sexta-feira, 26 de junho de 2015

Opinião do dia - José Roberto de Toledo

Menos militantes, menos dinheiro para financiar candidatos e sem discurso. O PT não sabe o que dizer para o eleitor. A falta de uma narrativa que faça sentido e seja convincente está por trás das discussões públicas entre petistas. Sem rumo não há estratégia. E sem estratégia não se faz campanha eleitoral.

Tudo isso aponta para o fim do ciclo de expansão petista. E, com ele, o contrafluxo das ideias que o PT tentou representar.

---------------------------
José Roberto de Toledo é jornalista. Fim de ciclo. O Estado de S. Paulo, 25 de junho de 2015.

PF: Pimentel é suspeito de corrupção

Fecha o cerco a Pimentel

• Alvo de operação da PF, governador é suspeito de corrupção por ter despesas pagas por empresário

Jailton de Carvalho, Catarina Alencastro e Gabriela Valente - O Globo

Escândalos em série

BRASÍLIA - A Polícia Federal deflagrou ontem operação em que investiga o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), pela prática de possíveis atos de corrupção e lavagem de dinheiro e por participação em organização criminosa supostamente chefiada pelo empresário Benedito Oliveira. Ao mencionar os indícios de corrupção, um documento da PF diz que o empresário pagou despesas com transporte e hospedagem do governador e da mulher dele, Carolina Oliveira, no Kiaroa Resort, em Maraú, na Bahia, entre 15 e 17 de novembro de 2013, quando Pimentel era ministro do Desenvolvimento.

Carolina também é investigada por receber pagamentos de empresas que obtiveram recursos do BNDES na época em que ela trabalhava como assessora do banco e Pimentel era ministro do Desenvolvimento. O BNDES é subordinado ao ministério.

A PF formulou a acusação contra o governador em relatório apresentado na chamada Operação Acrônimo 2 ao ministro Herman Benjamin, relator do inquérito sobre o assunto no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Benjamim considerou parte das acusações consistentes e autorizou a PF a fazer ontem busca e apreensão de documentos em Brasília, Belo Horizonte, Rio e São Paulo. Entre os locais visitados pelos policiais estão um escritório em Belo Horizonte usado por Pimentel na campanha eleitoral e outros endereços de empresas que fizeram negócios com Carolina nos últimos anos. Mas o ministro não autorizou a busca e apreensão no Palácio da Liberdade e nas residências de Pimentel, a oficial e a particular.

Empresas investigadas
Na lista de empresas objeto de busca estão a Pepper Comunicação Interativa, agência que prestou serviços a campanhas do PT ano passado (inclusive à campanha da presidente Dilma Rousseff nas redes sociais), e continua prestando serviços ao partido. Também foram feitas apreensões na empresa MR Consultoria, do jornalista Mário Rosa, e em endereços de Otílio Prado, ex-auxiliar do governador de Minas.

Segundo a polícia, Benedito Oliveira pagou R$ 12.127,50 pela hospedagem do então ministro e da mulher no resort, por intermédio de Pedro Augusto Medeiros, também acusado de movimentar parte do dinheiro do empresário. A partir da análise de uma troca de mensagens encontradas num dos celulares do empresário, a PF sustenta ainda que Carolina viajou ao resort num avião com despesas bancadas pelo empresário.

"Diante das convergências supracitadas, é provável que Benedito tenha pago a hospedagem e a viagem em avião particular para o então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Damata Pimentel", diz relatório. No documento, a polícia aponta mais três outros casos que colocariam sob suspeita as relações do governador e da mulher com o grupo de Benedito Oliveira. Entre as situações destacadas estão o subfaturamento de notas fiscais relativas a serviços que a Gráfica Brasil, de Oliveira, prestou para a campanha que resultou na eleição ao governo de Minas, ano passado.

Uma das notas fiscais emitidas pela Gráfica Brasil aponta a produção de 250 mil santinhos para a campanha de Pimentel. Mas as ordens de serviço apontaram a produção de 2,5 milhões de santinhos, ou seja, um número dez vezes maior que o registrado na contabilidade formal. A polícia encontrou disparidades também nos custos de produção dos santinhos. "Enquanto na parte esquerda da tabela constata-se o valor de produção de todos os materiais em R$ 781.183,45, na nota fiscal o valor de emissão é de apenas R$ 88.735,00", diz o relatório.

O subfaturamento teria como objetivo evitar que o então candidato a governador pelo PT estourasse os limites de gastos fixados pela Justiça Eleitoral.

O documento lembra ainda que a contas da campanha de Pimentel estão sendo questionadas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A polícia também levanta suspeita sobre pagamentos da Marfrig Global Food, do Groupe Casino, da Pepper e da MR Consultoria para a Oli Comunicação, empresa de Carolina.

A Marfrig e o Casino têm interesses junto ao BNDES, banco de desenvolvimento vinculado ao Ministério do Desenvolvimento. Parte dos pagamentos foram feitos num período em que Pimentel estava à frente do ministério e Carolina atuava como assessora do BNDES. A PF suspeita que os repasses tenham ligação com o interesse das empresas por financiamentos do BNDES.

A Marfrig desembolsou R$ 595 mil para a Oli Comunicação entre novembro de 2011 e abril de 2012. O Groupe Casino pagou R$ 362.868,20 para a empresa de Carolina entre abril e julho de 2012. "É razoável inferir-se que pode ter havido simulação de contratação da Oli Comunicação pelo Groupe Casino e pelo Marfrig Global Foods, a fim de repassar valores que, em última análise, poderiam ter como destinatário o então ministro de Estado titular do MDIC", diz o relatório.

Sócia oculta da Pepper
No texto, a PF menciona 11 notas fiscais de serviços de consultoria que a Oli teria prestado à Pepper, mas sem deixar claro qual o montante recebido por Carolina. A polícia suspeita que Carolina seria uma espécie de sócia oculta da Pepper. No documento, a PF destaca ainda que a Oli recebeu R$ 2,4 milhões da MR Consultoria entre 2012 e 2014, "o que configuraria, em média, pagamentos da ordem de R$ 800 mil por ano".

A PF argumenta que a Oli tinha registro de apenas um único funcionário, e que a MR também é empresa de pequeno porte. No relatório, a PF sustenta que Mário Rosa, dono da MR, é sócio de Benedito Oliveira na Roi Participações. A partir daí, conclui que Mário Rosa "simulou a contratação de consultoria da Oli" para "escamotear a origem/movimentação/propriedade dos valores envolvidos".

O ministro Herman Benjamin considerou "consistentes os indícios de materialidade e de autoria até agora coligidos" pela PF, e determinou o aprofundamento das investigações. Além das buscas no palácio e na casa de Pimentel, a PF também pediu autorização para apreender documentos na sede do PT, do BNDES e da BR Distribuidora, que pagou despesas de Benedito no resort usado por Pimentel. Mas os pedidos foram rejeitados.

"É de se notar que a realização de busca em sede de partido político por autoridades policiais é medida de extrema gravidade no regime democrático, devendo estar plenamente justificada em elementos concretos, considerando-se, sobretudo, que o pluralismo politico é um dos fundamentos do Estado brasileiro", afirmou o ministro. Benjamin disse ainda que os fatos apontados pela PF são referentes ao período anterior à chegada de Pimentel ao governo. Por isso, não havia necessidade de busca no palácio.

Queixa de arbitrariedade
Para o governo de Minas, a atuação da PF "é a extensão da arbitrariedade cometida anteriormente (na Operação Acrônimo I)". "Com base somente em ilações e deduções fantasiosas, essa investigação prossegue eivada de irregularidades, tanto que os pedidos para a realização de busca e apreensão nas sedes do governo de Minas Gerais, na residência oficial e na residência particular do governador, e ainda em relação a sua esposa, foram negados pelo ministro", diz a nota.

O presidente do PT, Rui Falcão, disse que a investigação sobre a agência Pepper não tem relação com o partido.

- Ela (Pepper) presta serviço para nós. O que ocorreu lá a empresa tem que se manifestar. Não tenho detalhes. Não creio que isso envolva qualquer tipo de relação da Pepper com o PT - disse Falcão.

Mário Rosa confirmou que contratou Carolina entre 2012 e 2014. Disse que o contrato para prestação de serviço jornalístico não envolvia recursos públicos.
- Questionamentos são razoáveis considerando que trabalho num ambiente de gestão de crise. Mas não recebi dinheiro público nem federal, nem estadual, nem municipal.

O advogado Melillo Dinis, da Pepper, disse que a empresa não cometeu irregularidade. Ele nega ainda que a Pepper tenha sociedade com a Oli Comunicação ou com Carolina, como acusa a PF.

- A Pepper não tem e nunca teve qualquer relação societária com a Oli Comunicação ou com Carolina - disse. (Colaborou André de Souza)

PT aprova resolução que eleva tom das críticas à Lava-Jato

• Após cobranças de Lula, partido defende até mesmo empreiteiras

Sérgio Roxo e Fernanda Krakovics – O Globo

Escândalos em série

SÃO PAULO e BRASÍLIA - Três dias depois de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticar o PT publicamente, a Executiva do partido reunida ontem em São Paulo aprovou uma resolução que responde às cobranças do seu líder e endurece o confronto aos investigadores da Operação Lava-Jato. Quatro dos 16 itens da resolução são dedicados à investigação. Sem mencionar diretamente o juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava-Jato, o presidente do PT, Rui Falcão, classificou de "inexplicável e inaceitável" a manutenção da prisão do ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto.

