domingo, 2 de agosto de 2015

Opinião do dia - Eliane Cantanhêde

E, em agosto, chega finalmente a vez de o Supremo entrar em cena, numa guerra contra o Congresso. Depois de empreiteiros, executivos da Petrobrás, doleiros e paus-mandados de todos eles, a Lava Jato vai pegar os políticos. Isso vai longe e tem potencial explosivo.

É nesse cenário, e com a economia em frangalhos, que o TCU vai julgar as contas do primeiro governo Dilma, e o TSE vai julgar as contas da campanha de Dilma. Ah! E com aquele arremate perfeito: as manifestações do dia 16 vêm aí!
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Eliane Cantanhêde é jornalista. ‘Bruxas e cachorros loucos’. O Estado de S. Paulo, 2 de agosto de 2015

Tempestade perfeita

• Os indicadores da economia brasileira apontam para uma recessão prolongada. O tombo será ainda mais profundo caso o governo não recupere rapidamente a confiança dos investidores nem consiga evitar o rebaixamento da nota de crédito do país

Giuliano Guandalini e Bianca Alvarenga – Veja

As análises econômicas mais realistas e desapaixonadas indicavam, fazia algum tempo, que a crise na economia brasileira era um acidente prestes a acontecer. Por seis anos seguidos, o governo pisou fundo demais no acelerador dos gastos públicos e aliviou o pé no freio do controle da inflação. Em pouco tempo, arruinou a confiança construída em duas décadas de ajustes e reformas — sem falar nas manobras na contabilidade federal. Ao assumir o Ministério da Fazenda, Joaquim Levy apresentou um plano para evitar o desastre, como o personagem do filme Juventude Transviada que escapa da morte ao saltar do carro momentos antes da queda no desfiladeiro.

Por alguns meses, parecia que Levy seria bem-sucedido. O ministro procurou extinguir os trambiques do antecessor e propôs uma série de medidas para reforçar o caixa do governo e impedir um rombo ainda maior nas finanças públicas. A iniciativa seria um primeiro passo para arrumar a casa e retomar os projetos de longo prazo para incentivar o crescimento econômico. O clima político hostil, entretanto, atrapalhou os planos do ministro. Quanto mais frágil a situação da presidente Dilma Rousseff e maior o envolvimento de políticos da base aliada nas revelações da Lava-Jato, menor a disposição do Congresso para aprovar ajustes impopulares. O tempo sobre a economia brasileira já estava fechado. Agora, o país está sob a ameaça de lidar com uma verdadeira tempestade perfeita.

O Brasil não é tão vulnerável como no passado, mas entrou avariado na trovoada. O povo brasileiro já percebeu, em seu dia a dia, o aumento no custo de vida, a dificuldade para quitar dívidas, o desemprego de pessoas conhecidas.

O pior, entretanto, está por vir. Principalmente se as medidas de austeridade nas contas do governo não forem aprovadas. Na semana passada, a agência americana de classificação de risco Standard & Poor"s reduziu para negativa a avaliação do país. Existe agora uma probabilidade elevada de rebaixamento da nota do Brasil, possivelmente no próximo ano. Se assim for, o país perderá, na avaliação da S&P, o status de grau de investimento. E o que isso significa?

A economia deixará de ter acesso ao crédito farto e barato dos mercados internacionais. Os maiores fundos de pensão estrangeiros restringem a aplicação em países sem o grau de investimento. Em vez de ficar mais próximo de países como os Estados Unidos, a Alemanha ou o Chile, o Brasil seria rebaixado para o grupo de caloteiros contumazes, que inclui a Grécia, a Argentina e a Venezuela.

Não é apenas o governo que é afetado. As empresas brasileiras também serão vistas como investimentos especulativos. Ao pôr a nota do país em perspectiva negativa, a agência fez o mesmo para 41 empresas locais. Entre elas figuram companhias que, a despeito do cenário econômico adverso, estão entregando bons resultados e não têm dependência direta do Estado, como Ambev e NET. Isso acontece porque a nota de crédito do país é o teto de classificação das empresas. Raramente uma empresa pode ter nota melhor do que o país no qual ela opera, porque sempre existe o risco de ser afetada por alguma restrição na transferência de pagamentos.

No cenário de rebaixamento, as empresas e o governo, em vez de contarem com um mercado de 15 trilhões de dólares de crédito em condições favoráveis de prazo e juros, terão de disputar uma oferta mais modesta, de 5 trilhões de dólares, de capitais especulativos. "Com a perda do grau de investimento, haverá dois tipos de empresa: o primeiro, de companhias vistas com maior solidez que o próprio Brasil, conseguiria fazer ajustes para diminuir o custo de captação.

Já o segundo grupo, de empresas que não têm tantas garantias a oferecer, tende a sofrer mais", afirma Cid Oliveira, gestor de fundos globais da corretora XP Investimentos. Dada a deterioração da economia, as empresas brasileiras com selo de bom pagador que buscam recursos no exterior já estão desembolsando juros equivalentes aos de empresas de maior risco de investimento. O mesmo acontece com o Brasil, cujos títulos externos pagam atualmente juros de países considerados mais arriscados, como Rússia, Turquia e Hungria. "Caso perca o grau de investimento, o Brasil terá de fazer várias reformas antes de ser visto como confiável novamente. O processo demandará um esforço para melhorar os fundamentos econômicos, com foco na política fiscal e nas correções que tendem a aumentar a produtividade, reduzir a burocracia e tornar o país mais eficiente", diz Oliveira.

Em um cenário projetado por um modelo matemático desenvolvido pela consultoria Tendências, a cotação do dólar poderia passar dos 4 reais no próximo ano, a taxa Selic chegaria a 17% e o PIB teria mais um ano de retração. Melhor seria nem pensar nessa possibilidade, mas a imprudência dos anos Dilma a tornou factível demais. Tanto é assim que o Brasil já sofre uma queda no ingresso de capitais. As empresas passaram a ter restrições no mercado externo e pagam juros mais elevados para rolar as suas dívidas externas. O preço do dólar, um dos termômetros mais sensíveis para aferir a confiança dos investidores, subiu a valores não vistos em doze anos. A cotação aumentou mais de 50% nos últimos doze meses, e o real foi uma das moedas que mais perderam valor em relação à americana nesse período. É um reflexo do pessimismo generalizado e da perspectiva de crescimento fraco.

A revisão da Standard & Poor"s foi um recado explícito de que as reformas de Levy não cumpriram os objetivos originalmente previstos. Em março, há apenas quatro meses portanto, a mesma agência havia emitido um voto de confiança nos ajustes. Agora, entretanto, avalia que as circunstâncias políticas dificultam a execução do plano. Além do mais, o crescimento econômico foi castigado pelas investigações de corrupção, que tiveram impacto direto nos investimentos. Como resultado, as perspectivas para o Brasil se deterioram. O país está por um fio. As duas outras grandes agências de classificação de crédito, a Fitch e a Moody"s, ainda conferem notas mais elevadas ao país, mas estão em processo de revisão.

A capacidade de Levy de ser o fiador da economia foi posta em xeque, como indica a piora recente do humor dos investidores nacionais e estrangeiros em relação às perspectivas para a economia. O aprofundamento da recessão e o aumento do desemprego atingiram também o estado de ânimo dos consumidores e empresários brasileiros. Ficou evidente que a retomada será lenta e gradual. O Brasil corre o risco de amargar dois anos consecutivos de retração do produto interno bruto (PIB, o total de mercadorias e serviços produzidos), algo nunca visto antes na história nacional desde a década de 30. Sem novos solavancos nem surpresas negativas, a atividade econômica voltará a crescer apenas em meados de 2016, na melhor das hipóteses.

O mau tempo, desta vez, quase nada tem a ver com a conjuntura internacional. Com raras exceções, as principais economias mundiais passam por um momento favorável, superando as dificuldades do período da crise internacional. O PIB dos Estados Unidos deverá avançar 2,5% e o da Inglaterra, 2,4%, de acordo com as projeções mais recentes do Fundo Monetário Internacional. A média mundial ficará em torno de 3,3%, semelhante ao ritmo de 2014. A China enfrenta uma desaceleração e crescerá "apenas" 6,8%. Entre as principais economias internacionais, a brasileira é a única em recessão. O tombo no PIB em 2015 será ao redor de 2%.

Em uma inversão preocupante, os indicadores que deveriam subir estão em queda, enquanto aqueles que deveriam cair sobem. Mesmo com a recessão, o Banco Central, comandado por Alexandre Tombini, aumentou novamente a taxa básica de juros, a Selic, na semana passada, para 14,25% ao ano, o maior nível desde 2006. A alta foi necessária porque a inflação, que deveria ser cadente em uma economia retraída, permanece elevadíssima. Por quê? Culpa dos descuidos dos primeiros anos de Dilma. Os reajustes das tarifas de energia e dos combustíveis foram represados.

Agora eles estão sendo ajustados, contagiando os preços de outras mercadorias. A moeda americana mais cara não dói no bolso apenas dos turistas em viagem ao exterior. Diversos produtos, e não apenas os importados, possuem preço definido em mercados internacionais. A falta de credibilidade da atual gestão do BC também pesa contra. "É como a história do alcoólatra que passou os últimos quatro anos de pileque e agora diz que parou de beber", afirma um ex-diretor do banco. "Os juros precisam ser mais altos do que o necessário por causa da desconfiança de que a meta da inflação não será cumprida." Essa desconfiança custa caro. Cada aumento de 1 ponto na taxa Selic representa um gasto adicional com juros de 15 bilhões de reais ao ano.

