sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Opinião do dia – Roberto Freire

A grave crise econômica que abate o Brasil, agravada pela tremenda incompetência do PT e pelo desmantelo da corrupção, também afeta um setor determinante para o futuro de qualquer nação, mas que não parece atrair a atenção do governo de Dilma Rousseff. A área científica, capaz de mudar a realidade do país, é uma das que mais vem sendo penalizadas pela irresponsabilidade que marca a atual administração.
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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS. ‘O apagão científico do Brasil’. Diário do Poder, 12 de novembro de 2015.

Com desvalorização do real, prejuízo da Petrobrás vai a R$ 3,7 bi no 3º trimestre

• Estatal teve resultado pior do que o previsto pelos analistas e anunciou redução dos investimentos, de US$ 25 bilhões para US$ 23 bilhões este ano; diretor financeiro disse que não há 'varinha mágica' para resolver a crise da empresa

Antonio Pita, Fernanda Nunes, Mariana Durão, André Magnabosco - O Estado de S. Paulo

Com resultado pior do que o previsto pelo mercado, a Petrobrás amargou prejuízo de R$ 3,76 bilhões no terceiro trimestre. O balanço financeiro da estatal mostra que o resultado foi fortemente afetado pela desvalorização do real, que elevou seu endividamento e os custos operacionais. O câmbio pressiona diretamente a gigantesca dívida em moeda estrangeira da companhia, gerando um custo adicional de R$ 5,4 bilhões com o pagamento de juros.

Esse é o terceiro prejuízo da Petrobrás nos últimos cinco trimestres, o que indica uma dificuldade em solucionar sua crise financeira. Nesta quinta-feira, 12, a estatal anunciou ainda que reduziu ainda mais os investimentos previstos para este ano. A nova cifra é de US$ 23 bilhões. No início do ano, o orçamento era de US$ 28 bilhões e, em outubro, foi rebaixado para US$ 25 bilhões.
Apesar de afirmar estar “muito satisfeito” com os resultados operacionais da companhia, o diretor Financeiro da Petrobrás, Ivan Monteiro, disse que a recuperação da estatal não se dará com “uma varinha mágica”.

“Tudo que fazemos é para que a companhia melhore estruturalmente, não seja algo pontual. Estamos muito satisfeitos com o resultado alcançado até agora, mas estamos vigilantes”, disse Monteiro, que substituiu o presidente Aldemir Bendine no comando da entrevista coletiva sobre os resultados.
Monteiro descartou ampliar as baixas contábeis referentes à corrupção na empresa, mesmo após a Polícia Federal indicar, em laudo, que os desvios podem chegar a R$ 42 bilhões. No balanço do terceiro trimestre de 2014, a companhia estimou em R$ 6,2 bilhões as perdas com a corrupção descobertas durante as investigações da Operação Lava Jato.

“Não temos nenhuma informação adicional, de nenhuma fonte, que leve a acreditar que aquele valor de perdas esteja equivocado. Esse valor não vai ser alterado”, disse. Mas Monteiro indicou que fará, no final do ano, nova reavaliação dos ativos da empresa. A reavaliação concluída no início do ano resultou em uma baixa contábil de R$ 40 bilhões.

Desempenho. Mesmo com as perdas causadas pelo câmbio, Monteiro não quis antecipar uma avaliação sobre o pagamento de dividendos e indicou que a distribuição de lucros depende do resultado anual.

No acumulado de nove meses, a companhia registra lucro de R$ 2,1 bilhões. O executivo chamou atenção para o resultado operacional e o saldo de caixa da companhia, que ficou em R$ 3,8 bilhões no trimestre – o primeiro positivo desde 2007, resultado da maior disciplina financeira.

Dívida da Petrobrás cresce R$ 78 bilhões em três meses

• Alta do dólar elevou a dívida total da companhia a R$ 402 bilhões; empresa fala em vender ativos para aliviar as contas

Fernanda Nunes, Antonio Pita, Mariana Durão - O Estado de S. Paulo

RIO - Principal fragilidade da Petrobrás, a dívida líquida da companhia cresceu R$ 78 bilhões somente entre julho e setembro, segundo o balanço divulgado nesta quinta-feira, 12, pela empresa, chegando a R$ 402,3 bilhões. A dívida bruta, por sua vez, chegou a R$ 506,6 bilhões. A alta do endividamento decorre diretamente da depreciação cambial.

O diretor financeiro da companhia, Ivan Monteiro, condicionou a melhora nos indicadores à reestruturação e à venda de ativos da companhia, e sinalizou que trabalha para reestruturar e alongar os prazos dos compromissos. Segundo ele, “não há risco” de os desinvestimentos não saírem do papel.

A meta em cinco anos é vender US$ 57 bilhões em ativos. Até o próximo ano, a meta é vender US$ 15,1 bilhões. Em 2015, a companhia vendeu US$ 200 milhões e, caso conclua a venda da subsidiária Gaspetro, da área de gás natural, até dezembro, ainda terá mais US$ 500 milhões. O negócio fechado com o grupo japonês Mitsui depende da aprovação de órgãos reguladores.

Segundo Monteiro, a conclusão do plano de venda de ativos para o próximo ano permitirá que a companhia não volte ao mercado para captar novos financiamentos em 2016. Somente neste ano, a estatal já contratou US$ 11 bilhões em empréstimos, com o objetivo de fechar o ano com saldo de caixa de US$ 22 bilhões.

A companhia também negocia mais US$ 3 bilhões em financiamentos, neste ano, para suprir a necessidade de caixa estimada para o próximo ano.

Captação alternativa. Após ter o grau de investimento cassado por três agências de classificação de risco – o que implica em pagar taxas mais altas nos empréstimos feitos no exterior –, a Petrobrás está em busca de alternativas de captação que não elevem excessivamente o seu custo de financiamento. Uma das modalidades em estudo seria a venda com arrendamento e opção de compra (sales and leaseback) de plataformas de produção de petróleo.

O diretor financeiro da estatal detalhou ainda que, em alguns casos, a empresa pode manter a operação de ativos que vierem a ser vendidos. Ele citou o exemplo de gasodutos, que podem ser repassados a terceiros. Nesse caso, ao adquirir o bem, a empresa que fez o negócio deve assinar um contrato garantindo à Petrobrás a operação da rede.

Volta ao mundo. Na próxima segunda-feira, a diretoria da Petrobras, liderada por Monteiro, viajará ao exterior para “dar uma volta ao mundo”, passando por países como China, Estados Unidos, México, Canadá e Inglaterra. “Não conseguimos dar conta da agenda de tanto interesse. Todos querem ter a Petrobrás como parceira”, disse Monteiro.

Com a alta de 28% na cotação do dólar frente ao real no período, o endividamento líquido da empresa atingiu a marca de R$ 402 bilhões. A conclusão do plano de desinvestimento é fundamental para a redução da alavancagem – relação entre a dívida líquida e a geração de caixa da companhia – da estatal, que subiu a 5,2 vezes no trimestre, ante uma taxa de 4,6 vezes no trimestre anterior. A meta da própria companhia é fechar o ano com nível de 3,3 vezes.

“Esse nível está dentro do nosso plano. Não há como reduzir a alavancagem (relação entre endividamento e patrimônio da empresa) sem que haja forte contribuição da venda de ativos. Mas isso não é para um ano especifico, mas ao longo do plano de negócios até 2019”, frisou Monteiro, durante coletiva de imprensa.“A velocidade (da desalavancagem) está viculada à venda de ativos. A aceleração desse processo depende basicamente do plano de desinvestimento.”

Moro quebra sigilo telefônico da sede nacional do PT

• Juiz da Lava Jato acolhe pedido do Ministério Público Federal na ação sobre propinas arrecadadas por João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do partido por meio de gráfica; análise abrange período de 2010 a 2014, pegando três campanhas

Por Ricardo Brandt, Fausto Macedo e Julia Affonso – O Estado de S. Paulo

O juiz federal Sérgio Moro decretou a quebra do sigilo telefônico do PT e de pelo menos seis números que seriam usados pelo ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto, preso desde março, em Curitiba, acusado de ser operador de propinas no bilionário esquema de corrupção na Petrobrás. A abertura de dados alcança um período de quase cinco anos, 2010 a 2014 – abrangendo três campanhas eleitorais.

A força-tarefa da Operação Lava Jato aponta o uso da legenda como forma de ocultar dinheiro desviado da estatal por meio de contribuições e doações de campanha.

Moro atendeu um pedido do Ministério Público Federal, que acusa formalmente Vaccari em uma ação penal pelo uso de uma gráfica ligada ao partido para supostamente lavar dinheiro da Petrobrás. O ex-tesoureiro é réu acusado de corrupção e lavagem.

“Defiro o requerido e decreto a quebra do sigilo dos terminais telefônicos acima, incluindo dos dados das ligações efetuadas no período de 22 de julho de 2010 a 31 de dezembro de 2014”, decidiu Moro.

A ordem de quebra do sigilo atinge o coração do PT, cuja sede fica situada na Rua Silveira Martins, Centro de São Paulo. Os telefones alvos são: (11) 3188-5218; (11) 99325-9751; (11) 3243-1356; (11) 5589-7500; (11) 99299-1683; (11) 3243-1313; e (11) 97618-1208.

“A medida pretendida é adequada e necessária para possibilitar a identificação dos registros das chamadas originadas e recebidas pelos terminais-alvos da investigação e seus respectivos interlocutores, bem como a localização geográfica em que se encontravam os alvos no momento das comunicações de interesse da investigação criminal, por meio de antenas que captaram o sinal”, sustenta o MPF no pedido.