Durante a reunião, um grupo de amigos de Vaccari, preso desde 15 de abril, apresentou um dossiê para embasar sua defesa. O PT pretende distribuir o material nos estados.

Na resolução aprovada na reunião de ontem, em São Paulo, o PT aponta, na Lava-Jato, violação dos "princípios da presunção da inocência, que prisões preventivas sem fundamento se prolongam e que um estado de exceção está sendo gestado em afronta à Constituição".

O texto chega até a defender as empreiteiras acusadas de participar do esquema de corrupção na Petrobras, argumentando com o risco de desemprego: "Preocupa o PT as consequências para a economia nacional do prejulgamento de empresas acusadas no âmbito da Operação Lava-Jato. É preciso apressar os acordos de leniência, que permitam a recuperação de recursos eventualmente desviados e que não se paralisem obras, a fim de impedir a quebra de empresas e a continuidade das demissões daí resultantes".

Anteontem, na véspera da reunião da Executiva, Rui Falcão teve uma longa reunião com Lula na sede do instituto do ex-presidente, em São Paulo. O documento aprovado pelos dirigentes mostrou que os ponteiros foram acertados. Em outra frente, o partido também elevou o tom das críticas à política econômica do governo federal em relação ao texto aprovado duas semanas atrás no Congresso da legenda. Agora, o partido pede "medidas urgentes de reorientação", entre elas a redução da meta de superávit fiscal.

Na segunda-feira, durante palestra promovida por seu instituto, Lula disse que o partido precisa "fazer uma revolução interna, colocar gente nova, gente que pensa diferente". Entre outras medidas, a Executiva decidiu ontem criar um conselho com a participação até de não filiados. Segundo Falcão, será uma instância para "trocar ideias" sobre a conjuntura política:

- Vai ser um conselho ligado à presidência do PT com entre 15 e 20 participantes. Faremos uma reunião a cada 30 ou 40 dias com participação de gente do PT e gente amiga do PT - afirmou.

Lula recebeu anteontem o ministro Edinho Silva (Comunicação Social) em São Paulo. Para baixar a temperatura, a bancada do PT na Câmara adiou a divulgação de um documento respaldando as críticas de Lula, como havia feito a do Senado, e convidou o ex-presidente para uma reunião na próxima semana, em Brasília. O encontro aconteceria enquanto Dilma Rousseff visita oficialmente os Estados Unidos.

PT aprova resolução em defesa de empreiteiras

Após prisão de Odebrecht, PT aprova resolução em defesa das empreiteiras

• Efeito Lava Jato. Sob a orientação de Lula, que mantém relação de proximidade com o empresário Marcelo Odebrecht, partido afirma em documento que está "preocupado" com as consequências da operação da Polícia Federal e aponta "prejulgamento" da Justiça

Ricardo Galhardo José Roberto Castro – O Estado de S. Paulo

Menos de uma semana depois da prisão dos presidentes da Odebrecht e da Andrade Gutierrez pela Operação Lava Jato, o PT, em resolução política aprovada ontem pela sua Executiva Nacional, saiu em defesa das empreiteiras investigadas por desvios na Petrobrás. No documento, o PT defende pressa nos acordos de leniência que permitam o desbloqueio de recursos para as empresas e afirma que as empreiteiras são vítimas de "prejulgamento".

"Preocupam o PT as consequências para a economia nacional do prejulgamento de empresas acusadas no âmbito da Operação Lava Jato", diz o texto. A Executiva argumenta que o bloqueio dos recursos vai causar demissões e afetar a economia, mas, segundo dirigentes, a defesa é um pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Embora não seja investigado pela Lava Jato, Lula tem proximidade com empreiteiras que estão na mira da operação, especialmente a Odebrecht, e está preocupado com a possível exploração política do caso.

Anteontem Lula se reuniu longamente com o presidente do PT, Rui Falcão. Segundo o dirigente, os dois conversaram sobre "essa ofensiva conservadora voltada contra" o partido. Além de defender as empreiteiras, o PT acusa a Lava Jato de agir "fora dos marcos do estado democrático de direito", gestar um "estado de exceção" e criticou a manutenção da prisão do ex-tesoureiro João Vaccari Neto, detido preventivamente desde o dia is de abril.

Reorientação. Depois de aliviar críticas ao ajuste econômico do governo Dilma Rousseff no 5° Congresso do PT, a sigla mudou de rumo e, no texto aprovado ontem, defendeu uma "reorientação" da política econômica com a redução da meta de superávit fiscal, redução da taxa de juros e criação de um plano de proteção do emprego, a ser elaborado em conjunto com sindicatos.

Com aval do ex-presidente Lula, o PT também decidiu ontem criar um conselho, cujos nomes serão definidos por Falcão, que será composto por estrelas petistas afastadas da direção partidária e integrantes de movimentos sociais. O objetivo é quebrar a rígida estrutura burocrática do partido e abrir a legenda para a participação de novos atores políticos. Além disso, serão criados cinco grupos de trabalho com missões específicas. Um deles terá a participação do próprio Lula e terá o objetivo de construir urna agenda nacional envolvendo as principais lideranças do partido.

Lula prometeu voltar a viajar pelo Brasil. Outro grupo terá como objetivo preparar o PT para as eleições de 2016 resgatando bandeiras históricas da legenda. Falcão negou que as mudanças sejam uma resposta às declarações de Lula sobre o PT estar "velho" e "só pensar em cargos", feitas na segunda-feira passada. "Acabamos de fazer uma reunião e vocês querem se referir a coisas de três, quatro dias atrás. Não vou falar sobre isso", irritou-se o dirigente.

Insatisfeito com Dilma e com Cardozo, petista irá até Brasília

Vera Rosa – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Depois de fazer duras críticas ao PT e ao governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentará pôr um freio de arrumação na crise política. Na segunda-feira, quando a presidente Dilma Rousseff estará nos Estados Unidos, Lula vai se reunir com as bancadas do PT no Senado e na Câmara, em Brasília, para pedir que os deputados e senadores saiam da defensiva em relação à Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Lula está preocupado com o que chama de "desarticulação" do PT e "paralisia" do governo diante da sucessão de denúncias. Quer unificar o discurso e acertar o passo petista no Congresso. Não esconde, por exemplo, a contrariedade com os rumos da CPI da Petrobrás, que convocou para depor o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto.

Em conversas reservadas, ele tem dito que a oposição quer transformá-lo no próximo alvo da Lava Jato e não vê reação do governo. Não é só: o ex-presidente não se cansa de criticar o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que, na avaliação dele, não tem controle da Polícia Federal. Ministros próximos de Dilma e Lula trabalham, nos bastidores, para uma reaproximação entre os dois. Ex-titular da Secretaria-Geral da Presidência e homem da confiança de Lula, Gilberto Carvalho, hoje presidente do Sesi, e o ministro da Comunicação Social, Edinho Silva, também estão ajudando a jogar água na fervura.

Página virada. Para o ex-presidente, Dilma precisa urgentemente "virar a página do ajuste fiscal" e o PT, reagir às denúncias com veemência. Lula também tem dito que PT e PMDB precisam se acertar no Congresso. Na quarta-feira, por exemplo, a Câmara aprovou emenda que vinculou a política de valorização do salário mínimo aos reajustes das aposentadorias graças à traição de partidos da base, como o PMDB, o PDT e o PP. "Nós temos de fazer um pacto interno pelo PT e pela governabilidade", disse o líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE). "Tudo o que não precisamos no momento é de briga interna, pública." Embora Dilma tenha dito que Lula tem "todo o direito de fazer críticas", seus gestos contrariaram o Planalto.

A portas fechadas, ministros do PT observam que o ex-presidente toma a dianteira para se afastar dos escândalos de corrupção que abalam o partido e aponta falhas do governo na tentativa de se preservar politicamente. Apesar da crise, Lula ainda é, hoje, o nome mais forte do PT para disputar a sucessão de Dilma, em 2018. A candidatura, porém, depende do êxito do governo e da recuperação da imagem do PT, desgastada com um escândalo após o outro. No Planalto, auxiliares d a presidente dizem que as críticas de Lula prejudicam o governo e abafam a "agenda positiva" das concessões de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias, jogando luz sobre a divisão entre "criador" e "criatura".

Lula reconhece para petistas que se excedeu nas críticas ao partido

• Mea-culpa do ex-presidente foi relatado por Rui Falcão em reunião fechada da cúpula da sigla

• Dias atrás, ao defender a renovação do partido, Lula chegou a dizer que hoje petistas "só pensam em cargo"

Catia Seabra, Bela Megale – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Após afirmar que petistas "só pensam em cargo", o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu ter se excedido nas críticas públicas que fez ao PT e ao governo Dilma Rousseff. Em conversas com aliados, também admitiu que suas declarações prejudicam a imagem da sigla, em vez de ajudá-la.

Lula alegou, no entanto, que a imprensa exagerou o tom de sua avaliação e que não tinha ideia de que a repercussão de suas declarações seria tão grande.

Esse mea-culpa foi relatado pelo presidente do PT, Rui Falcão, na manhã desta quinta (25), durante reunião da cúpula da sigla, em São Paulo.

Em sua exposição, Falcão descreveu parte de sua conversa na véspera no Instituto Lula. Segundo participantes da reunião da Executiva do partido, Falcão afirmou que Lula se comprometeu a atuar pela pacificação interna do partido e que cumprirá uma agenda para fortalecê-lo.