A economia ficou presa a um ciclo vicioso difícil de ser rompido. "A baixa confiança do consumidor se reflete na diminuição da atividade da indústria e do comércio. Ao mesmo tempo, as baixas expectativas desses setores implicam menor criação de vagas, o que deprime o consumo", afirma Viviane Seda, coordenadora de sondagem do consumidor do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas. "É um efeito que se retroalimenta." Segundo a pesquisadora, o desemprego foi decisivo para a piora da confiança do consumidor nos últimos meses. Mais de 600 000 postos de trabalho foram fechados desde junho do ano passado. O desalento não chegou a índices tão baixos nem mesmo em 2009, ano em que a economia se retraiu 0,2%. Isso porque, na época, o estímulo ao consumo foi a ferramenta usada pelo governo para dar fôlego à retomada econômica. "No atual contexto, não há mais espaço para o crescimento do consumo. O endividamento, a inflação e o desemprego estão altos e afetam diretamente a renda familiar", diz Seda.

O Brasil precisa contar agora um pouco com a sorte para não sofrer ainda mais. Além da situação interna complicada, existem riscos externos que podem se materializar. O maior deles seria uma crise financeira na China. Outra ameaça, ainda felizmente fora do radar, seria um aumento mais acentuado dos juros nos Estados Unidos. Janet Yellen, a presidente do Federal Reserve (Fed), o banco central americano, vem postergando ao máximo o aumento da taxa, que permanece há anos próxima de zero. Se os juros subirem na economia americana, o investimento em países emergentes, como o Brasil, ficaria menos atrativo. A revoada dos dólares seria inevitável. Pairam ainda no ar eventuais complicações na Grécia e no restante da Europa.

A crise brasileira atual, contudo, é integralmente feita em casa. Superá-la exigirá o aperto do cinto da austeridade fiscal e a aprovação de ajustes profundos. O exemplo da índia mostra que essa receita funciona. O país asiático esteve prestes a perder o grau de investimento. Mas as reformas implementadas pelo atual primeiro-ministro, Narendra Modi, evitaram o rebaixamento da nota pelas agências. É a esperança de ver a tempestade dissipada.

Você votou neles. Eles vão honrar seu voto?

Teatro da Política

- Época 

• Quando os índices econômicos se deterioram, nossa vida piora significativamente. Que nossos representantes pensem nisso na hora de votar a "pauta-bomba"

Existe uma correspondência clara entre os números ruins na economia e as atribulações na vida do cidadão comum. Na semana passada, a situação, que já era ruim, piorou um pouco mais. Os juros básicos subiram para 14,25% - recorde no governo Dilma e maior patamar em nove anos. As contas do governo fecharam o primeiro semestre com déficit de R$ 1,6 bilhão, o pior resultado desde 1997. Para o cidadão comum, isso significa juros mais altos em qualquer tipo de crédito, dificuldade de conseguir aquele empréstimo para reformar a casa (e, se conseguir, como pagá-lo?), alta dos preços na feira e no supermercado e a ameaça crescente de aumento de impostos, num país onde eles já são abusivos. Para defendê-lo, o cidadão comum elegeu, em 2014, seus representantes. Eles formam o Congresso Nacional. Nesta semana, o Congresso volta de férias e paira no ar um paradoxo. Os deputados e senadores escolhidos para representar o cidadão comum podem piorar enormemente a vida do cidadão comum. É só aprovarem a "pauta-bomba", como está sendo chamada uma série de medidas que aumentam gastos do governo - numa época em que, como os números mostram, qualquer pequeno aumento que desequilibre a economia pode ser fatal para nossas vidas (leia a reportagem a partir da página 38).

Em momentos assim, em que a vida cotidiana dos cidadãos está nas mãos dos representantes que elegeram, tais representantes costumam ser chamados à razão. Foi o que ocorreu em outras épocas históricas, em que políticos esqueceram momentaneamente suas divergências para se unir em torno de uma agenda comum (leia mais na página 42). Num primeiro momento, tal agenda é simples. Basta evitar a criação de novos gastos, como aumentos para o Judiciário ou nas aposentadorias. Isso nos ajudará a atravessar este momento difícil. Mas, no médio prazo, não será suficiente. Como mostra o economista Samuel Pessoa (leia a entrevista na página 46), os problemas na economia brasileira vêm de longe e são mais complexos do que parecem num primeiro momento. Para resolvê-los, será necessário um pacto ainda mais profundo.

A presidente Dilma Rousseff tem condições de liderar esse pacto? Dilma dedicou sua semana a reuniões com governadores e com seus auxiliares diretos. Enquanto ela preferir relacionar o caos econômico às investigações da Lava Jato (leia Choque de Realidade, na página 50) em vez de cortar despesas seriamente, as dificuldades continuarão. Para que qualquer pacto dê certo é preciso, antes, reconhecer os erros. Dilma fez isso, num primeiro momento, ao abandonar a política econômica equivocada do primeiro mandato e nomear Joaquim Levy, o que representa uma grande correção de rumo. Ainda é pouco. Ela precisa fazer gestos concretos que ajudem a cicatrizar feridas de campanha. Precisa também apoiar seu ministro da Fazenda incondicionalmente, e demonstrar isso de maneira clara. Só assim o cidadão comum - nós - poderá escapar de anos de sacrifícios impingidos pelos representantes que, na eleição, mereceram sua confiança.

Deu certo na Espanha. Daria aqui?

• No Pacto de Moncloa, os espanhóis se entenderam para debelar uma crise simultaneamente econômica e política. O caso pode ser uma inspiração para o Brasil

Guilherme Evelin e Ruan de Souza Gabriel - Época

Se o Congresso agir responsavelmente na volta do recesso parlamentar, como se espera, e não aprovar projetos para aumentar ainda mais os gastos públicos, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, vai ganhar mais tempo para tocar seu plano de ajuste. Está ficando, porém, cada vez mais claro que o desarranjo fiscal não se deve apenas às estripulias financeiras cometidas no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. Ao contrário de outros ajustes, como o feito em 2003, no primeiro ano do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a economia não vai voltar a crescer rapidamente, e a questão da solvência das contas públicas vai permanecer, mesmo que o governo cumpra as novas metas de superávit primário (o tamanho da poupança para estabilizar a dívida pública) fixadas para 2015 e 2016. Economistas que viam com simpatia o governo Dilma, como o ex-ministro Delfim Netto, dizem agora que o ajuste não poderá ser "circunstancial". O próprio Levy passou a afirmar que a questão das contas públicas é "estrutural".

Esse debate é um dos efeitos de um estudo de nove páginas feito pelos economistas Marcos Lisboa, Mansueto Almeida e Samuel Pessoa (leia a entrevista com Pessoa na página 46). No estudo, eles mostram como os gastos públicos, por causa da Previdência Social, de programas sociais e de uma série de subsídios dados pelo Tesouro Nacional de forma não transparente, vêm crescendo num ritmo acima da renda nacional desde 1991. Mantida a tendência até 2030, os gastos com educação, saúde e Previdência aumentarão R$ 300 bilhões, cerca de 6% do Produto Interno Bruto (PIB). Por um tempo, essa conta fechou. Agora, ela não fecha mais. Para bancar esses gastos crescentes, seria necessária, pelas contas dos autores do estudo, a criação de impostos equivalentes a quatro CPMFs (o antigo imposto sobre movimentações financeiras). Num país onde a carga tributária aumentou de 25% do PIB em 1991 para mais de 35% em 2014, isso não é mais possível. Segundo os economistas, a saída é rever o modelo de "Suécia tropical" (expressão do ministro dos Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger), instituído no país desde a Constituição de 1988.

Como sugere o título do estudo, O ajuste inevitável, ou o país que ficou velho antes de se tornar desenvolvido, os economistas consideram que, com a crise, a realidade vai impor essa agenda ao país. Segundo disse o economista Marcos Lisboa a ÉPOCA, há duas maneiras de o Brasil enfrentar essa questão, uma ruim e outra boa. A ruim seria a repetição de um caminho como o percorrido pelo país na década de 1980, a "década perdida". Por adiar o enfrentamento de uma série de problemas estruturais do Estado brasileiro, que acabaram levando à hiperinflação, o país levou mais de dez anos em crise até estabilizar a economia brasileira com o Plano Real, lançado em 1994. O bom caminho, sugere o estudo, é "reconhecer que há escolhas difíceis sobre os benefícios a ser mantidos e os que devem ser revistos". Esse caminho exige um governo com autoridade política para tal (qualidade que aparentemente falta ao governo da presidente Dilma Rousseff) ou um pacto entre as forças políticas em que todos estão dispostos a fazer concessões e abrir mão de suas ambições em prol do bem comum.

A ideia de um pacto nacional já foi defendida em entrevista a ÉPOCA pelo economista Luiz Gonzaga Belluzzo, de tendência oposta à dos autores do estudo, e é sempre suscitada em momentos de crise. A inspiração de todos que pensam num acordo dessa envergadura é o Pacto de Moncloa, firmado na Espanha em 25 de outubro de 1977. Foi assim chamado por ter sido assinado no Palácio de Moncloa, em Madri, por todos os partidos com representação no Parlamento espanhol - num momento em que a Espanha, como o Brasil agora, também enfrentava uma crise econômica e política. O país vivia a transição da ditadura de Francisco Franco para a democracia e, ao mesmo tempo, vários problemas estruturais, que se tornaram evidentes com a crise da alta dos preços do petróleo em 1973. "Um desses problemas é que a ditadura franquista havia conferido a determinados setores industriais uma série de vantagens que se tornaram excessivas e insustentáveis", escreveu Caries Sudrià, professor de história e instituições econômicas da Universidade de Barcelona. Pela sobreposição de crise política e econômica, e até pelo abuso de subsídios, o quadro tem uma leve semelhança com o vivido hoje pelo Brasil.

