presidente interino Michel Temer, projetam que 10% dos atendidos estão fora dos critérios. Osmar Terra destacou que a proporção pode ser até maior:

— Se for cruzar todos os dados, pode dar mais, de 20% a 30%, mas estamos falando de uma população flutuante, que melhora de vida e piora rapidamente. O importante é dizer que será um processo gradual, que não prejudicará a população que realmente precisa. Inclusive a família que eventualmente sair do programa terá as portas abertas para voltar, em caso de necessidade.

Reajuste confirmado
Terra disse que o governo Temer vai garantir o reajuste de 10% no Bolsa Família anunciado pela presidente afastada Dilma Rousseff em 1º de maio. Como foi anunciado pela gestão anterior, ele confirmou que há R$ 1 bilhão no Orçamento disponibilizado para custear a medida. O ministro estima que, até o fim de junho, a correção do valor dos benefícios será confirmada.

— Foi um gesto político de Dilma. Completaremos o serviço que ela não fez. Vamos garantir porque (o benefício) está defasado com a alta da inflação, que é acima da média no caso dos produtos que são consumidos com o recurso do Bolsa Família — afirmou Terra.

No MEC, as reavaliações começaram ainda na sexta-feira, primeiro dia de Mendonça Filho à frente da pasta. Ele determinou à Consultoria Jurídica do órgão uma devassa nos atos recentes da gestão anterior. A suspeita é que deliberações tenham sido apressadas de forma indevida.

Um dos atos que poderão ser anulados é o decreto presidencial de 10 de maio que nomeou 12 conselheiros no Conselho Nacional de Educação, que tem 24 membros no total. A troca de cadeiras estava marcada apenas para 3 de julho. Foi antecipada sob o argumento de que havia risco de descontinuidade dos trabalhos.

Para Mendonça, é preciso avaliar se a real intenção não foi assegurar assentos para pessoas ligadas aos petistas no conselho, que tem um poder de interferência grande na política do MEC. Cabe ao colegiado referendar diversas políticas a serem adotadas na Educação.

A Consultoria Jurídica está recuperando decretos anteriores para verificar se é praxe antecipar em quase dois meses a troca de conselheiros. Dos 12 nomeados antes do final do mandato, cinco foram reconduzidos, e sete são novos.

Outro ato na mira da nova gestão é uma portaria que mudou regras para aquisição e distribuição de materiais digitais a escolas de educação básica. Por envolver recursos expressivos, as alterações serão analisadas com cuidado e podem ser revogadas. Paira sobre os colaboradores de Mendonça a sensação de que a gestão petista deixou diversas “cascas de banana” em forma de decretos, portarias e resoluções publicados nos últimos dias.

Ontem, Mendonça gravou um vídeo para desmentir boatos que circulam na internet sobre cortes de programas como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Universidade para Todos (ProUni). O ministro vem afirmando que preservará iniciativas importantes da pasta e que, neste momento, nenhum corte está sendo considerado. Na sexta-feira, ele também teve que divulgar nota de esclarecimento sobre mensagens nas redes sociais atribuindo ao novo governo a suspensão de bolsas de assistência universitária, que havia sido efetivada três dias antes.

Mudança no INEP
A nova presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep) será Maria Inês Fini, doutora em Educação e com passagem pelo órgão durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Ligada ao PSDB, ela também foi colaboradora do governo José Serra em São Paulo.

Ela comandou projetos de reestruturação curricular e avaliação. No Inep, trabalhou na criação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que nasceu como teste para medir o conhecimento antes de se transformar em vestibular unificado.

Maria Inês foi indicada por Maria Helena Guimarães de Castro, nova secretária-executiva do MEC. As duas lecionaram na Universidade Estadual de Campinas e trabalharam juntas no Inep, onde Maria Helena era presidente. Luiz Roberto Curi, empossado recentemente na presidência do Inep, recebeu pela imprensa a notícia de que sua sucessora fora escolhida.

A montagem da equipe deve ser concluída esta semana. Alguns nomes cotados para a Secretaria de Educação Superior (Sesu) do MEC são de dois ex-reitores da Universidade Federal Rural de Pernambuco: Emídio Cantídio, que já foi diretor de Programas e Bolsas da Capes, e Valmar Correia. Para a Secretaria de Educação Básica (SEB), um forte candidato é Eduardo Deschamps, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed). A Capes poderá ser comandada por Abílio Baeta, que já foi secretário do MEC no governo FH.

Maria Helena deixou ontem a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), ligada ao governo Geraldo Alckmin, para auxiliar Mendonça Filho na definição dos nomes.

Proposta para a Previdência deve sair em 1 mês

Proposta de reforma da Previdência sai em junho

• Após encontro com Temer, centrais falam em se unir contra projeto que mexa com trabalhadores da ativa

Geralda Doca, Catarina Alencastro, Eduardo Barretto - O Globo

-BRASÍLIA- O governo do presidente interino Michel Temer decidiu ontem criar um grupo de trabalho com representantes das centrais sindicais para discutir as principais resistências à reforma da Previdência. Em reunião com as centrais no Planalto, foi sugerida a apresentação de uma proposta em até 30 dias. Auxiliares de Temer, no entanto, garantem que, independentemente de haver consenso, dois projetos serão enviados até o dia 18 de junho ao Congresso: para a Previdência e para a área trabalhista.

O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força Sindical, saiu da reunião dizendo que não aceita negociar uma reforma previdenciária que atinja os trabalhadores que estão na ativa. Ele defende que qualquer mudança valha apenas para os que ainda não ingressaram no mercado de trabalho, o que só começaria a funcionar por volta de 2050.

Paulinho disse que, caso o governo Temer insista em enviar para o Congresso uma medida diferente, se juntará à Central Única dos Trabalhadores (CUT), ligada ao PT, e à Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) para tentar barrar o projeto. As duas centrais recusaram o convite de Temer para participar do encontro de ontem, alegando que o governo interino é “golpista”.

Segundo Antonio Neto, presidente das Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Temer garantiu que os direitos de quem já está trabalhando serão mantidos. Para Neto, o governo precisará convencer as centrais sobre a reforma.