A primeira tarefa será um encontro com parlamentares petistas na próxima segunda-feira (29), em Brasília.

Revolução
No início desta semana, Lula pregou uma "revolução" no partido, afirmando que os petistas parecem querer salvar apenas a própria pele.

Seu discurso provocou forte reação interna no partido. Até a presidente Dilma Rousseff se pronunciou, tentando minimizar a polêmica.

Nesta quinta, Falcão também tentou reduzir o impacto dessas declarações. publicamente, em entrevista a jornalistas, afirmou, em entrevista, que o caso não fora tema de debate na reunião.

Apesar da tentativa de aplacar a crise, o partido atendeu à cobrança de Lula e divulgou um texto em que cobra "reorientação" da política econômica implementada pelo governo:

"Avultam entre estas providências a redução da meta de superávit fiscal, a imediata reversão da elevação da taxa de juros praticada pelo Banco Central e a taxação das grandes heranças, das grandes fortunas e dos excessivos ganhos financeiros", diz o texto redigido por Falcão, em consonância com demais dirigentes petistas.

O PT reivindica ainda a "aceleração da negociação com centrais sindicais para lançamento de um plano de proteção ao emprego".

Autor de um texto que serviu de base para este parágrafo, o secretário de Formação Política do PT, Carlos Henrique Árabe, explica que a proposta ganhou força após os rumores de aumento da meta de superávit.

"Espetáculo"
A resolução da executiva do PT ataca ainda a atuação da Justiça, da Polícia Federal e do Ministério Público na Operação Lava Jato.

Segundo o documento, há uma "ação ilegal, antidemocrática e seletiva" de agentes públicos num "espetáculo jurídico-político-midiático".

O texto não poupa o TCU (Tribunal de Contas da União): "é inadmissível a disputa política no interior do TCU para colocar sob suspeição as contas de 2014 [do governo federal]".

Seguindo a orientação do ex-presidente, o documento também alerta para o risco de "quebra" de empresas investigadas na Operação Lava Jato. "Preocupa o PT as consequências para a economia nacional do prejulgamento de empresas acusadas", diz.

PT defende reorientação de política econômica

Cristiane Agostine – Valor Econômico

SÃO PAULO - O PT mudou o discurso em relação ao governo federal e pediu a reorientação da política econômica da presidente Dilma Rousseff, depois de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticar publicamente o partido. Em resolução política divulgada ontem, a legenda defendeu a "imediata reversão" da elevação da taxa de juros e a redução da meta do superávit fiscal.

Há menos de duas semanas, no 5º Congresso petista, o PT evitou críticas à política econômica e retirou do documento final propostas que pudessem ser vistas como uma afronta ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e à presidente. Durante o evento, o comando do partido vetou o verbo "alterar" a política econômica e o substituiu por "conduzir" para retomar o crescimento econômico.

A alteração na postura do partido foi combinada com o ex-presidente Lula, em reunião na quarta-feira com o presidente nacional do PT, Rui Falcão. Ontem, depois de reunião da Executiva nacional do PT, em São Paulo, o presidente da sigla anunciou também medidas para democratizar as decisões partidárias, reaproximar a sigla de sua base social e iniciar a criação de uma frente popular, com vistas às próximas eleições. Falcão afirmou que criará um conselho ligado à presidência do PT com a participação de movimentos sociais, integrantes de partidos como PSOL, PSTU, PSB e PDT, empresários e de petistas que não integram o comando partidário. O grupo, que deve ser composto por entre 15 e 20 pessoas, deverá se reunir em um intervalo entre 30 e 40 dias para "trocar ideias". O dirigente não descartou a participação do ex-ministro Gilberto Carvalho, por exemplo, um dos petistas mais próximos ao ex-presidente Lula. O presidente do PT citou também a possível participação do ex-presidente do PSB Roberto Amaral.

Falcão afirmou que o partido criará também grupos de trabalho para ampliar os debates dentro da legenda com petistas que não estão no comando. A decisão foi anunciada quase duas semanas depois do fim do congresso petistas, que não havia sinalizado mudanças na condução do partido nem em seu financiamento.

A resolução política, com mudanças na postura do PT, foi divulgada dias depois de Lula ter dito que o partido está velho e abaixo do "volume morto", criticado os petistas por só pensarem em cargos e ter defendido uma revolução interna na legenda.

As recentes críticas públicas expressam o aumento da ansiedade do ex-presidente em relação à falta de respostas do PT e de Dilma. Lula tem se mostrado impaciente com a demora da presidente em reagir às crises política e econômica e está angustiado com o aumento do desemprego. Segundo amigos do petista, o ex-presidente subiu o tom das reclamações e resolveu expô-las para dar um "chacoalhão" em Dilma.

Lula tem demonstrado irritação com o fato de suas recomendações ao partido e à presidente não serem seguidas nem surtirem efeito, diz um frequentador do Instituto Lula. O ex-presidente está cansado dos reiterados "tropeços" do governo, de acordo com esse petista. "Essas reclamações são a expressão da ansiedade e angústia que ele tem sentido. Tudo o que ele fala ou tenta interferir no governo não tem resultado. Lula está impaciente com a demora das reações do governo e com as respostas que são dadas", disse um amigo do petista. "Há tempos ele falava isso nas reuniões privadas e agora, ao expor, é como se falasse: 'pelo amor de Deus, vamos mexer nos problemas que estão acontecendo'".

Segundo um amigo de Lula, o ex-presidente tem dito que o ajuste econômico não pode ser o único tema do governo e que é preciso "sacudir" a cultura do partido, já que o congresso petista "não produziu nada" para mudar os vícios e problemas.

O ex-presidente está preocupado com o recrudescimento da crise econômica, em especial com o aumento do desemprego, que tem impacto direto na vida dos trabalhadores - e atinge em cheio o legado de Lula, a imagem do PT e do governo. Lula tem dito que a crise é muito grave e que não tem sido combatida da maneira adequada. Dentro do Instituto Lula, a leitura sobre a conjuntura é pessimista e o governo deve passar por um longo processo de "agonia".

Petistas que frequentam o Instituto Lula afirmaram que não há como o ex-presidente dissociar sua imagem da gestão de Dilma e lembram que o ex-presidente foi o primeiro a dizer isso. Em discursos a petistas, Lula tem afirmado que o fracasso da gestão de sua sucessora é fracasso também dele e do partido.

Mudança de discurso mostra disposição de salvar legenda

Raymundo Costa – Valor Econômico

BRASÍLIA - Entre salvar o PT e salvar Dilma, a decisão do PT é salvar o PT. A convicção é de que o governo está perdido e é preciso salvar o legado, a narrativa do Partido dos Trabalhadores. O que dificulta o discurso do partido é querer se salvar e manter a aparência de que não permitirá "uma campanha de cerco e aniquilamento da presidente Dilma".

Seus dirigentes prometem ir às ruas para defender o mandato de Dilma. Mas a cada manifestação como a resolução que a Executiva Nacional divulgou ontem, pedindo mudanças imediatas nas metas de inflação e do superávit, o PT só alimenta a convicção dos aliados de que Dilma foi abandonada e entregue à própria sorte. Pela sigla e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Uma coisa não bate com a outra.

Segundo um ministro do PMDB, o ex-presidente Lula "enxerga na curva". Entendeu que precisava descolar para se preservar. Foram as críticas de Lula ao PT e à presidente que aceleraram o processo de desgaste de Dilma e recolocaram a palavra impeachment na ordem do dia. A presidente está isolada e - segundo os mais maliciosos - hoje tem o apoio apenas de Aloizio Mercadante (Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça).

A menção aos dois não é obra do acaso. Após mais de ano de sucessivas fases Lava-Jato, o juiz Sergio Mouro decididamente estressou a classe política e Lula, particularmente. Não é à toa que a escalada de críticas do ex-presidente começou com a convocação de Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula, para depor na CPI da Petrobras, e atingiu o clímax com a prisão dos donos da Odebrecht e da Andrade Gutierrez.

Atribui-se aos dois a distância que o governo vem mantendo das decisões de Moro, quando Lula - e não apenas ele - preferiria que o governo condenasse expressamente o que se considera excessos da Justiça, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal (vinculada a Cardozo) cometidos no âmbito da Operação Lava-Jato. O argumento é que ninguém aguenta mais uma fase da Lava-Jato. E que a Petrobras levará décadas para se recuperar e a Odebrecht não ganha licitação nem na África.

No mínimo, o que Lula quer é influir mais no governo, coisa que já antecipava desde antes das eleições. Alguns lulistas devem voltar ao governo, na área de comunicação da Presidência. Mas Dilma, segundo ministros, ainda tem cartas na manga. Se está ruim para a presidente, está pior para a classe política que quer tirá-la do cargo. Todas as forças estariam fracas para uma prevalecer sobre a outra. A menos que PT e PMDB se juntem. O PMDB também está dividido. Tirar Dilma significaria a posse de Michel Temer, que não é bem vista pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, onde as tertúlias agora contam também com a presença de raposas como José Sarney.

Comando do PT faz nova defesa de ex-tesoureiro

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O comando do PT divulgou nesta quinta-feira (25) um texto em defesa de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do partido que está preso desde abril, no âmbito das investigações da Operação Lava Jato.

"O PT repele a negativa da revogação de prisão preventiva do companheiro", diz o documento.

