quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Opinião do dia – Beto Richa

A ideia de dividir o percentual com estados e prefeitos me parece mais uma tentativa de dividir o ônus político da criação de um novo imposto, do que desejo de ajudar os administradores. Não dá para penalizar o contribuinte com mais taxas.
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Beto Richa é governador do Paraná. O Globo, 16 de setembro de 2015

Aprovar o ajuste será mais difícil do que governo previa

Por Ribamar Oliveira – Valor Econômico

BRASÍLIA - As medidas de ajuste do Orçamento de 2016 enfrentarão grande resistência no Congresso. Em especial, a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), com a qual o governo espera arrecadar R$ 32 bilhões em 2016. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já disse que é impossível aprová-la neste ano.

O fim do abono de permanência concedido aos servidores que adiam a aposentadoria é visto como "erro grosseiro" por consultores do Senado e da Câmara. Conhecido como "pé na cova", equivale ao valor da contribuição previdenciária paga pelo funcionário. Quem adia a aposentadoria recebe o abono, um estímulo para permanecer no serviço público. Tirá-lo seria um "tiro no pé" porque vai estimular pedidos de aposentadorias.

Com a medida, o governo ganharia no curto prazo economia de R$ 1,2 bilhão em 2016, mas teria despesas crescentes no médio e longo prazos por causa das novas aposentadorias. Além disso, com os pedidos de aposentadoria, perderia a elite do funcionalismo, os mais experientes. O governo estima haver 101 mil servidores nessa condição apenas no Executivo. O fim do abono de permanência terá que ser feito por emenda constitucional, o que torna muito difícil sua aprovação.

O uso de emendas parlamentares para cobrir o corte de R$ R$ 3,8 bilhões nos gastos com saúde e R$ 3,8 bilhões no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é outra missão considerada impossível. A Emenda Constitucional 86 tornou obrigatória a execução das emendas parlamentares ao Orçamento, em montante correspondente a 1,2% da receita corrente líquida realizada no exercício anterior, metade para ações e serviços públicos de saúde e a outra metade de livre destinação de deputados e senadores. O total de R$ 7,6 bilhões corresponde ao valor previsto para emendas em 2016, mas não há como obrigar parlamentares a pôr o dinheiro nas ações de saúde e do PAC que o governo deseja.

A quarta medida, que geraria economia de R$ 800 milhões, é uma lei que disciplina a implementação do teto remuneratório do serviço público - pela Constituição, o subsídio mensal de ministro do Supremo Tribunal Federal. Mas cada Poder tem um entendimento sobre o que entra no teto. Só um governo com base parlamentar sólida conseguiria aprovar a lei rapidamente.

Base se nega a dar apoio a pacote fiscal, e Dilma recua

Planalto cogita diminuir vigência da CPMF de quatro para dois anos

Aliados e empresários se opõem a pacote de Dilma

• Planalto aceita rever propostas para driblar resistência encontrada no Congresso

• Líder do PMDB diz que será impossível convencer deputados a abrir mão de emendas para ajudar o governo

Marina Dias, Ranier Bragon, Débora Álvares, Valdo Cruz e Natuza Nery – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dia depois de anunciar seu novo pacote fiscal, a presidente Dilma Rousseff montou uma operação para convencer deputados e senadores aliados a aprová-lo, mas recebeu sinais de que eles resistirão a aprovar a principal medida, a criação de um imposto sobre operações financeiras como a antiga CPMF.

Em duas reuniões no Palácio do Planalto nesta terça (15), Dilma ouviu de sua base críticas à ideia de recriar o chamado imposto do cheque e à retirada da autonomia que os parlamentares têm hoje para destinar a obras em redutos eleitorais os recursos de suas emendas ao Orçamento.

"A CPMF não é suportável e vai causar problemas na economia", resumiu o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A insatisfação com o destino das emendas foi expressada pelo líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ). Para ele, será impossível convencer os deputados a destinar os recursos somente para obras de interesse do governo no PAC.

Após as críticas, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, indicou a parlamentares que o governo vai recuar na sua proposta de usar as emendas para cobrir o corte de R$ 3,8 bilhões em obras do PAC.

Sobre a CPMF, a presidente conta com o apoio de governadores, com quem esteve na noite de segunda (14). Ela espera arrecadar com o novo imposto R$ 32 bilhões.

Sem dinheiro em caixa, os governadores vão sugerir elevar a alíquota proposta pelo governo para o imposto de 0,20% para 0,38%. A diferença iria para os cofres de Estados e municípios. O governo está disposto a reduzir o prazo de vigência do tributo, batizado por eles de CPPrev, de quatro para dois anos.

Em evento no Palácio do Planalto, Dilma antecipou sua disposição de negociar diante das reações negativas. "O governo não aprova a CPMF, quem aprova é o Congresso."

Seu tom foi uma resposta a deputados e senadores aliados que estiveram reunidos com ela e saíram fazendo críticas ao seu pacote fiscal, que depende do Congresso para ser aprovado –15 das 16 medidas têm de ser votadas no Legislativo.

"A CPMF não é o caminho. Aliás, nenhum imposto é", afirmou o líder do PTB, deputado Jovair Arantes (GO). "Quando o governo está bem é difícil aprovar uma medida como essa [CPMF]. Imagina num momento desses", disse o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE).

O próprio Eduardo Cunha desdenhou: "Eu acho que 0,20% ou 0,38% é só o tamanho da derrota. Eu não acredito que passe nem com uma nem com outra".

O governo também enfrentará resistência do empresariado. O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Robson Andrade passou o dia pedindo apoio contra medidas do pacote que atingem o setor.

"Liguei para parlamentares governistas e da oposição para derrubar ou mudar a proposta que retira 30% das verbas do Sistema S, o que pode levar ao fechamento de cursos profissionalizantes em funcionamento", afirmou.

Ministério
Assessores presidenciais acham que Dilma errou ao anunciar o pacote sem informar os presidentes dos partidos aliados antes. Agora, eles esperam que ela corrija o problema com a reforma ministerial que promete anunciar até a próxima quarta-feira (23).

Os aliados querem que ela nomeie alguém com peso político para negociar com o Congresso a aprovação das medidas fiscais.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PMDB defendem que ela troque o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, mas Dilma resiste à ideia.

A Folha apurou que Mercadante ligou para Temer, que está em viagem à Rússia, para consultá-lo em nome de Dilma sobre a possibilidade de Giles Azevedo, assessor especial e homem de confiança da presidente, assumir a Secretaria de Relações Institucionais (que hoje está vaga e perderia o status de ministério). Assim, ele tocaria o dia a dia da articulação política. Temer disse não ver problema.

A deputados Mercadante repetiu o discurso sobre Giles e disse que Ricardo Berzoini, hoje nas Comunicações, também ajudaria na articulação política. Outra fusão cogitada é a da Secretaria de Portos com a de Aeroportos, pastas hoje com o PMDB.

Base rejeita pacote; Cunha diz que CPMF fica para 2016

Cunha diz ser ‘impossível’ votar novo tributo este ano e base rejeita proposta

• Após o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ter atribuído ao Congresso a culpa pelo rebaixamento do Brasil por agência de risco, presidente da Câmara afirma que Legislativo foi desrespeitado e que não há tempo suficiente para a Casa aprovar novo imposto

Daniel Carvalho, Erich Decat e Bernardo Caram - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff tentou nesta terça-feira, 15, buscar apoio da base aliada para levar adiante no Congresso a recriação da CPMF (tributo conhecido como imposto do cheque), mas os líderes da base aliada e da oposição criticaram o pacote do Executivo. Para complicar ainda mais as relações entre os Poderes, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou ser “impossível” a votação do novo tributo este ano no Legislativo.

A presidente comandou duas reuniões com parlamentares no Palácio do Planalto. Os encontros foram tensos e tiveram direito a bate-boca com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ampliando ainda mais a crise entre Executivo e Legislativo. Das 17 medidas anunciadas pelo governo em seu pacote para zerar o déficit orçamentário para 2016, apenas uma não precisa passar pelo Congresso.
Apesar dos apelos da presidente, os congressistas mantiveram-se irredutíveis em não apoiar medidas polêmicas como a volta da CPMF por quatro anos, com uma alíquota de 0,2% - que pode chegar a 0,38% para contemplar também Estados e municípios.

“Eu acho 0,2% ou 0,38% é só o tamanho da derrota (para o governo), eu não acredito que passe nem com 0,2% nem 0,38%”, disse Cunha. “A CPMF é que é insuportável. A CPMF é que vai causar problema na economia, que tem impacto não só na inflação, mas no conjunto de preços. Ela entra em toda cadeia produtiva simultaneamente, em cascata. Então, ela realmente é perniciosa”, afirmou ele.

Um dos focos da rejeição foi o fato de o Palácio do Planalto querer engessar das emendas parlamentares. O governo quer que deputados e senadores destinem os recursos que utilizam para irrigar suas bases eleitorais à Saúde e a obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “De repente, o parlamentar não quer colocar recursos na duplicação da BR-101, mas quer na estrada vicinal de seu município”, exemplificou o líder do PSD, Rogério Rosso (DF).

“Se você tem que jogar os recursos no orçamento (de obras do PAC), vira uma gota d’água no oceano”, disse o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ). “Isso desarruma o debate na partida. Cria um pandemônio desnecessário”, avaliou Picciani.