Com o Pacto de Moncloa, além de concordar em enterrar todo o entulho autoritário da ditadura franquista, as forças políticas espanholas se comprometeram com uma política monetária e fiscal austera e rígida, que se manifestava por meio de superavits primários, privatizações e juros altos para combater a fuga de capitais e uma inflação que ultrapassava os 26% ao ano. O câmbio flutuante e a desvalorização da peseta (antiga moeda espanhola) foram outras medidas adotadas para facilitar as exportações e melhorar o resultado das contas externas. Os trabalhadores espanhóis, que vinham se mobilizando em greves cada vez mais numerosas, concordaram em abrir mão de aumentos reais de salário em nome do pacto. Os reajustes foram limitados a um teto abaixo da inflação acumulada e baseado na inflação prevista.

O Pacto de Moncloa criou as condições econômicas e sociais que permitiram à Espanha superar a crise, consolidar a democracia e dar um salto de desenvolvimento. O país, que até os anos 1980 tinha características de Terceiro Mundo, virou uma nação moderna da União Européia. O pacto teve um grande artífice: Adolfo Suárez, o presidente do governo espanhol em 1977. Protótipo do arrivista, Suárez chegou ao posto depois de ascender no firanquismo por meio de demonstrações de bajulação e servilismo e virou o "herói da retirada", como o definiu o poeta alemão Hans Magnus Enzenberger. O herói da retirada é um herói paradoxal, pois ocupa uma posição estratégica que pode garantir o estado das coisas, mas opta por matar aquilo que teria o poder de ressuscitar. Suárez tinha a chance de conferir um novo fôlego ao firanquismo, mas preferiu enterrá-lo de vez para construir a democracia espanhola.

Protagonista do livro Anatomia de um instante (Globo Livros), do escritor espanhol Javier Cercas, Suárez teve seu momento de heroísmo real ao resistir a um golpe militar em 1981. Às 18h23 do dia 23 de fevereiro daquele ano, 186 membros da Guarda Civil espanhola, armados com metralhadoras e revólveres, comandados pelo tenente-coronel Antônio Tejero Molina, franquista, invadiram o Parlamento espanhol e ordenaram: "Todo mundo no chão". Suárez não obedeceu e permaneceu sentado, "sozinho, estatuário e espectral, em meio a um deserto de cadeiras vazias", segundo a descrição de Cercas. O vice de Suárez, o general reformado Manuel Gutiérrez Mellado, e o líder comunista Santiago Carrillo também não se curvaram. O improvável líder do país resistia ao lado de um militar e um comunista, o que ilustrava a amplitude do pacto que ele foi capaz de costurar. E a democracia venceu.

"Suárez carecia de uma boa preparação acadêmica, de uma grande cultura e de grandes princípios, mas tinha as virtudes fundamentais para um político, naqueles anos cruciais de transição da ditadura para a democracia", disse Cercas a ÉPOCA. "Tinha sentido da realidade, conhecia bem o país, não era soberbo, sabia escutar, sabia colocar-se no lugar de seu interlocutor e aprender com ele, era capaz de colocar o interesse do país acima de seu próprio interesse. Era valente, quase temerário. Sua tragédia e grandeza é que destruiu um sistema que manejava como ninguém - o franquismo - e construiu um outro que não sabia manejar - a democracia."

O Brasil nunca teve algo parecido com o Pacto de Moncloa. O mais próximo que tivemos de um pacto nacional foi o governo de coalizão formado em torno do presidente Itamar Franco, em 1992, num momento de um trauma para o país: a crise econômica dos anos 1980 ainda não fora debelada, e o primeiro presidente eleito depois da redemocratização - Fernando Collor - sofrerá um processo de impeachment. O PT, porém, optou por ficar fora do governo. Itamar teve um quê de Suárez e também foi nosso herói improvável. Conduziu seu breve governo aos trancos e barrancos, mas lançou o Plano Real, que criou as condições de estabilização da economia brasileira.

A atual crise brasileira pode desembocar num pacto à Moncloa? A última campanha presidencial deixou um lastro de ressentimentos, como mostra a entrevista de Samuel Pessoa e a rejeição do ex-presidente Fernando Henrique a manter um diálogo com o PT. Além disso, a presidente Dilma ainda não mostrou nenhuma vontade de se dissociar da herança política e econômica do lulismo que a levou ao poder. Existem momentos, no entanto, em que é preciso ser um pouco Adolfo Suárez. As verdadeiras revoluções da História, aquelas que duraram e renderam frutos, foram lideradas por espíritos conciliadores. Essa lição vale ouro no Brasil de hoje.

Essa bomba vai estourar?

• Na volta do recesso, a pauta do Congresso está repleta de projetos que podem aumentar ainda mais os gastos públicos. Evitar essa irresponsabilidade é do interesse de todos os cidadãos

Leandro Loyola - Época

Como é comum em sua rotina, o vice-presidente Michel Temer recebeu o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB, em sua residência oficial, o Palácio do Jaburu, na quinta-feira da semana passada. Entre vários assuntos, Temer fez um pedido especial. Preocupada com a volta da Câmara aos trabalhos, nesta semana, com um enfurecido Cunha à frente, a presidente Dilma Rousseff marcara um jantar com líderes partidários de sua suposta base de apoio para as 19h30 desta segunda-feira, 3 de agosto, no Palácio da Alvorada. É uma tentativa de Dilma de buscar apoio em um momento difícil. Ao saber disso, Cunha, craque na arte de espezinhar o governo, marcara para a mesma segunda-feira à noite um jantar com seus aliados, em sua residência oficial. Temer pediu a Eduardo Cunha que evitasse esse pequeno enfrentamento. Conseguiu que Cunha adiasse seu convescote para as 22 horas, para que os políticos não passassem pelo constrangimento de ter de escolher entre um e outro. Assim, eles poderão jantar com Dilma e comer a sobremesa com Cunha. Outra hipótese é Cunha realizar um almoço no dia seguinte. Ser articulador político de um governo fraco como o de Dilma implica para Temer ter de se preocupar com minúcias do gênero.

Tal cuidado com coisas tão pequenas não deveria ser tarefa da segunda maior autoridade da República e chefe da articulação política do governo. Mas tornou-se necessário nestes tempos em que até os políticos mais experientes se impressionam com a aspereza inédita nas relações. Nesta semana, o frágil governo Dilma embarca em - mais um - período delicado. Todos os cuidados são necessários para enfrentar a volta ao trabalho do Congresso Nacional, com Renan Calheiros, um presidente do Senado silencioso, mas oposicionista, e Eduardo Cunha, um presidente da Câmara declaradamente pintado para a guerra, desde que foi acusado de receber uma propina de US$ 5 milhões. O governo está à mercê de um Congresso cada vez mais hostil a uma Dilma fraca, com um conjunto de projetos (leia no quadro ao lado) que, se manejado com ira política e sem responsabilidade, pode jogar o Brasil em um precipício. "Ninguém parece empenhado em fazer uma agenda positiva para o Brasil", diz o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira. "Não é questão de apoio à presidente, é questão de manter o país funcionando. Não se pode colocar o país em risco."

O perigo é latente. Na semana passada, a agência de classificação de risco Standard & Poor"s fez o que todos os investidores já esperavam, ao reduzir a perspectiva do Brasil. Desde 2008 o Brasil integra o seleto clube dos países com grau de investimento que merecem maior confiança por sua solidez econômica. Agora está perigosamente perto de deixar esse clube, o que significa perder investimentos de fundos internacionais que só podem alocar seu dinheiro em países com tal selo. Para o Brasil, pode implicar a saída de cerca de US$ 200 bilhões em questão de semanas e o recebimento de menos investimentos estrangeiros a partir daí. Em seu relatório, a Standard & Poor"s citou especificamente a incapacidade de o governo Dilma obter apoio no Congresso para as medidas econômicas saneadoras tocadas, com dificuldade, pela equipe do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O Congresso pode aniquilar com facilidade a minúscula economia de gastos já obtida. Basta derrubar o veto da presidente ao reajuste de 56% a 78% para os servidores do Judiciário, capaz de agregar uma despesa extra de R$ 25 bilhões em quatro anos.

Ameaças desse gênero estão no baralho de maldades de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, companheiros de partido e nas acusações de envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras. Há meses, desde que se tomaram investigados pela Lava Jato, ambos elegeram o governo Dilma seu saco de pancadas. Os dois atraíram o apoio da oposição, que foi capaz de emplacar vitórias contra o governo, em uma magnitude que não era vista desde que o PT chegou ao Palácio do Planalto em 2003 com a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A oposição aposta em obter ganhos políticos com o desgaste contínuo do governo. Sondagens de popularidade mostram Dilma e o PT no subsolo, o que abre caminho para candidatos opositores nas eleições por vir - a primeira no calendário é a eleição municipal de 2016. Politicamente, bater no governo mais impopular desde Fernando Collor é um esporte simples, uma boa defesa e um agregador de votos eficiente.