Os investigadores da Lava Jato descobriram que propina do esquema da Petrobrás teria sido canalizado par a Editora Gráfica Atitude por meio de repasses do executivo Augusto Ribeiro Mendonça – do grupo Setal -, um dos delatores da operação. Ele revelou que o ex-tesoureiro lhe pediu R$ 2 milhões para o partido e sugeriu que o depósito fosse feito em favor da gráfica. Mendonça diz que repassou parte do montante.

“No tocante à ligação da Editora Gráfica Atitude com o denunciado João Vaccari Neto com o Partido dos Trabalhadores – PT, deve-se salientar que, a partir de pesquisas em bancos de dados, verificou-se que os sócios da Editora são o Sindicato dos Empregados de Estabelecimentos Bancários de São Paulo/SP e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, de notória vinculação ao Partido dos Trabalhadores, sendo que Juvandia Moreira Leite, presidente do primeiro Sindicato, figura como administradora da Editora.”Preso desde março em Curitiba, Vaccari integra o sindicato dos bancários. Ele foi presidente da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop), fundada por um núcleo do PT nos anos 1990.

“Necessário destacar, de outro turno, que a ligação entre a Editora Gráfica Atitude e o Partido dos Trabalhadores – PT vai além da afinidade entre as entidades sindicais proprietárias daquela com os programas partidários desta agremiação”, afirmam os procuradores.

O PT informou que não vai comentar a decisão do juiz.

Juiz autoriza quebra de sigilos de Mantega

Justiça autoriza quebra de sigilo bancário e fiscal do ex- ministro Mantega em inquérito da Zelotes –

• PF e MP investigam se ex- ministro teria vínculo com empresa que se livrou de multa

Jailton de Carvalho - O Globo

BRASÍLIA- O juiz da 10 ª Vara Federal, Vallisney de Souza Oliveira, autorizou a quebra do sigilo bancário e fiscal do ex- ministro da Fazenda Guido Mantega a partir de um dos inquéritos da Operação Zelotes, investigação sobre venda de decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais ( Carf ). A Polícia Federal e o Ministério Público Federal investigam supostos vínculos do ex- ministro com o empresário Victor Sandri, um dos donos do Grupo Comercial Cimento Penha, uma das empresas beneficiadas por decisões suspeitas do Carf.

Pelas investigações da Zelotes, o grupo conseguiu se livrar de uma dívida fiscal de R$ 106 milhões a partir de tratativas intermediadas pela SGR Consultoria Empresarial, uma das empresas que estão no centro das investigações sobre manipulação de decisões do Carf. Ao todo, as dívidas da empresa com o fisco somariam aproximadamente R$ 200 milhões. A PF e o Ministério Público não têm indicativos de que Mantega tenha recebido qualquer tipo de vantagem material da empresa, mas entendem que é necessário aprofundar a apuração.

Sandri manteria estreitos laços de amizade com o ex- ministro. O empresário também teria ajudado a negociar a eliminação de dívidas fiscais de outras empresas. No mesmo despacho em que autoriza a PF e o Ministério Público a vasculhar as contas do ex- ministro da Fazenda, Vallisney determinou a quebra de sigilo de mais 30 empresas, conforme divulgado ontem pela “Folha de S. Paulo”. As investigações fazem parte de um dos 19 inquéritos já abertos pela Polícia Federal para apurar fraudes no Carf.

STF proíbe doação oculta a candidatos

Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal proibiram ontem a doação oculta nas campanhas eleitorais, que tinha sido aprovada na reforma eleitoral feita este ano pelo Congresso. Com isso, os candidatos ficarão obrigados a declarar a origem dos recursos que receberão via partidos já na eleição de 2016.

STF proíbe doações ocultas em campanhas

• Na eleição de 2016, candidatos que receberem recursos via partidos terão que declarar doador originário

Carolina Brígido, Maria Lima - O Globo

- BRASÍLIA- O Supremo Tribunal Federal ( STF) proibiu ontem as chamadas “doações ocultas” em campanhas eleitorais. Pela minirreforma eleitoral aprovada este ano no Congresso, os partidos poderiam receber recursos de doadores e repassá- los ao candidato, sem que o político declarasse a real origem do dinheiro. O Supremo, no entanto, derrubou por unanimidade a mudança. O entendimento da Corte será aplicado a partir das eleições municipais de 2016.

Pela lei aprovada neste ano, os candidatos que recebessem doações intermediadas por partidos políticos deveriam prestar contas ao Tribunal Superior Eleitoral “sem individualização dos doadores” originais. A norma foi questionada no STF por meio de ação direta de inconstitucionalidade pela Ordem dos Advogados do Brasil ( OAB). Para a entidade, a regra “viola o princípio da transparência e o princípio da moralidade, e favorece a corrupção, dificultando o rastreamento das doações eleitorais”. Afirma ser “preciso que o eleitor saiba quem financia seus candidatos, compreendendo todo o caminho do dinheiro nas campanhas eleitorais”. 

Marco Aurélio preferia 2018 
O relator da ação, ministro Teori Zavascki, foi enfático ao dizer que o eleitor tem o direito de saber quem são os reais financiadores das campanhas antes de escolher seus candidatos. Ele ressaltou os princípios republicanos da moralidade e da transparência.

— É preciso que os abusos do poder econômico e político tenham severa resposta, sob a pena de tornar ineficaz não só o modelo atual, mas também o modelo que se tenha no futuro. Informação sobre doadores interessa à sociedade como um todo. O conhecimento do nome dos doadores denuncia maior ou menor propensão do candidato a abandonar suas convicções ideológicas. É necessário garantir ao eleitor possibilidade de fazer esse juízo antes da escolha nas urnas — afirmou Zavascki.

O ministro Dias Toffoli, que preside o Tribunal Superior Eleitoral ( TSE), também destacou a necessidade de transparência para o eleitor.

— É necessário que se saiba, é necessário que a imprensa divulgue, é importante que o eleitor, ao longo do processo eleitoral, possa saber quais são os interesses que estão financiando o candidato. Essa transparência é inerente à democracia. Não pode o Legislativo ocultar quem financia a democracia no Brasil — disse Toffoli.

Embora tenha concordado com a maioria, Marco Aurélio Mello defendeu que a regra só vigorasse nas eleições de 2018. A proposta foi derrotada.

Lideranças da base e da oposição minimizaram a decisão, já que em 2016 a doação de empresas está vedada por outra decisão do Supremo, que só permite doação de pessoas físicas. Mas o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), acha que a proibição das doações ocultas pode ser derrubada na votação de proposta de emenda constitucional ( PEC) que prevê doações empresariais, em tramitação no Senado.

— Ainda tem a votação da PEC que está no Senado. Pode mudar tudo — disse Cunha.

O líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima, também acha que a doação empresarial vai ser resgatada na Casa, para as eleições após 2016.

— Não vejo impacto maior se a regra vale para todos. Mais cedo ou mais tarde vai voltar a doação de empresas. Se a empresa não doa nem para partido A, B ou Y para não ser identificada, não tenho preocupação — disse Cunha Lima.

O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, aprova a decisão, mas lamenta que tenha sido tomada pelo STF:

— As decisões soam boas, mas, tomadas pelo Supremo, demonstram incapacidade do Congresso de decidir assuntos importantes.

CPI convoca amigo de Lula

A CPI do BNDES convocou José Carlos Bumlai, amigo do ex- presidente Lula, para depor. Firma de Bumlai recebeu R$ 459 milhões do BNDES em 2008 e 2009.

Empréstimo do BNDES à usina de Bumlai teve garantia inferior a 1%

• Banco sustenta que operação ocorreu dentro dos padrões normais

Chico Gois - O Globo

- BRASÍLIA- O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ( BNDES) emprestou, entre dezembro de 2008 e fevereiro de 2009, R$ 459,8 milhões para a usina São Fernando, empreendimento de José Carlos Bumlai com o grupo Bertin. A garantia oferecida, porém, foi de menos de 1% desse valor: R$ 2 milhões, ou seja, 0,45%. Na sessão de ontem, a CPI do BNDES aprovou a convocação de Bumlai para prestar depoimento.

Esse empréstimo se deu de forma direta, quando o próprio BNDES concede os recursos e arca com os riscos de inadimplência. Em resposta a um requerimento de informação do deputado José Rocha ( PR- BA), relator da CPI, o banco informou que os R$ 2 milhões ofertados como garantia se deram porque “se tratava de um projeto greenfield ( quando um empreendimento começa a ser desenvolvido do zero), no qual a garantia é evolutiva e, portanto, tem seu valor incrementado ao longo de sua implementação”. O banco acrescentou que as garantias atingiram R$ 496,1 milhões após a conclusão do projeto, em julho de 2010.

Ao GLOBO, o BNDES também justificou a operação com garantia inferior a 1% do valor do crédito: “A estruturação de projeto com garantia evolutiva é padrão para este tipo de empreendimento. Não houve qualquer tipo de excepcionalidade no caso em questão. Outro ponto importante é que o desembolso do BNDES não ocorre de uma só vez, mas de acordo com o andamento do projeto. À medida em que o projeto vai avançando, a garantia real vai se robustecendo. Além da garantia real, o projeto da São Fernando conta com fiança da Heber Participações”.

 Empréstimos e calotes 
A documentação fornecida à CPI sobre a transação com a usina de Bumlai, amigo do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, revela uma sucessão de empréstimos e calotes que culminaram com o pedido de falência da São Fernando pelo próprio BNDES.

A São Fernando teria capacidade para moer 2,3 milhões de toneladas de cana por ano para gerar energia. Em julho de 2009 o projeto já estava pronto e, no mesmo mês de 2010, entrou em funcionamento. Mal havia começado a operar, a usina quis dobrar sua capacidade. Mas a safra de 2010/ 2011 teria sido afetada pelas chuvas, como alega o próprio BNDES. Em consequência, a produção foi de 3,1 milhões de toneladas.