Com o direcionamento da aplicação das emendas, o governo espera economizar R$ 7,6 bilhões no ano que vem. Alguns líderes entendem que um recuo do governo neste ponto pode abrir espaço para apoio às demais medidas. Eduardo Cunha discorda. “É apenas menos uma derrota”, afirmou.
Senado. O retorno da CPMF também gerou críticas na cúpula do Senado, mas apenas nos bastidores. Há o sentimento de que, caso ela passe pela Câmara, o texto deverá ser alterado, estabelecendo um prazo máximo para a sua vigência. Também foi considerado “irrisório” o esforço do Planalto em relação ao corte de ministérios, que deve ser anunciado por Dilma na próxima quarta-feira, 23.

Apesar das críticas veladas, integrantes da cúpula do Senado deverão manter, estrategicamente, o discurso de “responsabilidade com o País”, mas sem se comprometerem a apoiar propostas consideradas impopulares. O cálculo feito por parte das lideranças da Casa é de que é desnecessário criar um desgaste prematuro com as respectivas bases eleitorais tendo em vista que as propostas poderão ser enterradas na Câmara, onde inicia a tramitação.

“O que vai acontecer na tramitação da CPMF não cabe ao presidente do Congresso Nacional dizer. O Congresso Nacional tende a melhorar todas as medidas que por aqui tramitam”, limitou-se o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

O governo admite dificuldade. “Quando o governo está bem, com uma base social forte, uma base parlamentar forte, já é difícil aprovar uma medida como essa, imagina num momento como este que estamos passando por algumas dificuldades. Mas vamos trabalhar e vamos ver”, disse o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE).

Tenso. Uma declaração do ministro Joaquim Levy ampliou o fosso criado pela crise política entre o Planalto e o Congresso. Em um bate-boca com Rogério Rosso durante a reunião desta terça Levy disse que a agência de classificação de risco Standard & Poor's tirou o grau de investimento do Brasil por causa do Congresso.

Rosso havia recomendado que Levy “tirasse férias de 30 dias” e colocasse em seu lugar “um desenvolvimentista”. Para o parlamentar, a política econômica de Levy “não está funcionando” e, por isso, o ministro deveria ir mais a “chão de fábrica”. “O ministro é o líder da política econômica e tem que ter humildade de ouvir sugestões”, afirmou Rosso.

Cunha reagiu ao comentário com indignação. “Isso, ao invés de ajudar, vai atrapalhar ainda mais o trâmite das medidas dele”, disse Cunha. “Acho um absurdo ele falar isso. É até um desrespeito ao Congresso. Tudo o que ele mandou de proposta de ajuste fiscal foi aprovado no Congresso”, disse Cunha. “Se eles não têm capacidade de buscar o equilíbrio fiscal, não culpem o Congresso que não recusou nada até agora. Não usem isso como elemento para tentar constranger o Congresso a aprovar algo que o Congresso não esteja disposto a aprovar”, afirmou o presidente da Câmara. / Colaborou Isadora Peron

Em reunião com Dilma, aliados criticam pacote

• Líderes governistas resistem à volta da CPMF e a adiar reajuste de servidor

Presidente da Câmara, Cunha diz que proposta de novo imposto sobre movimentações financeiras só deve ser votada no ano que vem e é ‘ insuportável’; parlamentares também reagem a uso de emendas para Saúde e PAC

Empenhada em convencer o Congresso a aprovar o pacote de cortes de despesas e aumento de impostos, com a volta da CPMF, a presidente Dilma ouviu ontem dos líderes aliados que enfrentará dificuldades tanto na Câmara como no Senado. Além da resistência à recriação da CPMF, governistas reclamaram do adiamento do reajuste dos servidores e das propostas de usar emendas parlamentares para financiar projetos na Saúde e no PAC. Dilma anunciou que a reforma ministerial será divulgada até a próxima quarta- feira.

Resistência até na base

• Aliados criticam pacote fiscal; Cunha diz ser impossível votar CPMF este ano

Catarina Alencastro, Cristiane Jungblut, Júnia Gama, Isabel Braga, Evandro Éboli, Bárbara Nascimento, Washington Luiz e Simone Iglesias - O Globo

- BRASÍLIA- A presidente Dilma Rousseff recebeu ontem um recado claro dos líderes dos partidos da base aliada sobre a dificuldade para aprovar as medidas do pacote fiscal, anunciado na segunda-feira. Durante dois encontros, com as bancadas da Câmara e do Senado, Dilma ouviu relatos sobre a dificuldade de aprovar aumentos de impostos em momento de crise econômica, e críticas pelo adiamento do reajuste dos servidores e pelas propostas de utilizar verbas de emendas parlamentares para cumprir obrigações da União na Saúde e no PAC.

A presidente disse aos líderes que vai se empenhar pela aprovação da nova CPMF e que não tinha outra alternativa para reverter o déficit fiscal, já que um aumento da Cide ( contribuição sobre combustíveis), aventado pelo vice Michel Temer, impactaria a inflação, que começa a dar sinais de controle. Ao sair do evento de entrega do prêmio Jovem Cientista, a presidente defendeu as medidas e nomeou a nova CPMF de CPPrev, já que será voltada a corrigir o rombo da Previdência:

— A proposta que o governo fez é de uma contribuição provisória para a Previdência, uma CPPrev. O governo não aprova a CPMF, quem aprova a CPMF é o Congresso. Como será feito no Congresso é um outro processo de discussão. Nós nos empenharemos bastante para aprovar essas medidas, que são necessárias porque passamos por um momento em que é fundamental que saiamos dessa situação de restrição fiscal o mais rápido possível.

O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral ( PT- MS), resumiu o estado de espírito dos líderes no encontro com Dilma:

— Se falássemos ( que aprovar a CPMF) era fácil, não estaríamos falando a verdade. Ela ( Dilma) tem noção clara das dificuldades que vamos enfrentar. Agora, é dialogar muito. É barriga no balcão e conversa.

Segundo aliados, a presidente disse estar “focada” nas negociações e que tem consciência de que o maior problema está na Câmara, por causa das resistências do presidente da Casa, deputado Eduardo Cunha ( PMDB- RJ).

— Vou me envolver e buscar pessoalmente consolidar a fidelização das bancadas. O presidente Obama, no momento de crise, também teve que tomar medidas amargas e fazer opções, cortou salários e até verbas de programas de segurança — disse Dilma, avisando que não abre mão de manter os programas sociais.

Na reunião, os deputados aliados comentaram que qualquer aumento de imposto seria um tema difícil, mas se propuseram a discutir com suas bancadas o assunto.

— A proposta de ajuste dificulta muito a recomposição da base. Com a criação da CPMF, o governo está enfurecendo mais ainda a população e isso vai ter impacto na Câmara. O PR vai discutir, mas é majoritariamente contra a CPMF — disse o líder do partido, Maurício Quintella ( AL).

À tarde, Cunha, que chamou a CPMF de “insuportável”, afirmou ser “impossível” a Câmara votar este ano a criação do tributo. O presidente da Câmara disse que um eventual apoio dos governadores não terá influência sobre os deputados. Perguntado sobre quanto tempo levaria a tramitação da CPMF, deixou claro que será um longo período:

— A desvinculação de receitas está há três meses na CCJ, não saiu de lá ainda. Tem um rito. Ela ( a CPMF) vai primeiro para a CCJ, depois para a comissão especial, lá tem 40 sessões, e não são 40 dias, podem ser até 80 dias. Só depois vai para o plenário. Este ano é impossível votar.

Líder do PSD discute com Levy
Pouco depois de a presidente deixar a sala, o líder do PSD na Câmara, Rogério Rosso ( DF), teve uma discussão acalorada com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Rosso defendia que o governo optasse por uma política mais desenvolvimentista, no que foi retrucado pelo ministro, que apontou o Congresso como um dos responsáveis pelo rebaixamento da nota de crédito do Brasil. A discussão precisou ser interrompida pelo chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante.

O presidente da Câmara respondeu ao ministro da Fazenda em entrevista no fim da tarde:

— Se eles não têm capacidade de buscar o equilíbrio fiscal, não culpem o Congresso, que não recusou nada até agora, e não usem isso como elemento para constranger o Congresso a aprovar algo que não esteja disposto a aprovar, que é um aumento de carga tributária.

Ao contrário do presidente da Câmara, o presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDBAL), disse que será preciso esperar as medidas amadurecerem no Congresso.

— Deixa o pacote assentar. Agora, temos que esperar as medidas chegarem ao Congresso, que vai fazer a sua parte para melhorar essas medidas. Não quero aprofundar a discussão de mérito das propostas até porque não vou predizer o que o Congresso vai fazer ou não. 

FH diz não acreditar na aprovação da CPMF

• Ex- presidente afirma que pelo Congresso ‘ nada passa sem força política’

Silvia Amorim- Globo

- SÃO PAULO- O ex- presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que não acredita na aprovação da CPMF pelo Congresso Nacional. Para ele, faltaria à presidente Dilma Rousseff “fibra política” necessária para obter apoio ao pacote de ajuste fiscal apresentado anteontem pela equipe econômica.

— Eu não acredito que vão aprovar. Basta ver as declarações feitas pelos líderes políticos. É muito difícil sair desta situação se não resolver a crise política — afirmou o ex- presidente, que evitou se posicionar a favor ou contra a recriação do “imposto do cheque”, criado durante a sua gestão, alegando que ainda não sabia detalhes da proposta.