— O presidente repete aquilo que foi o discurso dele. Ele não mexerá naquilo que são direitos garantidos dos trabalhadores. Toda vez que troca de governo, a primeira coisa que vem é “vamos discutir a reforma da Previdência, vamos discutir a reforma trabalhista”. Chegou a hora de a gente dar um basta nisso definitivamente — disse, emendando:

— Eles tentarão nos convencer e nós vamos tentar convencê-los.

Serra pede estudo DE custo de embaixadas na África e no Caribe

Patrícia Campos Mello, Johanna Nublat – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O novo ministro das Relações Exteriores, José Serra, encomendou um estudo para analisar o custo e a utilidade dos postos diplomáticos abertos nos governos Lula (2003-2010) e Dilma Rousseff para, eventualmente, pedir o fechamento de alguns deles.

O estudo será elaborado pelo próprio Itamaraty. O alvo são embaixadas e consulados abertos na África e no Caribe nos últimos anos.

O Itamaraty sofreu com sucessivos cortes e contingenciamento de gastos nos últimos anos. A participação do orçamento do Itamaraty no total do Executivo, que já era pequena, caiu a quase a um quarto em 2015 em relação a 2003 —de 0,5% para 0,13%.

Trata-se da segunda medida do chanceler Serra que diverge da política externa dos governos petistas.

Na semana passada, o Itamaraty emitiu duas notas rechaçando o que chamou de "falsidades" propagadas por Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua, que haviam questionado a legalidade do afastamento da presidente Dilma Rousseff. Os países bolivarianos eram aliados da administração petista.

A abertura de embaixadas e postos em países pobres, principalmente da África e Caribe, foi marca da do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que abriu 17 embaixadas e fez inúmeras viagens a países africanos.

Não é certo que o estudo vá resultar em fechamento de postos. Fechar embaixadas gera grandes despesas por causa de ações trabalhistas de funcionários e rompimentos de contratos. Haverá avaliação do custo-benefício.

Simbólico
Diplomatas argumentam que fechar alguns postos menores seria algo cosmético.

Uma embaixada pequena na África custa entre US$ 200 mil e US$ 250 mil por ano (R$ 700 mil e R$ 875 mil), segundo fontes na área, incluindo pagamento de funcionários locais, alugueis, carros e custeio do posto.

Já uma embaixada como a de Lisboa —crucial, e onde o custo de vida é menor que o de outras capitais europeias— não custa menos de US$ 4 milhões, sem incluir o pagamento de funcionários locais.

"Um governo que quer investir pesado em comércio no exterior precisa pensar duas vezes antes de fechar suas embaixadas na África, um dos lugares mais dinâmicos da economia internacional", diz Matias Spektor, colunista daFolha e professor de Relações Internacionais da FGV.

Mas o fechamento de postos considerados menos relevantes seria uma sinalização de mudança de rumo na política externa.

O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que preside a Comissão de Relações Exteriores do Senado, afirma que a comissão vai se debruçar, neste ano, sobre a estrutura do Itamaraty. "Vamos avaliar em que medida a estrutura e os recursos do ministério são suficientes para suas necessidades."

O senador diz que não há unanimidade sobre a política de abertura acelerada de embaixadas brasileiras no exterior, que ocorreu sob Lula, e ressalva que há custo político em fechar um posto —o país, que possivelmente também abriu uma embaixada no Brasil, pode ver na medida um esfriamento de laços.

Ferreira diz que é preciso aguardar a manifestação de Serra sobre o tema, mas avalia que a real mudança na política externa passa por assuntos como a reformulação do Mercosul, permitindo, por exemplo, que cada país-membro firme acordos comerciais independentes.

O deputado Pedro Vilela (PSDB-AL), presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, avalia que, antes de fechar postos, seria preciso verificar o impacto financeiro e político da medida. "É preciso ter calma e nunca ir para os extremos."

Diplomata substitui Marco Aurélio Garcia como assessor da Presidência

Patrícia Campos Mello – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O diplomata Fred Arruda será o novo assessor internacional da Presidência da República, em substituição a Marco Aurélio Garcia. Mas a função de assessor internacional terá menos peso na gestão Temer.

Nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, havia dois polos de formulação de política externa: o Itamaraty e o Planalto, com Marco Aurélio Garcia.

Agora, a assessoria internacional terá papel meramente consultivo e toda a formulação ficará com o chanceler José Serra.

O embaixador Claudio Frederico de Matos Arruda, conhecido como Fred Arruda, está atualmente à frente da Representação Permanente do Brasil junto aos Organismos Internacionais sediados em Londres, que lida com órgãos como a Organização Internacional do Café, a Organização Marítima Internacional e a Comissão Baleeira Internacional.

Arruda, 58, trabalhou como assessor diplomático de Temer de 2010 a 2014.

É do circulo próximo do presidente interino e participava de viagens, ao lado do consultor Gaudêncio Torquato e do advogado José Yunes, assessor especial de Temer.

Arruda é considerado extremamente leal por observadores e dava subsídios a Temer sobre todos os temas internacionais.

Outro diplomata que trabalhava como assessor de Temer na vice-presidência, Pompeu Andreucci, será o chefe do cerimonial.

O atual secretário-geral do Itamaraty, Sergio Danese, vai se manter no cargo, assim como a maioria dos diplomatas do gabinete, pelo menos em um primeiro momento.

Serra estuda fundir e fechar embaixadas

O ministro das Relações Exteriores, José Serra, encomendou um levantamento detalhado sobre os atuais custos de operação e do possível fechamento de representações brasileiras abertas no exterior durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A ideia é fechar ou fundir postos, principalmente na África e no Caribe.

Serra estuda fechamento de embaixadas

Por Daniel Rittner – Valor Econômico

BRASÍLIA - O ministro das Relações Exteriores, José Serra, encomendou à sua equipe um levantamento detalhado sobre os atuais custos de operação e do eventual fechamento das representações brasileiras abertas no exterior durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A ideia é fechar ou fundir postos, principalmente na África e no Caribe.

