terça-feira, 19 de abril de 2016

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

"Acho que hoje as instituições estão fortes. A Lava-Jato, como outras apurações, tem de ser feita. É preciso respeitar a lei, mesmo aqueles que vão presos eu acho que tem de haver respeito à lei, o juiz tem de julgar se é caso de habeas corpus, se for o caso deve dar. Eu acho que é fundamental manter muito firme a ideia de que nós temos um Estado Democrático de Direito.

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Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República. Entrevista no Valor Econômico

Senado e STF farão roteiro conjunto para impeachment

• Temer já prepara Ministério e busca nomes fortes para economia e área social

Processo contra Dilma é entregue a Renan Calheiros e será lido hoje por senadores; votação que decidirá destino da presidente está prevista para ocorrer dia 11 ou 12 de maio

Depois de aprovado na Câmara, o processo de impeachment da presidente Dilma chegou ontem ao Senado, que hoje fará a leitura do relatório. Os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e do STF, Ricardo Lewandowski, decidiram fazer um roteiro conjunto para o julgamento. O trabalho da comissão especial de senadores que analisará o caso deve começar na próxima segunda-feira, e a votação que poderá afastar Dilma está prevista para 11 ou 12 de maio. O vice-presidente Michel Temer, que assumirá a Presidência caso a petista seja afastada, já monta seu governo e discute nomes, principalmente, para as áreas econômica e social.

Roteiro conjunto

• Processo chega ao Senado, e Renan vai definir o seu rito junto com o presidente do STF

Cristiane Jungblut, Eduardo Bresciani, Carolina Brígido - O Globo

-BRASÍLIA- A batalha recomeça no Senado. Hoje, a Casa inicia a discussão de como analisará o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. O presidente do Senado, Renan Calheiros, lerá a decisão da Câmara em sessão, à tarde, como prevê o rito do impeachment. Renan acertou com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que o rito do processo será definido em parceria pelos dois Poderes. Eles se encontraram ontem. Se o processo for aberto pelo Senado, Lewandowski presidirá o processo de impeachment na Casa.

O presidente do STF garantiu que sua participação será apenas formal, para conduzir o caso, sem nenhuma pronúncia quanto ao mérito das acusações. É o mesmo rito de 1992. Nos bastidores, Renan queria que Lewandowski participasse apenas da fase final, da sessão de julgamento, que deve ocorrer em setembro. Pouco antes do encontro com o ministro, Renan havia se reunido com a presidente Dilma, a pedido dela.

— Aproveitei a oportunidade para dizer (a Dilma) da isenção, da neutralidade, do meu compromisso com processo legal. Do ponto de vista do Senado, vamos fazer tudo para que cheguemos a bom termo, sem nenhum trauma — disse o presidente do Senado.

Renan repetiu que não quer queimar etapas. A votação em plenário do parecer da comissão especial sobre a admissibilidade do processo deve ocorrer em 11 ou 12 maio, conforme o cronograma inicial de Renan. A Câmara aprovou no domingo a autorização para que o Senado abra o processo. O grupo do vice-presidente Michel Temer calcula que já há 48 votos favoráveis ao impeachment e ao afastamento de Dilma por 180 dias, até o julgamento final.

— No Senado, com certeza, não vai ter voto em função do que a família quer ou não. O julgamento vai ser de mérito, se há ou não há crime de responsabilidade — disse Renan, numa ironia aos votos de deputados homenageando a família, por exemplo.

Renan e Lewandowski acertaram ainda que, enquanto o rito não estiver pronto, os senadores já podem realizar a primeira etapa do impeachment na Casa, que é o juízo de admissibilidade do processo.

Apesar das pressões de aliados do vice-presidente Michel Temer para que Renan acelere o processo, o presidente do Senado sinalizou que só pretende votar na semana do dia 11 de maio a abertura do processo no plenário do Senado — que se aprovada leva ao imediato afastamento de Dilma. O presidente do Senado disse que não fará nada que permita ao PT judicializar o processo.

Ontem mesmo Renan fez sua primeira manobra para mostrar aos senadores e ainda ao vice-presidente Michel Temer que terá o controle do calendário do processo. Renan cedeu a um pedido do PT de prazo extra para indicação de nomes para a comissão especial, o que atrasará os trabalhos. Na prática, Renan tenta manobrar para que a comissão comece a trabalhar apenas na próxima segunda-feira. Aliado da presidente Dilma, ele quer definir quando Temer assumirá a cadeira caso Dilma seja afastada.

— É papel do Senado instaurar. Temos pessoas que pedem para agillizar o processo. Mas não poderemos agilizar o processo de tal forma que pareça atropelo ou delongar de tal forma que pareça procrastinação. Vou pedir presteza aos líderes na indicação dos nomes, mas não posso obrigar que eles façam isso com menos de 48 horas — disse Renan.

Numa contra-ofensiva, o presidente do PMDB e porta-voz de Michel Temer, senador Romero Jucá (RR), quer que o Senado trabalhe nesta sexta-feira e instale a comissão neste mesmo dia. A queda de braço dos prazos sobre a abertura do processo e o imediato afastamento de Dilma por 180 dias serão discutidos hoje, em reunião de Renan com os líderes dos partidos. Ontem, o próprio Jucá e o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), estiveram com Renan mas não chegaram a um acordo.

— O que vai se discutir nesta terça-feira (hoje) é se vamos trabalhar e instalar a comissão na sexta-feira, ou se vamos parar no meio dessa crise e só instalar na segunda-feira. O que não dá é o Senado parar de trabalhar nesse momento. Quem vai ditar o ritmo da comissão especial é o seu presidente e relator, não é o Renan ou a minoria do PT — rebateu Jucá.

Neste momento, a negociação é para indicar a senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS) como relatora e o senador Antônio Anastasia (PSDB-MG) como presidente da comissão, por ser tido como um parlamentar moderado. Os dois cargos são eleitos, ou seja, basta que haja acordo da maioria. Os partidos deverão indicar os 21 membros usando o critério da proporcionalidade.

— O PT já me queimou hoje. Mas ser relator não é pleito, é missão — disse Ana Amélia.
Do lado do PT e PCdoB, os senadores deixaram claro que não indicariam imediatamente os nomes, querendo as 48 horas de prazo.

— Interessa para gente ganhar tempo porque a impopularidade do Temer é cada vez maior e isso vai nos ajudar. E não aceitamos a Ana Amélia. Temos que ser juiz nesse caso e como o PP fechou questão ela não tem condição de relatar — disse Lindbergh Farias (PT-RJ).

O presidente do Senado recebeu ontem oficialmente a decisão da Câmara em encontro com o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O processo de 34 volumes e 12 mil páginas chegou ao Senado num carrinho.

Vice planeja superministérios da economia, infraestrutura e social

• Temer avalia que precisa dar uma resposta efetiva de que está comprometido com a recuperação política e econômica

Alberto Bombig - O Estado de S. Paulo

O vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), definiu três eixos principais para a formação de seu eventual governo: economia, infraestrutura e área social. A partir desse tripé, ele pretende criar três superministérios para enxugar o tamanho da Esplanada e impulsionar uma gestão de transição que tenha como prioridades a retomada do crescimento e a estabilidade política.

O vice avalia que precisa dar uma resposta convincente ao País de que está comprometido com a recuperação política e econômica. Ele também acha que a formação de um Ministério reconhecidamente técnico e respeitável seria a melhor forma de aliviar as pressões sobre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pela cassação da chapa que o elegeu junto com a presidente Dilma Rousseff em 2014.

Somente depois dessas definições o restante do governo seria definitivamente formado, caso Dilma seja afastada pelo Senado. Essas três áreas trabalhariam sustentadas politicamente pelo núcleo mais próximo de Temer no PMDB e encarregado das relações com o Congresso, formado pelos ex-ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco, ambos do partido do vice.

O senador, ex-governador, ex-prefeito e ex-ministro José Serra (PSDB-SP) é cotado para comandar esse futuro ministério da infraestrutura, mas também é lembrado para a Fazenda. No modelo estudado pela equipe do vice, essa nova pasta poderia abrigar até o Ministério das Comunicações.

O tucano José Serra também poderia ocupar a Saúde, pasta que comandou no governo Fernando Henrique Cardoso, e o Itamaraty. Esta última alternativa agrada a Serra pessoalmente, mas esbarra nas pretensões políticas dele de ser candidato em 2018. Caso Serra assuma o controle da infraestrutura, o médico David Uip, secretário da Saúde de São Paulo, poderia ser chamado a contribuir com o governo federal, na cota de indicações do governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Agenda. Temer quer definir uma agenda econômica, algo que ele ainda não tem, para entregá-la a um ministro da Fazenda com forte influência sobre o Banco Central e o Planejamento. A ideia é buscar coesão na política econômica.

O economista e ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga ainda continua como um nome forte, mas, por ser ligado ao PSDB, gostaria de levar com ele, se aceitar o convite, outros nomes do partido, o que encontra resistência por parte do vice. Henrique Meirelles, outro ex-presidente do Banco Central, continua com chances, porém não agrada à totalidade do empresariado com quem o vice tem conversado.