O ex- presidente participou ontem de um seminário em seu instituto em São Paulo para discutir as crises política e econômica no país. Estavam na mesa de debate o ex- presidente do Banco Central Armínio Fraga e o cientista político Sérgio Abranches.

Além da CPMF, FH mostrou pouco otimismo com a implantação do pacote de propostas para enfrentar a crise fiscal:

— A última proposta que apresentaram ontem ( anteontem) é muito difícil que o Congresso aprove, e todo mundo sabe que é difícil. Para passar no Congresso, é preciso ter força política. Nada passa sem força política porque fazer reformas é enfrentar interesses enraizados. Para atravessar isso, é preciso ter fibra política e convicção. Ela ( referindo- se às medidas) vai cair daqui a pouco.

O ex- presidente disse que “a solução para o país hoje é muito mais do que apertar o cinto e fazer corte”, referindo- se à instabilidade política. Nesse cenário, considerou difícil a retomada do controle do país por Dilma:

— Pode haver possibilidade da presidente voltar a ter controle da situação? É difícil. Em tese pode, mas é difícil.

“Quem vai dar as cartas?”
Ao GLOBO, ele adotou um tom ainda mais cético. Para ele, a queda do atual governo é uma “questão de tempo”:

— Se ela não der uma virada, é uma questão de tempo. E eu não vejo como ela possa dar uma virada porque ela está perdendo a base do partido dela.

FH também usou a noção de tempo ao se referir às alternativas para a crise política.

— Qualquer processo de solução política não é rápido, é custoso, e hoje nem se sabe quem fará esse jogo. Em política, tem que saber a hora. Tem que saber calar.

Sobre a possibilidade de o PMDB ser a alternativa política em caso de saída de Dilma, FH preferiu um discurso cauteloso.

— Temos que ver o que a LavaJato vai significar nisso tudo. Enquanto isso não ficar mais claro, não há o que fazer. Quem vai dar as cartas no partido ( PMDB)? É uma situação muito difícil.

O ex- presidente tem defendido junto a outros líderes do PSDB que recolham neste momento suas pretensões políticas individuais e busquem unidade. Ontem, ele reforçou o discurso:

— Um quer que a Dilma saia hoje. Outro que tenha nova eleição. Outro que ela fique até 2018. Até entendo que todo político tenha seus interesses pessoais, mas tem hora em que temos que entender que há algo maior em jogo, o país.

CUT ataca pacote do governo, e sindicalistas invadem o MEC

• Fórum de servidores planeja marcha em Brasília contra ajuste

Jessica Moura* Renata Mariz - O Globo

- BRASÍLIA E SÃO PAULO - Um dia depois de o governo anunciar medidas para contenção de gastos, os presidentes das duas maiores centrais sindicais do país — Central Única dos Trabalhadores ( CUT) e Força Sindical — criticaram duramente o pacote de ajuste fiscal. Em ato pela campanha salarial unificada de diversas categorias, realizado ontem na capital paulista em frente à sede da Federação das Indústrias de São Paulo ( Fiesp), Vagner Freitas, presidente da CUT, entidade alinhada ao governo, considerou “lamentável” o pacote de ajuste, que em sua visão vai penalizar ainda mais os trabalhadores.

— É um pacote recessivo, que imputa a culpa da crise aos trabalhadores e vai contra as propostas que a CUT tem apresentado — disse Freitas.

Em nota, Miguel Torres, presidente da Força Sindical, disse que o pacote transfere “de forma nefasta” aos trabalhadores o ônus dos erros da política econômica. “O governo fez uma opção errada de política econômica, e nós, trabalhadores, não estamos dispostos a pagar esta conta”, disse Torres. Para ele, a ideia de congelar os salários dos servidores federais é “absurda”.

Em comunicado divulgado ontem no site da CUT, Freitas disse ainda que as medidas estão “na contramão das necessidades do país e dos trabalhadores, pois onera a atividade econômica e reduz gastos sociais em um momento que a recessão atinge a todos”.

“Nenhuma das medidas aponta para a retomada do crescimento e geração de empregos, que são os problemas mais urgentes e graves que enfrentamos no país”, disse o presidente da CUT no site, informando que pedirá uma audiência à presidente Dilma Rousseff para apresentar “nossas propostas”.

Também em reação ao pacote do governo, servidores técnicos das universidades federais ocuparam por sete horas a Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação ( MEC). Só saíram após interferência de parlamentares petistas e a promessa de serem recebidos no Ministério do Planejamento.

A categoria reivindica um aumento de 9,5% nos salários no próximo ano e 5,5% para 2017. O MEC ofereceu um reajuste de 10,8% que seria pago em duas parcelas a partir de janeiro de 2016. Contudo, com o anúncio do pacote de medidas do ajuste fiscal anteontem, o reajuste só seria pago em agosto do ano que vem.

A greve atinge 63 universidades federais e tem a adesão de 180 mil trabalhadores, segundo o sindicato da categoria, a Fasubra. Para o coordenador- geral da entidade, Gibran Jordão, não há perspectiva para encerrar a greve.

Em nota, o Ministério da Educação afirmou que os servidores foram recebidos “normalmente” no ministério para debater a pauta de reivindicações da categoria. Segundo a pasta, quando os servidores disseram que iriam ocupar o terceiro andar, “imediatamente foram recebidos pelo secretário executivo”.

Para discutir medidas contra o pacote do governo, mais de 20 entidades sindicais, que compõem o Fórum dos Servidores Públicos Federais, se reuniram ontem em Brasília. As categorias planejam uma marcha sexta- feira, em São Paulo, onde pretendem reunir cerca de 20 mil pessoas, como um primeiro passo rumo a uma possível greve geral.

Segundo Paulo Rizzo, presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, a proposta governista já não atendia aos anseios dos servidores públicos federais, que exigiam um reajuste mais próximo da inflação, de cerca de 10%, no ano que vem. No entanto, explicou, a promessa foi de 5,5% em 2016 e 5% em 2017. O pacote de medidas do governo adiou essa correção de janeiro para agosto.

Ontem, em entrevista ao canal oficial do governo, NBR, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se referiu ao adiamento do reajuste do funcionalismo. Ele disse que seria “natural distribuir um pouco esse esforço ( fiscal)”.

(* Estagiária sob supervisão de Francisco Leali)

Servidores querem barrar medidas no Congresso

Por Edna Simão e Camilla Veras Mota – Valor Econômico

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Os servidores públicos federais vão tentar barrar no Congresso Nacional o adiamento do reajuste salarial, suspensão de concursos e o fim do abono permanência que fazem parte do pacote de medidas anunciadas o governo para reduzir gastos para conseguir reverter um déficit primário de 0,34% do Produto Interno Bruto (PIB) do setor público consolidado em um superávit de 0,7% no ano que vem. Somente com essas três medidas, a equipe econômica terá uma economia de R$ 9,7 bilhões. O valor sobe para R$ 10,5 bilhões se o governo conseguir implementar o teto remuneratório do serviço público.

Apesar da indignação do funcionalismo público, o secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Sérgio Ronaldo da Silva, destacou que ainda é cedo para se falar em greve geral. Até porque, essa negociação também teria que envolver os sindicatos que representam a iniciativa privada.

Silva admite, no entanto, que as negociações salariais para que os servidores em greve voltem ao trabalho poderão ser comprometidas. No caso dos servidores do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a greve foi iniciada em julho e compromete os serviços prestados à população. Segundo o secretário-geral da Condsef, a tendência era que os funcionários públicos aceitassem a proposta de reajuste de 10,8%, dividida em dois anos a partir de janeiro. Agora, as medidas anunciadas pelo governo terão que ser rediscutidas.

Novas assembleias serão realizadas no fim de semana para definir qual a será a resposta da categoria para as medidas anunciadas pelo governo. Ontem à noite também foi realizada uma reunião do Fórum dos Servidores Públicos e o assunto também seria tratado. Somente com o adiamento do reajuste dos servidores, a equipe econômica terá uma economia de R$ 7 bilhões. A implementação depende de negociação com o funcionalismo público e envio de projeto de lei ao Congresso Nacional.

"Estamos no momento de se fazer o debate. Existe uma nova realidade de adiamento do reajuste de janeiro para agosto, retirada de ditos e suspensão de concursos. Os servidores públicos levaram uma paulada", disse Silva. "Estávamos chegando a um consenso em torno dos 10,8%, mesmo estando muito aquém."

O último acordo firmado entre governo e servidores públicos foi em 2012, quando as categorias receberam 15,8% de reajuste distribuído nos anos de 2013, 2014 e 2015. Para garantir os reajustes em 2016, os funcionários públicos precisam chegar a um consenso com o governo para garantir recursos no Orçamento.

Além do adiamento do reajuste salarial, os servidores estão confiantes que conseguirão impedir o fim do abono permanência. A avaliação é de que dificilmente o governo conseguirá votos necessários para aprovar Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Com essa medida, a equipe econômica pouparia R$ 1,2 bilhão.

As medidas que afetam os servidores foram as mais criticadas pelo movimento trabalhista. Em ato ontem na capital paulista, o presidente da CUT, Vagner Freitas, disse que a entidade deve continuar realizando mobilizações para que o "trabalhador não pague pela crise". A Força Sindical colocou sua estrutura à disposição dos sindicatos que realizarem protestos. A CSP-Conlutas fará manifestação na sexta-feira em São Paulo, conforme Atnágoras Lopes, da diretoria da entidade.