A partir daí houve uma sucessão de transações financeiras que acabaram levando ao calote. Em 2011, a usina reestruturou sua dívida com o BNDES. O saldo devedor era, na época, de R$ 362,4 milhões. A Bertin reescalonou sua dívida de R$ 59,3 milhões, em 23 de julho de 2012, e a São Fernando, outros R$ 303 milhões, na mesma data.

A Bertin só pagou o refinanciamento até junho de 2014 e se tornou inadimplente, devendo R$ 39,4 milhões. Mesmo assim, obteve novo reescalonamento, e, mais uma vez, não pagou. A São Fernando pagou até março de 2013 apenas R$ 2 milhões, dos R$ 303 milhões que devia e, no mês seguinte, entrou com pedido de recuperação judicial. Como não pagou aos credores, o BNDES pediu a falência da empresa.

No dia 1 º deste mês, a “Folha de S. Paulo” noticiou um empréstimo do BNDES a Bumlai de R$ 101,5 milhões, em julho de 2012. Em novembro de 2011, Bumlai já fora alvo de um pedido de falência por parte de um fornecedor, a quem devia R$ 523 mil. Ainda segundo o jornal, as normas do BNDES proíbem empréstimos a empresas nessa situação.

Cúpula petista articulou apoio a Cunha

Por Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - Lideranças petistas deram um "aval tácito" à nota de apoio ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), divulgada ontem, como resposta ao pedido do PSDB para que o pemedebista se afaste do cargo, diante do processo a que responde por quebra de decoro no Conselho de Ética.

Doze partidos, quase todos da base aliada do governo, defenderam a manutenção de Cunha no comando da Casa, argumentando que ninguém pode ser condenado de forma antecipada sem direito de ampla defesa.

O PT participou das reuniões que tratavam do ato, mas não assinou o documento, que tem a rubrica do PMDB, PR, PSC, PP, PSD, PRP, PTN, PTdoB, PEN, PHS, PTB e SD. Segundo uma fonte, até mesmo a maioria da bancada do partido de Cunha acha que situação dele é difícil, mas quer dar a chance de se explicar. "Não é uma defesa total [dele], mas também não é uma execração, uma acusação direta", observou.

A ideia do ato de apoio a Cunha partiu dos líderes Rogério Rosso (PSD-DF) e André Moura (PSC-SE), responsável por declarar o apoio dos partidos no plenário da Câmara minutos depois do PSDB pedir a saída do presidente da Casa e cobrar uma decisão sobre o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

José Guimarães (PT-CE) e Sibá Machado (PT-AC), líder do governo e do PT na Câmara, respectivamente, não declararam apoio, mas estavam dentro da operação. O Valor apurou que Guimarães inclusive deu sugestões ao texto que foi lido por Moura. Machado decidiu não assinar o documento alegando que precisaria convocar a bancada, o que "geraria ainda mais ruído", relatou a mesma fonte.

Fiel aliado de Cunha, Moura declarou ontem que o grupo partidário, que representa 230 deputados, ratificou "total apoio e confiança em sua condução na presidência da Câmara e que o princípio da presunção da inocência deve prevalecer para qualquer cidadão desse país, inclusive para o presidente da Câmara".

Governistas afirmam que a estratégia do Palácio do Planalto é não fazer movimentos contra Cunha. Se o pemedebista continuar colocando os projetos de interesse da presidente Dilma em votação, o governo não vai tomar nenhuma medida drástica contra ele, explicou um líder.

Por isso, na nota de apoio a Cunha foi destacado: eEventuais disputas políticas não podem prevalecer para paralisar o funcionamento da Casa no momento em que o país exige e espera que a Câmara delibere as matérias necessárias para o país retomar o crescimento", conforme discurso de Moura.

Um dos principais líderes que apoiaram o ato disse que foi um recado para a oposição, que "não vai impor sua vontade no grito". PSDB, DEM e PPS endureceram o discurso contra Cunha após ele apresentar seus argumentos sobre as contas bancárias ligadas a ele na Suíça. A ação dos tucanos irritou Cunha que interpretou a posição do partido como uma forma de pressionar o impeachment da presidente Dilma. Mas a decisão do presidente da Câmara sobre o caso continua prevista para depois do dia 15 de novembro.

Pedro Paulo agrediu mulher duas vezes

O pré- candidato a prefeito Pedro Paulo agrediu a hoje ex-mulher duas vezes, segundo registros. Eles alegaram que eram brigas de casal.

Pedro Paulo e ex- mulher confirmam segunda briga com agressões

• Após divulgação de novo caso, secretário diz que mantém candidatura

- O Globo

O secretário de Governo do Rio e pré- candidato à Prefeitura, Pedro Paulo Carvalho, e sua ex- mulher Alexandra Mendes Marcondes reuniram ontem a imprensa para falar sobre os dois casos de agressão em que se envolveram e foram registrados na polícia. Pedro Paulo afirmou que mantém sua pré-candidatura. Segundo o boletim de ocorrência 6304/ 2008, divulgado ontem pela revista “Época”, Alexandra foi agredida pelo então marido Pedro Paulo diante da filha do casal, Manuela. O registro foi feito na madrugada de 26 de dezembro de 2008, horas após o Natal. À polícia, Alexandra contou que a briga foi dentro do carro, quando a família chegava em casa, no Jardim Prudência, em São Paulo. Segundo o registro, Pedro Paulo a chamou de “vagabunda”, “piranha” e deu socos em seu corpo e rosto.

O outro caso registrado foi em 2010. Quando este veio a público, em outubro deste ano, o secretário afirmou que havia sido um momento de descontrole que nunca ocorrera. Ontem, após ser questionado sobre a divulgação da segunda agressão, afirmou que ele a mulher viveram momentos de amor e ódio. Diante da insistência da imprensa sobre o caso, Alexandra pegou o microfone e respondeu:

— Pedro nunca foi um cara agressivo. Tivemos duas discussões, que foram esses dois tristes episódios, infelizmente. Mas ele nunca foi um cara agressivo. Eu vim de São Paulo porque vocês transformaram a minha vida, a vida do Pedro e a da nossa filha num inferno. É uma criança que tem 10 anos, que não tem absolutamente nada a ver com isso — afirmou. — Qualquer casal tem brigas. As pessoas têm discussões.

Perguntado se achava normal os dois casos de agressão, Pedro Paulo voltou a dizer que perdeu o controle:

— Quem não tem uma briga dentro de casa? Quem nunca exagerou em uma discussão? Quem não perde o controle às vezes? Cometi um erro muito grave, que foi trair a minha mulher e, às vezes, a gente perdia o controle nas discussões.

Questionada se, como mãe, acharia normal um episódio assim ocorrer com sua filha, Alexandra disse que não:

— Nunca vou achar normal. Mas, enfim, acho que é difícil julgar. Na vida de um casal, os dois entre quatro paredes, qualquer um se destempera, você pede, você fala, você quer ouvir, você cobra. Você age com o coração com a emoção. Você perde a cabeça e não tem como explicar.

O secretário chegou à entrevista, num hotel de Copacabana, de mãos dadas com a atual mulher, Tatiana. Alexandra estava com o atual marido, Tom. Enquanto Pedro Paulo e Alexandra se sentaram à mesa para a entrevista, Tatiana e Tom ficaram sentados na primeira fila, junto à imprensa. Durante alguns minutos, Tatiana e Tom ficaram de mãos dadas. Ao final da coletiva. Os quatro se cumprimentaram.

Sobre o impacto em sua candidatura, Pedro Paulo afirmou ter confiança do PMDB:

— Tenho imenso orgulho de ter a confiança do meu partido, o PMDB, e ser a escolha do prefeito Eduardo Paes para a sucessão dele. Sou pré- candidato a prefeito do meu partido.

Questionado se o episódio se enquadrava na Lei Maria da Penha, respondeu:

— A PGR ( Procuradoria Geral da República) já está com o caso e vai analisar. Estou à disposição para prestar todos os esclarecimentos.

Ao depor em 2010, Alexandra citou a palavra travesti, quando relatou a traição do exmarido. Ao ser questionada ontem se Pedro Paulo a traiu com um travesti, ela negou:

— Falei que, quando vi na câmera do elevador, que a mulher que saiu do meu apartamento parecia um travesti. Era uma mulher. Óbvio que era uma mulher. Foi um comentário infeliz, e o cara ( escrivão) colocou.

Secretário de Paes escala ex-mulher que agrediu para defendê-lo

Italo Nogueira – Folha de S. Paulo

RIO - A divulgação de novo caso de agressão à ex-mulher fez o secretário-executivo municipal e pré-candidato à Prefeitura do Rio, Pedro Paulo (PMDB), escalar a vítima para defendê-lo.

A turismóloga Alexandra Mendes Marcondes foi ao Rio afirmar que, apesar de ter registrado dois boletins de ocorrência contra o ex-marido por violência física, ele "não é um cara agressivo".

Marcondes participou de entrevista coletiva nesta quinta-feira (12) ao lado de Pedro Paulo após a revista "Época" revelar que, em 2008, o secretário já havia sido acusado de agredir a ex-mulher, em São Paulo.

Há uma semana, em entrevista à Folha, Pedro Paulo disse que o episódio registrado em 2010, no Rio, havia sido o único de violência entre o casal.

"Nós tivemos duas discussões que foram esses dois tristes episódios. Mas o Pedro não é uma pessoa agressiva", disse Marcondes. Ela e Pedro Paulo estavam acompanhados dos atuais companheiros. Todos se abraçaram ao final.

Em 2008, a turismóloga prestou depoimento relatando xingamentos e socos no corpo e rosto quando estava no carro, na presença da filha, à época com dois anos.