Social. No últimos dias, Temer decidiu eleger a área social como prioridade numa resposta às acusações que sofreu do PT e do Palácio do Planalto de que planeja acabar com o Bolsa Família e outros programas.

Ele pretende fazer uma reformulação do setor, mas que não elimine políticas públicas, apenas as concentre sob um mesmo guarda-chuva. Até ontem o vice não tinha um nome para comandar essa área e gostaria de encontrá-lo na sociedade civil, para reforçar o conceito de um “Ministério de notáveis”.

O vice-presidente quer confiar ao DEM, partido com participação importante no processo de impeachment de Dilma, o Ministério de Minas e Energia, atualmente com o PMDB. José Carlos Aleluia é o nome preferido até agora.

Justiça. Embora não faça parte dos três eixos definidos por Temer, o Ministério da Justiça integra a lista de prioridades porque tem o controle da Polícia Federal e, portanto, uma interface com a Operação Lava Jato. O ex-ministro da Defesa Nelson Jobim é o preferido de Temer, mas já advogou para empreiteiras investigadas pela operação. Ayres Brito, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, também é sempre lembrado.

Dilma se diz 'injustiçada' e afirma estar apenas no começo da luta

Gustavo Uribe, Marina Dias, Valdo Cruz

BRASÍLIA - Em sua primeira declaração pública desde a derrota na Câmara dos Deputados, a presidente Dilma Rousseff afirmou que teve os "sonhos e direitos torturados", se sentiu "indignada" e "injustiçada" com a aprovação do impeachment.

Também acusou o vice-presidente Michel Temer de trair e conspirar abertamente contra ela.

Em pronunciamento nesta segunda (18), a petista disse que nenhuma democracia aceitaria comportamento como o de Temer: "A sociedade não gosta de traidores".

Dilma afirmou ainda que é vítima do "mais abominável crime" que pode haver contra uma pessoa –ser condenada injustamente.

Emocionada, declarou que não está no fim de seu mandato, mas "no início da luta".

Impeachment
A presidente disse que se sentiu "injustiçada" e "indignada" com a aprovação da abertura do processo de impeachment neste domingo (17) pelo plenário da Câmara.

"É muito ruim para o Brasil que o mundo veja que a nossa jovem democracia enfrenta um processo com essa baixa qualidade", disse. Ela repetiu que não cometeu crime de responsabilidade nas chamadas "pedaladas fiscais" e acusou a Câmara de ter reservado a ela um tratamento diferente do oferecido a seus antecessores. "Os atos dos quais eles me acusam foram praticados por outros presidentes antes de mim e não se caracterizaram como ilegais ou criminosos".

A petista também acusou os partidos de oposição de terem aderido à estratégia do "quanto pior, melhor" para impedir que ela governasse com estabilidade nos últimos 15 meses.

Afirmou ainda que o governo não abrirá mão de "nenhum instrumento para exercer o direito de defesa", confirmando que a AGU (Advocacia-Geral da União) recorrerá ao Supremo Tribunal Federal questionando o mérito do processo de impeachment.

Temer
Dilma fez um discurso duro contra o vice-presidente Michel Temer (PMDB). "É inusitado, é estranho, é estarrecedor que um vice-presidente no exercício de seu mandato conspire contra a presidente abertamente. Em nenhuma democracia do mundo uma pessoa que fizesse isso seria respeitada, porque a sociedade não gosta de traidor. Por que não? Porque cada um de nós sabe a injustiça e a dor que se sente quando se vê a traição no ato".

Cunha
Em críticas ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a petista disse que a aprovação do impeachment foi associada à imagem da vingança e do desvio e abuso de poder. "O rosto estampado na imagem que foi transmitida ao mundo é o do desvio de poder, do abuso de poder e do descompromisso com as instituições e com as práticas éticas e morais".

Em uma provocação a Cunha, Dilma lembrou que não há contra ela nenhuma acusação de desvio de dinheiro, de enriquecimento ilícito ou de recursos no exterior. O presidente da Câmara é réu por corrupção passiva e acusado de esconder contas na Suíça.

Novas eleições
A petista não descartou a possibilidade de apresentar ao Congresso Nacional projeto para antecipar para este ano a eleição presidencial, mas disse que não a avalia neste momento. A proposta é defendida como uma "saída honrosa" por ministros e petistas. "Tudo o que jamais podemos aceitar é que o cumprimento da legalidade não se dê no processo. Todas as outras alternativas você pode avaliar, mas não estou avaliando isso agora."

Senado
A presidente antecipou que participará pessoalmente de sua defesa no âmbito do Senado Federal e afirmou que ainda não discutiu com a equipe de governo sobre a relatoria do impeachment na comissão especial.

Favorável ao afastamento da petista, a senadora Ana Amélia (PP-RS) tem sido cotada pelo PSDB e por parte do PMDB.

Dilma informou que se reuniu nesta segunda (18) com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e que ele explicou a ela os encaminhamentos do processo. A presidente afirmou que a ofensiva no Senado será "absolutamente diferente" da realizada com a Câmara, mas não detalhou a distinção.

Tortura e sonhos
Emocionada, Dilma ressaltou que o país vive atualmente "tempos muito difíceis", mas que tem "força, ânimo e coragem" suficientes para enfrentá-los. "Não vou me abater, não vou me deixar paralisar e vou lutar como fiz ao longo de toda a minha vida".

Ela acrescentou que, assim como enfrentou com convicção a ditadura, irá encarar agora um "golpe de Estado".

"De uma certa forma, estou tendo meus sonhos e os meus direitos torturados. Agora, não vão matar em mim a esperança, porque sei que a democracia é sempre o lado certo da história", declaro. Ela disse que a decisão da Câmara não é o começo do fim de seu mandato, mas o início de uma luta que será "longa" e "demorada".

Novo governo
A presidente anunciou que os deputados federais que votaram favoravelmente ao impeachment serão exonerados ou não retornarão à Esplanada dos Ministérios, como é o caso de Mauro Lopes (Secretaria de Aviação Civil).

A petista defendeu a necessidade de um "grande rearranjo" no governo caso consiga barrar o impeachment no Senado, para construir "um novo caminho". "Eu enfrentei o terceiro turno e agora entrarei no quarto turno. Passado ele, além das medidas que já anunciamos, lançaremos outras medidas", disse Dilma, sem detalhá-las.

Com impeachment, gestor aposta na economia local

Por Luciana Seabra – Valor Econômico

SÃO PAULO - O avanço do impeachment da presidente Dilma Rousseff animou gestores de recursos a reduzir o comportamento defensivo nos fundos de ações. Agora, eles começam a comprar papéis de empresas com maior exposição à economia doméstica, que, na opinião majoritária do mercado, pode se recuperar com a posse de um novo governo.

O setor de infraestrutura é o mais citado para quem pensa em investimento de longo prazo. Companhias de varejo, que se valorizaram muito durante o último boom de consumo, também voltam a entrar no radar desses gestores, que administram R$ 145 bilhões em fundos de ações.

Gestores de longo prazo, que vinham evitando falar sobre temas políticos e ao mesmo tempo diziam que a estratégia neste momento era reforçar o caixa, ficaram mais otimistas após a passagem do impeachment pela Câmara no domingo. Alguns já vinham montando posições nessa direção, mas de forma cautelosa. Agora, começam a se expor no mercado à vista. Entre os setores com perspectiva de valorização, na opinião de muitos gestores, estão os de logística, concessão de estradas e energia.

"O mercado vai começar a olhar não para 2016, mas para 2017 e 2018. E um setor que pode se recuperar bem é o de infraestrutura", diz Marcos Peixoto, gestor de renda variável da XP. O setor ficou em segundo plano durante o boom de consumo e há dois anos está praticamente paralisado por causa das investigações da Operação Lava-Jato.

"São setores que [com um novo governo] podem voltar a crescer, ter novos leilões, licitações e renovações de concessões", aposta Peixoto. A XP dedicou 20% do seu portfólio de ações a empresas cujos negócios podem se beneficiar com a aprovação do impeachment.

O documento "Uma Ponte para o Futuro", divulgado pelo vice-presidente Michel Temer com diretrizes do PMDB para a economia, é analisado pelos gestores como um programa de governo. O fato de o texto não ter sido submetido a um processo eleitoral é visto como uma vantagem, já que muitas das medidas seriam impopulares e poderiam não passar pelo crivo dos eleitores.

Gestor aposta em ações de varejo e de infraestrutura
O avanço da possibilidade de troca de governo animou gestores de recursos a reduzir a postura defensiva nos fundos de ações e começar a se posicionar em empresas com maior exposição à economia doméstica. O setor de infraestrutura é o mais citado como atraente para uma exposição de longo prazo. Companhias de varejo também voltam a entrar no mapa de alocação desses gestores, que administram R$ 145 bilhões em carteiras de ações.