Na terça (23), o juiz Sergio Moro negou o pedido de liberdade do ex-tesoureiro petista.

O presidente do partido, Rui Falcão, classificou como "inexplicável e inaceitável a rejeição do pedido de relaxamento da prisão preventiva de Vaccari", alegando que a defesa apresentou todas as provas documentais requeridas.

"Se as prisões preventivas sem fundamento se prolongam para constranger psicologicamente e induzir denúncias, não é a corrupção que está sendo extirpada. É um estado de exceção que está sendo gestado em afronta à Constituição e à democracia", diz o texto.

Antes da redação do documento, um grupo de sindicalistas apresentou à Executiva Nacional do PT um dossiê em defesa de Vaccari.

A proposta dos sindicalistas é que o documento seja difundido para diretórios estaduais e zonais do PT. O dossiê, com manifestação de juristas como Pedro Dallari e Luiz Flávio D"Urso está dividido em três blocos, incluindo a família de Vaccari.

Lava-Jato não denunciou nem 25%, diz procurador

• Procurador da República, Carlos Fernando Lima revela que, um ano depois, a Lava-Jato ainda tem fôlego para denunciar empresários e políticos

Germano Oliveira – O Globo

A Operação Lava-Jato já está em sua 14ª fase. Quais os próximos passos?

Não denunciamos ainda nem 25% (dos investigados) do esquema envolvendo as diretorias básicas da Petrobras, de Serviços e Abastecimento. Ainda temos a parte das sondas, da área internacional do (Nestor) Cerveró e (Jorge Luiz) Zelada. Temos que fechar uma investigação na área de comunicações, que teve informações prestadas pela (ex-gerente) Venina Velosa. E temos a parte de investigação que resultou na prisão do (ex-deputado) André Vargas e do (publicitário) Ricardo Hoffmann, envolvendo a comunicação da Caixa e do Ministério da Saúde. E ainda a questão do cartel em Angra 3 e algo semelhante em Belo Monte.

Como viu o pedido de habeas corpus feito em favor do ex-presidente Lula?

Achei muito divertido. A peça beira a ofensa pessoal ao juiz Sérgio Moro. Coisa absurda os termos da peça. Até porque não há investigação envolvendo a pessoa do ex-presidente. O que temos é a investigação de diversos prestadores de serviços para as empreiteiras. Nesse âmbito, surgiu a empresa Lils, que seria do ex-presidente. Mas isso não é suficiente. Entre as empresas prestadoras de serviço investigadas está a de Lula. Agora, o método de lavagem de dinheiro é a prestação de serviços. No caso da Lils, sabemos que o ex-presidente faz palestras efetivamente.

Acha que o dinheiro que o ex-presidente e o Instituto Lula recebem de empreiteiras tem algo de ilegal?

Precisamos analisar isso com cuidado. Enquanto a prestação de serviços exige contrapartida comercial, para o instituto não há efetivamente uma contrapartida, é uma doação. Vamos precisar analisar com cuidado esses valores e as motivações dadas para os pagamentos dessas doações.

As investigações podem chegar a novos políticos?

A investigação de políticos com foro privilegiado não é nossa. É do STF. Se aparecer algum nome de político, vamos mandar para o STF. Acredito que sim (surgirão novos nomes). Sempre que apuramos novo esquema criminoso, ele revela a participação de políticos com foro privilegiado.

Qual sua avaliação sobre o bilhete de Marcelo Odebrecht escrito na carceragem falando em "destruir email sondas"?

A Polícia Federal fez bem de tirar uma cópia do documento. É praxe na PF. Não aconteceu somente com o bilhete do Marcelo. Todas as cartas passam por controle dos agentes. Quando um policial vê uma frase como essa falando em destruir um e-mail, no sentido de destruir provas, ele tem obrigação de investigar. Se a defesa quer interpretar, dizendo que o destruir é no sentido jurídico, isso será avaliado em inquérito policial.

A defesa alega que destruir significa contestar.

Vamos investigar se houve atentado à lei penal ou ao português. Mas que houve algo estranho, houve. Não vou dizer que não tenha o sentido que a defesa quer dar, mas este primeiro momento é de investigar.

E quando Marcelo fala que o sobrepreço na compra de sondas é um termo comercial de mercado?

Tem que ver se há coerência no que ele está falando. Mas o e-mail demonstra que o Marcelo Odebrecht está dentro da cadeia de decisões. Temos não uma pessoa que se omite, um ditador de papel. Temos uma pessoa que participa ativamente do negócio. E, se temos tantos pagamentos no exterior, e ele participa tão proximamente da empresa, sustentamos que ele sabe o que acontece na empresa.

Quais as provas do envolvimento da Odebrecht no cartel da Petrobras?

A questão do cartel não se tem dúvidas. Ela é a principal integrante do cartel. Não aceitar isso é tapar o sol com a peneira. A questão é que temos bastante documentos, informações de colaboradores, investigação no Cade. Denunciar executivos da Odebrecht por cartel é só uma questão de tempo. O que descobrimos de novo é que ela participa de uma segunda fraude, envolvendo Angra 3, mesmo depois de deflagrada a Lava-Jato.

Governo cometeu impropriedades fiscais, diz Renan

• Presidente do Senado protocolou proposta de criação de órgão no Congresso para fiscalizar as contas do Executivo

• Projeto de órgão regulador precisa ser votado e aprovado pelos congressistas para entrar em vigor

Gabriela Guerreiro, Marina Dias – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Com duras críticas ao ajuste fiscal e ao governo Dilma Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), formalizou nesta quinta-feira (25) sua proposta de criar um órgão no Congresso para fiscalizar as políticas fiscais do Executivo.

Renan disse que o governo cometeu uma série de "impropriedades" em sua gestão fiscal, por isso o Legislativo precisa acompanhar suas ações de forma "técnica".

O peemedebista incluiu nas críticas as medidas do ajuste fiscal elaboradas pela equipe econômica --a maioria já aprovada pelo Congresso-- que, na opinião dele, reduzem direitos dos trabalhadores.

"Os acordes dissonantes do governo são como um samba de uma nota só. O samba do ajuste com aumento de imposto sem corte nos gastos públicos. É o ajuste pelo ajuste. Há uma série de impropriedades na gestão fiscal. Pedaladas, contabilidade criativa, descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal", atacou Renan.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) que cria a AFI (Autoridade Fiscal Independente) recebeu o apoio de outros senadores além de Renan, inclusive de aliados da presidente.

Entre as atribuições do órgão previstas na PEC estão avaliar os custos e benefícios dos programas do governo. O texto prevê a possibilidade da AFI identificar se investimentos na área de infraestrutura foram planejados de forma adequada, levantando se há gastos além dos previstos nos orçamentos iniciais das obras.

A proposta determina que o diretor-geral da AFI terá mandato fixo de quatro anos, vedada recondução ao cargo, e será nomeado pelo presidente do Congresso após apresentação de lista tríplice que pode ser integrada por qualquer brasileiro com reputação ilibada e "notórios conhecimentos" fiscais.

Na prática, Renan teria autonomia para escolher quem será o responsável pela AFI se a PEC for aprovada ainda durante sua gestão na Presidência do Senado.

"Isso é fundamental para coibir práticas contábeis fictícias. Coibiria a contabilidade criativa e colocaria um freio nas pedaladas governamentais. É como um árbitro registrando impedimentos, evitando que lances como caneladas e pedaladas estejam nas regras do jogo", afirmou.

Ao rebater críticas de que o órgão vai adotar funções semelhantes à do TCU (Tribunal de Contas da União), Renan disse que o órgão não vai ter o papel de emitir pareceres sobre as contas do governo, ou a sua aplicação.

Reforma política
Após reunir-se nesta quinta-feira com a presidente Dilma para discutir a reforma política, Renan disse que o Congresso vai atuar em conjunto com o Executivo e o Judiciário para evitar o "fracasso" das mudanças no sistema político do país.

A Câmara aprovou recentemente, em primeiro turno de votação, propostas como o fim da reeleição, a unificação dos mandatos eletivos em cinco anos e a criação de uma janela para a troca de políticos entre os partidos, entre outros pontos.

Os senadores já deixaram claro que não concordam com parte do que foi aprovado pelos deputados.

Teori homologa delação de chefe do ‘club vip’ de cartel

• Relator da Lava Jato no STF valida colaboração de Ricardo Pessoa, da UTC; material tem 80 páginas e cita nome de políticos

Talita Fernandes, Beatriz Bulla – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, homologou ontem a delação firmada pelo dono da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, com a Procuradoria-Geral da República. O empreiteiro firmou acordo com a Procuradoria-Geral em13 de março em troca de um abrandamento de pena. Pessoa é acusado de coordenar o "clube vip" das empreiteiras na formação de um suposto cartel que atuou no esquema que desviou recursos da Petrobrás. A delação do empreiteiro deverá ser usada para reforçar indícios de envolvimento de políticos já investigados na Lava Jato ou ainda para que novos inquéritos, envolvendo outras pessoas, sejam abertos.

Entre os citados está o senador Edison Lobão (PMDB-MA), ex-ministro de Minas e Energia. Ele é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal por ter supostamente solicitado recursos para a campanha da ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney. A delação de Pessoa tem cerca de 80 páginas e menção a alguns nomes já investigados na Lava Jato, como o do senador peemedebista Romero Jucá (RR), que é um dos 39 investigados no inquérito que apura perante o Supremo suposta formação de quadrilha. O empreiteiro da UTC ficou preso de novembro de 2014 a abril deste ano na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Foi solto após decisão do STF sob alegação de que não havia argumentação jurídica para mantê-lo preso.