Dois anos depois, ela relatou empurrões, chutes e socos que lhe quebraram um dente, segundo laudo do IML (Instituto Médico Legal).

Marcondes confirmou o teor dos depoimentos. Mas classificou os casos como "episódios do passado".

"Vim de São Paulo até aqui porque vocês [jornalistas] transformaram minha vida, a vida do Pedro, a vida da minha filha num inferno. Vocês estão expondo episódios do passado, que aconteceram quase seis anos atrás. Qualquer casal tem briga", disse ela.

Pedro Paulo, braço direito do prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), voltou a afirmar que o caso se tratou de um "episódio superado" num momento de descontrole. Ele se emocionou no início da coletiva.

"Quem não tem uma briga dentro de casa? Quem não tem um descontrole? Quem não exagera numa discussão? Fomos um casal como qualquer outro. Quem não passa isso? Quem às vezes não perde o seu controle? Agora não achar que isso possa ser uma coisa normal na nossa vida", afirmou o secretário.

Ele se irritou ao ter a fala comparada à do goleiro Bruno –em março de 2010, ao comentar briga entre o atacante Adriano e a ex-namorada Joana Machado, soltou: "Quem nunca brigou ou até saiu na mão com uma mulher?".

Bruno foi preso quatro meses depois, sob suspeita de ter participado da morte da amante Eliza Samudio.

"A gente tem que ter um nível de respeito aqui. Estou abrindo meu coração, nossa vida. Fazer algum tipo de aproximação disso, não vou permitir", reagiu Pedro Paulo.

O secretário não quis explicar porque disse, há uma semana, que o caso de 2010 tratava-se de um episódio único de agressão à ex-mulher.

"Estamos falando de uma dimensão familiar. Ficar detalhando uma frase que não foi bem colocada... Pelo amor de Deus. Vamos superar isso", disse ele.

Pedro Paulo evitou fazer previsões sobre o futuro de sua pré-candidatura a prefeito do Rio.

"O processo eleitoral começou e ele vai se acirrar. Tenho imenso orgulho de ter a confiança do meu partido, a escolha do prefeito Eduardo Paes para sucessão dele. Vamos jogar o jogo", disse o peemedebista.

Dilma reforça meta fiscal e rejeita pressão contra Levy

Valdo Cruz, Mariana Haubert e Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Numa semana em que foi pressionada a substituir seu ministro da Fazenda e mudar a política econômica, a presidente Dilma Rousseff tomou partido de Joaquim Levy e autorizou seus aliados no Congresso a reforçar a meta fiscal prevista para 2016.

Contrariando decisão tomada por ela mesma na véspera, a presidente orientou os representantes do governo na Comissão Mista de Orçamento do Congresso a fixar a meta em R$ 43,8 bilhões, o equivalente a a 0,7% do PIB (Produto Interno Bruto), sem permitir nenhum abatimento.

Na quarta-feira (11), Dilma havia concordado com um desconto de R$ 20 bilhões na meta de superavit primário do governo central, a economia prevista para o pagamento de juros da dívida pública. A decisão da presidente chegou a ser transmitida ao Congresso e incorporada ao relatório da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2016.

O abatimento era defendido pelo Ministério do Planejamento, sob o argumento de que o governo precisa de margem para acomodar eventuais frustrações de receitas como as ocorridas neste ano.

A Fazenda era contra, por achar que isso passaria a mensagem de que, mais uma vez, o governo já admitia que não iria cumprir a meta original, como nos últimos anos.

Reservadamente, Levy tem dito que o mercado pode aceitar o rombo "gigantesco" previsto para o Orçamento deste ano se o governo garantir um superavit "robusto" e "confiável" para 2016. Derrotado na quarta, o ministro pressionou o Palácio do Planalto e venceu a disputa nesta quinta.

Interlocutores de Levy disseram que, se perdesse o embate, o ministro da Fazenda poderia inclusive considerar sua permanência no governo sem sentido e aproveitar a oportunidade para deixar o cargo. Assessores presidenciais afirmaram que Levy não colocou o cargo à disposição, mas admitem que ele tem desabafado com amigos e indicado cansaço com os constantes ataques de petistas.

A vitória do ministro da Fazenda ocorre numa semana em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez gestões para substituir Levy pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles. Dilma resiste à ideia e tem dito que pretende manter o ministro da Fazenda no posto.

Levy foi alvo também de críticas de senadores governistas durante jantar na terça (10). Presente ao encontro, Romero Jucá (PMDB-RR) definiu o encontro como um "massacre" contra o ministro e sua política econômica.

Oposição
Na disputa em torno da LDO, Levy contou com apoio até da oposição. Para aprovar a redução da meta fiscal deste ano, que passa de um superavit para um deficit de, no mínimo, R$ 51,8 bilhões, a oposição exigiu que o governo não adotasse mecanismos que permitam fazer abatimentos no superavit de 2016.

O Planalto corre contra o tempo para conseguir a aprovação do Congresso para a redução da meta de 2015 a fim de evitar que a presidente seja acusada de desrespeitá-la, o que poderia ser usado para justificar novos pedidos de impeachment contra ela.

No fim do dia, assessores presidenciais reclamavam que o governo fez a sua parte, mas a comissão não votou a alteração da meta fiscal de 2015, mantendo a presidente em posição "vulnerável".

A proposta original do governo para a LDO de 2016 não previa abatimentos. A queda da arrecadação e as dificuldades para aprovar no Congresso medidas de ajuste, porém, levaram o Planejamento a propor o desconto de R$ 30 bilhões previstos para investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Diante das resistências da Fazenda, Dilma autorizou um desconto menor, de R$ 20 bilhões, buscando um meio termo entre os dois lados. Mas Levy insistiu na sua posição, alegando que a redução da meta iria fragilizar o governo e levar a uma nova perda do grau de investimento do país, ameaçando aprofundar a retração da economia, estimada neste ano em 3% do PIB.

Para Lula, mudança na economia é condição para se afastar risco político

Por Andrea Jubé e Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai intensificar sua atuação em Brasília para, informalmente, ajudar o governo na articulação política no Congresso Nacional e bater duro na necessidade de mudanças nas decisões na área econômica. Lula - que tem vindo semanalmente a Brasília - reuniu-se ontem com lideranças petistas, quando voltou a defender a substituição do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles.

A avaliação de Lula, segundo relatos de um dos presentes à reunião, é de que "houve um refresco na área política". Para Lula, "se não houver avanço na área econômica apontando que vamos sair dessa crise, a [crise] política pode retornar ao ponto anterior". Ele se referia ao movimento pelo impeachment.

Um interlocutor de presentes à conversa contou que a intenção de Lula nas incursões a Brasília é "ajudar o Palácio do Planalto a articular as lideranças", além de insistir na mudança da política econômica e na troca do ministro Joaquim Levy por Henrique Meirelles.

Embora insista na tese, Lula chamou a atenção do PT pelos vazamentos das notícias que revelam estar o governo preparando a troca de ministro da Fazenda para o fim do ano. Essa troca já foi abortada uma vez, há cerca de um mês, quando um dirigente do partido a anunciou em uma entrevista, e o novo momento de mudança, também revelado agora, irritou a presidente Dilma Rousseff, que não gosta de agir sob pressão.

De qualquer forma, como a flexibilização da política econômica, com a adoção de medidas para liberação do crédito, é uma estratégia prevista para a virada do Ano Novo, acredita o ex-presidente que ainda há tempo de apaziguar os ânimos.

No momento de maior intensidade do noticiário sobre a substituição de Joaquim Levy por Henrique Meirelles, o ex-presidente decidiu, na volta da Colômbia, fazer uma escala em Brasília na quarta-feira à noite. Lula disse aos líderes com quem se reuniu que está contrariado com o vazamento de notícias sobre a nomeação do ex-presidente do BC para o comando da economia e pediu aos parlamentares que evitem comentar o assunto. A avaliação é de que Levy ganhou sobrevida no cargo, após o vazamento da sua articulação em torno de Meirelles.

Desta vez, Lula e Dilma - que está contrariada com os vazamentos sobre Meirelles - não se encontraram, ao contrário das últimas semanas. O ex-presidente tem aterrissado na capital federal uma vez por semana, e invariavelmente reúne-se com sua sucessora para discutir os desdobramentos da crise política.

Nas duas últimas semanas, Lula se reuniu com Dilma, o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, e o ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, que têm sido seus interlocutores constantes no governo. Na semana em que participou da reunião do Diretório Nacional do PT, Lula jantou com Dilma, Wagner e Berzoini no Palácio da Alvorada. E na sexta-feira, depois de participar da Conferência de Segurança Alimentar (Consea), Lula tomou café da manhã com Dilma, Wagner e Berzoini na residência oficial.

Desta vez, reuniram-se na manhã de ontem, com Lula, no hotel onde ele costuma se hospedar em Brasília, entre outros aliados, o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), o líder do governo na Comissão Mista de Orçamento (CMO), deputado Paulo Pimenta (PT-RS), e auxiliares do ex-presidente.

O Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, apurou, com interlocutores do grupo, que a avaliação geral foi de que Levy saiu fortalecido das notícias de que Meirelles poderia substituí-lo, porque Dilma irritou-se pela segunda vez com o novo vazamento das articulações.

Outra avaliação do grupo é de que a vitória de Levy na Comissão Mista de Orçamento é prejudicial ao governo, porque contingenciaria recursos que deveriam ser voltados ao investimento.

Segundo relatos de um dos presentes na reunião ao Valor PRO, Lula defende para o comando da economia um nome com o "perfil" de Henrique Meirelles, que resgate a política de ampliação do crédito, a retomada das obras públicas, e simultaneamente, tenha o aval instantâneo do mercado financeiro e recupere a confiança dos investidores.