Gestores de longo prazo, que evitavam até então falar sobre temas políticos e sustentavam discursos de reforço no caixa, assumiram teses mais otimistas depois de o impeachment ter sido aprovado na Câmara dos Deputados no domingo. Alguns já vinham montando posições nesse sentido, mas de forma cautelosa, via opções, e agora começam a se expor no mercado à vista. Entre as empresas com perspectiva de valorização na opinião deles aparecem Rumo Logística, Mills, CCR, EcoRodovias e Eletropaulo.

"O mercado vai começar a olhar não para 2016, mas para 2017 e 2018. E um setor que pode se recuperar bem é o de infraestrutura", afirma Marcos Peixoto, gestor de renda variável da XP. O segmento não somente foi negligenciado nos últimos anos por um foco mais forte no consumo, diz, como também ficou paralisado pelas investigações da Lava-Jato. "São setores que podem voltar a crescer, ter novos leilões, licitações e renovações de concessões", defende. A XP dedicou 20% do portfólio de ações a empresas cujas teses estão diretamente associadas à aprovação de um impeachment.

O documento "Uma Ponte para o Futuro", divulgado pelo vice-presidente Michel Temer com diretrizes do PMDB para retomar o crescimento da economia brasileira há cerca de seis meses, já é analisado pelos gestores como um eventual programa de governo. E o fato de o texto não ter sido submetido a um processo eleitoral é visto por alguns deles como uma vantagem, já que muitas das medidas podem ser impopulares. Um ponto específico da lista de pontos fundamentais do documento é citado como suporte à tese que começa a crescer nos fundos. Nele, o PMDB propõe uma política centrada na iniciativa privada, com "concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura".

É com base no documento que Rodrigo Galindo, gestor de ações da Flag Asset, vê os setores elétrico, de concessões rodoviárias e portos como oportunidades. "Tendo regras claras, infraestrutura principalmente é um setor que pode se beneficiar, porque vai ter um fluxo de investimento", diz o gestor, com passagem pelas equipes de ações do Banco Pactual e da Vinci Partners.

Também na Quest, com R$ 1,07 bilhão em fundos de ações, o gestor Alexandre Silverio abandona a postura defensiva e parte para os setores que sofreram mais nos últimos anos, ligados à economia doméstica, que no entendimento dele poderiam se beneficiar de uma melhora na percepção de risco. Ele cita siderúrgicas, fabricantes de bens de capital e o segmento de construção civil.

"Deve haver ainda uma tentativa de judicialização do processo pelo governo, o que pode trazer volatilidade aos mercados. Agora, na minha opinião, o passo que foi dado é praticamente irreversível", afirma Silverio, que reduziu a parcela em renda fixa dos fundos de ações da Quest de 25% a menos de 10%, a fim de aumentar a exposição à bolsa. Os fundos de ações podem ter até um terço do patrimônio em caixa.

Mesmo empresas muito endividadas, que até então eram evitadas a todo custo, começam a aparecer no discurso dos gestores como potenciais beneficiárias de um cenário de Selic mais baixa. De fato, a perspectiva de troca de governo tem se refletido nos juros futuros, que espelham a expectativa do mercado para a taxa.

A possibilidade de troca de governo traz a perspectiva de menor intervenção do governo na economia com a escolha de setores a privilegiar, considera Fabio Motta, superintendente de renda variável da Western Asset, que aloca R$ 1,36 bilhão em fundos de ações no Brasil. "Isso tende a abrir espaço para uma melhor alocação de capital, que deve ter reflexos positivos no mercado acionário", afirma.

Motta vê boas oportunidades à frente de montar posições mais ligadas ao consumo doméstico, em segmentos que penaram nos últimos anos. "O varejo, a construção civil, o setor industrial, toda a cadeia de fornecimento do setor automobilístico, que sofreram bastante, tendem a ter um desempenho bom quando vier pelo menos um sinal de recuperação da atividade econômica", diz o gestor.

Daniel Utsch, gestor de renda variável da Fator Administração de Recursos (FAR), também vê as empresas mais expostas ao consumo doméstico, como as do segmento de shopping center, ganharem valor no novo cenário.

As exportadoras, que reinaram nos portfólios ao longo de 2015, como o segmento de papel e celulose, são as grandes vítimas dessa virada no portfólio. Ao mesmo tempo em que dão lugar à tese da economia doméstica pela perspectiva de crescimento econômico, elas sofrem com a possibilidade de valorização do real ou ao menos, caso o Banco Central evite esse movimento, a menor possibilidade de fortalecimento do dólar.

No radar dos gestores agora, decisivos para impor um reforço na exposição ao mercado doméstico no portfólio, estão, além da própria aprovação do impeachment no Senado, a redução do número de ministérios, a definição de uma equipe de ministros pró-mercado e a disposição do novo governo para aprovar reformas como a da previdência e do mercado de trabalho. No campo dos dados, os gestores estão atentos a ajustes nos indicadores de confiança, do empresário e do consumidor, tidos como os primeiros indícios de uma recuperação econômica.

Presidente se diz injustiçada e volta a falar em golpe

Na sua primeira aparição pública após a aprovação do impeachment pela Câmara, a presidente Dilma disse se sentir injustiçada e afirmou que o processo, referendado duas vezes pelo STF, é um “golpe de Estado”. Abatida, Dilma disse ser “estarrecedora” a atuação do vice Michel Temer, que chamou de traidor, e afirmou que está apenas no começo da luta. Também atacou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e voltou a dizer que não há contra ela acusação de desvio de dinheiro público. Para a oposição, ela não convenceu.

Dilma se diz injustiçada e afirma que tem ânimo para lutar até o fim

• Demonstrando abatimento, presidente volta a acusar Temer de conspiração

Catarina Alencastro, Eduardo Barretto - O Globo

-BRASÍLIA- Abatida e aparentando cansaço e tristeza, a presidente Dilma Rousseff fez ontem um pronunciamento, seguido de entrevista, no qual disse se sentir injustiçada com o resultado da votação da Câmara dos Deputados, que anteontem autorizou a abertura de processo de impeachment. Dilma também afirmou estar indignada, especialmente com o fato de a sessão ter sido presidida por Eduardo Cunha (PMDB-RJ), réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de corrupção. A presidente alegou que o objeto da acusação contra ela, as “pedaladas fiscais”, não foi citado nas declarações de voto.

— Eu me sinto injustiçada. Injustiçada porque considero que esse processo é um processo que não tem base de sustentação. A injustiça sempre ocorre quando se esmaga o processo de defesa, mas, também, quando, de uma forma absurda, se acusa alguém por algo, primeiro, que não é crime e, segundo, acusa e ninguém se refere a qual é o problema — disse.

Mantendo o discurso de que impeachment é golpe, Dilma recorreu à sua biografia de luta contra a ditadora e afirmou que, os atrasos dos pagamentos a bancos públicos, as “pedaladas”, não a beneficiaram pessoalmente.

— É o golpe em que se usa de uma aparência de processo legal e democrático para perpetrar, talvez, o mais abominável crime contra uma pessoa, que é a injustiça, é condenar o inocente — reclamou.

O rito do processo de impeachment foi definido a partir de uma decisão do STF em novembro do ano passado, quando a Corte impôs a Cunha regras diferentes das que ele estipulara. Semana passada, quando o governo recorreu para anular a votação, mais uma vez o STF negou o pedido do Executivo. No domingo, a Câmara aprovou, com apoio de 72% dos deputados, a autorização para que o Senado abra o processo de impedimento.

No pronunciamento, Dilma disse que não se abaterá e lutará para que não seja retirada da Presidência. Voltou a chamar o vice-presidente Michel Temer de conspirador e traidor:

— É estarrecedor que um vice-presidente, no exercício do seu mandato, conspire contra a presidente, abertamente. Em nenhuma democracia do mundo, uma pessoa que fizesse isso seria respeitada. Porque a sociedade humana não gosta de traidor. Porque cada um de nós sabe, também, a injustiça e a dor que se sente quando se vê a traição no ato — disse. — Tenho ânimo, força e coragem suficiente para enfrentar essa injustiça. Não vou me abater, não vou me deixar paralisar por isso. Vou lutar como fiz ao longo de toda a minha vida.

Dilma falou em tom baixo. Chegou ao Salão Leste, ao lado dos ministros Edinho Silva (Comunicação Social) e Jaques Wagner (chefe de gabinete). Apesar de demonstrar abatimento, fez questão de se apresentar como uma combatente animada para o próximo round. Negou que o revés sofrido seja definitivo:

— Ao contrário do que alguns anunciaram, não chegou o fim. Será longa e demorada, não é uma luta que envolve apenas o meu mandato. Não é por mim, mas pelos 54 milhões de votos que tive. É uma luta de todos os brasileiros pela democracia em nosso país. Sem democracia não há e não haverá crescimento econômico.