Consciente da própria decadência, o governo foi a campo na semana passada para se prevenir dos percalços que poderão surgir no Congresso. Dilma se reuniu com os 26 governadores e a vice-governadora do Mato Grosso do Sul, Rose Modesto, no Palácio da Alvorada. Colocou-os ao redor de uma mesa e leu um discurso de 3.400 palavras, transmitido ao vivo pela televisão. Terminada a enfadonha leitura, os governadores ouviram uma explanaçao sobre as conseqüências fimestas de projetos que estão no Congresso - não só para as finanças do governo federal, como para os estaduais.

Dilma repetiu o gesto que fez em 2013, quando estava enfraquecida pelas manifestações nas ruas: em vez de pedir ajuda, usou os governadores como claque de apoio. Daquela vez, não funcionou. Agora, ainda procurou amedrontá-los com as conseqüências de algumas medidas. Entretanto, a crise é tão grave que os governadores manifestaram boa vontade. "Há uma preocupação genuína de todos de tentar evitar o pior", diz o tucano Si-mão Jatene, governador do Pará. "Apesar das posições partidárias, há uma agenda comum que afeta a todos. Não podemos sair da crise pior que entramos." Os governadores prometeram tentar influenciar deputados e senadores. De concreto, obtiveram de Dilma a promessa de liberação de financiamentos do Banco do Brasil, entre outras medidas que podem aliviar suas finanças. A queda de arrecadação que empareda o governo federal também bate forte nos Estados.

Antes da reunião, o governo fez o que manda o manual político em tempos difíceis. O ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, que auxilia Temer na articulação, anunciou a distribuição de 200 cargos no terceiro escalão para acalmar aliados. Em outra iniciativa para aplacar animosida-des contra o Planalto, anunciou também que o governo liberará cerca de R$ 4,9 bilhões para pagar emendas ao Orçamento, as indicações de gastos públicos que os parlamentares têm direito a fazer.

O vice-presidente Michel Temer tratou pessoalmente de aplainar o terreno em outras áreas. Combinou com Eduardo Cunha de chegar a um acordo sobre o futuro presidente da incômoda - para o governo - CPI que vai investigar contratos do BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, responsável por financiar no exterior empreiteiras enroladas na Operação Lava Jato e diversas empresas doadoras de campanhas do PT (leia reportagem na página 52). Um dos nomes em cogitação é o do deputado Edio Lopes (PMDB-RR), um aliado de Cunha, mas que mantém bom diálogo com o governo. Temer acertou ainda que, antes de partir para o jantar com Dilma, nesta segunda-feira, os líderes dos partidos da base aliada farão uma parada estratégica no Palácio do Jaburu, às 18 horas.

Dilma sempre se mostrou inapetente para a gestão política e para lidar com o Congresso. Angariou a antipatia da maioria dos parlamentares. O mesmo tipo de hostilidade é mostrado pela maior parte do Congresso em relação ao PT, que cultivou ambições hegemonistas de eleger as maiores bancadas na Câmara e no Senado, antes da realização das eleições do ano passado. Agora, os petistas estão recebendo o troco - não só dos oposicionistas, mas de seus supostos aliados no governo, que não perdem uma oportunidade para criar mais dificuldades apenas com o objetivo de fazê-los sangrar. Contudo, priorizar a disputa política em detrimento dos interesses nacionais é um perigoso flerte com a tragédia. Agora não se trata mais de uma questão de transferir o ônus por decisões impopulares para a presidente Dilma. Derrubar vetos da presidente, como ao fim do fator previdenciário ou do reajuste para os servidores públicos, implicará mais gastos, no momento em que o país não pode arcar mais com o crescimento das despesas públicas. Poderá implicar também aumentos dos impostos ou da inflação, com altas dos aluguéis e até do preço da comida na feira. Os parlamentares foram eleitos para defender os interesses dos cidadãos. Agora, trata-se de uma questão de agir com responsabilidade e honrar o voto que receberam.

Planalto aposta no Senado para barrar crise política e Renan apresenta fatura

Poderes. Após rompimento formal de Eduardo Cunha, governo Dilma busca refazer pontes com senador, considerado fiel da balança na tramitação de eventual processo de impeachment no Congresso

Isadora Peron e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Tratado pelo Palácio do Planalto como peça-chave para impedir o agravamento da crise política, que pode culminar até no impeachment da presidente Dilma Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tem sinalizado a interlocutores diretos que pode voltar a colaborar com o governo da petista a partir desta semana, na volta do recesso parlamentar. Renan, contudo, cobrará "faturas" nas áreas política e econômica, em troca da ajuda.

Há duas semanas, logo após o anúncio do rompimento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o governo decidiu reforçar uma operação envolvendo ministros como Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) e lideranças políticas petistas para cortejar o presidente do Senado. "Renan será o fiel da balança", definiu um dos envolvidos na investida do governo.

O Palácio do Planalto quer retomar a relação que mantinha com Renan durante o primeiro mandato Dilma, quando ele foi o principal interlocutor do governo no Congresso. O peemedebista, que contou com o apoio da presidente para se reeleger presidente do Senado em fevereiro, afastou-se do Planalto no mês seguinte, na esteira da abertura de três inquéritos contra ele no âmbito da Operação Lava Jato. Nos bastidores, Renan acusa o governo de ter atuado para incluí-lo no rol dos investigados.

O Planalto, porém, aposta no presidente do Senado para neutralizar os efeitos de uma provável decisão desfavorável no julgamento das contas de 2014 da gestão Dilma pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Caberá à Casa presidida por Renan apreciar inicialmente o parecer analisado pela corte.

Se tanto o Senado quanto a Câmara reprovarem as contas do governo, esse seria o primeiro passo para que um processo de impeachment fosse aberto contra a presidente. Por isso, dizem aliados, com a Câmara liderada pelo oposicionista Cunha, Renan é tido como fundamental para barrar no nascedouro um movimento pelo impedimento da presidente.

O peemedebista, porém, ainda não decidiu que papel vai adotar. É a esse delicado cálculo político que ele tem se dedicado nos últimos dias. Apesar da disposição de voltar a ajudar o governo, Renan deve investir na tese de que a análise das contas de 2014 poderá ser feita antes das contas de anos anteriores - ainda pendentes de julgamento - serem apreciadas pelo Congresso. Não há nada no regimento do Congresso que impeça isso e trata-se de uma decisão política.

Conta. Para aliados do presidente do Senado ouvidos pelo Estado, contudo, Renan está inclinado a assumir o papel de fiador da governabilidade de Dilma.

Mas vai impor condições. Segundo interlocutores, uma das principais faturas do peemedebista seria que Dilma promovesse mudanças no seu núcleo duro de governo, a começar pelo ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. O nome que conta com a simpatia de Renan é o do ministro da Defesa, Jaques Wagner, considerado por ele um político habilidoso. Desde a época em que eram colegas de Senado, Renan e Mercadante nunca tiveram uma boa relação e o peemedebista não está disposto a voltar a conversar com o Planalto se tiver o atual ministro como interlocutor.

Em outra frente, o presidente do Senado aguarda um apoio financeiro maior do governo federal a seu filho e herdeiro político, o governador de Alagoas, Renan Filho (PMDB) - que comanda um Estado com graves dificuldades econômicas. A expectativa no ano passado, quando Renan Filho foi eleito, era de que ele teria total apoio de Brasília para tirar de Alagoas o título de campeão em recordes negativos em indicadores sociais.

Ajuste. Renan também quer ter maior participação nas decisões do governo, principalmente em relação à política econômica. O fato de Levy ter consultado o senador antes do anúncio da redução da meta do superávit, há cerca de dez dias, agradou o peemedebista. Crítico do ajuste fiscal elaborado pela equipe econômica, que recentemente classificou como "tacanho", ele defende ainda que o governo corte despesas do próprio Executivo, a começar pela redução do número de ministérios.

Assim como na crise de 2007, em que contou com o apoio do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o peemedebista espera solidariedade do governo caso sua situação na Lava Jato venha a se complicar.

O assunto tem preocupado o Planalto, que avalia que a 16ª fase da operação, deflagrada na semana passada e que avança sobre as irregularidades do setor elétrico, pode afetar diretamente o grupo ligado a Renan na Casa e, assim, dificultar ainda mais a reaproximação.

A agenda que aguarda a presidente

O agosto de Dilma

• Congresso hostil, julgamento de contas, Operação Lava Jato e protestos estão na pauta deste mês

1. NO CONGRESSO
Volta do recesso
Após um semestre de atritos com o Executivo, o Congresso retoma os trabalhos a partir desta semana com a votação de pautas delicadas para o Planalto, como o projeto que reduz as desonerações na folha de pagamento de empresas - medida pendente que integra o ajuste fiscal de Dilma. Outro item na lista de "pautas-bomba" é um projeto que muda a correção dos recursos do FGTS - o govemo alega que o projeto afetará programas como o Minha Casa Minha Vida e obras de saneamento básico.

Impeachment
Rompido com o govemo após ser citado por delator da Lava Jato, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), admite analisar eventuais pedidos de impeachment contra Dilma no Congresso. Cunha havia rejeitado em abril propostas de impedimento da petista; agora, afirma que todos os pedidos de afastamento "serão analisados sob a ótica jurídica". "Os que tiverem fundamento terão acolhimento", disse o peemedebista em julho.

CPI do BNDES
Eduardo Cunha marcou para o início deste mês a instalação da CPI que investigará contratos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Outra CPI, a que investigará fundos de pensão das estatais, também deve ser criada neste mês. A decisão de Cunha de criar as CPIs foi vista como uma retaliação ao govemo federal, a quem o deputado peemedebista acusa de ter se articulado com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para incriminá-lo na Operação Lava Jato.