De olho em uma redução de despesas, Serra demonstrou interesse em fazer um corte imediato na rede de embaixadas e consulados. A situação orçamentária do Itamaraty é vista internamente como "dramática". O auxílio-moradia de diplomatas lotados em outros países está indo para o terceiro mês seguido de atraso e algumas contas para manutenção das representações enfrentam quatro meses de inadimplência.

O novo chanceler foi convencido por seus auxiliares de que o fechamento ou fusão de postos geraria, no curtíssimo prazo, mais gastos do que economia. São despesas com rescisões de contratos de imóveis e prestação de serviços, indenizações trabalhistas, remoção de diplomatas. Sem falar no custo político das relações com os países que forem alvo dos cortes, que o ministro está disposto a bancar.

Diante do alerta, Serra adotou uma postura mais cautelosa e pediu o levantamento, mas o Itamaraty dá como bastante provável que parte das representações inauguradas na década passada será eliminada. Os consulados, normalmente voltados ao atendimento de cidadãos brasileiros no exterior, estão mais na mira do que as embaixadas propriamente ditas - estas responsáveis pelo relacionamento direto com os governos estrangeiros.

No governo Lula, o ex-chanceler Celso Amorim concebeu uma política de rápida expansão diplomática do Brasil, que envolveu a abertura de 67 representações entre 2003 e 2010. Entre elas estão consulados-gerais em cidades como Mendoza (Argentina), Iquitos (Peru), Atlanta (Estados Unidos) e Vancouver (Canadá). A abertura de embaixadas incluiu capitais como Iaundê (Camarões), Nouakchott (Mauritânia), Basse-Terre (São Cristóvão e Névis) e Kingstown (São Vicente e Granadinas).

Hoje a rede brasileira chega a 227 postos diplomáticas, uma das sete mais amplas do mundo, muito acima dos Brics e da esmagadora maioria dos países emergentes. O Brasil, por exemplo, é o único latino-americano - além de Cuba - a manter uma embaixada na Coreia do Norte.

A construção dessa rede ocorreu em meio aos esforços da dupla Lula-Amorim para angariar apoio na campanha brasileira para uma reforma do conselho de segurança das Nações Unidas.

O Brasil não conseguiu um assento permanente no conselho, como desejava, mas foi bem sucedido em duas campanhas internacionais. José Graziano e Roberto Azevêdo só foram eleitos para os comandos da FAO (agência das Nações Unidas para agricultura e alimentação) e da Organização Mundial do Comércio (OMC), respectivamente, graças aos votos de países do mundo emergente.

Especialistas são prudentes, no entanto, ao avaliar a conveniência de fechar ou fundir os postos abertos. Para Matias Spektor, coordenador do centro de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o debate está partidarizado. "Muita gente agora quer fechar embaixadas para fazer o oposto daquilo que o PT fez no governo Lula", afirma Spektor. "Antes de fechar um posto, é necessário ter clareza sobre seu custo. Uma embaixada brasileira média na Europa custa mais aos cofres públicos do que várias embaixadas grandes na África."

As representações no continente africano chamam a atenção do especialista por causa do potencial de crescimento das exportações brasileiras. Segundo ele, a demanda é grande por produtos que o Brasil oferece, como cerveja, gasolina, etanol, aço, carnes processadas, caminhões e ônibus, telefonia celular, aviões e serviços financeiros. "É o continente da transformação social acelerada. São centenas de milhões de novos consumidores entrando no mercado a cada ano. Se este governo quer mesmo dar ênfase ao comércio exterior, então precisa pensar duas vezes antes de sair de lá. O resto do mundo está entrando", diz Spektor.

Embora já esteja despachando no Itamaraty, Serra marcou para amanhã uma cerimônia de transmissão de cargo, quando receberá simbolicamente a chefia do ministério do ex-chanceler Mauro Vieira. Ele manteve toda a equipe anterior, mas tem se aconselhado quase diariamente com o embaixador Sérgio Amaral. Aposentado, ele não pode mais assumir cargos da carreira diplomática e descarta presidir a Agência Brasileira de Promoção das Exportações (Apex), que migrou para a estrutura do Itamaraty. Amaral foi porta-voz e ministro do Desenvolvimento no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Serra já planeja sua primeira viagem oficial ao exterior e pretende que seja para Buenos Aires. Ele se reunirá com a ministra de Relações Exteriores da Argentina, Susana Malcorra, e poderia até ser recebido pelo presidente Mauricio Macri - o que ajudaria o governo interino no combate à acusação de "golpe" feita por países do chamado "eixo bolivariano".

A situação orçamentária do Itamaraty é vista internamente como "dramática". O auxílio-moradia de diplomatas lotados em outros países está indo para o terceiro mês consecutivo de atraso e algumas contas para manutenção das representações enfrentam quatro meses de inadimplência

PT planeja limitar aliança nos municípios

• Partido, que realiza hoje reunião do Diretório Nacional, quer promover ‘volta às origens’

Vera Rosa, Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Depois do afastamento da presidente Dilma Rousseff, o PT quer promover uma espécie de “volta às origens” e limitar as alianças nas disputas municipais a partidos do campo de esquerda ou que sejam contrários ao governo comandado por Michel Temer. A orientação para que o PT não se una ao PMDB de Temer nas eleições de outubro deve ser aprovada hoje, em reunião do Diretório Nacional petista, a primeira após o impeachment de Dilma.

O assunto chegou a ser tratado ontem em encontro da Executiva, mas houve dúvidas sobre a viabilidade da medida, uma vez que a maioria dos partidos da base aliada do governo Dilma no Congresso votou a favor do impeachment. Para que o PT não fique isolado nas próximas eleições, porém, a tendência é que os pedidos de coligação sejam examinados “caso a caso”.

Dirigentes do PT observaram, na reunião de ontem, que a sigla também precisa fazer um balanço de seus erros, e não apenas bater na tecla do “golpe”, se quiser enfrentar a crise e sair do “abismo”. A maioria dos participantes do encontro, no entanto, avaliou que “não é hora de fazer isso”.