Em sua fala inicial, antes responder a perguntas, Dilma voltou a comparar a luta contra a ditadura com o momento atual, que, a seu ver, também é marcado por uma tentativa de um golpe:

— Estou tendo meus sonhos e direitos torturados, mas não vão matar em mim a esperança. A democracia é sempre o lado certo da História.

Segundo Dilma, não há no governo estudos para enviar ao Congresso uma proposta de convocação de novas eleições presidenciais. Sem discorrer sobre a estratégia de busca de votos no Senado, onde passa a correr o processo de impeachment, disse que o governo terá uma articulação política “absolutamente diferente” e “qualificada” com os senadores. Para ela, a passagem do processo para o Senado significa que enfrentará um “quarto turno” das eleições vencidas em 2014, sendo os dois primeiros na eleição e o terceiro, no plenário da Câmara.

— Teremos com os senadores uma relação absolutamente diferente da que tivemos com a Câmara — declarou — Teremos uma interlocução muito qualificada com seus senadores.

Embora sem citar Cunha, deixou claro sua indignação pelo fato de a votação de domingo ter sido comandada pelo peemedebista.

— Não há contra mim nenhuma acusação de desvio de dinheiro público; não há contra mim acusação de enriquecimento ilícito. Eu não fui acusada de ter contas no exterior. Por isso eu me sinto injustiçada. Eu me sinto injustiçada porque aqueles que praticaram atos ilícitos, que têm contas no exterior, presidem a sessão que trata de uma questão tão grave como é a questão do impedimento de um presidente da República.

Temer já começou busca por nome para Fazenda e área social

• Vice-presidente tem que compor novo governo até maio, diz aliado

Lauro Neto, Mariana Sanches - O Globo

SÃO PAULO- O vice-presidente Michel Temer já trabalha na escolha de nomes para um novo governo e deverá decidir até o próximo mês a composição de sua eventual equipe. Segundo o ex-ministro Moreira Franco, que se encontrou com o peemedebista ontem em São Paulo, Temer tem obrigação de montar um governo “até maio”.

— É obrigação dele (um novo governo até maio). As regras são essas e assim que tem que ser — disse Moreira, sem revelar nomes da equipe econômica que comporia um possível novo governo e enfatizando que os três principais problemas do Brasil são “a economia, a economia e a economia".

Além de Moreira Franco, Temer se reuniu com aliados e empresários afinados com o PMDB. A ideia, nesses encontros e nos próximos que fará, é que o vice-presidente defina a "cara" do seu eventual governo com dois eixos principais: acenos ao mercado e à área social. A missão mais imediata é definir o perfil de sua equipe econômica. A ideia é ter alguém na Fazenda que tenha capacidade de vender o Brasil lá fora, impulsionar a economia e criar um ambiente de segurança, favorável ao investimento.

— As conversas com gente do mercado são para ver o que esperam de nós, para termos claro o que fazer e, em seguida, saber com quem fazer. Os partidos vão ter que procurar nomes dentro de cada perfil, moldar as escolhas dos ministros de acordo com as demandas do governo. Tem que acelerar essas conversas. Michel vai ter que falar com diversas dessas pessoas, Fernando Henrique Cardoso, Armínio Fraga, rapidamente — afirma um próximo interlocutor de Temer.

Esta semana, Temer dará continuidade a reuniões com diferentes setores empresariais para sentir o “pulso” do PIB brasileiro. Ele teria tido um encontro reservado com o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, também do PMDB. O vice-presidente também dispensará atenção ao PSDB, que deseja ter ao seu lado caso venha a ser presidente. Ele também deverá incluir propostas tucanas de governo em sua plataforma.

Encontro com ex-ministros
Temer chegou a São Paulo no início da tarde para o encontro com Moreira Franco (PMDB-RJ) e também com Thomas Traumann, ex-porta-voz de Dilma Rousseff. Os dois são ex-ministros da petista, respectivamente da Aviação Civil e da secretaria de Comunicação Social.

Na chegada ao escritório, Moreira Franco disse como o vice-presidente reagiu à aceitação da abertura processo de impeachment contra Dilma, aprovada pela Câmara dos Deputados no domingo.

— Claro que (Temer reagiu) com senso da grande responsabilidade, porque, a cada vez que esse processo vai tomando corpo, pesa sobre ele. Temer tem a noção exata do tamanho do desafio que a presidência da República impõe àquele que a exerce — disse Moreira.

— Acho que o Brasil inteiro está desesperado em busca de uma alternativa. Temer pensa, e eu tenho pensando nisso o tempo todo. Por isso que produzimos o “Pontes Para o Futuro”, porque temos que tirar o Brasil da crise rápido. O problema maior da sociedade brasileira é a economia. O segundo maior é a economia. O terceiro é a economia. É absolutamente intolerável que tenhamos 284 brasileiros perdendo o emprego por hora.

Na avaliação de Moreira, a votação de domingo foi muito expressiva e “geradora de esperança”, tirando o caráter de “golpe”. Ontem, Temer se mostrou “enfurecido” com a pecha de conspirador e golpista que, segundo ele, o PT e a presidente Dilma tentam atrelar à sua imagem. Segundo interlocutores, Temer pretende lançar uma contra ofensiva de marketing em que questionará se também são golpistas os eleitores que foram às ruas pedir a saída de Dilma, ou se também são golpistas os 367 deputados que votaram pelo afastamento da presidente.

PSDB afirma que não indicará nomes para governo Temer

• Decisão foi anunciada após encontro entre FH e Aécio Neves

Thiago Herdy, Mariana Sanches - O Globo

-SÃO PAULO- Um dia depois de a Câmara dos Deputados ter aprovado o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), decidiram ontem, durante um almoço em São Paulo, que o partido não deve indicar nomes para cargos em um eventual governo de Michel Temer, em caso de confirmação de afastamento da presidente. Eventual participação de José Serra (PSDB) no governo é tratada como iniciativa individual do senador, e não moeda de troca por apoio da legenda.

A ideia do partido é manter vivo o projeto de voltar ao poder em 2018. Por isso, busca deixar claro que apoiará eventual administração Temer por se tratar de “governo transitório” e capaz de fazer avançar “uma agenda que precisa ser implantada”. No encontro com o ex-presidente, Aécio levou para discussão uma carta de “ideias e princípios” que o partido considera fundamental para dar apoio no Congresso ao possível novo governo. O documento, já discutido por governadores, será levado na próxima semana à Executiva do partido e à bancada federal. Em seguida deverá ser apresentado a Temer, em data mais próxima do possível afastamento de Dilma.

Os tucanos consideram problemática a condição de eventual administração do PMDB, um “governo sem voto”, e veem com preocupação a articulação conduzida por Temer por nova divisão de cargos, no eventual novo governo, entre alas de partidos mais fisiologistas, como PP e PSD.

— Se começarem a dar essa cara ao novo governo, não vai dar certo — afirmou um interlocutor dos tucanos.

Ontem, mais cedo, Fernando Henrique afirmou que não via riscos à democracia no prosseguimento do processo de impeachment, que classificou, no entanto, como “violento” por contrariar a vontade expressa pelo voto nas eleições. E disse que o apoio do PSDB não é ao PMDB, mas sim ao “projeto de salvação” da possível nova administração.

— Ninguém pode colocar como objetivo político a chegada ao impeachment. Ele tem que ser uma consequência de atos e fatos de duas dimensões: uma é jurídica, a Constituição tem que dizer se aquilo é ou não crime de responsabilidade, e outro é política, se o governo tem força ou não para governar. Quando se juntam essas coisas é muito difícil evitar o processo. Mas tem que ser dentro da regra. Em todo esse debate que estamos vivendo hoje eu não creio que haja riscos à democracia — declarou o ex-presidente. — É um processo violento porque nós temos que contrapor a vontade do povo com a decisão político-jurídica que emana do Congresso — acrescentou.

Ao falar a uma plateia de intelectuais e pesquisadores durante seminário sobre os desafios ao estado de direito na América Latina, promovido pela Fundação Getúlio Vargas e pelo Bingham Centre of Rule of Law, de Londres, Fernando Henrique comentou a performance dos deputados federais durante a sessão de domingo.

— Agora é tudo baixo clero. É preciso ver o outro lado da moeda, houve uma democratização grande e aparecem como representantes da sociedade pessoas que antes não estavam no Congresso. É uma inclusão, uma mobilidade social.

No Senado, polêmica sobre nova eleição para presidente


  • Grupo de parlamentares recolhe assinaturas para pedir pleito este ano

-BRASÍLIA- Mesmo diante da dificuldade de aprovar uma proposta de emenda constitucional (PEC) antes de 2 de outubro, um grupo de senadores anunciou ontem que começará a recolher assinaturas de apoio à realização de eleições diretas para presidente e vice-presidente da República junto com a disputa municipal deste ano. A proposta já enfrenta resistência de parlamentares que são contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, pois, na opinião deles, os esforços devem ser concentrados em derrubar o afastamento no Senado.