Cerca de 25 sindicatos de servidores federais reuniram-se ontem à noite em Brasília. O encontro, segundo Pedro Armengol, da Condsef, foi marcado antes do anúncio do pacote fiscal, para discutir a campanha salarial, mas também incluiria as novas medidas. Até o início da reunião, entretanto, não havia deliberação sobre possível greve geral.

Segundo dados do Ministério do Planejamento, a despesa líquida com pessoal somou R$ 77,6 bilhões de janeiro a abril, o que representa 5,5% do PIB e 30,9% da Receita Corrente Líquida (RCL). Em 2014, esse gasto foi de R$ 220,6 bilhões (4,3% do PIB e 34,4% da RCL).

PT vê condução errática, mas vai poupar Dilma de críticas

• Partido deve expressar apoio às medidas para reequilíbrio de contas, mas sem fazer defesa contundente

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Mesmo dividido em relação ao pacote fiscal lançado pela presidente Dilma Rousseff, o PT expressará apoio às propostas, mas sem fazer uma defesa contundente de todos os pontos. A estratégia vem sendo planejada porque cresce na cúpula petista a percepção de que Dilma corre grande risco de ser afastada do cargo, caso a reação não seja rápida.

A Executiva Nacional do PT vai se reunir amanhã, em São Paulo, para avaliar a crise, mas o sentimento, hoje, é que o partido só sobrevive se Dilma concluir o mandato. Apesar da avaliação geral no PT de que o governo adotou uma condução errática, apresentando agora medidas que não resolvem o problema, dirigentes petistas argumentam que o partido não pode impor mais desgaste à presidente.

"Não estamos falando de uma ou outra medida, mas do conjunto das propostas", disse o deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, ao ser questionado se o PT apoiaria o congelamento do reajuste salarial dos servidores públicos.

Embora o PT tenha perdido militantes, os movimentos sociais e o funcionalismo ainda constituem a base do partido. "As pessoas precisam entender que o governo está cortando R$ 26 bilhões na própria carne e que a CPMF sugerida não atinge os pequenos. Não vamos entrar nesse jogo de conspiração", afirmou o deputado.

Guimarães participou ontem de uma reunião entre Dilma e líderes da base aliada, marcada por momentos de tensão entre o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o deputado Rogério Rosso (PSD-DF).

"Nós vamos apoiar 100% a presidente", insistiu o petista.

Lula. O Palácio do Planalto sabe, porém, que enfrentará greve do funcionalismo e protestos em todas as correntes do PT, além de queixas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cada vez mais distante de Dilma. No diagnóstico de Lula, o governo escolheu o pior caminho para sair da crise.

O ex-presidente não foi consultado antes de Dilma divulgar o pacote. Ficou magoado, mas, segundo informações obtidas pelo Estado, tentará segurar as críticas mais veementes, ao menos em público.

"A sensação que temos é que Dilma se rendeu às pressões", disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), numa referência aos ultimatos de empresários e banqueiros. "A preocupação é porque acreditamos que esse novo ajuste vai deprimir ainda mais a economia. Além disso, não resolverá o problema fiscal, se não mexer na política monetária, sem falar na consequência política de brigarmos com nossa base social."

Para o senador Walter Pinheiro (PT-BA), o governo errou na dose do remédio amargo. Pinheiro vai votar contra a reedição da CPMF, com alíquota de 0,2% por quatro anos, proposta pela equipe econômica para cobrir o déficit da Previdência. "A solução não se apresenta com esse imposto", insistiu Pinheiro. "O meu medo é que o remédio, em dose cavalar, acabe matando o doente."

Lula teme que ajuste não freie impeachment

• Para ex-presidente, Dilma depende de apoio político-eleitoral para aprovar pacote a tempo

Catia Seabra – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva explicitou a aliados o temor de que o pacote anunciado pelo governo não seja suficiente para deter a ameaça de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A aliados Lula elogiou, nesta terça-feira (15), a disposição da presidente de lançar medidas severas em resposta à cobrança da sociedade. Mas, segundo interlocutores, avalia que o ajuste só terá sucesso se acompanhado de medidas para aquecer a economia e uma estratégia de comunicação mais eficiente.

Na segunda-feira (14), Lula assistiu pela TV ao anúncio do pacote e a toda sua repercussão politica. Depois, disse a aliados que, pela complexidade do pacote e a diversidade de suas medidas, terá que ouvir os setores envolvidos antes de se manifestar. "Não sou comentarista econômico", disse ele, segundo relato de um colaborador.

Lula adiantou, porém, o temor de que Dilma não tenha capital político para aprovar seu ajuste e que seja tarde demais para conter o desgaste de seu governo.

Nessas conversas, o ex-presidente justifica a necessidade do ajuste, lembrando que ele mesmo adotou medidas drásticas no início de seu governo. Ao fazer comparação, ele ressalta, no entanto, que desfrutava de prestígio popular no seu primeiro mandato. E que Dilma depende de apoio do Congresso.

Aliados do ex-presidente contam que ele considerou uma "trapalhada" o governo ter enviado ao Congresso uma proposta orçamentária com estimativa de deficit de R$ 30,5 bilhões para o ano que vem.

Apesar de sua apreensão, Lula defendeu a aliada na manhã desta terça durante reunião com estudantes.

Após ouvir críticas à presidente, repetiu o discurso de que o governo federal, apesar de ter defeitos, é uma gestão que os representa. Ele pediu apoio à petista.

FHC lança livro em São Paulo em que aponta 'crise moral' do PT

• Debate com a presença do ex-presidente marca o lançamento de 'A Miséria da Política' a partir das 17h30, em São Paulo

- O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso lança hoje à noite, em São Paulo, seu mais recente livro, A Miséria da Política - Crônicas do Lulopetismo e outros Escritos, no qual reúne textos publicados desde 2010 no Estado e no jornal O Globo, acrescidos da transcrição de dois discursos e de um artigo para a revista Interesse Nacional. A organização é do diplomata e cientista político Miguel Darcy de Oliveira.

Antes do lançamento, FHC participará de um debate com os jornalistas Eliane Cantanhêde e Ricardo Gandour, do Estado, a partir das 17h30, no Teatro Eva Herz, na Livraria Cultura (Avenida Paulista, 2013). O evento é aberto aos interessados.

Miséria da Política é a primeira coletânea de textos publicados na imprensa por FHC, autor de obras clássicas da sociologia nos 1960 e 1970 que tratavam daquela que ficou conhecida como "Teoria da Dependência da América Latina". Em 2006, FHC lançou A Arte da Política (Ed. Civilização Brasileira), o mais extensivo relato sobre o período em que esteve na Presidência (1995-2002).

Desta vez, neste novo livro, FHC se dedicou a compor um painel sobre as gestões do PT na Presidência, com maior ênfase no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (2011-2014). O retrato final é o que ele chama de "derrocada do lulopetismo". "Eu não estou discutindo o Lula, mas o que deu a gestão dele, a inspiração dele dentro do PT", afirma o ex-presidente. "É o que vem junto com essa transformação de capitalismo de coalização em capitalismo de cooptação e os instrumentos utilizados para isso: a corrupção, que penetrou e casou com a vida política com setores importantes da vida política. Isso traz uma crise moral, e as pessoas não acreditam mais nas instituições", diz.

Governadores aliados tentam mobilização a favor de nova CPMF

• Alckmin diz que analisará proposta, mas outros tucanos criticam medida

Maria Lima, Thiago Herdy, Simone Iglesias e Sílvia Amorim- O Globo

- BRASÍLIA- Governadores aliados que receberam da presidente Dilma Rousseff a missão de brigar no Congresso pela aprovação da CPMF — com uma alíquota maior de 0,38%, para dividi- la com estados e municípios — passaram o dia ontem tentando mobilizar colegas da oposição para uma reunião que farão hoje com as bancadas na Câmara. Mas os governadores da oposição resistem a dar seu aval para recriar o “imposto do cheque”.

A proposta inicial do governo é de uma alíquota de 0,2%, destinada exclusivamente à União, o que representar ia uma ar recadação extra de R$ 32 bilhões.

O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, deu ontem uma maratona de telefonemas para tentar convencer governadores do PSDB e do PMDB a irem hoje a Brasília.

Governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori ( PMDB) disse que não poderia deixar seu estado porque enfrenta votações importantes na Assembleia Legislativa. No entanto, anunciou ser favorável a uma nova CPMF, “desde que seja compartilhada com estados e municípios, mediante critérios justos”. Até o fim do dia, os governadores do PSDB Geraldo Alckmin ( São Paulo), Beto Richa ( Paraná) e Marconi Perillo ( Goiás) ainda não tinham confirmado se participariam do encontro.

— Agora tudo vai depender da arte da conversa. Que é preciso fazer um ajuste, é. Não tem jeito. As contas não fecham, principalmente na Previdência — disse Pezão.

Alckmin evitou se posicionar sobre o assunto. Disse que pretende analisar todo o pacote de propostas apresentadas pelo governo federal para se manifestar. O tom adotado por Alckmin é diferente do discurso feito por ele no fim de agosto, contra o retorno da CPMF, em evento do PSDB.