Bilhete. Não há consenso jurídico quanto à apreensão pela Polícia Federal do bilhete do empreiteiro Marcelo Odebrecht, preso preventivamente,no qual está escrita a expressão "destruir e-mail sondas", por trazer ao debate o princípio do sigilo da comunicação entre cliente e defesa. Há quem fale em violação, há quem afirme tratar-se de um caso excepcional.

Roberto Freire - As ruas e as oposições

Diante do agravamento da crise e da degradação dos indicadores da economia, com aumento do desemprego, juros nas alturas e escalada da inflação, alguns movimentos sociais voltaram a convocar uma manifestação para o dia 16 de agosto contra o governo de Dilma Rousseff. Sob o mote de que o país não pode “pagar a conta do PT”, o protesto espera reunir não apenas os brasileiros insatisfeitos com o ajuste fiscal que penaliza os trabalhadores, mas todos aqueles que defendem a rigorosa apuração do escândalo do petrolão pela Operação Lava Jato, a punição dos culpados, a democracia e a liberdade.

A pouco menos de dois meses para que o país volte às ruas contra Dilma, Lula e o PT, é chegado o momento de as oposições fazerem uma reflexão sobre a importância de seu envolvimento em um ato que tem tudo para ser significativo e marcante. Mesmo com o natural arrefecimento das manifestações desde o primeiro grande protesto, em 15 de março, que levou mais de 1 milhão de pessoas à Avenida Paulista, em São Paulo, e quase 2 milhões em todo o Brasil, a presidente da República continua isolada, enfraquecida e é amplamente rejeitada pela maioria da população.

Segundo a última pesquisa divulgada pelo Datafolha, apenas 10% dos brasileiros aprovam a gestão petista – enquanto 65% a avaliam como ruim ou péssima. Trata-se da maior reprovação a um governo desde setembro de 1992, quando Fernando Collor alcançou uma taxa de desaprovação de 68% a poucos dias do impeachment. O mesmo levantamento apontou que a preferência do eleitorado pelo PT despencou de 29% para 11% em apenas dois anos, entre março de 2013 e maio deste ano, atingindo o índice mais baixo obtido pelo partido desde que o instituto começou a aferir a preferência partidária dos brasileiros.

Mesmo sem enfrentar uma grande manifestação de rua desde os protestos realizados em 12 de abril, que tiveram menor adesão que os de março, o governo Dilma seguiu derretendo junto à opinião pública graças ao recrudescimento das crises econômica e política, que se aprofundarão nos próximos meses. Neste momento crucial que pode determinar os destinos do país, é fundamental que as oposições brasileiras estejam sintonizadas com o sentimento majoritário da população expresso pela chamada “voz das ruas”. Não basta ouvi-la, é preciso fazer coro a ela.

Ao contrário do que se viu em 12 de abril, quando os protestos foram organizados à margem dos partidos, desta vez é preciso que as forças políticas que se opõem ao governo do PT atuem tal como fizeram naquele memorável 15 de março: em conjunto com os manifestantes, mobilizando os militantes e associando-se aos milhões de brasileiros que foram às ruas, o que contribuiu de forma decisiva para o êxito do movimento.

Encastelada no Palácio do Planalto, a presidente da República ainda conta com uma maioria parlamentar que a sustentaria no cargo caso fosse instaurado um processo de impeachment. Mas é evidente que tal cenário pode mudar diante dos novos acontecimentos. A Operação Lava Jato se aproxima do núcleo do poder, a insatisfação popular cresce e o relator do processo no TCU que analisa as contas do governo já indicou ser favorável a que elas sejam rejeitadas por causa da irresponsabilidade das criminosas “pedaladas fiscais”. Tudo isso traz um componente de indefinição quanto ao futuro de Dilma – a hipótese de que se chegue à ingovernabilidade existe e não é remota.

Este é o momento em que devemos estar todos juntos, a sociedade e os partidos políticos, unidos pelo desejo de resgatar a esperança no futuro do país. Mesmo que tenhamos eventuais divergências ou diferentes visões de mundo, temos a consciência de que só com um novo governo, mais decente e responsável, será possível virar a página da crise. Pela democracia, pela liberdade, por um novo Brasil, vamos às ruas!

-------------------------
Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS

Gilvan Cavalcanti de Melo*- A Reforma política, nossas origens

O Brasil chega à metade da segunda década do século XXI, em compromisso com seu passado. Pode ser considerado o local por excelência da ‘revolução passiva’, isto é, uma ‘revolução sem revolução’, - conceito gramsciano para designar as mudanças ‘por cima’. O ponto de partida para o estudo desse conceito é o trabalho de Vincenzo Cuoco que o empregou para caracterizar o primeiro período da revolução napolitana de 1799 (Risorgimento italiano), modificando-o e desenvolvendo-o a ponto de transmutar sua estrutura e natureza. É sob vários aspectos, um dos mais ricos e complexos do pensamento do filósofo e militante político italiano. Seu vínculo e conexão com outros conceitos – ‘guerra de posição’, ‘americanismo’, ‘bloco histórico’, ‘hegemonia’, ‘fordismo’, ‘estado ampliado’ e outros - são múltiplos e determinantes, de modo que ele passou a servir como critério de interpretação para pensar época de transformações históricas.

Graças as diferentes rearticulações com as interpretações gramscianas, resulta que nas análises da nossa formação, pode-se descobrir os elementos da ‘revolução passiva’ dos grupos dominantes na elaboração de seu programa para conceber uma nação para o seu Estado. De outro lado, as grandes maiorias que vem surgindo com o processo de conquista de direitos e da cidadania ainda idealizou o seu Estado. Sua existência vem ocorrendo mais no plano societário que se realiza com rupturas moleculares. A política e apenas ela permite seu acesso ao Estado. E a palavra chave é a democracia como critério de interpretação sobre a sua forma de inclusão, para que se transforme no sustentáculo de um transformismo ativo em que se encontre o social – igualdade – com a política – a democracia, a liberdade.

Aos fundadores do nosso Estado-Nação importava adotar uma institucionalidade liberal. Esta se devia dobrar a realidade, uma vez que se mostrava incompatível com uma sociedade inarticulada e inorgânica. A forma liberal do Estado não podia ser criada em conformidade com o caráter da sua sociedade civil, mas devia concentrar em si, ao mesmo tempo, que projetava para o futuro, aquilo em que a sociedade deveria converter-se.

Esse pragmatismo da nossa cultura política se apresenta como a compensação necessária à sua natureza autoritária, uma vez que os fins sociais se constituem como um segredo da razão de Estado, que, ora é revelado para a sociedade e ora lhe é ocultado, encoberto. Como algo que é criado numa instância distante dela e que não se sente obrigada a consultar suas preferências.

Essa é a explicação de fundo para a continuidade dessa cultura política no processo que, após 1930, deflagra a modernização econômica e nos traz a primazia da indústria e do industrialismo, mas, também, um momento de triunfo da razão de Estado em busca dos fins civilizatórios e da preservação dos meios coercitivos de controle social e produção de uma determinada ordenação societária.

Não poderia ser diferente na questão da organização do sistema eleitoral e partidário. As discussões, controvérsias e a evolução da legislação, em diversos momentos de recomposição das forças políticas, comprovam as origens dessa ‘dialética sem síntese’.

Vejamos sua evolução: o Código Eleitoral de 1932 (Decreto nº 21.076 de 24.02.1932) - baseado na obra de Joaquim Francisco de Assis Brasil, Democracia Representativa: do Voto e do Modo de Votar, Rio, Imprensa Nacional, 1931 cria as seguintes normas:

(a) estabelecimento de tribunais (Supremo Tribunal Eleitoral e tribunais regionais); (b) voto obrigatório, adulto e universal (inclusive feminino), secreto e alfabetizado; (c) adoção do princípio majoritário na eleição do presidente, dos governadores e dos senadores, e o princípio proporcional para a Câmara Federal e para as Assembléias Estaduais.

O sistema idealizado por Assis Brasil e operacionalizado em 1932 era ainda caracteristicamente "pré-partidário", abrigando disposições extremamente frouxas nesta matéria. Assim, se admitia partidos estaduais, uni-estaduais e candidatos avulsos, sem filiação partidária.
Mais adiante o Código Eleitoral de 1945 (Decreto nº 7.586 de 25.05.1945) - a chamada "Lei Agamenon" institui - uma comissão para elaborar o novo Código.São seus membros: José Linhares, (Presidente); Vicente Piragibe, Lafayette Andrada, Miranda Valverde e Hahneman Guimarães:

A Comissão partiu dos princípios gerais e reproduzia os procedimentos do Código de 1932 - exceto no tocante à organização partidária, acrescentando-lhes dispositivos e inovações agrupados em quatro categorias gerais.

Primeiro lugar, sobre o registro de Partido: entendia-se que os partidos deveriam apresentar assinaturas de 10.000 (dez mil) eleitores distribuídos entre pelo menos 5 (cinco) estados, nenhum estado com menos 500 (quinhentas) assinaturas, a fim de obterem o competente registro.(Art.109 da Lei eleitoral). Em 1946 Dutra o aumentou para 50.000 (cinqüenta mil)- decreto-lei nº. 8.063, maio de 1946.