Parlamentares do PT avaliam que a PEC das novas eleições pode se tornar prioridade apenas caso o vice-presidente Michel Temer assuma a presidência. Dentro do partido, há quem acredite que apoiar agora a realização de nova disputa presidencial possa ser interpretado pela opinião pública como uma admissão de derrota no processo de impeachment. Outro problema é o trâmite da proposta, que precisa ser aprovada por 3/5 dos parlamentares em duas votações na Câmara e duas no Senado.

Os defensores da PEC alegam, por sua vez, que enquanto parte da população é a favor do impeachment, há também os que não querem Temer. Paulo Paim (PTRS) acredita que a proposta pode ganhar força se o grupo conseguir engajar a população:

— A PEC é uma saída para esse confronto entre golpistas e não-golpistas. O povo é quem vai dizer quem vai ser presidente e vice.

Marina Silva volta a defender nova eleição

• Segundo ex-senadora, Dilma e Temer, assim como PT e PMDB, são ‘irmãos siameses’

Renan Xavier* - O Globo

-BRASÍLIA- A ex-senadora e candidata à presidência da República em 2014, Marina Silva (RedeAC), defendeu ontem o processo de impeachment de Dilma Rousseff, mas reafirmou que a melhor saída para a atual situação política do país seria a realização de uma nova eleição presidencial. A porta-voz oficial do partido também atacou a chapa vencedora das últimas eleições e disse que Dilma e Temer são “irmãos siameses”.

— Defendo novas eleições por compreender que o processo de impeachment que está em curso tem base de legalidade. Não é golpe, mas não alcança a finalidade de resolver o problema. O PT e o PMDB; a presidente Dilma e o vice, Michel Temer, são irmãos siameses. Portanto, não se pode imaginar que uma parte do fruto estragado pode ser removida e a outra parte possa ser usada como alimento — declarou a ex-senadora durante coletiva.

Marina lembrou que seu partido, o Rede Sustentabilidade, entrou na última terça-feira com aditamentos em quatro processos que o PSDB abriu em 2015 no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a chapa de Dilma e Temer. A alegação dos partidos é que a chapa praticou abuso de poder econômico e político. Marina citou, inclusive, um possível uso de dinheiro proveniente do escândalo do Petrolão, além da suspeita de que o PT possa ter usado a máquina pública em favor da reeleição de Dilma.

Questionado se o movimento a favor de novas eleições, encabeçado por Marina, seria uma pré-candidatura da ex-senadora, José Gustavo, também portavoz nacional do partido, afirmou que ainda não há nada certo para o partido. De acordo com ele, a Rede Sustentabilidade ainda precisa se articular e montar uma chapa, já que tem no momento, “apenas doze segundos garantidos de propaganda no rádio e na televisão e quatro deputados federais”.

Antes da coletiva, Marina afirmou em nota que os eleitores devem decidir os rumos do atual cenário político: “a população tem o direito de dar a palavra final, agora sabendo de tudo o que ficou oculto em 2014, e escolher um novo governo". (*Estagiário sob supervisão de Paulo Celso Pereira)

É estarrecedor que um vice-presidente conspire contra o presidente, diz Dilma

• Presidente disse se sentir "injustiçada" e "indignada" com a decisão da Câmara dos Deputados de aprovar a admissibilidade do processo de impeachment de seu mandato

Bernardo Caram, Gustavo Porto e Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Em coletiva a jornalistas no Palácio do Planalto nesta segunda-feira, 18, a presidente Dilma Rousseff voltou a criticar fortemente Michel Temer. Ela reafirmou que é "estarrecedor" um vice-presidente conspirar contra sua parceira de chapa. "Em nenhuma democracia do mundo, uma pessoa que fizesse isso seria respeitada. A sociedade humana não gosta de traidor", afirmou. "Nenhum governo será legítimo - que o povo pode reconhecer como produto da sua democracia - sem ser pelo voto secreto, direto numa eleição previamente convocada."

A presidente disse se sentir "injustiçada" e "indignada" com a decisão da Câmara dos Deputados de aprovar a admissibilidade do processo de impeachment de seu mandato. "Considero que esse processo não tem base de sustentação", afirmou durante o seu primeiro pronunciamento à imprensa após a derrota da votação no domingo, 17, na Câmara.

Dilma considerou importante "insistir numa tecla só", ao defender a legalidade da edição de decretos de suplementação orçamentária. "Os atos pelos quais eles me acusam foram praticados por outros presidentes antes de mim e não se caracterizaram como ilegais ou criminosos", disse, ressaltando que as decisões foram tomadas com base em relatórios técnicos. "A mim se reserva um tratamento que não se reservou a ninguém".

A presidente voltou a dizer que a Constituição estipula que é necessário haver crime de responsabilidade para que um presidente seja afastado. Ela frisou que os atos assinados por ela não foram praticados para enriquecimento próprio. "Saio com a consciência tranquila de que os atos que pratiquei, não fiz baseado na ilegalidade", reforçou.

Ressentimento. Dilma disse ainda que não viu ressentimento de deputados retratado na votação de ontem. "Qualquer governo pode cometer erro, mas ressentimento também não é justificativa para nenhum processo de impeachment. Temos que procurar padrão de seriedade maior", disse.

Ela afirmou que o processo foi conduzido com hegemonia muito forte do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Segundo ela, o deputado fez a condução "como quis".

Luta. A presidente afirmou que vai continuar lutando pela democracia. "Na minha juventude, enfrentei a ditadura por convicção e agora eu também enfrento com convicção um golpe de Estado", disse. Ela ressaltou que agora, na maturidade, enfrenta outro golpe. "De certa forma, estou tendo meus sonhos torturados. Agora, não vão matar a minha esperança", disse.

Dilma frisou que o País vive tempos muito difíceis, mas históricos. "O mundo e a história nos observam. Eu tenho ânimo, força e coragem suficiente para enfrentar - apesar do sentimento de muita tristeza - essa injustiça", afirmou. "Não vou me abater, não vou me deixar paralisar, vou lutar como fiz ao longo de toda minha vida".

A presidente disse que a democracia é o "lado certo da história" e ressaltou que vai se defender no Senado. "Ao contrário do que alguns anunciaram, não começou o fim. Estamos no inicio da luta, que será longa e demorada", afirmou. Ela advertiu que, sem democracia, não há como retomar o crescimento econômico e o nível de emprego.

Jucá: presidente não tem ‘moral’ para atacar Temer

• Senadores da oposição reagem a discurso de Dilma após votação na Câmara dos Deputados

Eduardo Bresciani - O Globo

-BRASÍLIA- O presidente em exercício do PMDB, senador Romero Jucá (RR), rebateu a presidente Dilma Rousseff afirmando que ela não tem condições de questionar moralmente o vice Michel Temer. Senadores da oposição, por sua vez, atacaram as declarações da presidente de que foi injustiçada na decisão da Câmara dos Deputados sobre o processo de impeachment e afirmaram que ela faz “apelação” e “vitimização”.

— Me desculpe a presidente, nada contra ela, mas a verdade tem que ser dita e a primeira delas é que a presidente não tem condição de questionar moralmente Michel Temer. Ele era o melhor homem do mundo ao compor a chapa da presidente em 2014 — disse Jucá.
Ele disse entender os ataques porque “faltam argumentos” para Dilma. Ressaltou que Dilma não tem mais condições de recuperar a economia do país e que Temer é uma esperança.

— Hoje, a Dilma é certeza de desastre. O Michel pode ser possibilidade de acerto. Eu, como sou crédulo e acredito em Deus e nas pessoas, prefiro me agarrar a uma oportunidade que pode dar certo do que a uma certeza de desastre — afirmou.

A oposição criticou o discurso da presidente Dilma por questionar a decisão da Câmara dos Deputados.

— Se a margem de votos fosse pequena até poderia contestar, mas com um score de 72% a 28% qualquer desculpa é apelação pura, retórica vazia, algo que não convence ninguém — afirmou o presidente do DEM, José Agripino (RN).

— Ela fez uma postura de vítima, tentou se vitimizar, chegou a se dizer torturada pelo Congresso, mas esqueceu de citar tortura que faz ao povo brasileiro, a tortura do desemprego, da desassistência diante de crises tão graves — disse o líder do PSDB, Cássio Cunha Lima (PB).

Para o tucano, a fala da presidente não terá repercussão no Senado e serve apenas como discurso para aqueles que já a apoiam.

— Ela fala para dentro e se distancia cada vez mais da maioria que não aprova tanto seu governo. Quanto ao comportamento, esse governo nasceu de uma grande mentira e terminará como uma imensa fraude — afirmou o líder tucano.

O vice-presidente Michel Temer decidiu não comentar as declarações de Dilma Rousseff. Um aliado do vice afirmou que a fala de Dilma não merecia resposta, pois a presidente estaria, neste momento, em uma situação de fragilidade que motivou os ataques ao vice.