2. NO TCU
"Pedaladas fiscais"
O Tribunal de Contas da União examinará neste mês as contas do govemo federal de 2014 - em abril, o TCU declarou que o govemo Dilma Rousseff incorreu em crime de responsabilidade fiscal ao usar recursos de bancos públicos para inflar os resultados das contas da União - o expediente de atrasar o repasse aos bancos ficou conhecido como "pedalada fiscal". A recomendação do TCU - pela aprovação ou rejeição das contas do govemo federal - será encaminhada ao Congresso Nacional.

3. NA LAVA JATO
Desdobramentos
Também são esperadas para este mês denúncias envolvendo a primeira leva de politicos investigados na Operação Lava Jato. Há expectativa de que os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, possam estar no "pacote" dos denunciados pela Procuradoria. Temor do governo com eventual denúncia dos peemedehistas é de que Cunha, já rompido com o Planalto, atue para desgastar ainda mais o Executivo; no caso de Renan, receio é de que as investigações da Operação Lava Jato dificultem uma reaproximação entre Dilma e o presidente do Senado

Eleição no Ministério Público
Nesta semana, dia 5, Dilma terá de escolher, de uma lista com três nomes, um dos candidatos para ocupar o cargo de procurador-geral da República. O nome indicado por Dilma passa por sabatina na Comissão de Constituição e Justiça e aprovação no plenário do Senado. A disputa está sob influência da Operação Lava Jato - o atual chefe do Ministério Público, Rodrigo Janot, favorito para ser reconduzido ao cargo, enfrenta rejeição de parlamentares como Renan e Cunha, por tê-los incluído no rol de investigados.

4. NAS RUAS
Panelaço
Com pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV marcado para a próxima quinta-feira - o objetivo é defender o governo e o PT -, Dilma pode ser alvo de novo panelaço, a exemplo do que ocorreu durante seu pronunciamento no Dia Internacional da Mulher, em março deste ano. Grupos anti-Dilma estão se mobilizando via internet para promover novo protesto nesta semana.

Manifestação
Movimento Brasil Livre (MBL), Revoltados On Line e o grupo Vem Pra Rua - alguns dos responsáveis pelos protestos contra o governo de 15 de março e de 12 de abril deste ano - organizam para o dia 16 nova manifestação contra a presidente Dilma Rousseff. O PSDB já afirmou que vai usar as inserções a que tem direito na TV para chamar a população a ir às ruas contra a petista.

Peemedebista espera para avaliar a 'pressão das ruas'

A disposição do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de ajudar o governo da presidente Dilma Rousseff vai depender também principalmente da pressão que vier das ruas.

Para avaliar qual caminho vai seguir, o peemedebista tem, inclusive, encomendado pesquisas para ver se os eleitores o relacionam como um nome ligado à petista. Segundo auxiliares do presidente do Senado, os resultados das pesquisas encomendadas por Renan mostram um descolamento da imagem dele e da petista, o que facilitaria a construção de um discurso caso ele decida romper publicamente com o governo.

O peemedebista tem dito a interlocutores que está aberto a uma reaproximação com o governo, mas isso pode mudar caso as manifestações que pedem o impeachment da presidente ganhem força. Os próximos protestos estão marcados para o próximo dia 16.

Renan deixou engatilhado o discurso de que o governo tomou um rumo, principalmente na crise econômica, com o qual não concorda. Por isso, estaria livre para desembarcar da base aliada.

Para lembrar: O "camaleão político"
Com mais de 36 anos de carreira pública, desde que se elegeu pela primeira vez deputado estadual por Alagoas pelo antigo MDB, o atual presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), completa 60 anos no dia 15 de setembro, tendo passado por sobressaltos em sucessivos governos. É um "camaleão político", na definição de um aliado.

No governo Sarney, Renan foi um dos artífices da candidatura de Fernando Collor (foto) à Presidência e, depois, integrante da tropa de choque do governo dele no Congresso. Rompeu com Collor posteriormente e contribuiu para sua queda ao acusá-lo de ter conhecimento do esquema PC Farias.

No governo Itamar, foi vice-presidente executivo da Petrobrás Química (Petroquisa) e, em 1994, elegeu-se senador pela primeira vez. Quatro anos depois, se licenciou do cargo para se tornar ministro da Justiça do governo do tucano Fernando Henrique Cardoso.

Mesmo tendo apoiado a candidatura de José Serra em 2002 (o único Estado em que o tucano venceu foi Alagoas), foi um dos primeiros peemedebistas do Senado a apoiar o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano seguinte, logo após emplacar seu apadrinhado Sérgio Machado na Transpetro (que perdeu o cargo por envolvimento na Lava Jato).

Em 2011, já no governo Dilma, como líder do PMDB, foi um dos principais fiadores da governabilidade. Foi relator da Medida Provisória 579, batizada de MP do Setor Elétrico. Em fevereiro deste ano, ganhou pela quarta vez a disputa pela Presidência da Casa na votação mais acirrada que disputou. No mês seguinte, tornou-se alvo de três inquéritos da Operação Lava Jato e, de aliado irrestrito, se distanciou do governo.

O teorema da corrupção

• Banco do Brasil, Petrobras, Eletrobras... A Operação Lava-Jato mostra que as estatais e órgãos públicos seguiram à risca o enunciado de 2003 do governo Lula

Daniel Pereira e Hugo Marques – Veja

Lula e José Dirceu têm em comum o receio real ser presos pela Operação Lava-Jato. Esse sentimento compartilhado por eles é justamente o que os separa. O ex-presidente não perde uma oportunidade de lembrar que Renato Duque, o ex-diretor de Serviços da Petrobras preso sob a acusação de recolher propinas para o PT, era homem da confiança de Dirceu. Especializado na arte de transferir responsabilidades e, principalmente, irresponsabilidades, Lula está deixando seu antigo braço-direito fortemente contrariado. Dirceu já avisou que não levará mais uma bala endereçada ao ex-presidente. Caso seja preso novamente, será quase inevitável que ele fale e una os elos que faltam para o desenho completo do modelo de governabilidade da era Lula, baseado na compra de apoio parlamentar. No mensalão, Dirceu carregou quase sozinho culpas que lhe teriam sido bem mais leves se divididas com o ex-presidente.

Depois da vitória de Lula em 2002, Dirceu defendeu a tese de que o governo garantiria a maioria no Legislativo unindo petistas, peemedebistas e até setores do PSDB. As conversas nesse sentido andavam bem quando foram desautorizadas pelo presidente eleito. Lula optou por fechar alianças no varejo. Foi a festa para PTB, PR e PP. Foi também o começo do escândalo do mensalão. Dirceu se sente injustiçado quando Lula e o PT dão vazão à versão de que foi dele a ideia de comprar apoio entre partidos mais sensíveis ao vil metal. É inegável que Dirceu foi o operador do esquema que resultou no escândalo. Mas quem seria o pai da ideia? Essa é uma pergunta ainda em aberto. Aliás, também está em branco o lugar destinado ao pai na certidão de nascimento do petrolão. Talvez não por muito tempo.

Em entrevista recente ao jornal Folha de S.Paulo, o deputado Miro Teixeira (Pros-RJ) disse que Lula "caiu em tentação" ao montar sua base aliada. O parlamentar não é oposicionista, golpista nem conspirador. Pelo contrário, fala com a autoridade de quem foi ministro de Lula e participou de uma reunião, em janeiro de 2003, em que foram tratadas a formação e a composição da base aliada. "Havia quem dissesse que a maioria poderia ser em torno de projetos. E havia quem dissesse que aquele Congresso burguês poderia ter uma maioria organizada por orçamentos. Essa tendência dos que quiseram organizar pelo orçamento foi vitoriosa", revelou Miro, resumindo o pecado original do PT. Desde 2003, o partido usa ministérios, estatais e o orçamento mastodôntico da União para comprar parlamentares e financiar seu projeto de poder.

O mensalão foi bancado em parte com recursos desviados do Banco do Brasil. A descoberta do escândalo, em 2005, não inibiu o funcionamento de outros esquemas de corrupção. Segundo o Ministério Público e a Polícia Federal, ex-diretores da Petrobras receberam propinas de empreiteiras desde 2004, quando assumiram o cargo sob as bênçãos do PT e do PP.

O petrolão permitiu, por baixo, o desvio de 19 bilhões de reais dos cofres da Petrobras e funcionou até o ano passado. Os delatores estão contando em detalhes como empresas que se locupletaram desse dinheiro financiaram campanhas presidenciais de Lula e Dilma Rousseff.

"A corrupção no Brasil é endêmica e está em processo de metástase", afirmou o procurador Athayde Ribeiro Costa, integrante da força-tarefa da Lava-Jato. Na semana passada, a polícia prendeu o vice-almirante da reserva Othon Luiz Pinheiro da Silva, presidente licenciado da Eletronuclear, acusado de receber 4,5 milhões de reais em propina de cinco empresas envolvidas na construção da usina de Angra 3. Depois do mensalão e do petrolão, foi puxado agora o fio da meada do que já se batizou de eletrolão. O empresário Ricardo Pessoa havia dado uma pista da alta voltagem desse esquema ao revelar às autoridades em sua delação o envolvimento no eletrolão de Valter Cardeal, diretor da Eletrobras e "o homem da Dilma" no setor elétrico. A área de atuação de Cardeal era a obra de construção da usina nuclear de Angra 3.