O artigo 114 do Código Eleitoral estabelecia que o Tribunal Superior Eleitoral poderia negar registro a quaisquer partidos que fossem contrários aos princípios democráticos e aos direitos fundamentais do homem, definidos na Constituição. De trinta e um com registro provisório, quinze foram cancelados. As razões foram bastante variáveis. Só uma vez o artigo foi utilizado de forma ideológica contra o PCB. O decreto de Dutra que aumentou o número de assinaturas permitia, também, pelo artigo 26 o cancelamento de registro de partido que recebesse orientação política ou contribuição em dinheiro do exterior.

Em segundo lugar, quanto ao registro de candidatos determinava que somente poderiam concorrer candidatos registrados pelos partidos ou alianças de partidos. Um candidato poderia concorrer por mais de um partido para os cargos regidos pelo princípio majoritário, mas só por um partido ou coligação partidária para os cargos regidos pelos princípios proporcionais (artigos 39 a 42). Um candidato poderia concorrer simultaneamente para presidente, senador e deputado estadual num mesmo estado ou em mais de um Estado.

Em terceiro lugar, sobre o item da representação era retida na legislação eleitoral de 1945, a dualidade de princípios, majoritário para os cargos executivos e para o Senado, e proporcional para Câmara dos Deputados e para os legislativos estaduais.

Na representação proporcional o quociente eleitoral seria determinado pela divisão do número de votos válidos, mais votos em branco, pelo número de cadeiras a ser preenchido. A representação de cada partido seria obtida dividindo-se a votação partidária pelo quociente eleitoral. Os lugares não preenchidos por esse critério seriam dados ao partido que obtivesse o maior número de votos na eleição em vez dos candidatos, individualmente, mais votados, como previa o Código de 1932.

Em quarto lugar, quanto ao alistamento eleitoral e face à precariedade dos recursos disponíveis e à lentidão do alistamento eleitoral, foi permitido o registro de blocos de eleitores com base em listas preparadas por empregadores e agências do governo: chamado de alistamento ex-officio. Esse sistema foi extinto com o Código Eleitoral de 24/07/1950, quando passou a ser exigido o alistamento individual.

O movimento político-militar de 1964, orientado para interromper o longo ciclo Vargas, se colocou em linha de continuidade com o que fora o objetivo de sua intervenção, isto é, 1964 confirma 1937 pelo seu aspecto coercitivo de suas instituições e pelo controle social sobre o conjunto da sociedade: modernização "por cima".

Foi com a alteração da Constituição de 1946 que o regime militar fundou os princípios ainda em vigor. A Emenda Constitucional n. º 14, de 03/06/1965 criou o Domicílio Eleitoral. Determinou que para ser candidato ao cargo de governador e vice-governador teria à data da eleição, pelo menos, quatro anos de domicílio eleitoral no Estado. Para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito o prazo era menor: pelos menos, dois anos de domicílio eleitoral no Município.

Para Câmara dos Deputados e Senado Federal e Assembléias Legislativas o candidato tinha que ter, pelo menos, quatro anos de domicílio eleitoral no Estado.

Mais adiante, a Junta Militar, em 1969, modificou a própria Constituição do regime de 1964 e criou novos mecanismos de controle. Com a Emenda Constitucional nº 1 de 17/10/1969 determinou que a Lei Complementar estabelecerá os casos de inelegibilidade e os prazos, visando a preservar: a moralidade para o exercício do mandato, a obrigatoriedade de domicílio eleitoral no Estado ou no município por prazo entre um e dois anos, fixado conforme a natureza do mandato ou função.

Determinou que a organização, o funcionamento e a extinção dos partidos políticos seriam regulados por Lei Federal, observados os seguintes princípios: exigência de cinco por cento do eleitorado que haja votado na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, distribuídos, pelo menos, em sete Estados, com o mínimo de sete por cento em cada um deles e a proibição de coligações partidárias.

Também, fundava o principio da fidelidade partidária, quando decreta que perderá o mandato no Senado Federal, na Câmara dos Deputados, nas Assembléias Legislativas e nas Câmaras Municipais quem, por atitudes ou pelo voto, se opuser às diretrizes legitimamente estabelecidas pelos órgãos de direção partidária ou deixar o partido sob cuja legenda foi eleito. A perda do mandato será decretada pela Justiça Eleitoral, mediante representação do partido, assegurado o direito de ampla defesa.

Não é por acaso que a atual discussão de reforma político partidária e eleitoral se orienta no sentido de interromper o curso da comunicação entre a democracia política e os processos de democratização social, iniciado com o fim do regime militar, com a concepção de racionalizar a participação política da sociedade civil. E, nesse caso, permanece como continuidade da "Era Vargas" e da "Era Militar": administrar ‘por cima’, seletivamente, o ingresso à cidadania, em uma democracia política entregue à ‘razão sensata dos ilustrados’. O lamentável é que essa idéia é compartilhada, também, pelo iluminismo democrático e no campo do pensamento progressista.

Não seria muito relembrar que Gramsci sublinhava o perigo de transformar a ‘revolução passiva’, ‘revolução sem revolução’, as mudanças ‘por cima’ em programa, porque a maneira dos atores representar o papel geral do problema, pode levar a um fatalismo que exclua a ampliação da democracia política dos modernos, ou seja, o Estado ampliado, democrático e, conseqüentemente, a manutenção da separação do ‘bom senso’ e do “senso comum’.

A maneira de conclusão:para aumentar a confusão e o drama, uma parte influente de nossos analistas políticos, jornalistas e dirigentes partidários, de distintas origens e matizes políticos, assumem como método narrativo de nossa realidade política o antigo sistema de díade – cartesiano e hobbesiano -, e a contraposição entre partes de um todo.

Essa dicotomia tem sua inauguração com a contraposição entre estrutura e superestrutura, prossegue com Estado e Sociedade civil, individuo e sociedade, teoria e pratica, público e privado, nós e eles, ricos e pobres, liberismo e estatismo, esquerda e direita e chega ao modismo dicotômico entre  azul e vermelho,- tucanos versus petistas.

--------------------
(*) Gilvan Cavalcanti de Melo é membro do Diretório Nacional do PPS.

Merval Pereira - Otimismo a longo prazo

- O Globo

Ontem, foi dia de ser otimista a longo prazo a respeito das instituições brasileiras, no debate do seminário "Brasil, Brasis", da Academia Brasileira de Letras, coordenado pelo acadêmico Domício Proença Filho. O tema, que coube a mim discutir, era a democracia e nossas instituições, e convidei o cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getulio Vargas do Rio, e o constitucionalista Gustavo Binenbojm para falarem, respectivamente, da relação do Congresso com o Poder Executivo e do papel do Supremo Tribunal Federal na democracia brasileira.

Na abertura, coloquei-me como um pessimista no curto prazo, mas otimista por verificar que, em meio ao caos político e econômico em que vivemos, nossas instituições seguem atuando de maneira independente e efetiva, mesmo quando se fala do Congresso.

A autonomia com que a Câmara e o Senado estão agindo, sem submissão ao Executivo, é motivo de regozijo em relação ao exercício democrático, mesmo que decisões irresponsáveis sejam decorrentes dessa independência. Ou que os líderes em ação não sejam exemplos de atuação política.

Lembrei que recentemente estive em Brasília para falar sobre a importância da liberdade de expressão na democracia para oficiais que trabalham no setor de comunicação social do Exército, o que para mim teve o significado de que também essa outra instituição nacional está inserida na atuação em favor da manutenção da democracia.

Chamei a atenção para o trabalho de instituições como o Tribunal de Contas da União, Ministério Público Federal, Polícia Federal, e a própria imprensa, cada qual atuando de maneira a garantir que a democracia seja protegida de eventuais tentativas de retrocessos institucionais.

Carlos Pereira chama a isso de "círculo virtuoso de controle", nascido da Constituição de 1988 que configurou mecanismos de controle muito robustos. "Esse é um emaranhado de estrutura de controle que tem a capacidade de dizer não para presidentes poderosos", ressalta.

Pereira, ao contrário da maioria de seus pares, considera que a fragmentação partidária representa um sistema inclusivo e democrático no Brasil, um fenômeno das novas democracias, modelo que, na sua avaliação, tem gerado estabilidade democrática e capacidade de governo.

Apesar de ver sucesso no modelo durante os governos Fernando Henrique Cardoso e em parte no primeiro governo de Lula, o cientista político diz que os problemas que agora se exacerbam no governo Dilma decorrem da escolha feita pelos petistas: "Uma coalizão muito grande e heterogênea gera mais riscos e torna mais cara a governabilidade", ressalta ele, que atribui a esse esquema implantado ainda na era Lula a origem do mensalão, a maneira encontrada para manter a coalizão unida sem que o PT abrisse mão do poder.

Já o constitucionalista Binenbojm, que foi advogado no STF das editoras no processo sobre as biografias não autorizadas, ressaltou o papel relevante do STF no fortalecimento da democracia brasileira. Ele lembrou que a ABL participou da ação como colaboradora, na gestão da escritora Ana Maria Machado, mostrando a relevância que o assunto tem para a cultura. O julgamento da questão das biografias, pela repercussão que alcançou, é considerado pelo constitucionalista como um marco na defesa da liberdade de expressão.