— A Dilma resolveu falar só para fazer uma queixa do Michel. Mas, não se bate-boca. Ficou ruim para ela. Essa alegação do golpe, o próprio Supremo já disse que não existe, que o impeachment é legal. E falar em conspiração com tanta gente indo lá no Jaburu à luz do dia, dando entrevistas, não cola. Conspiração se faz à sorrelfa, para usar uma expressão que Michel usa — afirma. (Colaborou Júnia Gama)

PSDB cria ‘agenda emergencial’ para Temer

• Aécio defende lista de propostas e diz que sigla ‘não é beneficiária do impeachment’

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O senador Aécio Neves (MG), presidente nacional do PSDB, começou ontem um ciclo de consultas a integrantes do partido sobre a participação em um eventual governo Michel Temer. A intenção é dar caráter institucional à aproximação e apresentar ao peemedebista uma plataforma que venha com o selo da “unidade partidária”.

O movimento ocorre no momento em que aliados de Temer ventilam a informação de que o senador José Serra (SP) é “cotado” para assumir o Ministério da Saúde, pasta da qual foi titular no governo Fernando Henrique Cardoso.

Aécio se reuniu ontem em São Paulo com o ex-presidente tucano e apresentou a FHC uma lista de demandas genéricas que os tucanos apresentarão a Temer, caso o Senado confirme a decisão tomada pela Câmara no domingo e veja indícios de crime de responsabilidade suficientes para afastar do cargo a presidente Dilma Rousseff. Aécio divulgou uma imagem do encontro em sua conta no Twitter e mencionou a “agenda emergencial” planejada pelo PSDB.

O documento, que foi elaborado pelo senador tucano Tasso Jereissati (CE), defende a simplificação do sistema tributário, compromisso com programas sociais, reforma política e blindagem da Operação Lava Jato.

Na semana depois do feriado, Aécio se reunirá com a bancada do PSDB na Câmara e, em seguida, vai procurar os governadores do partido. O senador, que é contra a indicação de tucanos para cargos, dirá a Temer que o PSDB defende a montagem de um “ministério de notáveis”.

Entre as propostas que os tucanos apresentarão a Temer estão, ainda, a profissionalização das empresas públicas, dos fundos de pensão e das agências reguladoras, acabar com o “impasse” da legislação trabalhista e uma reforma política que inclua a cláusula de barreiras e o fim da reeleição.

Nas últimas semanas, Aécio tem repetido um bordão – “O PSDB não é beneficiário do impeachment” – e dito que, se houver a participação de tucanos em algum ministério, ela será em caráter individual.

O senador mineiro, candidato derrotado na disputa presidencial de 2014, enfrenta outra questão nas conversas sobre uma eventual aproximação com Temer. Aécio foi o principal fiador da ação que o PSDB move no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e que virou um fator de constrangimento, já que poderia provocar também a cassação do peemedebista – a ação não pode ser retirada da pauta do colegiado.

No ano passado, já diante do desgaste da imagem de Dilma mas sem o avanço da mobilização pelo impeachment, o questionamento da chapa que elegeu Dilma e Temer foi o “foco” prioritário do PSDB. “A ação continua tramitando, mas não nos pertence mais”, diz o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PA).

A expectativa do jurista Miguel Reale Jr., autor do pedido de impeachment de Dilma, é que o processo se arraste até 2018, quando perderia objeto devido às novas eleições.

Discreto. Para evitar dar munição ao discurso de “golpe” do PT, Aécio decidiu ficar fora da comissão do impeachment no Senado e ceder a relatoria à senadora Ana Amélia (PP-RS).

Ao indicar o aliado Antonio Anastasia (PSDB-MG) para a presidência do colegiado, o dirigente do PSDB espera dar um caráter “acadêmico e jurídico” ao debate no Senado.
Ex-governador de Minas Gerais, Anastasia é advogado constitucionalista e foi professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

“Se o impeachment for aprovado no Senado, o PSDB deverá apresentar uma agenda emergencial ao Michel Temer”, disse Aécio Neves

Bancada do PT rejeita hipótese de antecipar eleições gerais

• Avaliação é de que a defesa de um novo pleito poderia passar a ideia de reconhecimento antecipado de derrota no Senado

Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dia após a aprovação da admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara, a bancada do PT na Casa procurou rejeitar a hipótese de antecipação de eleições gerais.

Mesmo com a derrota de Dilma na votação deste domingo, 17, e reconhecimento de que o placar tornou a situação dela no Senado ainda mais difícil, a estratégia dos petistas é focar o discurso na defesa do mandato da presidente.

De acordo com parlamentares petistas ouvidos pelo Broadcast Político, serviço de informação em tempo real da Agência Estado, defender novas eleições agora poderia passar a ideia de que o partido está reconhecendo antecipadamente a derrota no Senado e legitimando o "golpe" da oposição.

Segundo o líder do PT na Câmara, Afonso Florense (BA), a "hipótese" "não apareceu" no governo e no partido. "Hoje mesmo estive com ministro (Ricardo)Berzoini (Secretaria de Governo) e com a presidente Dilma e não vi isso", disse.

"Para nós, ela não existe", acrescentou Florense. Vice-líder do PT, o deputado Henrique Fontana (RS) foi na mesma linha. "Eleições gerais já têm data marcada: em 2018. Fora disso é golpe", afirmou o parlamentar gaúcho.

A antecipação das eleições gerais chegou a ser defendida, nos bastidores, por alguns setores do governo e do PT como uma proposta de saída da crise política, para caso o impeachment da presidente Dilma tivesse sido rejeitado pela Câmara.

Para que se tornasse realidade, Dilma e o PT teriam de encampar a aprovação de uma Proposta de Emenda a Constituição (PEC) propondo essa antecipação. A medida, contudo, teria muita dificuldade para ser aprovada pela Câmara e pelo Senado.

A proposta é defendida por lideranças políticas relevantes, como o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Nesta segunda-feira, 18, um grupo de seis senadores, entre eles, Cristovam Buarque (PDT-DF), também propôs uma PEC para antecipar eleições.

Grupo de trabalho. Como parte da estratégia de defesa do mandato de Dilma, a bancada do PT criou um "grupo de trabalho" de deputados para fazer articulação política junto aos senadores com o objetivo de barrar o impeachment.

Segundo Florense, que comandará o grupo, a ideia é que os deputados se juntem aos senadores para fazer o corpo a corpo em busca de votos para impedir a aprovação do impeachment no Senado.

Em outra linha, o PT decidiu investir em campanhas em defesa do mandato de Dilma com artistas, intelectuais e juristas. A terceira linha de atuação será tentar judicializar o processo em tudo que for possível.

Temer reúne equipe para combater discurso de 'vitimização' de petista

Thais Arbex, Daniela Lima - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO, BRASÍLIA - No dia seguinte à Câmara dos Deputados aprovar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o vice-presidente Michel Temer se reuniu em São Paulo com conselheiros para traçar uma estratégia de defesa à ofensiva governista.

Um dos principais auxiliares do vice, o ex-ministro Moreira Franco, chegou ao escritório de Temer, no bairro do Itaim Bibi, acompanhado de Thomas Traumann, que foi porta-voz e ministro da Secom (Secretaria de Comunicação Social) de Dilma.

A avaliação do entorno do vice-presidente é de que, a partir de agora, o governo insistirá, cada vez mais, "na vitimização" da presidente e que Temer não deve deixar de dar respostas.

A Folha apurou que, na avaliação do auxiliares de Temer, Traumann poderia "ajudar a calibrar o discurso" do vice-presidente, baseado na proximidade que teve com Dilma até recentemente.

A presidente, avaliam os auxiliares da presidente, estaria partindo para uma separação "litigiosa".

Ao chegar ao escritório de Temer, Franco afirmou que o peemedebista tem "a noção exata do tamanho do desafio que a Presidência impõe".

"O desafio [de Temer] começa pela necessidade de restabelecer a credibilidade do país, restabelecer a possibilidade de a economia crescer para que possamos gerar emprego e tranquilizar a sociedade brasileira", afirmou.

Questionado se o vice-presidente já estaria pensando em uma equipe econômica para o seu futuro governo, respondeu: "É claro".

Apesar das especulações, Temer interditou qualquer discussão pública sobre a composição de um eventual governo para não melindrar o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o plenário da Casa que vai avaliar a continuidade do impeachment de Dilma.

"Ele não se sente confortável de fulanizar essas discussões e nem acha que é a hora de fazer isso", afirma o ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), que integra o grupo mais próximo ao vice-presidente.

Como Temer e Renan são desafetos e acumulam um histórico de acusações de parte a parte, o vice pediu aos aliados muita cautela. Ele próprio pretende evitar pronunciamentos agora.

Por enquanto, a ordem é continuar sinalizando na direção de que uma eventual gestão Temer marcará uma ruptura do modelo implementado por Dilma, com corte de ministérios e uma gestão mais "técnica".

Pessoas próximas a Renan dizem que ele já avisou que não será o "motoboy" do impeachment. O senador reafirmou que se posicionará como "poder moderador", sem acelerar nem travar o andamento das discussões.

Pessoas próximas ao vice indicam que, mesmo optando por não polemizar publicamente com Dilma, ele poderia "responder" à presidente judicializando as acusações que ela faz contra ele.