Levy consegue evitar corte da meta fiscal

• Comissão de Orçamento exclui abatimento de R$ 20 bi do cálculo de 2016. Posição não era unânime no governo

Cristiane Jungblut, Martha Beck - O Globo

Ministro da Fazenda convenceu Comissão do Orçamento a manter meta fiscal de 2016 sem prever abatimento. Levy voltou a ser atacado por Lula. - BRASÍLIA- Às custas de um desgaste interno no governo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, obteve ontem uma vitória no Congresso. Ele conseguiu que a Comissão Mista de Orçamento ( CMO) excluísse do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias ( LDO) de 2016 um abatimento de R$ 20 bilhões em despesas do Programa de Aceleração do Crescimento ( PAC) da meta fiscal. Esse desconto baixaria o superávit primário ( economia para o pagamento de juros da dívida pública) do ano que vem de R$ 43,8 bilhões, ou 0,70% do Produto Interno Bruto ( PIB), para R$ 23,8 bilhões, ou 0,38% do PIB. O ministro não admitia reduzir a meta de superávit.

Ao longo da semana, o abatimento do PAC em 2016 foi amplamente discutido pela presidente Dilma Rousseff com a Junta Orçamentária, composta pelos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa Civil. De um lado, Nelson Barbosa ( Planejamento) e Jaques Wagner ( Casa Civil) argumentavam que será muito difícil para o governo atingir a meta de 0,70%, porque a arrecadação ainda será baixa no ano que vem. Segundo eles, o mecanismo evitaria que o governo tivesse que fazer alterações na meta ao longo do ano, como ocorreu em 2015. Do outro lado, Levy dizia que o abatimento daria ao Congresso e ao mercado uma sinalização ruim em relação ao compromisso fiscal e tornaria ainda mais difícil aprovar medidas como a recriação da CPMF, pois os parlamentares entenderiam que a medida não é essencial para os cofres públicos. Mesmo assim, a presidente Dilma Rousseff preferiu o abatimento.

Oposição ajudou ministro
A única concessão feita a Levy foi o valor do desconto. O valor defendido originalmente por Barbosa era de R$ 30 bilhões e acabou sendo reduzido para R$ 20 bilhões. Mas mesmo com o martelo batido por Dilma, o ministro da Fazenda não desistiu. Continuou conversando com os integrantes da CMO até a manhã de ontem para tentar convencê- los a retirar o abatimento da proposta que havia sido negociada com o relator da LDO de 2016, Ricardo Teobaldo ( PTB- PE).

O líder do governo na CMO, deputado Paulo Pimenta ( PTRS), ficou sem saber o que fazer. Pressionado por Levy, tentava ganhar tempo e pedia aos assessores que ligassem para Nelson Barbosa, pois a comissão já havia aprovado o parecer do relator prevendo o abatimento. Mas a oposição estendeu a mão a Levy. Um destaque para retirada do PAC da LDO foi apresentado pelo deputado Samuel Moreira ( PSDB- SP) e aprovado.

A amarração do ministro com os parlamentares acabou sendo feita de modo que o Planalto foi obrigado a ceder à ideia da Fazenda: em troca da retirada do abatimento, os parlamentares se comprometeram a não dificultar a votação do projeto que altera a meta fiscal deste ano, considerada urgente pela equipe econômica. Caso ela não seja aprovada até o fim do ano, a presidente pode responder por desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal ( LRF). Na negociação também entrou o empenho de emendas parlamentares.

— O importante é que o acordo permite avançar na pauta e votar a meta de 2015 — disse o relator da LDO de 2015, deputado Hugo Leal ( PROS- RJ).

Integrantes do governo afirmam que Levy está trabalhando para que pelo menos uma parte do esforço fiscal que não foi obtido em 2015 seja garantida em 2016. Mas seus críticos na equipe destacam que ele não está preocupado com o risco de não realizar a meta do ano que vem, pois provavelmente não estará no governo no próximo ano.

Lula sobre Levy: ‘não dá mais’
O ex- presidente Lula tenta emplacar o nome do ex- presidente do Banco Central e presidente do Conselho da J& F Investimentos, Henrique Meirelles, para o lugar de Levy. Ontem, Lula retomou as críticas ao ministro da Fazenda, e a defender a necessidade de mudanças na economia. Em reunião com senadores, Lula disse que o modelo econômico de Levy está “exaurido”. O ex- presidente disse a petistas que “Meirelles” é o seu candidato e pediu que outros aliados trabalhem pelo ex- presidente do BC.

A senadores, Lula reiterou que sua preocupação é com a economia sombria em 2016, com alto desemprego e retração do PIB. Segundo um aliado, Lula disse que “não dá mais” para a permanência de Levy .

Os interlocutores do Planalto admitem, porém, que essa campanha de Lula, que ainda não convenceu a presidente Dilma, se intensificou desde que a operação Zelotes — que revelou um esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais ( Carf ) — levou a Polícia Federal a fazer uma operação de busca e apreensão na empresa do filho do ex- presidente.

Técnicos dizem que Meirelles tem perfil tão fiscalista quanto Levy. E lembram que qualquer um que comande a Fazenda terá dificuldades porque o maior problema é a fragilidade política da própria presidente Dilma.

A comissão também aprovou uma emenda do PSDB que garante recursos para o reajuste dos benefícios do Bolsa Família no próximo ano. “O Projeto e a Lei Orçamentária de 2016 contemplarão recursos para o Programa Bolsa Família em valor suficiente para assegurar o reajuste de todos os seus benefícios financeiros, de acordo com a taxa de inflação”, diz o texto.

Troca pode estar sendo superestimada

Por Leandra Peres – Valor Econômico

BRASÍLIA - O mercado financeiro tem respaldado com indisfarçáveis aumentos no Ibovespa e quedas no câmbio a eventual chegada do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles ao Ministério da Fazenda. Mas o que pode estar acontecendo aí é um caso clássico de sobrepreço.

Meirelles não representa uma política econômica diferente de Joaquim Levy. Portanto, deduz-se que o caminho atual será muito parecido com o que faria o ex-chefe do BC e que essa não é a explicação principal para o ajuste de preços. A euforia com a troca de comando parece resultado da visão de que Meirelles teria "porteira fechada", autonomia para nomear um novo BC e um novo ministro do Planejamento. Formaria uma equipe econômica mais coesa e capaz de impor à presidente Dilma Rousseff uma coerência na política econômica que não existe hoje.

De fato, o governo ganharia com a maior capacidade de articulação de Meirelles. Mas não dá para esquecer os muitos elogios que recebeu o ministro Levy quando começou a negociar a pauta econômica com o Congresso. Naquele tempo, que nem é tão distante, ele era o articulador favorito do governo e dos parlamentares. Não é mais, como se pode ver pelas declarações de ontem no Valor.

Um outro ganho que o ex-presidente do BC pode trazer é a vasta experiência acumulada no governo Lula dos embates com o PT e o apoio velado que teria do PSDB e explícito do PMDB, Não custa lembrar, porém, que o PT chefia o tiro ao alvo a Levy, mas o PSDB é guiado pelo vislumbre de voltar ao poder em 2018 e o PMDB acha que Meirelles é mesmo um ótimo ministro da Fazenda, especialmente de um governo pemedebista.

Também é indiscutível a vantagem de uma equipe econômica coesa, onde todos remem para o mesmo lado e onde as propostas que chegam à presidente da República não trazem contradições insolúveis que exigem a arbitragem constante da chefe do Executivo. Mas até esse ganho precisa ser relativizado.

É ingenuidade política, ou um imenso desejo, achar que ministros poderosos, autônomos, impõem decisões a um presidente da República. Basta lembrar as inúmeras sessões de convencimento que o então poderoso e respeitado ministro Fernando Henrique Cardoso teve com o então presidente Itamar Franco. E naquela época, ao contrário de agora, havia um plano econômico de sucesso na praça. Alguém imagina um encontro desse entre Dilma e Meirelles? A presidente terá que ser convencida por um ministro de quem desconfia e de quem não gosta, isso só para começo de conversa.

A chegada do ex-presidente do BC, por si só, não representará uma capitulação, uma quase-renúncia. É preciso que Dilma Rousseff queira a política que esperam de Meirelles, que esteja disposta a abrir mão de seu governo. E os sinais não indicam que tenhamos chegado a esse ponto. Pode até ser que o momento chegue, mas hoje, não é o que se desenha.

Olhando pelo curto retrovisor do segundo mandato, Dilma deu autonomia a Levy para fazer tudo aquilo com que ela concordava. Os preços relativos mudaram, a energia elétrica subiu, a gasolina também e o dinheiro novo ao BNDES secou. Mas foi Dilma quem decidiu que o primeiro corte de gastos do ano seria de R$ 69,9 bilhões e não os R$ 70 bilhões anunciados por Levy. Foi a presidente quem assinou embaixo do orçamento deficitário, mesmo avisada do risco de downgrade. Foi a presidente quem autorizou, ontem mesmo, que o governo negociasse uma meta fiscal com abatimento de investimentos do PAC em 2016, mandando para o espaço qualquer tentativa de retomar a credibilidade fiscal.

É indiscutível que o ministro Levy chegou a um ponto de onde é difícil que se recupere. Assim como é indiscutível que a presidente terá que tomar uma decisão sobre como fortalecer sua equipe econômica. A única coisa que não está clara é que a saída encontrada por ela seja abdicar de seu mandato. Especialmente num momento em que a tese do impeachment parece perder força e ela vislumbra a chance de chegar a 2018.