Mesmo assim, a resolução política a ser aprovada hoje pelo Diretório Nacional deve listar como erros o fato de o partido ter demorado a perceber o que chama de “conspiração” do PMDB e o fechamento de alianças apenas para vencer as eleições, sem dar prioridade para os programas. Além disso, o PT faz uma autocrítica por não ter insistido para que Dilma encaminhasse o projeto de regulamentação da mídia.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não comparecerá ao encontro da cúpula petista. Abatido, ainda está consultando aliados sobre o tom da oposição a Temer.

Em conversas reservadas, o ex-presidente tem dito que o PT precisa pôr nomes de mais peso político na direção, como os dos ex-ministros Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) e Jaques Wagner (Gabinete da Presidência). Lula também defende um Encontro Extraordinário do PT, em novembro, para definir a nova fisionomia do partido, que, nas palavras de muitos dirigentes, precisa se “reinventar”.

Rumo. A proposta de antecipação das eleições presidenciais foi descartada ontem pelo comando petista, pois não há acordo para empunhá-la como bandeira, nesse momento. Dividido, o PT ainda está à procura de um rumo a seguir, além do grito de guerra “Fora Temer”.

“Mal começou e o governo usurpador confirma o que já prevíamos. Em sua primeira entrevista (…), o presidente interino anuncia a disposição de avançar em privatizações, em rever políticas sociais e de reforma agrária, bem como de acabar com o multilateralismo da política externa brasileira, retornando à dependência dos Estados Unidos”, escreveu o presidente do PT, Rui Falcão, em artigo publicado no site do partido. “Num ministério sem mulheres e negros, com vários ministros investigados por corrupção, a revogação de direitos não se resume à reforma da Previdência, com fixação de idade mínima.”

O ex-ministro da Previdência Social Miguel Rossetto chamou Temer de “impostor” e disse que o Diretório Nacional do PT vai discutir uma política de alianças para as eleições municipais centrada na “denúncia do golpe” contra Dilma. Rossetto afirmou, ainda, que serão intensificas mobilizações contra o novo governo.

“Vamos fazer ações com PC do B, PT, PSOL, Frente Brasil Popular, grandes mobilizações de posicionamento claro frente ao governo ilegítimo. Temer é um impostor”, disse Rossetto. “Estamos nos preparando para as eleições municipais e nossa política de alianças será ‘não ao golpe e em defesa dos direitos’”, afirmou o ex-ministro, que classificou a intenção de Temer de mudar as regras para aposentadoria como “inaceitável e cruel”.

Embora até Lula considere remota a chance de Dilma retornar ao Palácio do Planalto, após um afastamento de até 180 dias, o PT decidiu fazer forte oposição ao governo Temer. Na Câmara, por exemplo, deputados do PT afirmam que vão obstruir a votação de projetos de lei enviados pelo presidente em exercício, mesmo que o partido tenha defendido a ideia no passado, como é o caso da proposta de recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

PT deve manter alianças com PMDB nas eleições

Por Cristiane Agostine e Raphael Di Cunto – Valor Econômico

SÃO PAULO e BRASÍLIA - Desgastado com o processo de impeachment de Dilma Rousseff, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva cancelou sua participação na primeira reunião do diretório nacional do PT depois do afastamento da presidente eleita. No encontro desta terça-feira, o partido deve definir a manutenção de alianças com o PMDB nas eleições deste ano, mesmo depois da articulação de Michel Temer para assumir a Presidência da República. A legenda recomendará prioridade a siglas que apoiaram Dilma como PCdoB e PSOL, mas não deve proibir apoio aos pemedebistas.

Na resolução que deve ser aprovada hoje com as regras para as próximas eleições, o PT deve afirmar que os acordos com o PMDB serão tratados localmente e que em municípios maiores, com mais de 100 mil eleitores, o comando partidário examinará as alianças - que não deverão ser vetadas. Entre as capitais, a única que deve ter acordo entre PT e PMDB é Aracaju. Em 2012, os dois partidos disputaram juntos em oito capitais.

Dentro do partido há grupos como o do diretório do Rio Grande do Sul que defendem a proibição de alianças com o PMDB e com outros partidos que votaram pelo impeachment de Dilma, como PP, PR e PSD. A legenda já veta alianças com o antigo bloco de oposição - PSDB, DEM e PPS. No entanto, já com a perspectiva de que o partido sairá enfraquecido destas eleições, o comando do PT evitará regras que possam dificultar ainda mais a vitória de petistas neste ano.

A sigla já viveu uma debandada de prefeitos por causa da má avaliação do governo federal e do PT, por assédio de governadores e casos de corrupção. Com um círculo restrito de alianças, petistas teriam menos estrutura para concorrer.

Ontem o PT começou a debater o assunto em reunião da Executiva, em Brasília. No encontro, dirigentes voltaram a descartar a convocação de nova eleição presidencial este ano e analisaram o tom do discurso de oposição que farão.

O presidente do PT, Rui Falcão, publicou um texto que deve nortear os discursos dos petistas. Para o dirigente, o governo Temer é "usurpador", tem caráter repressivo, neoliberal e deve cortar os avanços sociais conquistados nos últimos anos. Falcão disse ainda que o partido deve combinar uma oposição firme com a pressão para convencer os senadores a votarem contra o exame de mérito do impeachment de Dilma no Senado. "O PT continuará alinhado com os partidos, frentes e movimentos do "Não ao Golpe. Fora Temer!".

O relato da História - Zander Navarro*

- O Estado de S. Paulo

Quando finalmente deixarmos o extraordinário tempo coberto pelos 13 anos petistas, as perguntas logo se apresentarão: como a História e seus escrevinhadores interpretarão esses anos? O que concluirão adiante aqueles que examinarem com rigor um período que ainda nos sobressalta, sobretudo pela abissal ruína que é o seu legado? À frente, que papel os estudiosos reservarão ao migrante expulso pela miséria do Nordeste rural, depois um líder sindical tornado presidente? Como uma economista sem nenhum brilho, imposta como candidata e destinada a ser a marionete do patrão do partido, depois destronada com humilhação, será avaliada como a primeira mulher no Planalto? Por que tantos intelectuais, artistas e cientistas foram enfeitiçados sem resistência e conduzidos ao abismo da magia petista, sendo tão facilmente aprisionados nas sombras e aparências, abandonando o pensamento crítico e se subordinando à ardilosa narrativa partidária?