Temer já adotou posição semelhante ao ser xingado pelo ex-governador Cid Gomes, que o chamou de "chefe de quadrilha".

Aliados dizem que o vice se incomoda com as acusações de Dilma e que se sente injustiçado pela petista.

Temer tem que ter governo até maio, diz Moreira Franco

Por Victoria Mantoan e Bruno Peres - Valor Econômico

SÃO PAULO e BRASÍLIA - O vice-presidente Michel Temer chegou ontem em São Paulo, onde deve permanecer pelos próximos dias. A exemplo do que aconteceu em Brasília, onde recebeu deputados na residência oficial para cumprimentos e saudações, Temer teve encontros com correligionários na capital paulista.

No fim da tarde, dois ex-ministro de Dilma Rousseff, o da Aviação Civil Moreira Franco e o da Secretaria de Comunicação Social da Presidência Thomas Traumann, foram ao escritório do vice. A assessoria de imprensa do vice-presidente confirmou que havia outros participantes no encontro, mas não divulgou nomes.

Questionado sobre a reação de Temer à votação de domingo no Congresso sobre o impeachment da presidente, Moreira Franco disse que o vice-presidente tem noção do tamanho do desafio que a Presidência da República impõe àquele que a exerce. Afirmou ainda que é obrigação de Temer formar um governo até maio, quando questionado sobre o prazo curto. Pelas regras para o processo do impeachment em discussão no Senado, a presidente Dilma Rousseff deve ser afastada do cargo no dia 11 de maio.

"Nós temos que tirar o Brasil da crise rápido, muito rápido", disse Moreira. Segundo Moreira, " o maior problema do país é a economia".

Ainda em Brasília, Temer, segundo aliados, evitou "aglomerações" para não sugerir comemoração ostensiva e procurou adotar um discurso de serenidade e responsabilidade, "sem precipitação", externando a avaliação de que o avanço do pedido de impeachment de Dilma no Congresso é um "pontapé inicial" de uma difícil travessia para o país que envolve simultaneamente um processo para "recolocar o país nos trilhos" e recompor a governabilidade no Congresso.

O vice-presidente já deu sinais a seus apoiadores políticos, entretanto, de que os partidos que formaram uma aliança em torno do encaminhamento do pedido de impeachment da presidente serão contemplados com espaços ou ao menos manterão as atuais posições em um eventual governo seu.

A alguns de seus articuladores políticos, Temer disse inclusive que pode debater propostas para o país, indo pessoalmente aos plenários do Congresso em um gesto político de busca da governabilidade em amplo diálogo.

Os partidos que defendem o afastamento de Dilma do cargo veem em uma gestão Temer a chance de colocar em prática algumas propostas defendidas na campanha eleitoral. Temer foi aconselhado a sugerir que os partidos com que conversa apresentem propostas a serem acrescidas ao seu eventual plano de governo.

A bancada do PSB na Câmara, por exemplo, prepara para até o fim deste mês um conjunto de sugestões para uma agenda positiva para o país. O PSDB também debate um conjunto de propostas a ser apresentado, provavelmente na próxima semana, como sugestões para um governo de transição.

Governo avalia ser inevitável que senadores aceitem processo da Câmara

• Afastamento de Dilma é dado como certo; foco é no julgamento final

Simone Iglesias, Jeferson Ribeiro - O Globo

-BRASÍLIA- Apesar do otimismo com a tramitação do pedido de impeachment no Senado, que a presidente Dilma Rousseff procurou demonstrar ontem, integrantes do governo avaliam como muito difícil a tarefa de impedir a aceitação do processo na comissão especial no Senado. Caso a comissão aceite a ação, isso levará ao afastamento imediato de Dilma do Planalto por até 180 dias.

Se esse diagnóstico se confirmar, o Palácio do Planalto concentrará os seus esforços no julgamento do processo de cassação, que exige ainda mais votos dos senadores. Para o acolhimento, é necessária maioria simples dos senadores presentes em plenário. Já para para rejeitar o processo de cassação, basta que Dilma tenha 28 votos dos 81 senadores.

Para conseguir uma virada no processo iniciado na Câmara, o Planalto aposta na “melhor qualificação” dos senadores e no maior equilíbrio que deverá ser proporcionado pelo presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), e, se o processo for aberto, do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski. O presidente do STF é o responsável por conduzir o processo, a partir do momento em que ele for aberto e a presidente, afastada do cargo:

— Os senadores são menos suscetíveis a pressões. São mais qualificados. A presidente também acredita no equilíbrio de Renan. Ele não fará as manobras de Eduardo Cunha — disse um interlocutor palaciano, referindo-se ao presidente da Câmara.

Mas os auxiliares da presidente preveem dificuldades. Com Dilma afastada do cargo, ela perderá seu Ministério, a caneta e o poder maior de negociação. O ministro da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo, é um exemplo. Ele não estará mais no cargo e deverá cumprir uma quarentena, o que o tira da defesa de Dilma. Esse problema está sendo tratado por Cardozo e pelo entorno da presidente, que já busca alternativas para sua defesa jurídica.

No Senado, Dilma reforçará sua equipe de articulação, com a ministra Kátia Abreu (Agricultura), que é senadora e espera a manutenção do apoio do ministro Eduardo Braga (Minas e Energia), também senador e ex-líder de seu governo. A petista voltou a dizer que a expectativa esta semana é que o STF permita a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil, decisão pautada para amanhã. A eventual liberação de Lula é vista no Planalto como um trunfo para reaglutinar forças aliadas.

Lula diz que não há volta caso Senado afaste Dilma temporariamente

- Valor Econômico

SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu, nesta segunda-feira, que a presidente Dilma Rousseff dificilmente voltará ao Palácio do Planalto caso o Senado aprove a abertura do processo de impeachment na Casa.

Essa avaliação foi feita durante reunião com o presidente do PT, Rui Falcão, e representantes de movimentos de esquerda.

É necessária a maioria simples para que o processo de impeachment tenha prosseguimento no Senado. Essa votação deverá ocorrer no início de maio.

Em um prazo de até 180 dias depois, os senadores têm que decidir sobre o mérito do pedido de impeachment, cuja aprovação requer dois terços da Casa.

Nesse interregno, Dilma fica afastada do cargo, que passa às mãos do vice-presidente, Michel Temer. Em uma reunião realizada no Instituto Lula, o ex-presidente admitiu a dificuldade de Dilma reassumir a Presidência depois que Temer ocupe a cadeira e conquiste o poder de negociação com os senadores.

Lula também avaliou como remotas as chances de impedir o prosseguimento do processo no Senado. Rouco e visivelmente cansado, ainda segundo os aliados, Lula ouviu a opinião dos participantes do encontro.

A reunião teve a participação de Guilherme Boulos, coordenador do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), Gilmar Mauro, líder do MST (Movimento dos Sem Terra), do presidente do PT, Rui Falcão e do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, além de presidentes de sindicatos e diretores do Instituto Lula.

"O MTST colocamos a necessidade de construir uma mobilização de forma sistemática contra o golpe", relata Boulos, segundo quem "Lula mais ouviu do que falou" durante as mais de quatro horas de reunião.

"Foi uma conversa para fazer um balanço do que aconteceu ontem [domingo] e pensar no que vamos fazer", afirmou Rui Falcão, na saída do encontro.

A exemplo de Boulos, Gilmar Mauro propôs uma agenda de mobilização, com nova palavra de ordem, para reverter a situação no Congresso. Ele afirma que o desempenho dos deputados na sessão de domingo pode criar uma reação na sociedade. O dirigente do MST disse que, embora não tenha ainda consenso na reunião, sua opinião é de que não existe chance de o governo se sustentar caso se consuma a saída de Dilma.

"Não há nenhuma chance de o governo Temer/Cunha andar. Nenhuma. A população não deixará. Essa é a certeza que eu tenho e a avaliação que eu faço. Não posso dizer que foi uma avaliação da reunião toda, mas muitos concordam. O que vimos ontem em Brasília foi uma aula de cretinice. Acredito que a partir do que os deputados mostraram para o Brasil, muitas mudanças vão acontecer na consciência das pessoas", completou.

Na reunião, a proposta de antecipação das eleições foi alvo de discussão. A maioria dos participantes lançou dúvidas sobre sua viabilidade.

Na manhã desta terça-feira, Lula participará de reunião do diretório nacional do PT para avaliação do cenário. Na quarta-feira, ele prestigiará o ato das frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo. Também na quarta, o STF (Supremo Tribunal Federal) deverá decidir se ele pode assumir um ministério do governo Dilma.

Impeachment não traz risco à democracia, diz FHC

Por Andre Guilherme Vieira e Bruno Peres – Valor Econômico

SÃO PAULO e BRASÍLIA - O processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff não traz riscos à democracia, na avaliação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). "Havia muita dúvida quando se tratava do impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello. Ulisses Guimarães e eu temíamos a quebra da democracia, do regime. E no caso do Collor não houve consequência negativa para a democracia. E, neste momento, com todo esse debate [sobre a abertura de processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff], não acho que haja risco à democracia", disse.