O mensalão foi substituído pelo petrolão, que funcionou em paralelo ao eletrolão. A diferença entre eles é apenas a cor do cofre. O esquema era o mesmo. O PT e os partidos aliados nomeavam diretores para as empresas de cada setor e cabia a eles entender-se com as empreiteiras para armar o bote sobre o dinheiro público. Quando se dignou a falar de denúncia de corrupção, Lula prestou solidariedade aos envolvidos e minimizou o impacto das revelações assombrosas que surgiam. "Sai na urina", disse Lula. Eleita presidente, Dilma começou demitindo ministros e altos funcionários flagrados em "malfeitos". Foi a fase da "limpeza ética". Durou pouco. Devagarinho, os acusados de corrupção foram retomando seu posto no governo.

Fora da Operação Lava-Jato, corre em segredo de Justiça um processo com 54 réus, entre eles representantes de dezenove empreiteiras, que respondem pelo superfaturamento de mais de 1 bilhão de reais em obras em aeroportos. Entre os réus figuram executivos de empresas investigadas no petrolão e no eletrolão, que distribuíram propinas a funcionários da Infraero. Pelos valores e pela ousadia das investidas sobre o Erário, fica evidente que os hoje réus jamais cogitaram uma punição.

A impunidade parece estar ficando para trás na triste história brasileira. As investigações e punições dos envolvidos no petrolão demonstram que, como manda a Constituição, os procuradores, os policiais federais e a Justiça estão cumprindo seu papel sem distinção. Todos são iguais perante a lei. As prisões de Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro (veja a reportagem) seriam inimagináveis poucos meses atrás. Lula e Dilma conversaram recentemente em Brasília sobre esses desdobramentos. É quase inacreditável, mas a saída vislumbrada por criador e criatura será a compra de apoio no Congresso — justamente a prática que, abusada, envenenou a política brasileira nos últimos anos. O governo Dilma vai liberar 5 bilhões de reais em emendas e distribuir centenas de cargos até o fim do ano.

Líderes da Câmara rejeitam o afastamento de Cunha

Maiores bancadas defendem que presidente fique no cargo ainda que se torne réu

A maioria dos deputados federais que lideram as bancadas de seus partidos na Câmara declara ser contra o afastamento do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mesmo que o STF abra processo contra ele na Operação Lava Jato.

Cunha foi acusado pelo lobista Júlio Camargo de ter recebido US$ 5 milhões em propina no escândalo de corrupção na Petrobras.

Desde a denúncia, alguns parlamentares têm pedido o afastamento do peemedebista do comando da Casa.

Segundo o levantamento da Folha, com 20 dos 22 líderes das maiores bancadas, os deputados também dizem não ver motivo para que colegas tomados réus na Lava Jato respondam a processo de cassação no Conselho de Ética.

Deputados dizem ser contra afastar Cunha da presidência


  • Líderes da bancada também não veem razão para impeachment de Dilma


  • Maioria é contra abertura de processo de cassação de colegas investigados pela Lava Jato, como Cunha

Ranier Bragon, Aguirre Talento – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A maioria dos deputados que lideram as bancadas de seus partidos na Câmara declara ser contra o afastamento do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mesmo se o Supremo Tribunal Federal abrir um processo contra ele por causa da suspeita de que recebeu propina do esquema de corrupção descoberto na Petrobras.

Os líderes também dizem não ver motivo para que outros colegas investigados pela Operação Lava Jato respondam a processo de cassação no Conselho de Ética.

A Folha ouviu na semana que passou 20 dos 22 líderes das maiores bancadas da Câmara. Desde que o lobista Julio Camargo afirmou que pagou US$ 5 milhões em propina a Cunha, alguns parlamentares têm pedido seu afastamento do comando da Casa.

Mas a posição manifestada pelos líderes partidários mostra que ele mantém sólido apoio entre seus pares –mesmo após as declarações da advogada Beatriz Catta Preta, que representava Julio Camargo e acusou aliados de Cunha na CPI da Petrobras de tentar intimidá-la.

Embora a enquete tenha sido feita antes da veiculação da entrevista da advogada ao "Jornal Nacional", da TV Globo, a Folha apurou que a posição dos parlamentares em relação a Eduardo Cunha não sofreu alteração significativa.

Líderes de dez bancadas, que somam 294 deputados (57% do plenário), são contra o afastamento de Cunha mesmo que ele seja denunciado pela Procuradoria-Geral da República e o Supremo abra um processo contra ele, transformando-o em réu.

"Não tem sentença ainda. Pode não dar em nada, e aí como faz?", diz Sibá Machado (AC), líder da bancada do PT, partido hoje em pé de guerra com Cunha. "Entendo que o presidente Eduardo Cunha deve exercer plenamente suas atribuições constitucionais e ter garantido seu direito à ampla defesa", reforça Rogério Rosso (PSD-DF).

Apenas o nanico PSOL e o PPS defendem o afastamento. "Vou questionar na reunião de líderes a situação do presidente em relação às denúncias gravíssimas que surgiram", diz Chico Alencar (PSOL-RJ). Com o fim do recesso de julho, o Congresso volta ao trabalho nesta semana.

Além de Cunha, 21 deputados são alvo de investigação por suspeita de envolvimento com a corrupção na Petrobras. A maior parte dos caciques partidários da Câmara diz não ver razão para que eles respondam a processo de cassação caso sejam denunciados pelo Ministério Público e processados no Supremo.

"Denúncia não significa condenação não só para o parlamentar, mas como para qualquer cidadão. Caso contrário, você está antecipando o julgamento e tirando um mandato decidido pelo voto popular", diz o deputado André Moura (SE), líder do PSC e um dos aliados de Cunha.

Impeachment
A enquete mostra também que a maior parte dos líderes partidários da Câmara diz não ver motivo para que Cunha dê prosseguimento a um pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, o que, nos bastidores, o peemedebista ameaça fazer.

"Não existe comprovação de cometimento de nenhum crime no exercício do mandato", afirma o líder da bancada do PMDB, o partido de Cunha, Leonardo Picciani (RJ).

Ao todo, 11 líderes de bancadas que somam 298 deputados (58% do total) dizem ser contra a abertura do processo de impedimento da petista.

"Não pode comprometer o país, o povo brasileiro, a economia do país, o capital estrangeiro investido aqui, falando uma coisa sem propriedade e sem embasamento jurídico nenhum", diz Celso Russomanno (PRB-SP), que comanda um bloco de 38 deputados formado pelo PRB com outros partidos nanicos.

"O Brasil não é uma republiqueta que qualquer um desrespeita as bases democráticas", diz o líder do governo, José Guimarães (PT-CE).

De todos os partidos ouvidos, só o oposicionista DEM diz já ver elementos suficientes. "São muitos fortes as comprovações de que ela afrontou a Constituição e as finanças públicas", afirma Mendonça Filho (DEM-PE).

"Com o PT, não dá para conversar", Samuel Pessoa

• O economista diz que o problema estrutural das contas públicas só poderá ser resolvido em outro governo, porque não dá para fazer pacto com os petistas

Guilherme Evelin – Época

Filiado ao PSDB, o economista Samuel Pessoa costumava fazer elogios públicos a programas dos governos do PT. Era uma voz a favor da distensão política e tentava abrir espaços de interlocução com economistas heterodoxos, com linha de pensamento diferente da dele. Samuel mudou. Um dos autores do estudo que diz que o problema da solvência das contas públicas do país só será resolvido com reformas estruturais, ele se tornou um cético quanto à possibilidade de um pacto nacional para enfrentar essa agenda. "Sou o efeito de uma campanha eleitoral sórdida e suja", diz ele.

ÉPOCA - O ajuste do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, vai resolver nosso problema estrutural nas contas públicas?

Samuel Pessoa - O Joaquim Levy está fazendo um ajuste macroeconômico cíclico. O que a gente está dizendo é que, além desse ajuste macroeconômico cíclico, o Brasil tem um problema estrutural, que é um superávit primário (tamanho da poupança que o governo deve fazer para pagar os juros de sua dívida) aquém do requerido para estabilizar a dívida pública. Para estabilizar a dívida, a gente tem de repensar o contrato social estabelecido desde a Constituição de 1988: os programas sociais, todas as decisões que a sociedade brasileira, por meio do Congresso Nacional, de forma absolutamente legítima, tomou para resolver o problema da desigualdade. O problema é que esse contrato social implica um crescimento do gasto público de 0,3 ponto percentual do PIB, todo ano, há 23 anos.

ÉPOCA - E agora essa conta não está fechando mais.

Pessoa - Por 12 anos, no período que vai de 1999 a 2011, essa conta fechou graças a uma taxa extraordinária de crescimento da receita. A receita cresceu sistematicamente em velocidade superior à velocidade do PIB real, sem que novos impostos tivessem sido criados. Mas esse comportamento da receita, muito extraordinário, entorpeceu a sociedade e os participantes do debate público para esse problema estrutural.

ÉPOCA - Seu estudo diz que agora o enfrentamento desse problema estrutural se tornou inevitável. Essa agenda vai se impor de forma organizada ou, pior, pelo aguçamento da crise. Qual é o cenário mais provável?

Pessoa - Não é possível manter um estado de bem-estar social cujos gastos crescem mais do que o PIB. Isso aconteceu nos últimos 23 anos, mas não pode acontecer sistemática e eternamente. A solução dessa crise exige que a sociedade entenda que ela tem de fazer um monte de mudanças, como a reforma da Previdência. A sociedade tem de olhar o todo e repensar esse contrato social. A dificuldade é que cada um desses itens, em que houve crescimento de gastos, são meritórios. Mas o fato de as coisas serem meritórias não significa que elas caibam dentro do nosso PIB. O problema de a gente continuar com um contrato social cuja dinâmica não cabe dentro do PIB é que a gente pode escorregar para uma hiperinflação e chegar no cenário da Venezuela.