Ainda mais desafiador será entender como uma força política que se construiu robusta e, em certo momento, a mais poderosa da Nação optou por seguir a via do suicídio político. Escolha ainda mais incompreensível em face da quase inexistência de um contrapeso oposicionista, já que a erosão petista ocorreu, sobretudo, pela interminável sucessão de seus próprios erros.

Vitimada por cupidez avassaladora, soberba e deslumbramento, a chegada ao poder descartou abruptamente o árduo aprendizado acumulado em muitos anos, como as experiências participativas e a valorização da democracia e do debate, assim como a ousadia das lutas que confrontaram a desigualdade e o conservadorismo que marcam a nossa vida social. Como esse denso conhecimento anterior foi esquecido de súbito, em nome do autoritário objetivo de eternizar-se no poder?

As perguntas são quase infinitas e em tantos campos de análise que o período vindouro produzirá, por certo, uma vastíssima bibliografia, a qual oferecerá uma leitura apropriada sobre os três mandatos e meio da aventura petista no Executivo. Será literatura que tudo discutirá, dos detalhes ainda desconhecidos aos métodos de poder, da ideologia aos termos que fantasiaram e camuflaram os vícios humanos, inclusive o primado da mentira como a arma principal que anestesiou durante anos a maioria dos brasileiros. Com o benefício do tempo, surgirão igualmente as explicações para iluminar a operação mais espantosa, o alçar da corrupção como o conduto favorito da forma petista de governar.

Entre as inúmeras consequências da interrupção do ciclo petista, uma delas representará forte perda, talvez até comprometendo o futuro do País. Refiro-me ao pensamento e à parte da ação social que usualmente intitulamos de progressista, uma orientação voltada para o futuro e, portanto, inclinada à mudança social. É a disposição dos cidadãos para se abrirem ao debate, ouvirem argumentações diferentes ou contrárias e aceitarem inovações que impulsionam a sociedade, modernizando-a.

Como as tradições políticas da esquerda têm na mudança o seu eixo fundante, quase sempre o senso comum associa a identidade progressista de um povo à presença mais saliente dessas tradições políticas. Mas nem sempre é assim, pois não é um paradoxo sociológico que sociedades tradicionais sustentem dimensões progressistas e se transformem, ainda que sob o controle ou de suas classes dirigentes ou de alguma contenção cultural. Portanto, a presença ostensiva da esquerda, de um lado, não necessariamente afirma uma vontade pública progressista, que transforma positivamente uma dada sociedade; nem, de outro, a sua inexistência indicaria uma correlação direta com a estagnação social. No caso brasileiro, é impacto que irá entranhar-se silenciosamente e somente emergirá com nitidez gradualmente, mudando os comportamentos, o poder coletivo e a qualidade do protagonismo dos cidadãos.

Quando o PT atribuiu a si próprio a designação de “esquerda” e, por isso, no imaginário coletivo monopolizou a faceta da mudança que potencialmente beneficiaria as maiorias, seu caminho político se tornou definido, mas também mais estreito. Se abandonasse a promoção das mudanças, das reformas às políticas sociais, do discurso a favor dos despossuídos ao aprofundamento democrático, da correção ética à luta tenaz contra a corrupção, incorreria em riscos políticos fatais, pois sua persona pública se tornaria irreconhecível.

Causa pasmo a todos os que se esforçam para entender essa quadra da vida nacional a decisão dos dirigentes petistas de liquidar o gigantesco capital político amealhado nas últimas décadas. O surgimento de um partido à esquerda que conquistou o espaço de progressismo antes mantido sob as asas do antigo “partidão” e, adicionalmente, foi capaz de mobilizar milhares de brasileiros ao longo dos anos será sempre um feito notável em nossa biografia política.

Desprezar aquela vitoriosa trajetória, contudo, sendo tão facilmente atraído pelas delícias do poder e do dinheiro, curvando-se a qualquer preço para usufruí-las sem pudor, assim enterrando o passado e suas impressionantes conquistas, talvez cause surpresa ainda maior. Por isso, nos anos vindouros, experimentaremos as agruras e os limites de uma sociedade agora mais conservadora e refratária à mudança, ante a inevitável marginalização de suas dimensões progressistas.

A espetacular e quase inacreditável derrocada do campo petista reduz fortemente o sonho de concretizar uma sociedade mais justa no Brasil, pois nenhuma sociedade democrática se afirmará jamais sem pujantes forças políticas opositoras e progressistas que animem o dissenso. No poder, o PT ignorou seu passado e se apequenou. Quem sabe na oposição se reconstitua eticamente e exerça o papel para o qual fora formado.
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*Zander Navarro é sociólogo e pesquisador em Ciências Sociais

Seguir ‘o livrinho’ - Merval Pereira

- O Globo

Começam as reações à campanha petista de difamação. O governo Temer parece andar em ritmos diferentes, mais harmônico na equipe econômica, claramente comandada por Henrique Meirelles e com coerência de objetivos, confuso nos demais setores, onde se destaca no primeiro momento a figura virtuosamente híbrida de José Serra no Itamaraty, que pode atuar bem em setores que não sejam puramente econômicos.

A qualidade diferenciada de Serra, que já havia se mostrado nos poucos meses em que atuou como senador por São Paulo, sobressaiu nos primeiros dias do novo governo com o enfrentamento sereno, porém vigoroso, do movimento político dos países bolivarianos que tentam, no plano internacional, viabilizar o que os petistas vendem como narrativa real, mas não passa de luta política rasteira.

A ideia de que estamos vivendo um quadro de ruptura institucional só pode ser aceita por ignorância ou má-fé. E acreditar que a presidente afastada Dilma Rousseff nada tem a ver com o escandaloso esquema de corrupção que destruiu a máquina pública, a partir da Petrobras, só pode ser explicado por interesses particulares de corporações ou pessoais.