Para Fernando Henrique, o atual momento mostra um amadurecimento e fortalecimento da democracia. "Temos uma crise de desemprego, uma crise moral por causa da corrupção e uma crise de falta de lideranças políticas. No passado, já se cogitaria qual seria o militar que viria. E hoje nós nem sabemos o nome do militar. Mas sabemos os nomes dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Isso é um fato sociológico da maior importância", avaliou o ex-presidente.

Sobre o processo de impeachment autorizado ontem pela Câmara dos Deputados, o ex-presidente avaliou que não é golpe, ao contrário do que afirma o governo. O tucano também discorda da proposta, ventilada por ministros de Dilma, de convocar uma nova eleição presidencial.

“Isso não está na Constituição. E é sempre perigoso. Já é ruim ter de passar por processo de impeachment. O processo que leva a isso não é um desejo. Então, imagina criar mais uma regra que não está na Constituição. Se o Tribunal Superior Eleitoral disser que a chapa [Dilma-Temer] é nula, se for este ano é eleição geral. E se for ano que vem o Congresso elege. Olha, nenhuma dessas soluções é maravilhosa. Nós vamos ter de juntar nossas forças para, a despeito de tudo, manter a liberdade, manter a democracia e o respeito. E não insistir em uma coisa que não é verdadeira. Não há golpe nenhum, é tudo dentro da lei, seguindo o rito da Constituição".

Indagado pelo Valor PRO, serviço em tempo real do Valor, durante entrevista coletiva em evento realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, Fernando Henrique negou que a Lava-Jato esteja ameaçada pela iminência de o PMDB assumir a presidência da República - integrantes do partido estão entre os principais investigados pela operação por suspeita de corrupção, como o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o próprio vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP), que, apesar de não ser formalmente investigado, já foi mencionado por delatores.

"Acho que hoje as instituições estão fortes. A Lava-Jato, como outras apurações, tem de ser feita. É preciso respeitar a lei, mesmo aqueles que vão presos eu acho que tem de haver respeito à lei, o juiz tem de julgar se é caso de habeas corpus, se for o caso deve dar. Eu acho que é fundamental manter muito firme a ideia de que nós temos um Estado Democrático de Direito", disse FHC.

O ex-presidente minimizou o fato de o PMDB já estar se articulando para alterar dispositivos legais, como a lei da delação premiada, com o objetivo de tornar a ação da Lava-Jato menos eficaz.

"Olha aqui, quantos parlamentares há do PMDB? Sessenta e poucos. É 12% do Congresso. Nenhum partido sozinho faz nada, pode querer o que quiser, não adianta. Se não houver uma opinião nacional ninguém faz nada, não leva adiante as transformações. Ninguém vai parar nada que o país não queira parar. O país quer avançar", avaliou.

Sobre o fato de o PSDB ter perdido o protagonismo no processo de impeachment, assumido pelo PMDB, Fernando Henrique reconheceu que os tucanos têm "uma força relativa no Congresso".

"Em primeiro lugar o processo de impeachment não foi definido pelo PMDB, foi pelo povo que se manifestou. E o PSDB tem uma força relativa no Congresso, não é o partido majoritário. De modo que ele tem de entender qual é o seu papel e ajudar a construir o Brasil. Mas o que decide as questões é o sentimento popular. Recentemente é assim. Agora tem internet, as pessoas opinam, se manifestam. Os partidos já não têm o protagonismo solitário do passado. São importantes, porque eles levam a reinvindicação a ser institucionalizada. Mas é preciso entender que uma andorinha só não faz verão", afirmou o ex-presidente.

Alianças
FHC disse que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou o "presidencialismo de cooptação", que resultou em um sistema viciado que "corrompeu à democracia". O tucano ainda criticou as alianças feitas pelos governos do PT com partidos pequenos.

"Quando você tem até quatro ou cinco partidos, você tem presidencialismo de coalizão. Eu tive dois [PMDB e PFL, atual DEM]. Tem de ter programa, ter uma agenda”, afirmou. “Hoje temos um presidencialismo de cooptação. Um certo presidente, não preciso aqui dizer quem é, resolveu fazer alianças com partidos pequenos e seguir pela cooptação. Isso é corrupção, não tem como funcionar. Esse sistema corrompeu à democracia. A própria democracia está corroída", disse o ex-presidente.

PSDB + PMDB
O PSDB ainda debate um conjunto de propostas a ser apresentado ao vice-presidente Michel Temer como sugestões para um governo de transição diante da perspectiva de afastamento do cargo da presidente Dilma.

Em linhas gerais, o partido aponta como condições para colaboração com uma gestão Michel Temer apoio absoluto à Operação Lava-Jato, da Polícia (PF); debate acerca de uma reforma política; ampla reforma administrativa do Estado; modernização da legislação trabalhista; reforma da Previdência; e revisão da política externa brasileira.

Ameaça à democracia - Merval Pereira

- O Globo

A presidente Dilma assumiu ontem formalmente a tese do golpe parlamentar que o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, vem defendendo temerariamente há algum tempo. Se na boca de Cardozo essa afirmação já era potencialmente perigosa, na da presidente transforma-se em ameaça à democracia. De instrumento da política partidária, passa a ser acusação oficial do governo.

É surpreendente que um pronunciamento de mais de 70% da Câmara, num processo que está todo controlado e avalizado pelo Supremo, possa ser acusado oficialmente de golpista.

A partir da decisão da Câmara sobre a admissibilidade do processo, passou a ser vocalizado pelas autoridades que se arrogam a defesa da democracia, mas que, agindo assim, estão atacando o estado democrático de direito e incentivando a desobediência às decisões institucionais que lhes são desfavoráveis.

Cardozo, que se saíra bem na defesa da presidente Dilma na primeira aparição da comissão do impeachment, perdeu o norte e chegou ao cúmulo na madrugada da decisão da Câmara, quando, num surto semelhante ao da advogada Janaína Paschoal na defesa do impeachment na manifestação das Arcadas no Largo de São Francisco, classificou de golpe a decisão soberana da Câmara.

Sua atuação em defesa da presidente Dilma, por sinal, é bastante controversa, e está causando incômodo na Associação Nacional dos Advogados da União, cujo presidente, Bruno Fortes, estuda medidas legais para impor limites a ela.

Segundo ele, “há limites para o uso dos advogados públicos pelos governantes, pois não se pode subverter a ordem jurídica nem as instituições”. Segundo o presidente da Anauni, a Portaria 13/2015, da própria Consultoria Geral da União, tratou expressamente do uso dos serviços do advogado-geral da União pelo presidente da República, exigindo que a solicitação preencha uma série de requisitos para ser atendida, destacando-se o interesse público do ato impugnado.

Afirma Fortes, porém, que “não há interesse público algum na defesa das ‘pedaladas,’ dos decretos ilegais e do crime de responsabilidade imputado à presidente”. Para ele, “o advogado-geral deveria ostentar posição isenta e imparcial neste processo, jamais assumindo postura partidária ou política em favor do governante”.

O presidente da Anauni sustenta a necessidade de uma clara vinculação da advocacia da União ao interesse público, jamais ao interesse privado do sujeito beneficiário. Diz ele: “Os advogados da União não são defensores dos governantes, pois isso equivaleria a um amesquinhamento dos serviços públicos, incompatível com o princípio republicano”.

No caso do impeachment, a reclamação dos seus pares é que estamos assistindo, no Congresso, a um advogado-geral da União que se assemelha a um criminalista contratado por Dilma, o que não é correto. Pior que isso, veem Cardozo se comportando como verdadeiro advogado do PT, alinhando-se com diretrizes do partido em defesa das “pedaladas fiscais”, dos decretos ilegais e, sobretudo, dos interesses privados da presidente acusada de crimes de responsabilidade.

Especialistas afirmam que os requisitos previstos para o uso do AGU para defesa de agentes públicos são rigorosos e merecem interpretação restritiva, em obediência ao art. 37 da Constituição, que trata dos princípios, entre outros, “da legalidade e impessoalidade” da administração pública, e à Lei 8.429/92. Também a Lei do Impeachment não prevê a possibilidade de o Estado atuar em defesa de um presidente da República, ou de qualquer agente público ali arrolado. A lei supõe que o denunciado contará com advogados próprios e privados, e foi assim no caso Collor.

O impeachment é um palco apropriado para advogados privados atuarem em nome da presidente da República, não para o advogado-geral da União assumir tal incumbência e valer-se de toda sua estrutura, como ocorreu no pronunciamento público logo após o julgamento da Câmara, criticam os membros da Anauni.

O que transparece dessa atuação é o uso da máquina administrativa e seu desvirtuamento, prática corriqueira no PT. O advogado-geral da União, assim procedendo, rebaixa o status da própria função, o que está causando indignação na Associação Nacional dos Advogados da União.