Aécio anuncia reação do PSDB contra crise

• Partido, derrotado na eleição presidencial de 2014, muda forma de atuação e prepara série de propostas para economia

Isabela Bonfim - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Criticado pela aliança com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e por ser pouco atuante na retomada da economia, o PSDB resolveu agir nesta semana. Rompeu com o peemedebista, negociou a aprovação de pautas econômicas com o governo e já começa a anunciar a divulgação de documento com propostas para o ano que vem. O PSDB busca maior empatia com o eleitorado nas eleições municipais de 2016, além de sinalização para o mercado financeiro.

“Vamos apresentar ao País um diagnóstico da gravidade da crise e do que nos espera para o ano que vem, mas principalmente propostas na área social, em razão da gravidade da crise pela qual passam hoje milhões de famílias brasileiras”, afirmou Aécio Neves (PSDB-MG), presidente do partido.

O documento será uma revisão da plataforma de campanha presidencial de Aécio em 2014, com propostas como pacto federativo e reforma tributária, além de enfoque social. A Executiva da legenda se reúne em duas semanas para fechar detalhes, e a apresentação da carta deve ser feita no início de dezembro em pronunciamento do próprio senador, que prometeu uma “fala forte”.

A estratégia integra uma tentativa de recuperar o protagonismo do debate econômico, perdido desde a derrota na eleição de 2014. Em um ano de crise econômica, tucanos chegaram a apoiar algumas das chamadas “pautas-bomba” no Congresso. Algumas delas em contradição com a defesa histórica feita pela sigla, como o fim do fator previdenciário – medida aprovada pelo governo Fernando Henrique Cardoso.

Há duas semanas, os tucanos assistiram ao PMDB lançar um documento com propostas para a economia que destoavam das defendidas pelo PT. É dentro dessa estratégia que se explica a sinalização com o governo na negociação direta pela aprovação de pautas do ajuste fiscal. A oposição anunciou acordo para aprovar a Desvinculação de Receitas da União (DRU) com alíquota de 25% na terça-feira. O pacto foi celebrado com um aperto de mãos entre os líderes José Guimarães (PT-CE) e Bruno Araújo (PSDB-PE).

Segundo Aécio, o apoio às pautas econômicas são uma demonstração do compromisso do PSDB com as questões que são cruciais para o País. “Não vamos fazer como o PT que, quando era oposição, encontrava vício de origem em tudo que vinha do Palácio, como a Lei de Responsabilidade Fiscal e o Plano Real.”

Merval Pereira: Questões na repatriação

- O Globo

O projeto de lei que autorizou a repatriação ou legalização de dinheiro depositado no exterior sem estar declarado oficialmente ao Banco Central corre o risco de ser impugnado na Justiça. O deputado Miro Teixeira lembra que o Código Tributário Nacional é uma lei complementar que só pode ser alterada por outra lei do mesmo nível.

A definição já tem jurisprudência no Supremo Tribunal Federal, o que tornam inconstitucionais as mudanças introduzidas pelo projeto aprovado ontem na Câmara. Além do mais, há no Código Tributário Nacional uma determinação de que crimes e contravenções não podem ser anistiados.

O governo só fez a mudança através de um projeto de lei porque para aprovar uma lei complementar precisaria de maioria absoluta da Câmara, o que não conseguiria, como ficou demonstrado na votação de quarta- feira à noite. O projeto foi aprovado por um placar apertado de 230 a favor e 213 contra.

O Ministério Público, que já se colocou contra o projeto de lei por considerá- lo muito amplo e que pode ajudar os envolvidos em processos de corrupção em curso, como a Lava- Jato, pode recorrer ao Supremo, ou simplesmente ignorar a nova lei, usando as informações sobre o dinheiro regularizado para processar seus possuidores.

De qualquer maneira o projeto ainda vai sofrer alterações no Senado e retornará à Câmara antes de ganhar forma final, e por isso ainda há tempo para mudanças importantes. O PSDB conseguiu aprovar no final da sessão um aditivo que determina que detentores de mandatos eletivos e funções públicas, assim como parentes até segundo grau, não poderão se utilizar da lei para legalizar dinheiro.

Essa medida, se mantida, evitará boa parte da leniência com que a nova legislação trata os possuidores de dinheiro ilegal no exterior. A começar pelo próprio presidente da Câmara, Eduardo Cunha, às voltas com a lei devido a um dinheiro ilegal que mantém em contas e trusts na Suíça.

A incongruência maior é que para se beneficiar da anistia o declarante terá que garantir que a origem do dinheiro é legal. Se é assim, como anistiar crimes como lavagem de dinheiro ou descaminho ( sonegação de imposto na exportação ou importação de produtos) que por si só caracterizam como de origem ilícita o dinheiro a ser repatriado?

Para completar as dificuldades do projeto, ele prevê que parte dos recursos arrecadados com as multas alimentaria um fundo de compensação para estados que viessem a ter perdas decorrentes de uma projetada unificação das alíquotas do ICMS. Tal fundo, criado por uma medida provisória, já não existe mais pois a MP, não tendo sido votada, perdeu a validade às vésperas da votação.

O projeto de repatriação de dinheiro é um instrumento comum em diversos países, já foi utilizado no Brasil e está nos planos dos governos petistas desde quando Antonio Palocci era ministro da Fazenda de Lula. O problema maior com ele é a circunstância atual, em que o país se debate numa ação contra a corrupção de amplo espectro que pode ser boicotada pela nova lei. Além do mais, os crimes anistiados foram muito ampliados.

PMDB na luta
O PMDB vai colocar em discussão sua proposta de programa de governo na convenção do próximo dia 17, com a intenção de aprová- lo com o apoio majoritário e transformá- lo em uma bandeira do partido para os próximos anos.

O relator do projeto será o senador Romero Jucá, e todos os diretórios nacionais e regionais receberão o material para usá- lo, quando menos, nas eleições municipais de 2016. Mas ele pode servir como um programa emergencial se, em algum momento, a grave situação econômica e social propiciar uma mudança no quadro político, levando ao impeachment da presidente Dilma.

Um detalhe politicamente importante é que o último parágrafo do programa lançado pelo Instituto Ulysses Guimarães, presidido pelo ex- ministro Moreira Franco, deixava explícito que o partido, diante da gravidade da situação, se oferece para um governo de transição sem pensar em uma reeleição.

O objetivo seria a união nacional em torno de um projeto de governo que possa ser continuado depois de um mandato tampão. Essa explicitação, que certamente causaria abalos políticos com o PT, foi retirada do texto, mas o sentido da proposta continua o mesmo.

Eliane Cantanhêde: Novo partido

- O Estado de S. Paulo

Com o governo Dilma Rousseff paralisado e o ex-presidente Lula, ao contrário, se mexendo freneticamente, parte do PT e diferentes setores da esquerda discutem como se descolar da crise política, econômica e ética e se movem em direção a um projeto ambicioso: a criação de um novo partido.

As articulações, restritas aos bastidores do Congresso e a reuniões fechadas em apartamentos funcionais, partem da constatação de que o Brasil vive o fim de um ciclo político. Depois de 13 anos no poder, do fiasco do governo Dilma e do imenso desgaste da imagem do PT e até do próprio Lula, pesquisa Ibope indica que o partido passou a ter a maior rejeição do País. É hora de mudar e de resgatar as teses da esquerda que afundam junto com a era petista.

Além da avaliação política, há também uma ameaça objetiva. Atrás dos diretores e gerentes da Petrobrás, dos donos e executivos das maiores empreiteiras, dos doleiros e dos políticos, os próximos da fila da Lava Jato, em 2016, serão os três partidos envolvidos no chamado “petrolão”: PT, PMDB e PP.

Esses partidos devem ser chamados a contribuir para o ressarcimento da Petrobrás por perdas que, segundo o Estado, podem chegar a R$ 42 bilhões. E há ainda a possibilidade de multas, bloqueio do Fundo Partidário e até suspensão do próprio registro de funcionamento – em pleno ano da eleição municipal. Golpes que podem ser mortais.

Participam das conversas parlamentares do PT, PSOL, PDT e PSB e da Rede da Marina Silva, mas também líderes de movimentos sociais identificados com as esquerdas, mas não braços do PT, como são CUT, MST e UNE. Na semana passada, por exemplo, o coordenador-geral do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), Guilherme Boulos, viajou a Brasília para trocar figurinhas sobre os rumos da esquerda e a falta de rumos do PT. Reuniu-se com pelo menos dois senadores, Lindbergh Farias, lulista do PT do Rio, e Randolfe Rodrigues, ex-PT, ex-PSOL e atual Rede do Amapá.

A fila é grande e inclui o deputado Alessandro Molon, que foi 18 anos do PT e foi o deputado mais votado do partido no Rio, mas não teve paciência para esperar o novo partido e pulou na Rede Sustentabilidade. Mudou de partido, mas não abandonou as conversas com as esquerdas.

Uma das grandes questões, aliás, é qual o papel de Marina Silva e da Rede. Com a política brasileira tão polarizada entre PT e PSDB, com a Polícia Federal e o Ministério Público aproximando-se perigosamente de Lula e com a falta de novos líderes no horizonte, Marina é considerada um personagem-chave de qualquer articulação das esquerdas.

Em 1985, nos estertores do ciclo militar, a dissidência do PDS apostou em Aureliano Chaves pelo Colégio Eleitoral indireto e, quando a aposta furou, partiu para o plano B: aderiu à eleição do pemedebista Tancredo Neves, contra Paulo Maluf, e depois lançou o PFL, atual DEM.

Em 1988, com a Constituinte encerrando o ciclo da transição, a dissidência à esquerda do PMDB jogou suas fichas: nas primeiras eleições diretas para presidente, em 1989, apoiaria a candidatura do deputado Ulysses Guimarães, mas não a do governador Orestes Quércia. Acabou dando Ulysses, mas era tarde: FHC, Montoro, Covas, Serra, Richa já tinham decidido criar o PSDB.