Todas as acusações contra Dilma que estão surgindo nas delações da Lava-Jato, de financiamentos ilegais de campanha até envolvimento pessoal em ações de obstrução de Justiça, e que podem chegar à comprovação de sua culpa pela compra da refinaria de Pasadena, só não puderam entrar no processo de impeachment graças a uma interpretação restrita e politicamente benéfica a presidente reeleito, que impede que crimes cometidos anteriormente, mas no exercício da Presidência, sejam cobrados no novo mandato.

Legislação aprovada sem que houvesse reeleição é interpretada literalmente, dando assim ao reeleito carta branca para abusar de todo seu poder em benefício próprio no ano eleitoral, como no ano de 2014.

O rombo nas contas nada mais é do que consequência do uso indevido do recurso público justamente no ano da reeleição, último do 1º mandato. Um descuido fez com que pedaladas e abusos orçamentários, embora mais contidos, continuassem em 2015, permitindo que o processo de impeachment pudesse ser aberto.

Mas quem se arvora a analisar a situação do país para criticar as medidas tomadas, como recente editorial do “New York Times”, precisa conhecer os detalhes legais e políticos em que os fatos se dão para não tirar conclusão equivocada. Ninguém está dando castigo excessivo a uma mulher honesta, está-se só usando a legislação possível para corrigir situação insustentável.

É o mesmo que dizer que a condenação de Al Capone por fraudes nos impostos foi castigo pesado demais para um cidadão comum, sem levar em conta seu passado de crimes. O fato de Eduardo Cunha ser quem é, ou de o Ministério Temer ter investigados, ou o Congresso ter centenas de acusados de crimes diversos, sem dúvida é lamentável, mas não pode ser justificativa para perdoar os malfeitos de Dilma.

Hoje, na entrega do prêmio Person of the Year em Nova York, o expresidente do Banco Central Armínio Fraga tocará nessa questão controversa. A certa altura afirmará: “Afortunadamente para o Brasil algumas das instituições básicas, como Judiciário, promotores públicos, Polícia Federal, e a imprensa livre, estão fazendo sua parte. À luz de ampla evidência de malfeitos, a presidente está agora sendo submetida a julgamento de impeachment de acordo com o devido processo legal, e com a Constituição”.

É o começo de reação à campanha de difamação petista. O senador Magno Malta, que hoje pode ser rejeitado pelos petistas, mas já foi aliado importante, falando sobre a corrupção no PT deu exemplo claro: podemos perdoar os traficantes porque eles ajudam as famílias carentes das comunidades, pagam os enterros, às vezes até mesmo de quem mandaram assassinar?

Os 300 picaretas um dia identificados por Lula no Congresso passaram a ser cúmplices dos esquemas de corrupção montados pelo PT, e depois se voltaram contra ele, por vingança ou outro motivo, o que não retira dos fatos ocorridos seu teor ilegal e criminoso.

Se este mesmo Congresso, ao fim do julgamento, por motivos políticos vis ou virtuosos, em revolta contra Temer, absolverem Dilma e a levarem de volta à Presidência, se transformarão em homens de bem? Voltarão a fazer parte do governo petista, como sempre fizeram?

Que é preciso realizar reforma política que reduza a chance de picaretas e bandidos encontrarem no foro privilegiado proteção a bandidagens, não há dúvida. Mas, enquanto não se torna realidade o desejo, seguir “o livrinho” (a Constituição) é o melhor caminho.

De volta aos eixos - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

A chegada de Michel Temer à Presidência ainda vai sofrer muitos solavancos, sobretudo nesses 180 dias de interinidade. Apesar disso, a expectativa é de que as coisas comecem a entrar nos seus próprios eixos. A oposição será oposição, os movimentos sociais voltarão a ser críticos, os governistas votarão com o governo. Natural assim, óbvio assim, mas não vinha sendo nem tão natural nem tão óbvio nos últimos 13 anos.

Já imaginaram que fantástico? A CUT vai descobrir do nada, subitamente, que há mais de 11 milhões de desempregados na rua da amargura, precisando de apoio, de protestos e de uma gritaria infernal. Contra o presidente interino Michel Temer, claro, que nem emplacou uma semana inteira no poder.

A dócil e governista UNE e as corporações fortemente petistas que habitam o Ministério da Educação, e ensinam a história ao seu jeito às crianças e adolescentes do País, vão dormir mudas e surdas num dia, como em todos os anos de Lula e Dilma, mas acordarão de repente estridentes e todas ouvidos para denunciar que a educação está o caos que está e que o Fies – ora, ora – desviou uma dinheirama pública para escolas privadas. Culpa do Temer?

O MST, tão passivo diante da não reforma agrária de Dilma, ficará ativíssimo contra a mesma não reforma agrária de Temer. E vai correr para cavar, plantar e semear crises no campo, invasões de propriedades produtivas e interrupção das estradas por onde escoa a produção brasileira interestadual e para o exterior.

O MTST, mais recente no cenário nacional e na órbita petista, também vai descobrir todas as mazelas nacionais da noite para o dia: a recessão, a indústria no buraco, a quebradeira de lojas e restaurantes, a falta de investimentos urbanos. Certamente, por incompetência desse tal de Temer...

Governadores condescendentes com Dilma mostrarão as garras para reclamar da falência em cadeia dos Estados. Até aqui, responsabilizavam os antecessores, agora culparão o governo federal. Num estalar de dedos, descobrirão que o atraso dos salários, pensões e aposentadorias de gaúchos e cariocas, entre outros, é por causa de uma crise... nacional! Que Temer e Henrique Meirelles produziram desde quinta-feira!

A guinada é também dos neo governistas. Fiesp e Força Sindical, que tanto condenaram Dilma e defenderam Temer, estão na linha de frente contra reformas e CPMF. E vamos assistir ao PMDB, PP, PSDB, PSD, PTB, DEM, PPS e outros correndo para votar projetos que até semana passada se recusavam a aprovar para corrigir os erros de Dilma na economia. E por que mudaram? Ah, porque Dilma era uma coisa, Temer é outra coisa. Mas o País é o mesmo.

