quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Cresce preocupação no PT com custo político do ajuste de Levy

Raphael Di Cunto e Cristiane Agostine – Valor Econômico

Preocupados com o impacto do ajuste fiscal nas eleições municipais de 2016 e na imagem do PT, integrantes da corrente majoritária do partido Construindo um Novo Brasil (CNB) fizeram uma avaliação do cenário eleitoral em reunião na segunda-feira e tentaram afinar um discurso que passe a mensagem ao eleitorado de que não haverá prejuízo aos trabalhadores em meio a crescentes críticas internas contra a nova política econômica.

No encontro de mais de seis horas na sede do partido em Brasília, integrantes da corrente fizeram uma extensa avaliação do cenário eleitoral e demonstraram preocupação com o resultado nas grandes cidades diante de um quadro de recessão que pode aumentar o desemprego e reduzir a renda das famílias.

"Temos que dar atenção especial para os governos municipais. Em 2014 o resultado eleitoral foi ruim para nós. Ganhamos a eleição perdendo. Vencemos a disputa presidencial, mas tivemos regressão no desempenho do PT, com redução das bancadas federal e estaduais e desempenho abaixo do nosso histórico nos grandes centros", afirma o ex-deputado Paulo Ferreira, um dos coordenadores nacionais da CNB.

O cenário tende a se agravar, avaliam petistas, se o ajuste executado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, levar à recessão em 2015, com impacto no emprego e perdas para os trabalhadores. As primeiras ações da nova equipe econômica foram mudanças no seguro-desemprego, abono salarial e pensões por medida provisória (MP), seguidas por aumento de impostos sobre gasolina, movimentações financeiras, importações e cosméticos.

A nova política econômica será um dos principais temas do próximo encontro da direção nacional do PT, no início de fevereiro, em Belo Horizonte. A cúpula da corrente majoritária do partido, a CNB, da qual fazem parte a presidente Dilma e o ex-presidente Lula, tenta minimizar o descontentamento de parte do partido e pondera que o sucesso eleitoral de 2018 depende da defesa política inequívoca do ajuste de agora. O respaldo a Levy tem partido da Executiva do partido.

Mensagens dissidentes já aparecem dentro da sigla. Integrante do Diretório Nacional do PT, o deputado estadual Raul Pont (RS) diz que as medidas poderão prejudicar o desempenho do PT em 2016. "Essa visão de política econômica do ministro não combina com o que pensamos e defendemos no PT. É uma negação do discurso da presidente", afirma.

Pont, da corrente Democracia Socialista, a mesma do ex-secretário do Tesouro Nacional Arno Augustin e dos ministros Miguel Rossetto (Secretaria-Geral da Presidência) e Pepe Vargas (Relações Institucionais), compara este início de mandato com os dois primeiros anos do governo Lula, quando Antonio Palocci (Fazenda) e Henrique Meirelles (Banco Central) promoveram uma política de austeridade. "Pagamos um preço enorme por isso nas eleições seguintes, quando o PT teve desempenho ruim nos municípios", diz.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), um dos líderes da tendência Mensagem ao Partido, diz que o PT ainda debaterá as medidas internamente e com Dilma. "O que for efetivamente combate à fraude [na Previdência] terá nosso apoio, mas vamos sugerir mudanças quando se tratar de revogação de direitos", afirma. "Me parece que a formulação inicial da MP precisa ser revista quando passar pelo Congresso", diz, ao negar impacto eleitoral.

A Central Única dos Trabalhadores (CUT), ligada ao PT e que fez campanha por Dilma, prepara uma marcha no dia 28, junto com as outras centrais, e um protesto no Congresso em 2 de fevereiro contra as mudanças. "É um governo em disputa. O arco de alianças contém progressistas e conversadores, e nosso papel é cobrar que seja colocado em prática o projeto defendido na campanha", diz o presidente da central, Vagner Freitas (PT). "O governo tem que dizer qual a claramente o que quer. Estamos preocupados com essa política recessiva junto com mudanças no seguro-desemprego."

O ex-ministro José Dirceu, que presidiu a sigla entre 1995 e 2002 e foi cassado no escândalo do mensalão em 2005, retomou reuniões políticas e publicou em ontem seu blog, pelo segundo dia seguido, que o país caminha para uma forte recessão. Citou a redução de 1,4% para 0,3% na previsão de crescimento da economia brasileira neste ano feita pelo FMI e afirmou torcer "para que uma projeção drástica do FMI - de que teremos algum crescimento este ano - se confirme, porque tudo indica que o que vamos ter é uma recessão, e das bravas no Brasil este ano".

A Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT e presidida pelo ex-presidente do IPEA Marcio Pochmann, também destacou ontem, em texto do economista Guilherme Mello, que as medidas "podem afetar a defesa dos ganhos sociais e de empregos dos anos recentes, dado o impacto recessivo". O texto diz que o governo Dilma "parece ver-se obrigado a coadunar parcialmente com os argumentos mercadistas (em particular na esfera fiscal), apesar de manter a orientação de buscar sempre a preservação dos empregos e da renda".

Responsável pela estratégia do PT para as eleições, o secretário de Organização, Florisvaldo de Souza, defende que ainda é cedo para discutir os efeitos das ações do ministro da Fazenda. "É precipitado achar que vai ter impacto nas eleições", diz. " O mais importante é que Dilma não está mexendo nas áreas sociais, que são muito caras ao PT. E não vejo redução dos direitos dos trabalhadores", afirma. "Na verdade o governo está fazendo um ajuste para manter o emprego".

Um Levantamento do Valor nos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o segundo turno mostra como é justificada a preocupação do PT com o que pode acontecere ao partido nos grandes centros. Nas cidades com mais de 200 mil eleitores, importantes como polos formadores de opinião e de criação de novas lideranças e por terem os maiores orçamentos, o partido registrou queda com relação à 2010.

Há cinco anos, a presidente Dilma Rousseff (PT) bateu José Serra (PSDB) por 20 milhões de votos a 17 milhões nas médias e grandes cidades. Agora, perdeu para Aécio Neves (PSDB) por 22 milhões a 19 milhões. Ou seja, teve um milhão de votos a menos, mesmo com o eleitorado destes locais crescendo cinco milhões.

O que a salvou a campanha à reeleição de Dilma foram as pequenas cidades, com menos de 200 mil eleitores, em que ela abriu 7 milhões de votos de vantagem em relação ao tucano no ano passado. A perda de influência nas grandes cidades já era sentida em 2012, quando o PT só não reduziu o eleitorado governado por vencer a disputa pela Prefeitura de São Paulo.

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