domingo, 30 de maio de 2010

Engordando o caixa das centrais

DEU EM O GLOBO

STF não decidiu se elas têm direito ao imposto sindical, mas dinheiro já é repassado

Geralda Doca

BRASÍLIA - A demora do Supremo Tribunal Federal (STF) para decidir se as centrais sindicais têm ou não direito de receber parte da arrecadação com o imposto sindical obrigatório ajudou a engordar o caixa dessas entidades pela segunda vez consecutiva: foram R$ 84,3 milhões em 2010, quantia superior à recebida no ano passado, de R$ 80,9 milhões, quando passaram a ter direito ao rateio. O valor referente ao bolo do tributo em 2010 foi pago pela Caixa Econômica Federal, responsável pelo recolhimento, há duas semanas.

Os sindicatos, que ficam com a maior fatia, levaram R$ 917,3 milhões, e o restante foi dividido entre confederações e federações — de trabalhadores e patronais — e governo.

Entidades vão apoiar Dilma

Ao todo, a contribuição obrigatória gerou receita de R$ 1,68 bilhão em 2010, do qual resta pagar só R$ 31,6 milhões. O tributo, descontado no salário dos trabalhadores em março, é recolhido até 30 de abril. O banco tem 40 dias úteis para efetuar o pagamento aos sindicatos e ao governo.

Segundo o Ministério do Trabalho, as duas maiores centrais, CUT e Força Sindical, receberam R$ 27,3 milhões e R$ 23,6 milhões, respectivamente — valores que representam 80% do orçamento da Força e 60%, da CUT. Em seguida, os maiores beneficiados foram a União Geral dos Trabalhadores (UGT), com R$ 14 milhões; Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), que embolsou R$ 9,9 milhões; Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), R$ 5,3 milhões; e Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), R$ 3, 9 milhões.

Na comparação com o ano anterior, os valores subiram para todas as seis centrais beneficiadas. São praticamente as mesmas que planejam apoio explícito à pré-candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, em ato programado para a primeira Conferência dos Trabalhadores, no início de junho, em São Paulo.

Ao legitimar as centrais há dois anos e dar a elas metade dos 20% que o Ministério do Trabalho recebe do bolo do imposto (Lei 11.648), o governo do PT estipulou como um dos critérios para o repasse o número de sindicatos filiados — o que levou as entidades a uma corrida pela criação de novos sindicatos e adesão dos existentes.

Dados do ministério (até 28 de maio) revelam que 358 pedidos aguardam análise na pasta; 2.979 foram indeferidos e outros 5.684, deferidos. Há mais de 9 mil sindicatos no país.

Enquanto o STF não julga uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), proposta pelo DEM contra a divisão do bolo da contribuição sindical com as centrais, o Congresso tenta aprovar mais um imposto.

As centrais estão em pleno lobby para aprovar proposta do senador Paulo Paim (PT-RS) que torna obrigatória a contribuição assistencial, hoje cobrada só dos filiados aos sindicatos, para todos os trabalhadores.

A nova contribuição seria de até 1% da renda líquida auferida pelo trabalhador no ano anterior (1% do salário mensal, incluindo 13oe demais ganhos, como participação nos lucros e resultados da empresa). Ou seja, teria potencial para mais que triplicar os 3,33% da contribuição sindical obrigatória. A proposta de Paim passou pelo Senado.

Os defensores da medida justificam sua necessidade.

— Os sindicatos não negociam só em nome de seus associados, mas de todos os trabalhadores.

A contribuição ajuda a manter ser serviços que oferecemos, como assistência médica, jurídica, colônia de férias — disse o presidente da Força, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP).

— Não parece razoável o trabalhador tirar até quatro dias de trabalho por ano para pagar aos sindicatos.

Com a elevada carga tributária do país, que incide sobre todos os produtos e serviços, será mais um imposto que vai reduzir sua capacidade de consumo e prejudicar a economia e os empregos — rebate Francisco Gadelha, presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Confederação Nacional de Indústria (CNI).

Julgamento está empatado no STF

No STF, o julgamento está empatado em três a três. Já no início de 2010, as entidades sindicais começaram a pressionar para evitar a conclusão do julgamento antes do pagamento deste ano, feito em maio. Já há parecer da Procuradoria Geral da República apontando a inconstitucionalidade do repasse às centrais. Já votaram neste sentido os ministros Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso.

Os ministros Marco Aurélio, Eros Grau e a ministra Carmen Lúcia votaram a favor das centrais. Faltam votar Ayres Brito, Celso de Mello, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Este último está impedido, pois se manifestou favoravelmente quando estava na Advocacia Geral da União (AGU). Não há previsão de quando o assunto entra na pauta.

O argumento pela inconstitucionalidade é baseado no fato de que as centrais fazem parte da estrutura sindical (sistema confederativo, federativo e sindicatos), previsto na Constituição.

Por essa lógica, os recursos arrecadados só podem ser destinados a entidades que negociam e atuam diretamente nas causa dos seus filiados.

O professor de Relações do Trabalho da Faculdade de Economia da USP José Pastore salienta que, apesar de ter enviado ao Congresso em 2005 uma proposta de reforma, o governo Lula nunca quis mexer na estrutura sindical. Ao contrário, seu governo deu mais poder às centrais, do ponto de vista jurídico e financeiro.

— O que o governo Lula está fazendo não é diferente do que fez Getulio Vargas em 1943, que cooptou sindicatos para governar sem problemas. A totalidade das centrais já se definiu a favor da candidata do governo.

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