Desde a chegada de Lula ao Planalto, em 2003, o PT já perdeu um pedaço para o PSOL, outro quando Marina trocou de legenda e mais um agora com a ida de Marta Suplicy para o PMDB e de Molon para a Rede. Mas todas essas cisões foram congressuais, sem impacto real nas bases. Em 2016, os dissidentes querem abandonar a tese de “refundação do PT” e partir para algo mais concreto, estratégico e abrangente: um novo partido que possa, além de resgatar um discurso de esquerda, devolver a esperança ao imenso mar de desesperança em que se debatem os petistas e a esquerda. É um balão de ensaio, mas faz sentido.

Bernardo Mello Franco: Água nas canelas

- Folha de S. Paulo

Não foi um súbito acesso de ética que levou o PSDB a abandonar o deputado Eduardo Cunha. Os tucanos só pularam do barco furado porque começaram a sentir a água nas próprias canelas.

A aliança já afetava a imagem do partido. Ao voltar a seus Estados, os parlamentares passaram a ser cobrados pelos eleitores. Era cada vez mais difícil se dizer indignado com a corrupção do governo e ignorar as provas contra o correntista suíço.

Ao mesmo tempo, o PSDB se deu conta de que foi enrolado por Cunha. O deputado usou o apoio do partido e a ameaça do impeachment para forçar o governo a negociar. Deu certo. Conseguiu um encontro com o ex-presidente Lula e conversas frequentes com o ministro Jaques Wagner.

Com atraso, os tucanos perceberam que o impedimento de Dilma Rousseff se tornou uma hipótese distante. O enfraquecimento de Cunha, as liminares concedidas pelo Supremo e a reforma ministerial fizeram o vento virar a favor do Planalto.

Isso não significa que a presidente deixou de correr riscos, mas obriga a oposição a lidar com um cenário em que o cenário mais provável é sua permanência até 2018. Foi por isso que Aécio Neves admitiu, nesta quinta, que o impeachment "não pode ser a pauta única" da oposição.

A ficha caiu para o senador, mas continua entalada na garganta do deputado Carlos Sampaio. No discurso em que anunciou o rompimento com Cunha, o líder do PSDB afirmou que o peemedebista não pode mais presidir a Câmara, mas ainda "tem todos os elementos" para deferir o pedido de impeachment.

Sampaio é um deputado criativo.

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"Quem é que não tem briga dentro de casa? Quem não tem um descontrole? Quem não exagera numa discussão?" Na tentativa de defender o indefensável, o deputado Pedro Paulo fez cariocas se lembrarem de uma frase do goleiro Bruno: "Quem nunca saiu na mão com a mulher?"

César Felício: Nação partida

• Argentina deve renovar sua cisão nas eleições

- Valor Econômico

Não deixa de ser irônico, na eleição argentina que se resolverá no dia 22, que o maior adversário do kirchnerismo, Mauricio Macri, tenha em seu estilo algo em comum com a presidente Cristina Kirchner. O verticalismo na relação política, em que sempre se opta pelo risco maior de isolamento, caso a opção pela união implique em concessões relevantes aos aliados, é o traço de identificação mais marcante.

Normalmente identificado como conservador, Macri convergiu para o centro há muito tempo. Segundo um correspondente de um jornal americano em Buenos Aires, nos Estados Unidos seria um político democrata, e não republicano.

Há cerca de dois anos, em conversa com o Valor e "Folha de S.Paulo", Macri citou como referência nacional Arturo Frondizi, um presidente que combatia o peronismo e que foi derrubado pelos militares por não conseguir desarticulá-lo eleitoralmente, em 1962. Frondizi formou um partido chamado "União Cívica Radical Intransigente", cujo nome é autoexplicativo. A referência internacional que citou foi Fernando Henrique Cardoso.

A menção a FHC, em encontro com os jornalistas brasileiros, foi estudada: Macri parte do pressuposto que a política do continente se comporta como uma onda, e que um eventual triunfo seu irá impactar outras eleições, a começar da legislativa na Venezuela em dezembro. O ex-presidente brasileiro parece concordar.

Em entrevista ao "La Nacion" há duas semanas, FHC afirmou que o contágio de uma vitória oposicionista argentina na Venezuela seria "uma maravilha". Mas usou a entrevista para aconselhar Macri a ampliar alianças. "A habilidade de conseguir consensos é o que fará com que as pessoas confiem que Macri terá capacidade para governar a todos".

O prefeito de Buenos Aires conta com o apoio da União Cívica Radical e da deputada Elisa Carrió, duas forças antiperonistas tradicionais, que no espectro ideológico argentino equivaleriam, grosso modo, ao que era o PSDB no Brasil antes de Fernando Henrique chegar ao poder, em 1994. Assim que terminou o segundo turno, o candidato inaugurou uma estátua de Perón, em um aceno oblíquo aos dissidentes do peronismo.

Mas aos aliados Macri não cedeu a vaga de vice na chapa e nem o governo do estado mais populoso, a província de Buenos Aires, que reúne quase 40% do eleitorado. Os postos ficaram com duas políticas sem luz própria.

O prefeito de Buenos Aires nunca escondeu o seu desprezo por alianças. Para Macri, partidos e caciques políticos têm pouco valor. O que importa é construir uma imagem pública que estabeleça pontos de contato e atraia as mais díspares faixas do eleitorado. De acordo com Macri, os líderes partidários não controlam suas bases. É o que cansou de dizer em entrevistas a correspondentes internacionais todas as vezes em que era obrigado a responder como pretendia chegar à Presidência com tamanha soberba.

Macri nasceu na antipolítica. Filho de um plutocrata que enriqueceu no regime militar e no menemismo, ganhou notoriedade depois de ser vítima de um sequestro em 1991. Tornou-se cartola do Boca Juniors e elegeu-se prefeito de Buenos Aires, sucedendo a um desastroso governo da esquerda não peronista.

O kirchnerismo se apropriou do peronismo, mas ao eleger-se em 2003 o marido de Cristina, Nestor Kirchner, também era a seu modo um "outsider". Um governador da província de Santa Cruz chegar à Presidência era o equivalente ao governador do Amazonas conquistar o Palácio do Planalto.

Caberá a Macri, se eleito, administrar seu estilo personalista com um governo de minoria no Legislativo. Sua coalizão elegeu apenas 15 dos 72 senadores e 91 dos 257 deputados argentinos. Com muito a fazer: desde que ficou claro para Cristina que não haveria um terceiro mandato, a presidente argentina trabalhou para institucionalizar em lei diversas políticas que deixam seu sucessor engessado.

Entre elas, tornou obrigatória a autorização legislativa, com quórum de dois terços, para a diminuição da participação acionária do Estado em qualquer empresa. Os diretores do Banco Central ligados a corrente "La Campora", uma ala governista comandada pelo filho da presidente, contam com mandato até 2021.

Não é nada que não se possa modificar, dada a fluidez das instituições, mas o esforço para romper essas amarras deve reforçar o clima de confrontação.

O primeiro desafio terá nome e sobrenome: Alejandro Vanoli. É o presidente do Banco Central argentino, um kirchnerista empedernido, com mandato até 2019. A independência do BC argentino é relativa: o presidente tem mandato, mas pode ser destituído mediante consulta ao Legislativo. Em 2010, quando quis usar as reservas do BC para financiar gastos correntes, Cristina decidiu destituir o então presidente do banco, Martín Redrado, durante o recesso do Congresso. Redrado recorreu ao Judiciário, o impasse se arrastou e a presidente desmoralizou a institucionalidade argentina.

Caberá a Macri agora fazer o mesmo, se for eleito e realmente quiser mudar a política cambial e monetária do País. Um caminho para defenestrar Vanoli, como observou ontem o jornal "La Nacion", poderá ser o da judicialização. Pesa contra o atual presidente do BC denúncia de venda de contratos futuros de dólar com taxa cambial irregular.

No jogo eleitoral argentino, o conciliador por excelência é o rival de Macri, Daniel Scioli, que é o candidato apoiado por Cristina. O governador da província de Buenos Aires conseguiu prevalecer sobre rivais internos por ser o plano B de todos. Era assim, até o início da campanha. A dinâmica eleitoral o empurrou para as posições mais intransigentes. Scioli era favorito para levar no primeiro turno, mas ficou apenas três pontos percentuais à frente de Macri e agora tenta fazer a rejeição do rival subir demonizando-o.

É algo a que o Brasil já se acostumou. Em 1989, Collor estigmatizou Lula. Em 2006, Lula fez o mesmo com Alckmin. No ano passado, Dilma e Aécio levaram a radicalização ideológica a um nível estarrecedor. Na Argentina, jamais se disputou um segundo turno. Do mesmo modo, o país vizinho terá uma experiência inédita neste fim de semana, com o primeiro debate presidencial relevante da história. Scioli irá enfrentar Macri perante as câmeras em um clima de tudo ou nada. A Argentina já possui todo o instrumental para renovar sua cisão.

Ruy Castro: Amigos, amigos

- Folha de S. Paulo

O ditado "Amigos, amigos, negócios à parte" está démodé. Não é mais necessário separar a amizade dos negócios. Ao contrário, pode-se muito bem ser amigo de alguém e fazer negócios com este. É até melhor. Como criticar alguém por prestar favores a um amigo? Em caso de zebra, a alegação de amizade também estende um vasto manto que a tudo encobre. E "honni soit qui mal y pense" –maldito seja quem nisso veja maldade.