— Vou aguardar ainda para a gente verificar o conjunto das propostas do governo. O que a gente percebe é que o corte de gasto anunciado é mais virtual. Agora, o aumento de imposto é real e num momento de dificuldade da economia — afirmou o governador, durante uma visita ontem de manhã a Sorocaba, no interior paulista.

Divisão do ônus
O presidente do partido, senador Aécio Neves ( MG), chamou de “covardia escancarada” a estratégia do governo de jogar no colo dos governadores o ônus pela aprovação da nova CPMF com uma alíquota maior, apesar de ter sinalizado que pode apoiar outras medidas do ajuste. Procurados, os governadores tucanos Beto Richa ( Paraná), Pedro Taques ( Mato Grosso) e Simão Jatene ( Pará) criticaram o novo imposto.

— A ideia de dividir o percentual com estados e prefeitos me parece mais uma tentativa de dividir o ônus político da criação de um novo imposto, do que desejo de ajudar os administradores. Não dá para penalizar o contribuinte com mais taxas — disse Richa.

Filho do presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDBAL), o governador de Alagoas, Renan Filho ( PMDB- AL), mostrouse um dos mais entusiasmados defensores da volta da CPMF. Após participar de jantar com a presidente Dilma Rousseff, anteontem, ele voltou a Alagoas para anunciar sua posição e ajudar a articular a adesão de mais estados. Ontem à tarde, retornou a Brasília para reunião no Palácio do Planalto.

Já o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo ( PSD), disse ser contra a volta da CPMF.

— Tenho compromisso com a sociedade catarinense de não apoiar o aumento de impostos, nem em âmbito estadual ou federal — disse.

Aliados entregam manifesto de apoio a Dilma

• Presidente diz que vai ‘ impedir que processos não democráticos cresçam e se fortaleçam’; oposição questiona Cunha

Isabel Braga, Catarina Alencastro e Evandro Éboli - O Globo

- BRASÍLIA- Um dia após o governo apresentar seu pacote de medidas para conter a crise econômica, o debate sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff esteve presente tanto no Congresso Nacional quanto no Palácio do Planalto. Após receber manifesto de apoio dos principais partidos da base, a presidente afirmou que fará tudo para impedir que movimentos para tirá- la do cargo se fortaleçam. E ao responder sobre o crescimento de articulações no Congresso em torno de um pedido de impeachment, Dilma lembrou que não vai concordar com processos que a enfraqueçam.

— Obviamente o governo está atento a todas as tentativas de produzir uma espécie de instabilidade profunda no país. O pessoal do quanto pior melhor, esse pessoal, só ele ganha. A população e o setor produtivo, de trabalhadores, de cientistas, perdem. O Brasil a duras penas conquistou uma democracia. Eu sei do que eu estou dizendo. Eu sei quantas penas duras foram para conquistar a democracia. Nós não vamos em momento algum concordar. Ou faremos tudo para impedir que processos não democráticos cresçam e se fortaleçam — disse Dilma.

Na Câmara, movimentos contrários
Na Câmara, foram dois os movimentos que trataram de impeachment. Enquanto aliados da presidente, capitaneados pelo PCdoB, assinavam manifesto contra o movimento de impeachment e em defesa do mandato, líderes de cinco partidos da oposição se reuniram em café da manhã com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), para avisá- lo de um novo passo na direção oposta: apresentariam em plenário uma questão de ordem cobrando detalhamento e esclarecimento de dúvidas sobre a tramitação do pedido de impeachment na Casa.

No primeiro caso, o manifesto que foi entregue depois à Dilma, foi assinado pelos presidentes do PT, Rui Falcão, do PMDB, senador Valdir Raupp ( RO) e do PCdoB, deputada Luciana Santos ( PE), pelo o ministro das Cidades e presidente de honra do PSD, Gilberto Kassab, além dos líderes e deputados de outros partidos como PP e PROS. No documento, eles afirmam que o mandato da presidente se extinguirá em 31 de dezembro de 2018 e se referem à oposição como força política radical.

“Contestam e questionam o mandato popular da presidenta Dilma Rousseff, utilizando- se dos mais diversos subterfúgios políticos e jurídicos, que vão desde o absurdo e inédito questionamento da urna eletrônica, lisura do pleito até a tentativa de criminalização de práticas orçamentárias em um contexto de crise fiscal e utilizadas por vários governos no passado, incluindo a contestação intempestiva das contas de campanha previamente aprovadas na justiça eleitoral”, diz um trecho do documento.

A oposição, por sua vez, apresentou a questão de ordem de 16 páginas, com perguntas variadas sobre a tramitação do processo de impeachment na Câmara, no início da noite de ontem, desencadeando uma série de reações em plenário. Na semana passada, a oposição lançou o Movimento Parlamentar Pró- Impeachment e avisou que a opção é focar no pedido de impeachment feito pelo jurista Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT que rompeu com a legenda em 2005, depois do escândalo do mensalão.

— É preciso que o presidente esclareça quais são as regras, prazos. Essa é uma questão que tem que ser tratada de maneira institucional e não em conversa informal, até para que a presidente, que é alvo do pedido, tenha clareza do que está sendo feito — explicou o líder do Solidariedade, Arthur Maia ( BA).

Na última segunda- feira, Cunha abriu prazo de dez dias úteis para Bicudo fazer adendos ao pedido de impeachment. Para pressionar Cunha, a oposição trabalha para apresentar o aditamento ainda esta semana e os termos estão sendo trabalhados conjuntamente por Bicudo e o jurista Miguel Reale. Nos bastidores, líderes de oposição afirmam que a questão do impeachment é “aritmética”, ou seja, saber o tamanho do apoio que o movimento encontrará na Casa. Calculam o apoio certo de 150 deputados da oposição e outros 70 da base aliada que já flertam com a ideia. Líderes definiram o impeachment como “a fruta que está amadurecendo”.

A oposição dá como certo que Cunha deverá negar o pedido de abertura de impeachment, já que ele vem declarando que os fatos levantados — como as “pedaladas fiscais” — são relativos ao mandato passado. A estratégia é recorrer da decisão de Cunha ao plenário e derrubá- la, com maioria simples, ou seja, 50% mais um dos presentes.

Depois que o líder do DEM, Mendonça Filho ( PE), leu a questão de ordem em plenário, os aliados de Dilma se manifestaram. Em nome da bancada, o deputado Paulo Pimenta ( RS) criticou o fato de a leitura ter sido feita pelo DEM, lembrando que o partido deriva do PFL e da Arena, partido que apoiou o golpe de 1964. O líder do governo, José Guimarães ( PT- CE), também criticou a atitude da oposição e disse que o governo tem capacidade de mobilização. Parlamentares lembraram o passado de lutas de nomes históricos do PSDB e citaram os ex- senadores Mario Covas e Franco Montoro, de São Paulo.

— A presidente tem história, passou muito tempo na prisão quando muitos de vocês serviam à ditadura. Não catuquem a onça com a vara curta, pensem duas vezes. Não recebam como ameaça, mas temos capacidade de reação — disse Guimarães.

Tumulto no plenário
Houve tumulto no plenário, com deputados criticando Guimarães e aliados reagindo. Cunha chegou a pedir a intervenção dos seguranças da Casa, mas não houve embate físico. Líder do PCdoB, Jandira Feghali ( RJ) avisou que as ruas reagirão:

— O Brasil não aceitará nenhum tipo de golpe. A luta política está colocada. Guerra é guerra e nossas armas são as ideias.

Depois dos discursos dos aliados do PT e do PCdoB, líderes da oposição também subiram à tribuna para defender o movimento de impeachment.

— O PT quer fazer uma reeleitura da história lembrando o golpe, mas a comparação aqui é como impeachment do Collor que eles ajudaram a defender — afirmou o presidente do PPS, deputado Roberto Freire ( SP).

A oposição chegou a fazer manifestações em plenário cobrando de Cunha a definição de um prazo para responder às questões de ordem do Democratas. O presidente avisou que levará o tempo necessário para analisar e não estipulou data.

— Eles ( oposição) tiveram um mês para apresentar isso ( a questão de ordem) e agora querem que responda na hora?! Não. O prazo será o necessário. São questões complexas — disse Cunha.

Pacote do ajuste gera efeito cascata entre governadores

• Líderes do Rio Grande do Norte, Pernambuco e Distrito Federal começam a instituir 'remédio amargo' para reequilibrar contas

Adriano Ceolin, Murilo Rodrigues Alves - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O pacote de ajuste fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, deve gerar um efeito cascata entre os governos estaduais do chamado "remédio amargo", termo usado pela presidente Dilma Rousseff para definir o aumento de impostos e o corte de investimentos e de benefícios sociais.

Desde o começo do ano, alguns governadores têm tomado algumas medidas relacionadas à redução de gastos. As discussões sobre aumento de impostos ainda ocorriam de forma tímida, apesar das dificuldades até mesmo para honrar compromissos, como o pagamento de salários do funcionalismo - como ocorreu no Rio do Grande do Sul, onde os vencimentos dos servidores foram parcelados.
Um dia após o anúncio do pacote federal, ontem foi a vez, porém, do governo do Distrito Federal divulgar o seu pacote de ajuste.