Ressaltando que a renovação do plenário nos últimos anos permitiu que o STF assumisse esse papel de defensor dos valores democráticos, Binenbojm deu como exemplos dessa atuação não apenas o julgamento do mensalão, como o fim da Lei de Imprensa, a permissão para que os candidatos sejam alvo de críticas de programas humorísticos ou na imprensa, no período eleitoral, o que era proibido, resquícios da legislação da ditadura que só recentemente foram removidos.

A conclusão do debate foi que temos instituições fortes para garantir a democracia, mesmo que, no presente, o país esteja mergulhado em crises políticas e econômicas.

A mandioca
O deputado Miro Teixeira, conhecido por sua veia irônica, não deixou passar o caso da mandioca, enaltecida pela presidente Dilma como "uma grande conquista dos brasileiros". Segundo o deputado, "os petistas estão comendo a mandioca que o diabo amassou. Depois de Lula tê-los acusado de cobiçar luxo e riqueza e Dilma ter prestado suas homenagens à planta tuberosa, passaram a ser ironizados como adoradores da mandioca de ouro. Claro que excluídos os que, como Lula, estão fora dessa suspeita".

Eliane Cantanhêde - De milhos e mandiocas

- O Estado de S. Paulo

Boatos de suicídio no Alvorada, suspeita de bombas no Planalto, um patético habeas corpus preventivo contra a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lula falando poucas e boas contra a sucessora, o governo e o PT. A presidente Dilma Rousseff passando vexame com milho, mandioca e "mulher sapiens". Não bastasse, a Polícia Federal na cola de Fernando Pimentel, amigão da presidente e governador do principal Estado administrado pelo PT.

Definitivamente, o mar não está para peixe e o ambiente político não está nada favorável nem para Lula, nem para Dilma, nem para o partido de ambos. No volume morto, eles se esforçam para tentar sobreviver.

Lula: debatendo-se, gritando contra a imprensa, as elites e agora também contra Dilma e o PT, para reanimar a desmilinguida militância petista. Dilma: viajando para bem longe, encontrando-se com Barack Obama e fingindo (até para ela mesma) que tudo está na mais santa paz. O PT: armando-se até os dentes e conspirando contra a sua presidente, o seu ministro da Fazenda e a política econômica do seu próprio governo.

É nesse ambiente já tão hostil que explodem revelações chocantes da Lava Jato e dados econômicos de amplo alcance e demolidores para qualquer governante e qualquer governo, ainda mais para uma governante com alarmantes 65% de rejeição e um governo bombardeado pelo seu próprio partido, o PT, e pelo seu principal aliado, o PMDB.

O Banco Central acaba de rever para baixo a previsão de crescimento em 2015, trabalhando agora com uma recessão de 1,1%. Como acaba de rever a previsão de inflação do ano para cima, já admitindo desastrosos 9%. Logo, Dilma, que jamais chegou nem perto da meta de 4,5% no primeiro mandato, ultrapassa em muito o próprio teto da meta, de 6,5%, no segundo. Para uma economista, é um feito e tanto!

É óbvio que, em não se tratando de jabuticabas, esse desarranjo macroeconômico acabaria corroendo os postos de trabalho. E está corroendo. Pelo insuspeito IBGE, o desemprego já está em 6,7%, enquanto o rendimento médio em maio caiu 5% em relação ao mesmo mês de 2014. É a maior queda em 11 anos. Aliás, Dilma bate recorde em cima de recorde negativo na inflação, no crescimento, no desemprego...

Detalhe: esses são os indicadores mais políticos da economia, porque afetam diretamente o bem-estar das famílias e, portanto, o humor do eleitorado. Estando ruins, Dilma não tem condições de ficar bem.

E o que falar das contas públicas? Bem, o governo Dilma Rousseff conseguiu nos cinco primeiros meses do segundo mandato produzir o pior superávit fiscal desde 1998. Resultado de um desequilíbrio que foi particularmente descarado no ano eleitoral de 2014 e é mantido até hoje: gastos altos, arrecadação em baixa.

É exatamente aí que entra a inestimável contribuição do Congresso para a bagunça geral. Primeiro, trocou o fator previdenciário por uma nova fórmula. Agora, estende o reajuste do salário mínimo a todos os aposentados. Os cofres da Previdência Social suportam esse tranco? Dilma vetou o cálculo previdenciário e terá de vetar a ampliação do reajuste do mínimo para aposentados, com inevitável desgaste político.

A chance de Dilma recuperar alguma popularidade, um pouco de respeito no PT e um mínimo de piedade do PMDB é revertendo a tendência da economia. Mas como, se as pesquisas, os ataques do PT e as investidas do PMDB no Congresso são exatamente os piores inimigos da política econômica do governo?

Diante de tudo isso, fica aquela sensação incômoda de que Obama, ao encarar Dilma olho no olho, reunir-se com ela, dar entrevista na Casa Branca ao seu lado e assinar uma penca de acordos e protocolos bilaterais, estará pensando: será que essa Dilma manda alguma coisa? Será que chega ao fim do mandato? Ou será que todos esses salamaleques aqui são uma baita perda de tempo, só para brasileiro ver?

Bernardo Mello Franco - A bomba não estava na praça

- Folha de S. Paulo

Na tarde desta quarta, a polícia isolou a praça dos Três Poderes por causa de três mochilas esquecidas em frente ao Planalto. O trânsito ficou caótico até o início da noite, quando a tropa concluiu que não havia risco de explosão. A bomba contra o governo estava do outro lado da rua, pronta para ser detonada no plenário da Câmara.

Em mais um rompante populista, os deputados estenderam a fórmula de aumento real do salário mínimo para todas as aposentadorias do INSS. Se fosse aplicada em 2015, a regra elevaria o gasto da Previdência em R$ 9,2 bilhões, segundo a equipe econômica. É outro golpe no esforço para reequilibrar as contas públicas.

O Titanic se aproxima perigosamente do iceberg, mas os parlamentares continuam a aproveitar a fragilidade do governo para posar de defensores dos velhinhos. A ordem é aprovar benesses, mesmo sabendo que não há dinheiro para pagá-las.

O ataque ao ajuste contou com o apoio do PSDB, que parece torcer pelo naufrágio como se não estivesse a bordo do mesmo navio. Os tucanos voltaram a recorrer ao "esqueçam o que escrevi", para desgosto de técnicos que participaram das medidas de estabilização do governo FHC.

"Uma coisa é criticar o ajuste, outra é elevar o gasto com as aposentadorias. Previdência é coisa séria, não dá para brincar assim. Isso vai gerar desequilíbrio estrutural e contraria o que a gente sempre defendeu", protesta a economista Elena Landau.

O apelo à coerência não conteve o furor explosivo dos tucanos. Com 44 votos, eles ajudaram a acender o pavio da nova bomba legislativa.

Um ministro de Dilma ficou abismado com a versão da Odebrecht para o bilhete em que seu presidente orienta a defesa a "destruir e-mail". Ao ouvir que o empreiteiro não teria a intenção de eliminar provas, ele deu uma gargalhada e soltou duas palavras de solidariedade --à defesa, não ao réu: "Advogado sofre..."

César Felício - Os riscos de uma aliança antecipada

- Valor Econômico

• Rumo ao centro e ao nordeste, Alckmin deve buscar PSB

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, leva a fama de ser previsível, quando na realidade esta é uma característica de todo o PSDB. Assim como o partido chega dividido a uma sucessão presidencial desde o início do século, seus esboços de aliança também podem ser divisados à distância.

Quando o próprio Alckmin escolheu em 2002 como vice em sua chapa ao governo estadual o então pefelista Cláudio Lembo, já sinalizava para uma chapa presidencial de aliança com o PFL em 2006, como de fato ocorreu, ao ter como parceiro José Jorge na tentativa de impedir a reeleição do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

José Serra foi eleito governador paulista naquele ano tendo como companheiro o também tucano Alberto Goldman, e em 2010 tentou como pôde a chapa pura para a eleição presidencial, chegando a anunciar o senador Alvaro Dias (PSDB-PR) para a vaga de vice. Recuou de última hora para o então pefelista Índio da Costa, do Rio de Janeiro. Era um momento em que o PFL acelerava a sua trajetória declinante.

Desta vez, no governo paulista o vice de Alckmin é Márcio França, do PSB, um partido que ganhou corpo nas últimas eleições, mas que está sem liderança nacional desde a morte de Eduardo Campos, o candidato presidencial no acidente aéreo que completa um ano em agosto. Formalmente filiada ao partido, a ex-senadora Marina Silva está engajada na criação de outra sigla e claramente não é opção do PSB para 2018.

O PSB hoje, em termos de estrutura política, equivale em proporções reduzidas ao que foi o PFL em tempos passados. Tem alguma inserção no nordeste, onde já governou todos os Estados com exceção de Bahia e Sergipe e controla os governos de Pernambuco e Paraíba. Conta com boas perspectivas de crescimento no sudeste, caso de fato consiga atrair a senadora Marta Suplicy para a sigla e estruture a candidatura de Romário à Prefeitura do Rio.

Em certo sentido, é complementar ao PSDB. Não seria absurdo, do ponto de vista eleitoral, pensar em uma chapa presidencial encabeçada por um tucano do Sudeste e um integrante do PSB do Nordeste. Algo como Alckmin e Renata Campos, para fazer uma especulação livre. A eleição presidencial do ano passado mostrou que a diferença entre os dois polos eleitorais nunca foi tão estreita e uma pequena brecha que a oposição consiga cavar na área de hegemonia petista pode fazer a diferença. Na área "azul" do mapa geopolítico brasileiro, para se fazer uma referência à cor predominante na indumentária tucana, a sobrevivência do petismo é cada vez mais precária.