Esse País que está quebrado, com um rombo de mais de R$ 100 bilhões nas contas públicas, indo para o terceiro ano de recessão, com juros e inflação muito acima do razoável, milhões de pessoas sem salário e renda, zika, dengue, chikungunya e H1N1 fazendo uma festa e a Olimpíada atraindo olhares – e desconfiança – de todo mundo.

Se a questão ideológica prevalecer sobre a racionalidade e sobre a urgência de soluções, o Brasil vai continuar afundando e arrastando os mais pobres e desvalidos da rua da amargura para o poço do desespero. Jornalistas, artistas, juristas, economistas e políticos sempre dão um jeito nas crises, mas a tal “base da pirâmide” não pode esperar. É preciso um consenso nacional mínimo para as medidas mais emergentes, para as votações fundamentais, para o início da recuperação.

Foi para o vice Temer que a Constituição, pedra basilar da democracia, apontou depois da tragédia Dilma. Nova oposição, não se esqueça que quem pôs ele lá e dividiu alegremente o poder com o PMDB nesses 13 anos foram vocês. Agora, aguentem, para o bem do País.

P.S.: – Quem deve estar gostando é Fernando Henrique. Antes, tudo era “culpa do FHC”. Agora, a culpa toda é do Temer

Todo cuidado é pouco - Luiz Carlos Azedo

• As prioridades de Temer são um freio de arrumação na crise fiscal e a aprovação definitiva do impeachment. Qualquer erro na condução política pode ser fatal

- Correio Brazilinse

O governo provisório do presidente interino, Michel Temer, ainda está enrolando os paraquedas, sob intenso tiroteio inimigo. E para complicar ainda mais a situação, o que não falta é fogo amigo. Era uma situação previsível, porque não houve uma transição entre o governo que saiu e o que entrou para garantir certa continuidade administrativa, ainda que a situação seja de ruptura, salvo nas pastas onde a alta burocracia de carreira ainda tem alguma influência.

Antes de se despedir do cargo, Dilma Rousseff exonerou todos os ministros; os que assumiram ficaram à mercê da boa vontade dos subordinados, mesmo aqueles que foram ministros do governo afastado e se baldearam para o atual, na reta final da aprovação do pedido de impeachment. Além dessa situação administrativa, governo que entra está encontrando um terreno arrasado por um terremoto econômico e uma tempestade política.

Essa situação favorece os erros e agrava as consequências. Ainda mais porque alguns ministros estão assumindo o comando de suas pastas sem avaliar direito a situação real em que se encontram. O resultado são declarações polêmicas, que depois precisam ser desmentidas, e algumas disputas por esferas de influência, tanto no núcleo político quanto na equipe econômica. Por exemplo, Temer teve que desautorizar a proposta de seu ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, de mudança no processo de escolha do procurador-geral da República. E administra contradições internas na base do governo na Câmara.

A Justiça sempre foi uma pasta política. É meio inevitável seu titular se envolver em assuntos polêmicos, pois acaba sempre no meio do fogo cruzado das relações entre os poderes do Estado com a sociedade. Moraes cultiva a imagem do cara durão, que combinava com a função de secretário de Segurança Pública de São Paulo, mas não é o melhor figurino para um ministro da Justiça, ainda que a bandeira da Ordem esteja gravada no slogan do governo Temer. A outra é Progresso. A política nacional é mais complexa do que a paulista, cujas características, digamos, são de uma guerra de posições, na qual PSDB e PT se digladiam, sem outros grandes protagonistas. Moraes precisa levar em conta que as contingências do Brasil não são as de São Paulo. Ou toda hora Temer terá que corrigi-lo e socorrê-lo.

A fricção não fica por aí, tem coisa mais complicada ainda. O sucesso do governo Temer está nas mãos do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, cuja política econômica precisa ser blindada. Ocorre que o ministro assumiu e pôs na pauta assuntos polêmicos, como a mudança da idade mínima para aposentadoria e a criação de um imposto provisório para fechar as contas do governo. De imediato, as centrais sindicais reagiram, a começar pela Força Sindical, liderada pelo deputado Paulinho da Força, aliado incondicional do presidente da Câmara afastado, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e um dos artífices do impeachment de Dilma. Na outra ponta, o presidente da poderosa Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, outro aliado de Temer, também já disse não. A entidade é um bunker do impeachment na Avenida Paulista.

O barulho maior, porém, é na Cultura, ministério extinto, que seria anexado à Educação, onde se organizava um condomínio político comandado pelo ministro Mendonça Filho, do DEM, com a participação do PSDB, na secretaria executiva, e do PPS, na secretaria de Cultura.

Deu errado, porque os artistas e produtores culturais, atiçados pelo ex-ministro Juca Ferreira e pelo PT, se mobilizaram contra a extinção do MinC e bombardearam a proposta, que teve ampla rejeição no meio artístico. Pra completar, nenhuma mulher faz parte do primeiro escalão, o que levou Michel Temer a reconsiderar a anexação ao Ministério da Educação e criar uma secretaria diretamente ligada à Presidência, que seria entregue a uma mulher. Até ontem o assunto não estava resolvido; com a pasta acéfala, os petistas iniciaram pelo Rio de Janeiro e Belo Horizonte a ocupação dos prédios dos órgãos da Cultura. A pasta virou abacaxi.

Outra queda de braço, esta mais surda, está instalada na Câmara. A bancada mineira pleiteia a liderança do PMDB para o deputado Leonardo Quintão, mas o secretário de Governo, Geddel Vieira Lima, articula a eleição de Baleia Rossi (SP), homem de confiança de Temer e aliado de Eduardo Cunha, o presidente afastado da Câmara. Já na liderança do governo, a situação é mais complicada. Cunha articula a indicação do líder do PSC, André Moura (SE), peça importante na aprovação do pedido de impeachment, mas os partidos de oposição querem o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que contaria com apoio do grupo palaciano.

A vida do governo provisório não será nada fácil. As prioridades de Temer são um freio de arrumação na crise fiscal e a aprovação definitiva do impeachment. Em ambos os casos, qualquer erro na condução política pode ser fatal.