Extremamente dependente de repasses da União, a capital do País enfrenta problemas para pagamentos de salários e de fornecedores. O ajuste de Rodrigo Rollemberg (PSB) inclui o aumento das passagens de ônibus, IPTU, ICMS de TV por assinatura, bebidas, cigarros e até mesmo do preço dos restaurantes populares - nesse caso, de R$ 1 para R$ 3. Além disso, servidores de carreira vão ficar sem reajuste, o que deve gerar uma economia de R$ 400 milhões neste ano.

Para tentar mostrar que fará sua parte, o governador anunciou um corte de 20% do seu próprio salário, do vice-governador, secretários e funcionários comissionados indicados politicamente. Somado às medidas anteriores, o ajuste deve chegar a R$ 5,25 bilhões no total, o suficiente para cobrir o rombo nas contas do DF, segundo o governo local.

Nordeste. Em Pernambuco, o governador Paulo Câmara (PSB) também avalia elevar impostos. "Por ora, estamos tentando cortar despesas de custeio, como a redução dos gastos de gasolina e energia do governo", disse o secretário de Fazenda, Márcio Stefanni, ao Estado. "Não descartamos, em nenhuma hipótese, o aumento de qualquer tributo".

No Rio Grande do Norte, o governador Robinson Faria (PSD) tomou a polêmica decisão de retirar dinheiro do fundo previdenciário do funcionalismo público para honrar as despesas com pessoal. Até o momento, o débito do Estado é de R$ 544 milhões. Em novembro do ano passado, quando esse fundo passou a ser utilizado como fonte, o saldo era de quase R$ 1 bilhão. Faria diz que tem até dezembro de 2018 para acertar a dívida. A esperança do Estado é a liberação de R$ 800 milhões dos depósitos judiciais.

A situação das contas dos Estados piorou nos últimos meses por uma confluência de fatores. Do lado das receitas, a política de desoneração de tributos corroeu uma parcela da arrecadação das economias estaduais, que já sentiam o impacto da menor atividade econômica. A União fechou a torneira dos empréstimos e reduziu as transferências federais. Além disso, as despesas cresceram em ritmo superior às receitas, principalmente por causa dos custos com folha de pagamento e benefícios previdenciários.

"O problema acontece em quase todas as 27 unidades da federação. Entre elas, cerca de 70% já estão conseguindo cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal", afirmou a presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Administração, Alice Viana. Ela é também secretária de Administração no governo de Simão Jatene (PSDB) no Pará, que este ano já enfrentou uma greve de professores por 72 dias. A categoria exigiu o cumprimento do piso nacional estabelecido por lei federal.

"Lava-jato deixa indefinida a saída da crise", diz FHC

Por Maria Cristina Fernandes - Valor Econômico

SÃO PAULO - "Quando Itamar percebeu que ia virar presidente começou a se acautelar. Com a autorização dada pela Câmara dos Deputados para que o Senado julgasse [Fernando] Collor pelo crime de responsabilidade, era a hora de o vice tomar posse. Nesse dia, o deputado] Roberto Freire me telefonou. 'Venha cá porque o Itamar não quer tomar posse'. Fui até lá e procurei o [Henrique] Hargreaves. 'Cadê o Itamar?'. Ele me apontou o quarto. Entrei e lá estava o Itamar todo vestido e deitado na cama. 'O cadáver ainda está quente'. Ele não queria se apressar nem parecer afoito".

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso contou essa história ontem à noite no instituto que leva seu nome ante uma plateia ansiosa pelo desfecho da crise que atinge o governo Dilma Rousseff. Anfitrião de um debate que tinha como convidados o economista Armínio Fraga e o cientista político Sérgio Abranches, Fernando Henrique falou mais que o habitual. Com variações em torno do tema, disse que ainda não havia chegado o momento para a crise encontrar seu desfecho: "Em política não basta ter o conhecimento. Tem que saber a hora".

O desfecho da atual crise tem um ingrediente inexistente à época em que Collor caiu, a operação Lava-jato. "A política não controla a crise econômica nem a Lava-jato e a gente não sabe quem pode conduzir a saída dessa situação por causa da operação. A Lava-jato deixa indefinido o pacto que pode conduzir o país", disse FHC.

Para o ex-presidente, ainda vai levar tempo para que se possa constituir um novo bloco de poder que não se resume aos partidos: "Quem vai perder sabe e resiste e quem vai ganhar ainda não sabe que ganho terá".

O ex-presidente vê grandes dificuldades de um governo enfraquecido como o de Dilma fazer passar no Congresso o pacote fiscal anunciado pelos ministros Joaquim Levy e Nelson Barbosa. Essas dificuldades podem agravar o cenário econômico e precipitar o desfecho - "O Estado faliu e isso foi muito agravado no gerenciamento dos processos decisórios. Fomos criando uma situação de inviabilidade concreta. As coisas só se resolvem na crise. O empresariado já está nesse momento, mas a sociedade ainda não. E é só nesta circunstância que se faz algo".

FHC intercalou seus comentários entre aqueles feitos por Fraga e Abranches. Depois de seu diagnóstico sobre como o Brasil havia entrado em recessão, o economista resumiu a ansiedade que parecia tomar a plateia: "Não fazer nada não é empurrar com a barriga é empurrar para o buraco".

Abranches retomou o impeachment de Collor para dizer que aquela crise fez com que o sistema político criasse barreiras que, a pretexto de evitar novos aventureiros, inviabilizou o país.

O ex-presidente rechaçou o risco de venezuelização, levantado pelo ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Rubens Barbosa, mas disse que o desfecho da crise não precipita seu fim: "Seja quem for o presidente e o ministro da Fazenda vão ter que lidar com o fato de que não há recursos e aqueles que existem não podem ser disponibilizados".

Da plateia, a cientista política Maria Hermínia Tavares de Almeida alertou para o risco de a crise, além de derreter o PT, levar junto a oposição, pela dificuldade de divisar aonde quer chegar. Ninguém foi capaz de discordar.

PT ganha aliados para defender mandato

Por Raymundo Costa - Valor Econômico

BRASÍLIA - Classificada de "fogo de encontro" no PT, a nota dos líderes e dirigentes partidários aliados do governo em defesa do mandato da presidente Dilma Rousseff recebeu apoio enfático do líder do PMDB na Câmara, deputado Leonardo Picciani (RJ). Segundo o deputado, é muito restrita a "participação de membros do nosso partido" à tese do impeachment. "Tanto eu quanto o presidente [Valdir] Raupp, quanto o [vice] presidente Michel Temer, sabemos o tamanho desse movimento dentro do partido".

Formalmente, a reunião e a nota foram articulados pela deputada Luciana Santos (PE), líder do PCdoB. Na prática, faz parte do contra-ataque do Partido dos Trabalhadores às articulações do impeachment. Ao Valor, o presidente do PT, Rui Falcão, disse que a nota emitida pelos partidos aliados em defesa do mandato de Dilma não implicava apoio às medidas para zerar o orçamento, discutidas mais tarde pelos líderes com a equipe econômica.

O PT vai se posicionar sobre o ajuste orçamentário em reunião da Executiva Nacional amanhã, em São Paulo. Mas também no encontro de cúpula a ênfase será o mandato da presidente, que o PT julga ameaçado por uma tentativa de "golpe". De acordo com Falcão, embora tenha uma ou outra divergência sobre as medidas de austeridade, o partido considera " mais importante, neste momento, defender o mandato dela".

A manobra do PT teve sucesso à medida que o PMDB se prontificou a defender o resultado das urnas. "O que mais nos une, neste momento, é a defesa do mandato popular, de defesa da estabilidade política", disse o líder Picciani. "A pergunta que deve se fazer é a quem interessa a falta de estabilidade política no país, quem é que ganha com isto? Certamente não é a população, certamente não é o país, enquanto Nação. É contra isso que nós devemos nos organizar", afirmou.

A reunião dos aliados foi chamada de "fogo de encontro" pois foi planejada para servir como contraponto às manobras pró impeachment que a oposição previa realizar ontem. O PT não imaginava que teria de concorrer com a discussão também do pacote de austeridade. Além do PMDB, o deputado Rogério Rosso (PSD-DF), também surpreendeu ao defender o mandato de Dilma. O líder do PSD disse que não votou na presidente, mas reconhecia nela uma pessoa "digna". O partido do ministro das Cidades, Gilberto Kassab, foi o primeiro a aderir à candidatura de Dilma à reeleição, ano passado, antes mesmo do PT.

A reunião em defesa do mandato de Dilma não deixou de ser um troco do PT no vice Michel Temer. Falcão evitou falar sobre o vice na conversa com o Valor, mas dirigentes petistas e auxiliares próximos de Dilma consideraram "um acinte" a decisão de Temer de participar de um debate do grupo Política Viva, a convite de Rosângela Lyra, que acumula a presidência da Associação dos Lojistas dos Jardins, em São Paulo, com a condição de manifestante nos protestos de rua contra o governo.

É muito delicada a relação do vice Temer com a presidente e o PT. O partido acha que Temer cresceu o olho em direção da cadeira da presidente, quando ela despencou nas pesquisas de popularidade. A posição dúbia de Temer levou Dilma a ter um encontro secreto com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, segundo apurou o Valor, antes de amarrar o apoio com o PMDB do Rio de Janeiro, do qual a manifestação de Picciani ontem é prova. Depois Dilma teve um encontro oficial com Cunha.