Para acumular tempo de televisão, Alckmin montou um secretariado que contemplou PV, DEM e PPS. Uma aliança com o PSB iria além: representaria ganhar densidade eleitoral e conferir à uma eventual candidatura do governador paulista um viés centrista. O aspecto de Geraldo Alckmin paulista demais e conservador demais o prejudicou em 2006, em uma lição que parece ter sido assimilada.

Na teoria, a parceria entre PSDB e PSB para 2018 é uma grande tacada, mas a estratégia está cercada de riscos que podem tornar um casamento desta natureza breve e fracassado. O primeiro obstáculo é a velocidade de mudança do cenário.

O desgaste do PT em função dos escândalos na política e da recessão na economia cresce de maneira tão rápida que a polarização que marcou todas as eleições presidenciais desde 1994 pode não sobreviver. Uma aliança PSDB-PSB poderia ser portanto algo análogo ao desastre proporcionado pelo exército da 3ª República da França em 1940.

A França havia construído a Linha Maginot, um conjunto de fortificações para barrar qualquer avanço bélico alemão. Os estrategistas franceses projetaram o futuro tendo como base o que havia acontecido no passado, mais precisamente na 1ª Guerra Mundial. Aquela foi uma conflagração marcada pela guerra de posições, em que soldados se matavam dentro de suas trincheiras por meses a fio.

Na 2ª Guerra, os franceses constataram que os alemães haviam mudado a tática para uma guerra de movimento e que, portanto, o escudo que ergueram para defender-se era inútil. Uma chapa PSDB/PSB faz menos sentido em um cenário multipolar.

Outro problema para a aliança está dentro dos dois partidos. Entre os tucanos, o grau de divisão pode levar a legenda a uma chapa própria para se fazer a composição interna. Foi o que ocorreu na eleição de 2014, quando Aloysio Nunes foi o vice de Aécio. O grupo do governador paulista deve assumir a presidência do partido em 2017, um componente estratégico no PSDB para definir a candidatura presidencial, mas Aécio tem a seu favor o "recall" da eleição passada e é sua pretensão em relação a permanecer no jogo presidencial que levou a bancada do PSDB no Congresso a radicalizar e partir para a oposição total. O atual presidente tucano terá menos instrumentos à mão para lutar pela candidatura presidencial quando deixar o comando da sigla, mas pode deixar armado um quadro que prolongue a indefinição dentro do partido até o ano eleitoral.

No caso do PSB, apenas Campos e seu avô, Miguel Arraes, conseguiam ser pragmáticos e manter a imagem de esquerda ao mesmo tempo. Com o desaparecimento dos caciques pernambucanos, o partido se dividiu entre pragmáticos, de um lado; e ideológicos, do outro.

Mesmo os pragmáticos no PSB estão divididos em várias vertentes. Existe a comandada por França, mas também o grupo pernambucano, que não necessariamente converge com o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg ou com o ex-deputado Beto Albuquerque, com grande ascendência no Congresso.

Este arquipélago não conseguiu se entender a respeito da frustrada fusão entre o PSB e o PPS, que já contava com a oposição dos ideológicos da sigla. A presença de França como vice já faz com que Alckmin tenha uma bandeira fincada no partido, mas isso não elimina a necessidade de pactuar com muito mais gente.

Marta Suplicy - Brasil sem rumo

- Folha de S. Paulo

Degringolou. Quem leu as notícias desta semana percebeu que a forma como a economia descarrilhou não tem mais "Judas" ou Cristo que dê jeito. A falta de credibilidade da presidente, a desmoralização das lideranças do PT e do governo se consolidou e a tragédia econômica para os brasileiros é real.

Que o Brasil estava em dificuldades já se percebia antes das eleições. O que ninguém esperava era esse mergulho, sem freio, e a aceleração irresponsável na escuridão da recessão.

No momento em que o Banco Central revisa a projeção para a inflação de 2015 de 7,9% para 9% e temos a notícia que a estimativa do PIB passou de 0,5% para retração de 1,1%, é nítido que estes resultados são consequência dos últimos anos do governo Dilma e já indicam que o fundo do poço ainda está longe. O fundo não dá nem para ver. As expectativas se evaporaram. E no mundo da economia é o "acreditar" que vale. Não se percebem sinalizações positivas em nenhuma área.

Em maio, a indústria nacional fechou mais de 60 mil postos de trabalho. Na Bahia, a Ford colocou em interrupção temporária de trabalho seus 3.000 empregados e todas as montadoras do ABC planejam férias coletivas para julho.

Desde janeiro as grandes redes fecharam 45% a mais de empregos com carteira assinada do que no mesmo período do ano passado.

O fator mais perverso da política econômica de aplicação açodada e que já resvala para o messianismo do "vai melhorar" é o emprego que já conta com 43% a mais de vagas fechadas, número do Cadastro Geral de Empregos. Estudiosos apontam para taxa de desemprego de 9% até dezembro. Com isso, a intenção de consumo das famílias recuou 23,8% em menos de um ano.

A intenção de investimentos dos empresários, apurada pela CNI, andou para trás em 35%. Os estoques já chegam a 36,5% da produção.

A inadimplência nas contas de luz saltou 13,9% em maio em relação ao mesmo mês de 2014. Não se vislumbra melhora --o BC já corrigiu para 43%, o percentual de aumento na energia até o fim do ano.

A Selic aumenta sem parar, e o Banco Central anuncia que a taxa de juros do crédito atingiu 57,3%. Recorde. A arrecadação de impostos está no mesmo nível que se tinha em 2003. Lá se foram 12 anos.

O Ipea aponta que estamos no pior momento da economia nos últimos anos. Não se sabe quando sairemos do atoleiro no qual a presidente Dilma nos colocou. "Os volumes mortos", como diz Lula, podem se abraçar e admirar a obra.

Poderiam ter o bom senso de fazerem o "mea culpa" e permitirem que um novo momento se instale e nos atrele a outro rumo. O Brasil clama por uma perspectiva que aponte um novo caminho a seguir.

----------------------
Marta Suplicy é senadora (sem partido)

Luiz Carlos Mendonça de Barros - O ajuste da economia continua forte

- Folha de S. Paulo

• Não há inflação que resista a um cenário de renda em queda, medo de desemprego e redução de investimentos

As informações mais recentes sobre a economia brasileira mostram que o ajuste recessivo em curso vem ganhando intensidade. O foco principal tem sido o mercado de trabalho, com aumento do desemprego e queda da renda real em razão da aceleração da inflação nos últimos meses.

O IBGE divulgou nesta quinta-feira (25) os dados sobre a chamada Renda Real Habitual do brasilei- ro no mês de maio, com uma queda de 6,5% em relação ao nível verificado em maio do ano passado e o ponto mais elevado de sua série histórica.

Em abril, essa queda era de 5% em relação ao mesmo período de 2014, o que mostra aceleração de grandes proporções. A grande vilã é, sem dúvida nenhuma, a aceleração da inflação, que está hoje próxima de 9% anualizada. Somente quando a inflação em 12 meses se estabilizar é que sairemos do corredor polonês em que se encontra o assalariado. Talvez isso venha a ocorrer ao longo dos próximos meses.

Por outro lado, as taxas de desemprego continuam a aumentar rapidamente, como mostra também o IBGE ao divulgar os dados relativos ao mercado de trabalho nas seis regiões metropolitanas que essa instituição acompanha mensalmente.

O desemprego em abril era de 6,4% e subiu em maio para 6,7%. Para medir o estrago, esse número era de 4,9% em maio do ano passado, pico do nível de emprego nos últimos 20 anos.

Quando combinamos as duas informações, chegamos à chamada "massa de salários", que é a medida do total de salários recebidos pelo trabalhador brasileiro. O IBGE nos diz que esse número foi 5,8% menor do que o verificado em maio do ano passado.

Esse quadro de deterioração da massa de salários deve continuar nos próximos meses, embora em intensidade menor, principalmente em razão da estabilização das taxas anuais de inflação.

A volta do crescimento do total de salários pagos só vai ocorrer mais à frente, quando a inflação começar a ceder sob o impacto da recessão e do fim dos ajustes de preços administrados pelo governo.

O leitor da Folha pode perguntar por que acredito que a inflação vai começar a ceder nos próximos meses e contrariar as pesquisas de opinião que mostram uma expectativa majoritária de que ela vai continuar a se elevar. Por uma razão simples, respondo eu: porque acredito na teoria econômica em momentos como o que estamos vivendo.

Foi o excesso de consumo no primeiro mandato da presidenta Dilma, estimulado pela expansão do crédito e pela segurança do emprego, que iniciou a escalada da inflação. Vivemos agora, em toda a sua plenitude, um processo oposto e que vai levar à sua queda. Medo do desemprego, renda em queda e restrições fortíssimas ao endividamento do consumidor são uma combinação perfeita para a redução da demanda privada na economia.

Somada a esse efeito temos também a redução dos investimentos e dos gastos do governo. Não há inflação que resista a esse cenário e por isso vai começar a ceder em poucos meses.

Se, e quando, vamos chegar ao famoso centro da meta, perseguida agora com vigor pelo Banco Central, vai depender apenas de fatores não econômicos.