O ex-presidente Lula fez muitas amizades pela vida. Começou amigo de intelectuais, jornalistas, padres, juristas, cantores, feministas, anistiados, velhos socialistas, liberais e democratas em geral. Mas essa turma só queria saber de produzir dissertações de mestrado, cozinhar macarrão uns para os outros e vender camiseta e estrelinha em porta de teatro. Alguns tentavam até obrigá-lo a ler livros. Lula custou a descobrir que, com eles, não chegaria a lugar nenhum.

Deu-se melhor quando os trocou por banqueiros, empreiteiros, latifundiários, usineiros, políticos da pesada –Sarney, Collor, Maluf–, especuladores, lobistas e doleiros. Esse pessoal, sim, sabe dar valor às amizades –com trocadilho, por favor. São pródigos em fornecer jatinhos, ceder de graça apartamentos em São Bernardo ou nos Jardins durante anos, vender triplexes no Guarujá a preço de mãe para filho, fazer doações "atípicas" a institutos fantasmas e pagar milhões por palestras de que não se conhece nenhum registro em vídeo, áudio ou mesmo telepatia. Aos amigos, tudo.

Pena que, em torno dessas pessoas tão generosas, fervam acusações na Justiça envolvendo formação de cartel, assalto aos cofres da Petrobras, favores tributários, compra de medidas provisórias, pagamento de propinas, predação de recursos públicos etc.

E daí? –diria Lula. Amigos, amigos, negócios fazem parte.

Míriam Leitão: O valor do vale

- O Globo

Quanto vale um vale? Sobre isso se discutirá nos próximos dias. A presidente Dilma ontem, na visita do sétimo dia, disse que a multa será de R$ 250 milhões para a Samarco. Mas quanto dessa multa vai para o Vale do Rio Doce? Normalmente as multas engordam contas paradas no governo. O Rio Doce pode estar sendo cimentado neste momento, explica um procurador.

Demorou uma semana para que o senso de urgência chegasse ao governo, e ontem, finalmente, a presidente Dilma visitou o local, mesmo assim há razoáveis dúvidas sobre a efetividade da ação governamental. Quando as empresas pagam as multas, como a que o governo aplicou na Samarco, o dinheiro fica lá parado. Ao todo o governo tem R$ 5 bilhões em multas por crimes ambientais e para as quais não há mais recurso. Ao todo, há R$ 30 bilhões. Aplicar multa na Samarco sem que o dinheiro vá para o Vale do Rio Doce é uma forma de iludir a opinião pública.

Há dois perigos imediatos rondando a região atingida pela tragédia em Mariana. A barragem do Fundão, a primeira que rompeu da mineradora Samarco, ainda tem uma parte de rejeitos retida. Só que a base que a segura tem risco de romper e aumentar a inundação de lama. Perigo maior: o rompimento das duas barragens erodiu um pedaço da base de uma terceira muito maior, a de Germano, que tem três vezes mais rejeitos do que a primeira. Se ela se romper será uma inundação ainda pior.

Inundação de que? O governo continua dizendo que a lama não é tóxica. Será? Mineradoras lidam com metais pesados. Mas há outro risco. Não se fala nisso abertamente porque ainda faltam comprovações, mas perto da barragem rompida há uma cava da Vale de extração de ouro. Se tiver havido mistura pode ter arsênico na composição da lama que agora escorre por todo o Vale.

Entrevistei ontem na GloboNews o procurador federal em Minas Gerais Adércio Leite Sampaio e ele contou que esses 50 milhões de metros cúbicos de lama podem cimentar o leito do Rio Doce. Alerta que tem sido feito pelos meus colegas do GLOBO de que a lama está destruindo a vida. Não é um perigo que está de passagem para o mar, é um risco continuado, ele permanece e se sedimenta no fundo do rio da maior bacia hidrográfica do Sudeste.

A presidente do Ibama, Marilene Ramos, que também entrevistei, disse que este é o maior desastre ambiental do Brasil e um dos maiores do mundo provocado por uma mineradora. Além das multas sobre a Samarco, será iniciada uma ação civil pública para responsabilizar a empresa e suas controladoras pelas ações de reparação.

Há danos reparáveis e irreparáveis. Sobre as vidas humanas perdidas, tudo o que se pode fazer é indenizar as famílias. Já suas casas destruídas precisam ser construídas em outro local, mas como a comunidade pediu: os moradores querem ficar juntos como estavam em Bento Rodrigues. A empresa, da Vale e da BHP, ao fazer a análise de risco ambiental havia registrado que Bento Rodrigues não estava na zona de influência da barragem. Imagina! Hoje o distrito não existe mais.

Aí reside outro problema. As mineradoras fazem elas mesmas o estudo de impacto ambiental e o governo sanciona. Elas se fiscalizam. Evidentemente sempre dizem que nada há de errado. Os discordantes podem apenas registrar sua desaprovação. Foi assim com a renovação da licença em 2013.

Mas tudo pode piorar. O novo Código de Mineração que tramita no Congresso aumenta a liberdade das mineradoras. Pelo artigo 109 do substitutivo de autoria do deputado Leonardo Quintão ( PMDB- MG) fica estabelecido que se houver potencial mineral numa região não será possível criar área de proteção ambiental. A mineração tem supremacia sobre tudo o mais.

Na opinião de Marilene Ramos, o Brasil deveria ter, como outros países, um fundo de mineração para reparar o estrago ambiental. As mineradoras são obrigadas por lei a compensar os impactos que causam, mas o que acontece quando uma empresa quebra ou entra em recuperação judicial, como a MMX? A presidente do Ibama acha que dificilmente a empresa de Eike Batista fará a compensação dos danos que causou. É preciso discutir a sério os riscos e custos da mineração. Mas o urgente agora é lutar para impedir a morte do Vale do Rio Doce. Seu valor é incalculável.

Protagonismo tardio – Editorial / O Estado de S. Paulo

Os tucanos não se podem queixar da sorte. No mesmo dia em que decidiram descer do muro e definir uma posição clara pelo afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara e até mesmo pela cassação de seu mandato, por artimanhas do próprio Cunha cerca de uma dúzia de legendas partidárias que compõem a base de apoio ao governo – a metade, partidos nanicos – divulga documento em que manifesta “total apoio e confiança” no parlamentar peemedebista e na forma como tem comandado a Casa de representação dos brasileiros. O PT, por razões óbvias, não subscreve o documento, mas participou das articulações para sua elaboração: foi redigido no gabinete do líder do governo na Câmara, o petista José Guimarães (CE) – aquele que diz que nada entende de transporte de valores.

O êxito de iniciativas de protagonismo político depende em boa medida do contraponto estabelecido pelo eventual antagonista. A imagem negativa de Eduardo Cunha resulta de um amplo consenso, é praticamente unanimidade nacional, de modo que o conchavo urdido para oferecer-lhe “total apoio e confiança” é tudo de que os tucanos necessitavam para respaldar e valorizar aos olhos da opinião pública sua decisão tardia de posicionar-se contra os interesses de um político mendaz e autoritário que para escapar da Justiça tem usado e abusado de todo o poder que sua investidura lhe confere.

A atribulada experiência vivida nos últimos meses pelo PSDB – maior partido da oposição – na ânsia de acelerar um processo de cassação do mandato da presidente Dilma Rousseff talvez tenha ensinado aos tucanos que, embora a política seja considerada a arte de aliar meios a fins, os fins jamais justificam os meios. É o que demonstra na prática, aliás, o retumbante malogro do projeto lulopetista de promover justiça social e prosperidade por decreto governamental.

O PSDB perdeu precioso tempo, desde o início deste ano, perseguindo a ideia do impeachment – que, certamente, cabe na agenda política, mas não pode ser preocupação obsessiva – em vez de cumprir o verdadeiro papel da oposição, que é não apenas denunciar e combater os erros do governo, mas, principalmente, propor ao País projetos alternativos de condução política e recuperação econômica.

Foi o PMDB, ainda formalmente aliado do governo, que tomou a iniciativa de propor um projeto assim. Enquanto isso, os tucanos votavam no Congresso para derrubar propostas com as quais sempre se identificaram, apenas para causar embaraços ao Planalto. Felizmente, esse surto de voluntarismo amador vai sendo superado.

O confronto do PSDB com a base de apoio do governo – reforçada pelo “oposicionista” Solidariedade, do notório deputado Paulinho da Força – revela também a absurda contradição em que se debate o lulopetismo: aliar-se por baixo do pano com seu maior adversário para tentar salvar a pele de uma presidente da República que, na verdade, não apoia efetivamente. Também fica exposta a indecorosa atitude do amontoado de legendas politicamente insignificantes que se dispõem a apoiar Eduardo Cunha pelo que ele verdadeiramente representa: um modo de fazer política inescrupuloso, autoritário, amoral e retrógrado como visão de mundo.

O nível de hipocrisia dos petistas mal disfarçados sob o manto da neutralidade e de seus aliados na luta inglória pela preservação – pelo menos momentânea – dostatus e do mandato de Eduardo Cunha está claramente expresso nos termos do documento apresentado em nome de PMDB, PR, PSC, PP, PSD, PTB, PEN, PMN, PRP, PHS, PTN, PT do B e, de quebra, do Solidariedade: “As denúncias apresentadas (contra Cunha) seguirão o curso do devido processo legal, onde haverá condições de defesa e julgamento por instâncias próprias e o princípio da presunção da inocência. (...) Eventuais disputas políticas não podem prevalecer para paralisar o funcionamento da Casa”. Lido em plenário pelo líder do PSC, André Moura, esse documento foi subscrito pelos 13 partidos que representam mais de 230 parlamentares. Não se trata de simples coincidência o fato de expressões como “devido processo legal”, “condições de defesa”, “julgamento por instâncias próprias” e, muito especialmente, “presunção de inocência” serem truísmos frequentes nas manifestações do PT a respeito da corrupção que malbarata suas fileiras.