Além da manifestação amanhã da Executiva Nacional, o PT programa também uma manifestação na Praça da Sé, em São Paulo, para o dia 26, já denominada de "Primavera da Democracia". No dia 3 de outubro, aniversário de criação da Petrobras, a Frente Brasil Popular, capitaneada pelo PT, deve fazer atos em defesa da democracia em todo o país.

Entre os projetos de austeridade que o PT se vê obrigado a engolir está o adiamento do aumento dos servidores públicos. Mas Falcão dispõe de um argumento na ponta da língua para rebater as críticas: "É melhor que ficar sem o aumento". Em julho, o Diretório Nacional do PT recusou uma proposta de apoio de seu presidente, Rui Falcão, para a criação da CSS, um imposto do cheque com recursos destinados à saúde. Agora deve discutir - e provavelmente apoiar - a recriação da CPMF, só que com a arrecadação destinada à Previdência. "É um imposto limpo, não regressivo e dá transparência total à arrecadação", disse Falcão.

O PT também discute a proposição de medidas que estimulem o consumo, no fim do ano, como a liberação de parte do compulsório dos bancos. O partido defende que Dilma libere os empréstimos já autorizados pelo Senado para Estados e municípios, estimados em mais de US$ 1 bilhão, e que estão sendo segurados pelo ministro Joaquim Levy. Uma liberação "republicana", que atenda Estados e municípios governados pela situação e a oposição, para aliviar a tensão política.

Oposição questiona Cunha sobre pedido de impeachment de Dilma

Por Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - Para manter o governo pressionado com a ameaça do afastamento da presidente Dilma Rousseff, a oposição proferiu ontem em plenário questão de ordem ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sobre a análise de um pedido de impeachment pelo plenário. O debate durou duras horas e pôs fim a sessão.

O questionamento foi discutido pela manhã na residência oficial de Cunha, enquanto líderes e presidentes de partidos aliados ao governo promoviam ato na Câmara contra o impeachment. PCdoB, PT, PMDB, PSD, PP e Pros lançaram manifesto para reforçar que Dilma deve terminar o mandato em 31 de dezembro de 2018 e atacar quem aposta no "quanto pior, melhor".

"Num regime presidencialista, a legitimidade do mandato é exclusivamente das urnas, não podendo ficar ao sabor de pesquisas de opinião que retratam uma conjuntura econômica adversa e impactada pela crise internacional associada a volatilidade de uma crise política artificialmente cevada por aqueles que se recusam a reconhecer sua derrota na última eleição", diz o texto, entregue depois à Dilma.

Já a oposição continuou a articular o afastamento com a questão de ordem, que exige uma resposta formal de Cunha sobre os procedimentos da Casa quanto ao impeachment. Foram feitas mais de duas dezenas de perguntas ao longo de 17 páginas, a maioria questões processuais já definidas pelo regimento, entre elas se o rito adotado contra o ex-presidente Fernando Collor de Mello em 1992 seria seguido agora.

Um dos principais pontos a serem respondidos são se, no entendimento da Câmara, o presidente da República pode ser alvo de impeachment por atos cometidos no mandato anterior, desde que tenham relação com as funções do cargo - ou seja, se a imunidade do presidente só vale para fatos que não sejam "estranhos ao exercício do posto". A resposta poderia embasar o afastamento pelas "pedaladas fiscais " de 2014.

A oposição também questiona como será a composição da comissão especial que vai proferir o parecer pela admissibilidade do processo e como será a eleição do presidente e do relator deste colegiado. Indaga se será possível candidatura avulsa, caso o critério para a escolha seja pelo tamanho das bancadas.

Os líderes do DEM, PSDB, PSC, SD e PPS e a presidente do PTB, deputada Cristiane Brasil (RJ), pedem ainda que seja estabelecido prazo para votar o recurso feito por parlamentar à pedido de impeachment negado pelo presidente da Câmara. A votação do recurso em plenário é a estratégia dos oposicionistas dar início ao processo. Basta o apoio de metade mais um dos deputados presentes para aprovar.

"Não tem a menor condição de dar a resposta hoje", afirmou Cunha, que falou que responderá assim que possível. "As soon as possible [tão logo quanto possível, em inglês]", emendou. A oposição, que deseja manter o tema em discussão, aguarda o retorno até terça-feira.

O vice-líder do governo, deputado Silvio Costa (PSC-PE), afirmou que a oposição era golpista e estava aliada a Cunha. "Se vossa Excelência não estivesse compactuando com essa posição golpista não tinha nem deixado ele [o líder do DEM] ler", acusou.

Lula e o Impeachment

Painel - Tiroteio / Folha de S. Paulo

Fala, garoto!
Em 1996, convidado do "Programa Livre", de Serginho Groisman, no SBT, Luiz Inácio Lula Silva foi questionado por uma garota da plateia:

–O que você sentiu com o impeachment do Collor, depois de ter perdido a eleição para ele em 1989?

Lula respondeu:

–Foi gratificante saber que aquilo que tínhamos denunciado na campanha foi provado três anos depois.

E continuou, para aplausos geral:

–O brasileiro mostrou que o mesmo povo que elege um político pode destituir esse político. Peço a Deus que nunca mais o povo brasileiro esqueça essa lição!

OCDE piora projeções e vê queda de 2,8% para o PIB do Brasil em 2015

• Organização, que antes projetava retração de 0,8% para a economia brasileira, agora está mais pessimista do que os analistas consultados pelo Banco Central; no próximo ano, OCDE espera queda de 0,7% na atividade econômica

Fernando Nakagawa, Correspondente - O Estado de S. Paulo

LONDRES - A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) piorou significativamente as previsões para a atividade econômica no Brasil. Agora, a entidade está mais pessimista que os economistas ouvidos semanalmente pelo Banco Central. Para 2015, a expectativa de recessão foi aprofundada de -0,8% no cenário previsto em junho para a previsão atual de -2,8%.

A recessão deve continuar no próximo ano. Até junho, a OCDE mantinha a previsão otimista de que o Brasil poderia crescer 1,1%. Três meses depois, diante da deterioração do quadro, a Organização agora aposta em contração do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil de 0,7% no próximo ano.

Com a piora do cenário, a OCDE agora está mais pessimista que os economistas ouvidos semanalmente pelo BC. Na pesquisa Focus divulgada esta semana, a mediana das previsões para o PIB mostra contração de 2,55% em 2015 e retração de 0,60% em 2016.

No relatório "Interim Economic Outlook", a OCDE explica que o cenário para os emergentes em 2015 sofreu deterioração desde junho diante especialmente dos sinais de fraqueza da China, o que reduz a demanda global por importações e ainda diminuiu o preço das commodities. Para os emergentes, o efeito China, diz a OCDE, acabou anulando a maior tração apresentada pela economia dos Estados Unidos.

Para piorar, alguns países sofrem com problemas internos. A OCDE dá como exemplo o Brasil e a Rússia, "que experimentam recessão profunda combinada com inflação relativamente alta". Além disso, a entidade cita que "o déficit em conta corrente e fiscal apresentaram ampliação para elevados níveis no Brasil e África do Sul".

Para 2016, a OCDE diz que grandes exportadores de matérias primas, como o Brasil e a Rússia, "podem ver alguma melhora se os preços das commodities não caírem ainda mais". Sobre a China, a entidade diz que a hábil escolha e implementação de políticas deve fazer com que a desaceleração do país seja "apenas gradual".

China. A OCDE reduziu ligeiramente as previsões de crescimento para a economia chinesa. A expectativa de expansão para o país em 2015 foi reduzida de 6,8% para 6,7%. Para 2016, a previsão para o crescimento foi diminuída de 6,7% para 6,5%. "A dinâmica de crescimento da China é difícil de avaliar diante de dados contraditórios", reconhece a entidade.

Os economistas da organização notam que "manter o crescimento sustentável" na segunda maior economia do mundo e ainda resolver as vulnerabilidades do sistema financeiro chinês compõem um "grande desafio". Um dos problemas gerados pela China são as consequências sobre outros emergentes. A Organização diz que a exposição de países em desenvolvimento à desaceleração da China e ao possível movimento de juro do Federal Reserve nos Estados Unidos "geram incerteza importante" no cenário global.

No relatório, a entidade reconhece que estímulos já foram anunciados por Pequim e sugere a adoção de mais medidas para evitar desaceleração pronunciada. "Estímulos adicionais podem ser necessários, mas isso poderia ser menos dependente da infraestrutura financiada por dívida e gastos em construção e mais através da expansão dos gastos sociais que ajudarão a dar suporte ao gasto dos consumidores", diz o relatório da OCDE.

Merval Pereira - Rumo ao abismo

- O Globo

Ao mesmo tempo em que parece ter recuperado a capacidade de iniciativa, o governo da presidente Dilma colocou- se em posição de risco extremo ao enviar ao Congresso um pacote de ajuste fiscal que se choca com suas bases populares e ao mesmo tempo atinge em cheio a classe média e o setor produtivo, com a criação de novos impostos, sobretudo a CPMF, que ressurge das próprias cinzas apenas 15 dias depois de ter sido abandonada por inviável pelo próprio governo.

Omomento é mais delicado, é verdade, graças a um erro de cálculo inacreditável do próprio governo, que enviou um Orçamento com déficit de R$ 30 bilhões para pressionar o Congresso e conseguiu chamar a atenção das agências de risco para sua incapacidade de administrar a crise que criou.