Início vacilante: cem horas de vai e vem - Raymundo Costa

• Protagonismo de PSDB e DEM ameaça unidade do governo

- Valor Econômico

A correria para a montagem do ministério ajuda a explicar o tumulto dos primeiros dias do PMDB no governo. Foi assim com Itamar Franco, depois do impeachment de Fernando Collor. Mas é pouco para justificar o vai e vem nas decisões do Palácio do Planalto, nessas pouco mais de 100 horas desde a posse do presidente interino Michel Temer, no fim da tarde da última sexta-feira.

Itamar precisou de três ministros da Fazenda antes de firmar o governo na área econômica. Mas além da "turma do pão de queijo", na copa e cozinha palaciana, demonstrou claramente o que queria ao nomear oito senadores para o ministério, a chamada "República do Senadores" - tirar Collor definitivamente. Bobagem dizer que Itamar nunca articulou a queda de Collor.

A plataforma do governo Temer é muito clara: a recuperação da credibilidade do governo e a votação das reformas que Dilma não conseguiu fazer, a fim de recuperar a confiança dos investidores e preparar a economia para a retomada do crescimento. Os primeiros movimentos, no entanto, são de um governo que parece não saber o que quer. Temer foi, voltou e depois foi de novo na proposta de redução de ministérios, por exemplo. Queria um governo de notáveis, mas teve de dobrar-se à evidência de que a oposição vai tratá-lo no Congresso como um presidente ilegítimo, sem concessões, e teve de recuar para fortalecer a base de apoio.

Houve outros episódios, menos (a indicação do ministro da Defesa) ou mais (a demora no anúncio do presidente do Banco Central) relevantes, de vai e volta. Mas o pior é o disse que disse sobre propostas fundamentais do novo governo, como a reforma da Previdência Social e a criação de novos impostos ou reedição da CPMF. O risco que corre o presidente interino é que prospere a fama de "governo vacilante" ou de "governo stop and go", definições já em curso na Câmara dos Deputados e no Senado. Entre aliados.

Talvez Temer devesse ter costurado uma agenda mínima com os 11 partidos que levou para o governo, com o compromisso de apoio; talvez falte no Palácio do Planalto alguém com mais experiência de governo para enquadrar o discurso da equipe. No Congresso, especialmente na Câmara dos Deputados, à deriva desde o afastamento de seu presidente, Eduardo Cunha, já é possível sentir o cheiro de queimado. As propostas de Temer devem ser votadas e aprovadas, até pelo motivo de que ninguém quer a volta de Dilma - a presidente explodiu as pontes que ainda tinha durante a discussão e votação da abertura do processo de impeachment no Senado. Mas há assuntos mal resolvidos.

No momento, o principal talvez seja o protagonismo que o PSDB e o DEM podem ter no novo governo.

Para bem acomodar tucanos e o Democratas, Temer sacrificou espaços reivindicado pelo "centrão", grupo com mais de 300 deputados que define as votações na Câmara. A presidente Dilma perdeu o "centrão" por conta dos privilégios ao PT - propunha a reforma da Previdência, por exemplo, e o partido se declarava contrário; Temer também pode perdê-lo se deixar que PSDB e DEM sejam como o PT da antiga base.

O Democratas tomou a frente das iniciativas para a declaração de vacância do cargo de presidente da Câmara, o que tem repercussão no "centrão", constituído por partidos que se mantêm fiéis a Eduardo Cunha. O deputado carioca vive uma situação singular - pode ser candidato a presidente da República, mas não pode presidir a Câmara. É uma espécie de "cassação branca". Já está no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação do PP, PSC e Solidariedade que pode levar a decisão do STF a ser submetida ao crivo do plenário da Câmara.

Se Temer indicar para líder do governo um nome do PMDB, não deve ter maiores problemas. A conversa muda quando se trata da designação de Rodrigo Maia (RJ), do Democratas. A disputa pela liderança é a expressão do litígio. O DEM ficou com o Ministério da Educação, o que já era considerado muito para uma bancada de apenas 29 deputados. O MEC mais a liderança, então, seria um exagero. As críticas ao partido na educação vão além, pois o DEM imprime uma face de direita difícil de acomodar com o setor. Não é por acaso a rebelião da área da cultura, dominada pela esquerda, que em princípio seria incorporada pelo MEC.

Havia uma candidata do DEM para a Educação, a deputada Professora Dorinha Rezende (TO). Educadora e mulher. Os partidos teriam representantes do sexo feminino para indicar a Temer, se tivessem sido demandados pela articulação política do governo. Simplesmente não se pensou nisso.

O DEM tem tradição na área das Minas e Energia. Tinha até um bom candidato, o deputado José Carlos Aleluia, bem aceito na área. Ficaria melhor lá que na Educação. Mas para o cargo fuciu com o PSB, partido sem tradição com o setor. O PMDB acabou repetindo um erro que condenava em Dilma: interferiu em assuntos internos de outra sigla, cujo diretório nacional havia decidido (22 x 8) não indicar ministros nem sancionar o nome de quem aceitasse convite em caráter pessoal.

O PSDB ficou com três ministérios, sendo que um deles, Cidades, em detrimento do PSD, que almejava ficar com a pasta. Causou mal estar entre aliados de Temer no PMDB e no "centrão" a declaração do líder tucano na Câmara, Antonio Imbassahy, segundo a qual o novo governo não pode contar com PSDB, se quiser aprovar a CPMF. Soou como o PT falando mal das reformas do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy -se os petistas, que em tese constituiam o alicerce da base do governo, votavam contra, por que os aliados seriam a favor?

Sem uma pauta mínima consensual entre os partidos, Temer pode ficar como Dilma Rousseff, que botou a CPMF no Orçamento da União, sem ter a menor chance de aprovar a volta do "imposto do cheque". Na prática, as dificuldades para a reedição da CPMF continuam praticamente as mesmas. Para os aliados, são compreensíveis as cautelas de Temer até o processo de impeachment ser concluído. Mas fazer um governo tendo PSDB e DEM como protagonista seria corroborar a tese do golpe.