sábado, 11 de agosto de 2012

Greves de servidores já afetam abastecimento

Paralisação também prejudica comércio exterior e arrecadação de impostos

Apesar dos avisos do governo de que não será possível dar reajustes generosos, movimento parte para o confronto nas negociações

A paralisação de funcionários das agências reguladoras, da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Federal e fiscais agropecuários está prejudicando a rotina das empresas e afetando a produção. Ontem, a concessão de passaportes ficou suspensa no país. O sindicato da indústria de carnes de Santa Catarina disse que os prejuízos já somam US$ 5 milhões por dia. Há alimentos importados, remédios, vacinas, equipamentos para soro, material radiológico e outros produtos farmacêuticos retidos em portos e aeroportos.

Sob fogo cerrado

Servidores prometem intensificar greves na semana que vem para pressionar governo

Vivian Oswald, Flavia Pierry, Cristiane Bonfanti e Lino Rodrigues

Serviços parados

BRASÍLIA e SÃO PAULO Os movimentos de greve do funcionalismo público que vão se espalhando pelo país já atingem em cheio setores-chave da economia, afetando do comércio exterior à arrecadação de impostos, passando pela emissão de passaportes e o trânsito de passageiros nos aeroportos. Depois dos repetidos recados da equipe econômica de que não será possível ceder aos pedidos dos grevistas, os servidores públicos federais decidiram enfrentar a presidente Dilma Rousseff e avisaram que vão radicalizar na próxima semana, com manifestações ainda maiores.

Preocupados com o prazo para o envio da proposta orçamentária ao Congresso Nacional, que vai até 31 de agosto, os servidores vão montar acampamento na terça-feira em frente à Catedral de Brasília e, na quarta, prometem parar a Esplanada dos Ministérios. Na segunda-feira, o primeiro item da agenda da presidente é uma reunião com a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, para discutir as greves.

Só a paralisação dos funcionários do Ministério da Agricultura, que começou na segunda-feira, pode ter um impacto de US$ 10 bilhões por mês sobre as exportações, segundo dados elaborados pela Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) a pedido do GLOBO. Antes mesmo da greve, o mercado já previa queda em comparação a 2011, em função da crise financeira global. O prejuízo mensal equivale a cerca de metade dos benefícios concedidos pelo Executivo ao setor produtivo no programa de estímulo Brasil Maior.

Em vista dessa ameaça, o governo obteve liminar na Justiça obrigando todos os servidores da Agricultura a voltarem ao trabalho. O sindicato recorreu. Esse setor ainda não havia sido afetado pela greves da Receita Federal e da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), que começaram há mais tempo. Isso porque 90% do que o país exporta sai pelo chamado canal verde, ou seja, não depende desses órgãos.

A AEB garante que também é negativo para a indústria brasileira o impacto sobre as importações. Em julho, quando a greve se limitava à Receita e à Anvisa, cerca de US$ 2,3 bilhões teriam deixado de ingressar no país. Esta poderia ser um boa notícia para ajudar a manter o superávit comercial em meio à queda das exportações. No entanto, 65% do que o país importa são bens de capital, usados na indústria de manufatura, e matérias-primas. A média diária das importações em julho foi a segunda pior do ano. E na primeira semana de agosto caiu ao menor nível de 2012: US$ 785 milhões.

Pelas contas do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), a operação-padrão deve provocar prejuízo de R$ 7 bilhões em apenas um mês - R$ 6 bilhões em autos de infração e R$ 1 bilhão que deixou de ser lançado nas contas do Fisco nas operações de comércio exterior. A Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef) orientou os dirigentes sindicais nos estados a intensificarem a mobilização. Isso deve prejudicar ainda mais as fiscalizações nos portos e o trânsito nos aeroportos.

- Cobramos diariamente o governo, mas ele ainda não sinalizou com uma proposta. Vamos fazer mais uma semana de protestos - afirmou o secretário-geral da Condsef, Josemilton Costa.

Nas contas dos sindicatos, hoje há 350 mil trabalhadores de 36 categorias parados. Mas o governo calcula que esse número não ultrapassa 80 mil.

Segundo o Sindifisco, dos 11.500 servidores em todo o país, os 2.400 que trabalham nas aduanas não pararam. Mas, com ritmo menor de trabalho, a inspeção e liberação de uma carga, que levava em média 24 horas, demora até 5 dias. O sindicato garante, porém, que cargas perecíveis, itens hospitalares e medicamentos não entram na fila.

O Sindicato Nacional dos Fiscais Federais Agropecuários (Anffa) afirmou que cerca de 70% dos 3.200 fiscais aderiram à greve. E admite que isso pode emperrar as exportações. O trabalho dos fiscais não se resume à inspeção e liberação de produtos nos portos, aeroportos e fronteiras. Parte do contingente atua dentro dos frigoríficos e produtores de alimentos, fiscalizando e concedendo o carimbo do Serviço de Inspeção Federal (SIF). Na PF, o sindicato da categoria estima que estejam parados 80% dos quase 9 mil policiais federais (entre agentes, escrivães e papiloscopistas).

A paralisação dos fiscais agropecuários afeta a produção e causa perdas aos frigoríficos de Santa Catarina, o maior produtor e exportador de aves e suínos do país. O Sindicato das Indústrias de Carnes e Derivados do estado (Sindicarne) estima perdas de US$ 5 milhões ao dia. Há mais de uma semana, apenas 30% dos produtos destinados à exportação das unidades fabris catarinenses estão sendo liberados nos portos.

- Se a situação persistir até segunda-feira, as 23 empresas de Santa Catarina terão de parar a produção - advertiu ontem o presidente do Sindicarne, Clever Pirola Ávila.

Os produtores já sofriam com a suspensão de importações pela Argentina e pela Rússia, com a greve dos caminhoneiros e com a alta dos preços de milho e soja. Somados, esses fatores elevaram os custos de produção em 50%, alta que está sendo repassada aos produtos.

A BRF Brasil Foods, maior exportadora brasileira de frango, está tendo que estocar os produtos nas fábricas e nos seus terminais nos portos. Além do custo para manter esses estoques, a empresa teme reflexos em toda a cadeia. A Aurora Alimentos, com sede em Chapecó (SC), por sua vez, já reduziu os abates de frangos e suínos.

Além dos prejuízos financeiros a empresas e consumidores, a greve dos servidores afeta estudantes de todo o país. Willian Carvalho, coordenador-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), estima que, nos institutos federais, trabalhadores de 280 dos cerca de 300 campi do país estão parados. Mas segundo o secretário de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação, Marco Antônio de Oliveira, cem unidades não estão funcionando e outras 160 trabalham parcialmente.

No que diz respeito aos professores, mesmo com a proposta de reajustes entre 25% e 40%, ainda há 80 mil servidores parados. Oliveira garantiu, no entanto, que não haverá nova oferta:

- Orientamos as universidades a reunirem os conselhos e estabelecerem um calendário de reposição das aulas.

FONTE: O GLOBO

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