Com a perda da classificação de bom pagador, o país encurtou seu tempo, e a presidente Dilma vê- se agora diante de uma luta de vida ou morte por seu mandato. A negociação no Congresso para aprovar o pacote fiscal transformou- se em uma decisiva batalha em que o governo começa com os partidos de oposição dispostos a negar- lhe qualquer nesga de ar para sobrevivência, e muitos da situação recusam sua solidariedade, acusando a presidente de ter se curvado diante das exigências dos neoliberais, representados pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Enquanto a agência de classificação de risco Moody’s considerou as medidas fiscais anunciadas como “desenvolvimento positivo”, mesmo diante da realidade de que não se conseguirá fazer superávit primário no próximo ano, o presidente da CUT, Vagner Freitas, diz que “o pacote é recessivo” e “imputa a culpa da crise aos trabalhadores”.

Segundo ele, as medidas refletem a política “do Levy, que é de corte, e não de investimento, de corte nos direitos dos trabalhadores servidores públicos federais”. No próprio PT, e por incentivo de Lula, vários setores já estão se mobilizando contra a proposta do governo.

O senador do Rio Lindbergh Farias, que tem se notabilizado por ser um porta- voz informal de Lula no Senado, disse que Dilma está dando um tiro no pé, defendendo política contrária aos trabalhadores. Como Lula já disse recentemente, em vez de cortes deveriam estar sendo estimulados investimentos ( com que dinheiro?) e aumentado o crédito ( com que dinheiro?).

Já o presidente nacional da Juventude do PT, Jefferson Lima, disse que “os jovens do PT precisam pressionar o partido e o governo, para colocar em prática aquilo que vendemos na campanha como projeto”. Também o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto ( MTST) repudiou as soluções apresentadas pelo governo, protestando, sobretudo, contra os cortes de financiamentos para o Minha Casa Minha Vida e o que chamam de congelamento no salário de servidores.

Para o MTST, “a solução para o problema fiscal deve ser buscada em cima dos que ganharam como nunca nos últimos anos. Defenderemos nas ruas a taxação das grandes fortunas, de dividendos e remessas de lucro, além da maior progressividade no Imposto de Renda. Os ricos, banqueiros e empresários devem pagar a conta”.

Estabeleceu- se, portanto, um embate em que o governo Dilma perdeu parte substancial de sua base, inclusive no próprio PT, e não ganhou a solidariedade da oposição ou da classe média, que continua querendo vê- la pelas costas. Vencedora nas negociações no Congresso, com o apoio dos governadores e provavelmente do presidente do Senado, Renan Calheiros, pai do governador de Alagoas, disposto a se contrapor como o “good cop” ao “bad cop” Eduardo Cunha, Dilma terá recuperado o fôlego para prosseguir lutando por seu governo.

Mas este é um cenário improvável, dada a correlação de forças hoje existente no Congresso. Também o bate- boca de Levy com deputados da base não ajuda a mudar esse clima de hostilidade. A atitude de enviar uma proposta ao Congresso e a posterior negociação podem ter dado a Dilma um fôlego suplementar, e neutralizam momentaneamente o movimento para apressar o trâmite do impeachment.

Derrotada, terá dado um passo decisivo rumo ao abismo, e poderá só restar a ela a iniciativa da renúncia honrada, ou a humilhação do julgamento no processo de impeachment que se seguirá à demonstração cabal de que não tem mais condições de governar.

Eliane Cantanhêde - Última tacada?

- O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff está pisando em brasas, pulando erraticamente de lá para cá e, em vez de acumular apoios, parecendo fazer justamente o contrário. Dilma não consegue conquistar novas alianças, nem recuperar as velhas e nem mesmo manter a eterna fidelidade canina dos movimentos sociais ao PT. Aliás, o próprio PT vai lhe escapando das mãos.

O pacotaço das contas públicas é duríssimo, na mesma proporção do tamanho da crise econômica criada por uma combinação explosiva: o voluntarismo, o viés ideológico e a inexperiência da economista Dilma. E ele veio um tanto tarde demais. Exatamente por isso, mesmo aliados do governo já tratam as medidas como “a última tacada” de Dilma.

Depois de reconhecer que “demorou” a perceber o tamanho da encrenca em 2014, Dilma deveria admitir agora que a apresentação de uma proposta de cortes de despesas e de aumento de receitas deveria ter sido feita antes de enviar ao Congresso um orçamento maluco, com rombo de R$ 30,5 bilhões, e antes do rebaixamento do Brasil pela Standard & Poor’s.

Na verdade, Dilma deveria estar se preparando para o tsunami – e preparando o governo e o País – desde o primeiro dia depois de reeleita, lá se vão quase dez meses. Mas a presidente anda meio distraída, incapaz de ouvir os alarmes sonoros, visuais e reais de que a onda está crescendo e pode arrastar não apenas o país, mas o seu próprio mandato.

Se demorou muito, Dilma também escolheu o pior momento para anunciar “remédios amargos”: justamente quando sua popularidade está no chinelo e sua aceitação no Congresso é constrangedora.

E as medidas são mesmo de doer, como o corte de gastos até em áreas sociais e particularmente sensíveis à sua base social e como a ressurreição da CPMF para uma indústria já no vermelho e para uma população que brinda a presidente com mais de 70% de rejeição.

Sem entrar no mérito do conteúdo econômico, algo que José Paulo Kupfer e Celso Ming já fazem com o brilhantismo habitual, vejamos o efeito político do pacote Dilma: ela conseguiu irritar os empresários urbanos, a área rural, os funcionários públicos, o Congresso, as bancadas do PT, os movimentos sociais, os estudantes, os concurseiros, os professores, os médicos. O pacote só foi bem recebido pelo tal “mercado” que ela tanto odeia. As Bolsas respiraram melhor e o dólar recuou um tanto, enquanto dez entre dez parlamentares previam que “vai ser muito difícil” o Congresso aprovar as novidades.

Dilma empurrou o anúncio para os abatidos Joaquim Levy e Nelson Barbosa e foi se arrumar e arregaçar as mangas para fazer o que ela nunca soube fazer: negociação política. Jantou na própria segunda-feira com governadores aliados (aliás, mais aliados no Alvorada do que parecem fora dele) e ontem passou o dia enrolada em reuniões com líderes de sua cada vez mais irascível base aliada.

Com os governadores, Dilma acenou com o aumento da alíquota da nova CPMF – a CPPrev –, de 0,2% para 0,38%, de forma a ter sobra para os Estados, que estão cambaleando. Foi uma espécie de chantagem, para que entrem no corpo a corpo com suas bancadas e sejam decisivos para aprovar o pacote, que, por ora, não passa de mero plano de intenções. Quanto à base aliada, há muito a dizer, mas fiquemos num ponto crucial: as falas mais iradas, mais oposicionistas, foram de petistas como os senadores Lindbergh Farias, eterno líder estudantil, e Walter Pinheiro, que por pouco não aderiu ao PSOL no início do governo Lula.

Sem o Congresso, sem a cúpula do PMDB, sem o setor produtivo e sem a opinião pública, o risco da presidente é ficar sem a CUT, a UNE, o MTST, o poderoso mundo do funcionalismo – e, portanto, sem o PT. Dilma ganhou ontem uma nota anti-impeachment assinada por líderes de seis partidos, mas Lula já picou a mula e Michel Temer refugiou-se convenientemente em solo russo e polonês. Hoje, ela tem boas chances de virar uma unanimidade nacional – do contra.

Bernardo Mello Franco - Começou a batalha

- Folha de S. Paulo

A gritaria que dominou o plenário da Câmara na noite desta terça-feira eliminou qualquer dúvida. Começou a batalha do impeachment, que promete incendiar o Congresso e pode produzir o mesmo efeito nas ruas do país.

O clima azedou após uma jogada ensaiada entre a oposição oficial e o deputado Eduardo Cunha. O líder do DEM, Mendonça Filho, foi escalado para questioná-lo sobre o trâmite de um processo contra a presidente.

Os passos seguintes do roteiro são conhecidos. Alvo da Lava Jato, Cunha deve rejeitar os pedidos de impeachment para não aparecer como seu principal articulador. Em seguida, a oposição recorrerá contra a decisão. Se reunir maioria simples, a roda começará a girar contra Dilma.

A operação atingiu seu primeiro objetivo, porque o tema passou a monopolizar os discursos em plenário. Deputados dos dois lados se inflamaram, dando início a uma troca de insultos que quase descambou para o confronto físico diante das câmeras.

O líder do governo, José Guimarães, deu o tom da reação petista. Acusou a oposição de golpismo e prometeu resistência. "Querem governar o Brasil? Ganhem a eleição", desafiou. "Não venham com esse tipo de comportamento, que vocês receberão o troco nas ruas."

"Golpe foi o que fez a presidente Dilma na eleição, mentindo descaradamente", reagiu Mendonça Filho. A deputada tucana Mara Gabrilli contribuiu para a radicalização ao chamar os petistas de "bando".

O clima em Brasília está conflagrado. Há mais berro do que argumento, mais provocação do que diálogo.

Com o pescoço de Dilma a prêmio, os deputados deixaram de lado uma discussão mais urgente: a do novo pacote de ajuste das contas públicas. No dia seguinte à apresentação das medidas, a Câmara preferiu bater boca sobre o futuro do mandato presidencial. É uma forma de prorrogar a crise econômica e inviabilizar o pacote, que depende do Congresso para sair do papel.