ÉPOCA - Mas o Brasil tem instituições mais sólidas do que a Venezuela.

Pessoa - Mas a gente não é intrinsecamente melhor do que a Venezuela ou a Argentina, que está com uma inflação de 30%. A Venezuela, há 15 anos, era mais organizada do que é hoje. A Venezuela, há 15 anos, não tinha 80 homicídios para cada 100 mil habitantes, nem tinha uma inflação batendo 100% ao ano. Construiu isso ao longo de uma década. O problema é que a gente já teve hiperinflação no passado.

ÉPOCA - Esse crescimento dos gastos é resultado de um contrato social. Para desfazer esse contrato, é preciso algum tipo de pacto nacional. Oual é a chance de isso ocorrer?

Pessoa - Essa concertação política está muito difícil. O PT mentiu de A a Z e recorreu a uma agressividade contra o Armínio Fraga, a Neca Setúbal, a Marina Silva. Isso inviabiliza a concertação. Entre os políticos que não são petistas, e não só os da oposição, a leitura dessa avançada no sinal que o PT deu para ganhar a eleição é que o PT está disposto a fazer qualquer coisa para se manter no poder. Setores políticos muito expressivos estão convencidos de que o PT é um perigo para a sociedade.

ÉPOCA - O senhor concorda com essa ideia?

Pessoa - Eu nunca concordei com isso, mas começo a concordar. Olhando o conjunto da obra - a ganância em ganhar a eleição a qualquer preço no ano passado, a dificuldade de reconhecer os erros, a relação ambígua com a Venezuela -, você vê um DNA autoritário. As cicatrizes e feridas da campanha são responsabilidade do PT. Não houve simetria. A oposição manteve a temperatura normal nas disputas políticas no Brasil. O PT se dá ao direito de avançar o sinal porque o PT é um partido que se vitimiza, que diz que é perseguido pela imprensa. Sempre que alguma coisa dá errado, o PT diz que os outros são culpados. Essa vitimização petista faz com que eles se sintam no direito de usar qualquer instrumento para se manter no poder porque eles são uns coitadinhos perseguidos pelo capital. O partido que ganhou a eleição com mentira de A a Z é o PT. É ele que tem de fazer um gesto. Mas esse gesto exige um desprendimento do PT, que eles nunca tiveram em 30 anos. É um partido difícil de conversar. Não vai ser agora que eles estão acuados que esse gesto vai vir.

ÉPOCA - Mas a presidente Dilma Rousseff, ao nomear Joaquim Levy, não fez esse gesto, reconhecendo seus erros?

Pessoa - Eu acho que ela está reconhecendo, mas, em política, a conversa é importante. Dada a ultrapassagem de sinal que eles deram e a prevenção que todo sistema político tem com o PT, eles teriam de fazer muito mais.

ÉPOCA - Se um acordo está difícil, isso significa que a crise vai se tornar mais aguda?

Pessoa - É muito difícil saber o timing disso. O mundo está muito paciente com a gente. O Brasil tem instituições boas. O joaquim Levy está fazendo um bom trabalho dentro das circunstâncias. O ajustamento cíclico avançou. A gente já consegue enxergar a inflação dentro da meta em 2017. Mas você tem um problema dramático que é o da insolvência do Tesouro Nacional. Por essas questões estruturais, essa insolvência, com o tempo, piora. A solvência não é atribuição do ministro da Fazenda, é problema da sociedade liderada pelo Executivo. Não vejo espaço político para uma concertação, mas a gente tem nos próximos dois anos um mundo de juros muito baixos, e isso dá um espaço para gente. É possível que a situação vá se deteriorando, mas que a gente consiga empurrá-la com a barriga por mais três anos e meio, até a próxima campanha presidencial, sem que haja um evento extremo até lá. E aí, em 2017, a gente discute o país e elege um governo para arrumar a casa. Mas, mesmo nesse cenário, otimista, não dá para ter crescimento porque você não endereça a questão do buraco fiscal. Fica todo mundo com o pé no freio porque sabe que vai ter um ajuste de contas lá na frente, mas não sabe a natureza dele. Isso cria uma incerteza.

ÉPOCA - A pauta-bomba no Legislativo ameaça esse cenário otimista. Como vê o comportamento do Congresso?

Pessoa - O petrolão também é um obstáculo para essa concertação política. O efeito do petrolão é menos na economia e mais nas dificuldades que ele introduz para agenda da política. Ninguém sabe o que vai acontecer, e aí as agendas individuais ficam mais importantes. Mas eu espero que, com a sinalização da Standard & Poors (sobre a possibilidade de rebaixamento da nota de crédito do Brasil), os deputados entendam a situação e aprovem a desoneração da folha de pagamentos como o ministro Levy tinha mandado ao Congresso em fevereiro. Os deputados deviam fazer isso pelo bem do país. O jogo dos parlamentares é votar coisas absurdas, como o fim do fator previdenciário, e deixar que a presidente vete. Eles querem desgastar o PT por tudo que o PT fez. É um pouco a resposta que os políticos estão dando a um grupo político que escolheu transpor alguns limites da política brasileira. Eu coloco a pauta-bomba nesse contexto. Mas eu acho que eles não vão derrubar os vetos da presidente. Eu espero que não.

ÉPOCA - Esse não é um comportamento muito irresponsável, inclusive do PSDB?

Pessoa - Entendo esse comportamento, mas discordo dele. O PSDB só se enfraquece quando vota contra o seu legado.

ÉPOCA - O senhor era uma voz moderada, a favor do diálogo. Por que mudou?

Pessoa - Eu também sou efeito de uma cicatriz de uma campanha sórdida e suja. Além disso, a partir de 2009, a política econômica ficou um desastre. A nova matriz econômica é a política econômica mais malconduzida da história da República. Você pega um navio com 200 milhões de habitantes e faz invencionices, destrói uma política econômica estável que a gente ficou 20 anos construindo com dificuldade. A gente voltou para trás. A vida da minha filha vai ser pior porque essa equipe que estava no governo atrasou o país em 20 anos.

Entrevista Marina Silva; Estou pagando o preço por não apoiar o impeachment

• Ex-senadora critica Dilma, mas prega 'responsabilidade' e diz que não vai 'instrumentalizar a crise' pensando em 2018

Bernardo Mello Franco - Folha de S. Paulo

A duas semanas das novas manifestações contra o governo, Marina Silva afirma que está disposta a pagar o preço por não defender o impeachment de Dilma Rousseff.

Ela prega "responsabilidade" com a democracia e diz que não vai "instrumentalizar a crise" para tentar ampliar o desgaste da presidente.

Sem citar o PSDB de Aécio Neves, que convocará eleitores para os protestos do dia 16, a ex-senadora sustenta que os políticos devem "respeitar a sociedade" e evitar o "oportunismo". "O momento é de escutar. Ouvir e compreender, olhar e perceber", rimou.

Marina recebeu a Folha na última quarta (29), em São Paulo. Segurava seu programa de governo da campanha de 2014, em cópia xerocada e cheia de anotações a lápis.

Ela manifestou incômodo com as críticas de que estaria muito calada diante da crise. "Estou trabalhando muito. Não estou sumida não, viu?"

Folha - A senhora consegue ver uma saída para a crise?

Marina Silva - A contração da economia vai se estender por um período que ainda não sabemos qual é. Se o país perder o grau de investimento, a situação vai se agravar.

Neste momento, é preciso ter muita responsabilidade. Já tivemos perdas em relação às conquistas econômicas. Agora estamos tendo perdas em relação às conquistas sociais, com inflação e desemprego. Uma coisa que não podemos perder é a nossa confiança na democracia.

Não podemos, em hipótese alguma, colocar em xeque o investimento que fizemos na democracia. Você não troca de presidente por discordar dele ou por não estar satisfeito. Se há materialidade dos fatos, não há por que tergiversar. Se não há, o caminho doloroso de respeito à democracia tem que prevalecer.

As manifestações do dia 16 devem pedir o impeachment de Dilma. Qual a sua opinião?

A sociedade tem todo o direito de se manifestar, porque foi enganada quando negaram os problemas e não fizeram o que era preciso.

Mas esse protesto não pode antecipar o que a Justiça ainda não concluiu. Uma coisa é o que a sociedade pauta, outra é o que as lideranças políticas têm que ponderar.

Alguns políticos estão tentando instrumentalizar a crise, em vez de resolvê-la. Na democracia, não se resolve a crise passando por cima do processo constitucional.

Isso tem um custo? Claro. Mas a liderança política não tem só que repetir o que se quer ouvir. Às vezes, ela tem que pagar um preço. Não podemos deixar de considerar o valor da democracia, até pelos traumas pelos quais passamos.

A sra. é cobrada por não defender o impeachment?

O presidente Fernando Henrique tem uma postura ponderada e paga um preço por isso. Eu tenho pago o meu. Não estou fazendo isso porque quero agradar A ou B. É porque acho que é o certo. É muito fácil pensar que existe uma saída mirabolante.

Dilma tem responsabilidade pelo escândalo da Petrobras?

Ela foi ministra de Minas e Energia, chefe da Casa Civil e presidente do conselho da Petrobras. Eu não seria leviana de dizer, sem provas, que ela tem responsabilidade direta. Sinceramente, torço para que não. Ela tem responsabilidades políticas e administrativas. Não há como ser isentada politicamente.

Mas a legislação brasileira diz que é preciso ter envolvimento direto para o impeachment. Não podemos ter uma atitude leviana com isso.

A presidente voltou a falar em diálogo. A sra. aceitaria um convite para conversar?

Agora que estamos com o leite derramado, as pessoas se dispõem ao diálogo...

O caminho do diálogo é sempre bem-vindo, desde que se saiba em que direção. Na direção de mais do mesmo, não há o que conversar.

Torço para que a presidente e sua equipe reconheçam a gravidade dos problemas e os erros que foram cometidos. Reconhecer isso é a base para encontrarmos uma solução.

Qual a saída possível?

Temos que seguir dois trilhos. Um é o das investigações, com autonomia para o Ministério Público, a Polícia Federal e a Justiça. O outro trilho é o dos rumos da nação.

Talvez seja o momento de um pacto em torno de uma agenda comum aos interesses do país. Qualquer governo deveria ter apoio para medidas estruturantes. Eu não posso ser a favor do desenvolvimento sustentável e votar contra ele porque quem está propondo é a Dilma ou o Aécio. Isso seria incoerente.

Quais são os erros que o governo precisa reconhecer?

Em 2008, o mundo todo decidiu fazer o dever de casa. O Brasil simplesmente negou a crise. Negou o princípio da realidade. Tomamos medidas inicialmente acertadas, de estímulo ao mercado interno, mas em algum momento a corda iria romper.

O governo criou a expectativa de que o país poderia continuar crescendo 7% ao ano, como em 2010.

Se a sra. fosse eleita, não faria um ajuste igual ao de Dilma?

A dose não seria de morfina, como a que está sendo dada agora. Com mais credibilidade, com certeza se criaria um ciclo virtuoso de investimento e mobilização dos setores produtivos. O remédio seria menos amargo.

Eduardo Cunha pode continuar à frente da Câmara?

Nenhum de nós está acima da lei, por mais que tenhamos cargos importantes no Congresso. Uma vez denunciado, é óbvio que ele deve ser afastado, sem que isso seja um pré-julgamento. Mas a função que ele ocupa pode criar impedimentos ao andamento das investigações.

Alguns eleitores reclamam que a sra. anda distante do noticiário. A Marina sumiu?

Em 2010, as pessoas me faziam a mesma pergunta. Esse não é o momento de ficar gesticulando, tagarelando. É o momento do gesto.

Não estou aqui para instrumentalizar a crise. Nunca parei de trabalhar. Continuo na militância socioambiental e sou professora associada da Fundação Dom Cabral.

Pretende se candidatar a presidente de novo em 2018?

Ainda não sei. Estou ajudando a criar a Rede [seu novo partido, ainda não registrado]. Quero fazer as coisas sem estar presa ao que pode ser eleitoralmente melhor.

A gente está no fundo do poço porque a preocupação é maior com as eleições do que com o futuro da nação.

Crise atinge até setor que nunca parou de crescer

Crise chega à telefonia móvel e operadoras recorrem a promoções

Alô, crise

• Setor tem previsão de queda nas receitas pela 1ª vez desde 2000

Bruno Rosa – O Globo

RIO - Queda na venda de smartphones, redução no número de linhas móveis em funcionamento e inadimplência crescente. A crise econômica chegou até na telefonia, setor que crescia ininterruptamente desde 2000.

Após quase quadruplicar seu faturamento nos últimos 14 anos, as empresas de telecomunicações devem amargar neste ano um recuo na receita de 3,8% a 6%. A previsão foi feita a pedido do GLOBO pela Orion Consultores, que estima redução nos negócios de R$ 234,1 bilhões, no ano passado, para algo entre R$ 220 bilhões e R$ 225 bilhões até dezembro. Hoje, o setor, diz a associação Telebrasil, responde por 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB).


Segundo especialistas, não há pacote de velocidade rápida na internet que resista ao atual momento da economia, com inflação de 8,89% em 12 meses até junho, desemprego em alta, queda de 2,9% na renda real e aumento de juros. Diante desse cenário desfavorável, as empresas estão fazendo o que podem para (tentar) driblar a crise: descontos de até 50% no preço de celulares, planos promocionais e parcelamento das contas em atraso para não perder clientes.

— Setores como o de telefonia estavam conseguindo se manter em patamar de crescimento por terem sensibilidade menor às variáveis econômicas. Antes, o dólar alto e a inflação afetavam o custo das empresas; agora, o desemprego e a menor renda começam a afetar os serviços de telefonia — diz Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management.

Assim, a queda do faturamento vem acompanhada de redução no Ebitda (o lucro antes de serem descontados impostos e juros). Segundo Ronaldo Sá, da Orion, o número deve cair 3,5%, de R$ 36,7 bilhões, em 2014, para R$ 35,4 bilhões neste ano.

Como indicativo, diz Sá, está o recuo no número de linhas em serviço. Segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o país perdeu em junho 1,7 milhão de linhas, somando 282,4 milhões. A queda de 0,6% foi a maior desde junho de 2006, quando recuou em 0,67%.

Mais inadimplência e queda nas vendas
Mas os números tendem a piorar. Entre as operadoras, a curto prazo predomina uma visão pessimista. O terceiro trimestre vem sendo chamado de “fundo do poço do setor” pelos executivos de teles. Redes varejistas e fabricantes de celulares devem fechar o ano com recuo inédito nas vendas de smartphones. A previsão, diz a consultoria IDC, é de queda de 2%. Por isso, até os badalados iPhone 6 e Galaxy S6 se renderem aos descontos.

Por trás da piora nos números, está a inadimplência no setor. Após aumentar em 39,5% de janeiro a abril, na maior alta desde 2013, o número de clientes com contas em atraso vai continuar subindo até o fim do ano, adianta Julio Leandro, Superintendente do Serasa Consumidor. Segundo ele, o setor ficou na dianteira do ranking, deixando para trás os segmentos de varejo, bancário e não bancário.

— Esse estudo é baseado nas informações repassadas pelas operadoras. A inadimplência maior está ligada ao emprego. Esperávamos uma alta, mas nos surpreendemos. E o serviço de telecomunicações não é tão básico como alimentação. Por isso, as pessoas deixam de pagar primeiro. O que já está difícil, vai piorar — prevê Leandro.

Ronaldo Sá, da Orion, destaca que os clientes de cartão pré-pago são os mais afetados neste primeiro momento, já que têm renda menor:

— Agora, vamos ver isso no pós-pago. O problema é a inadimplência que chegou a 1,8% da receita das operadoras móveis. E vai aumentar nos próximos trimestres.

Por isso, as operadoras vêm recorrendo a negociações com os clientes em atraso. Bernardo Kos Winik, diretor de Varejo da Oi, diz que a companhia tem sido mais seletiva na análise de crédito:

— Estamos sendo flexíveis, parcelando a conta em atraso para não perder o cliente. Também estamos investindo na melhora do sistema de cobrança. O desafio é não encolher neste ano. Por isso, estamos investindo em promoções nos nossos planos de convergência, que permitem economia de até 20% em relação ao valor caso o cliente contratasse os serviços de forma isolada. O dinheiro está mais curto.

Para George Dolce, vice-presidente da Nextel, a empresa decidiu criar novos planos promocionais porque os clientes estão buscando soluções para economizar.

— O nosso setor vinha imune à crise e, de um tempo para cá, sentimos essa desaceleração. A renda disponível está menor. Houve outros fatores como o aumento da energia elétrica, que onerou todo mundo. Por isso, tivemos de nos ajustar às novas necessidades, criando novos planos e aumentando o parcelamento de aparelhos, para até 24 vezes — afirma Dolce.

A Claro decidiu estender o parcelamento dos aparelhos mais caros para 24 parcelas. Até nos planos pós-pagos mais simples, de R$ 100 por mês, o aparelho 4G sai de graça. Segundo Ricardo César, Diretor de Unidades Regionais da Claro, os clientes estão otimizando seus recursos.

— Em todos os planos pós-pagos, ampliamos a franquia de internet, que chegou a dobrar, mas mantivemos o mesmo preço. No caso do pré-pago, mantivemos o valor e aumentamos em 50% a franquia de dados — exemplificou César.

Iphone entra na guerra do desconto
Na TIM, diz Rogério Takayanagi, diretor da empresa, a opção foi criar novos planos e ofertas para “quem está com o orçamento limitado". Por isso, a empresa decidiu não descontar da franquia o uso de redes sociais como o WhatsApp no plano pós-pago.

— A população está preocupada em proteger seus gastos. O desafio é adequar o portfólio em um momento de consumo crescente de dados e renda em baixa.

Essa menor renda disponível derrubou a expectativa de venda de celulares. Se em 2014 foram vendidos 54,5 milhões de smartphones, para este ano o volume pode chegar a 53 milhões de unidades, prevê Leonardo Munin, analista de pesquisas da IDC. Assim, o varejo investe em promoções, com descontos de até 48%. É o caso do LG L8, na Americanas.com, cujo preço caiu de R$ 859 para R$ 443,33. No Fast Shop, o iPhone 6, da Apple, está 10,72% mais barato (passou de R$ 3,499 mil para R$ 3,123 mil), e o Galaxy S6, da Samsung, que caiu de R$ 3,299 mil para R$ 2,723 mil, queda de 17,4%. Munin ressalta que o número final de vendas dependerá do desempenho da Black Friday e do Natal:

— O cliente só vai comprar o que o bolso aceita e não o que deseja.