quinta-feira, 20 de maio de 2010

Efeito Alemanha nos mercados

DEU EM O GLOBO

Chanceler diz que euro está em perigo. Bolsas caem no mundo e Bovespa tem pior nível em 8 meses

Bruno Villas Bôas
RIO, WASHINGTON, BERLIM e LISBOA

A decisão da Alemanha de suspender as operações de venda a descoberto de títulos governamentais e de ações de dez grandes bancos, anunciada na terça-feira, e as declarações da chanceler Angela Merkel ontem de que o euro está em perigo voltaram a derrubar os mercados globais. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) teve o quinto pregão consecutivo de queda.

O Ibovespa, seu principal índice, ficou abaixo dos 60 mil pontos, o que não acontecia desde setembro do ano passado, caindo 1,89%, aos 59.689 pontos. Investidores temem que outros países da União Europeia (UE) adotem medidas semelhantes à alemã na sexta-feira, os ministros de Finanças do bloco vão se reunir para discutir, entre outros assuntos, a proibição adotada pela Alemanha, alvo de críticas por sua unilateralidade.

A falta de regras e limites pode tornar o comportamento dos mercados financeiros destrutivo e acarretar uma ameaça existencial à estabilidade financeira na Europa e até no mundo afirmou Merkel no Parlamento alemão. Sozinho o mercado não corrigirá esses erros. O euro está em perigo. Se não lidarmos com esse perigo, as consequências para nós na Europa serão incalculáveis.

A chanceler pediu ainda que a UE aja rapidamente para evitar o que chamou de extorsão dos mercados, além de adotar medidas contra pecadores notórios de déficit na zona do euro, como retirar seus direitos de voto.

Merkel colocou mais lenha na fogueira da aversão a risco. Investidores continuaram vendendo ações e títulos para preservar seu dinheiro explica Leonel Pitta, analista-chefe da Lopes Filho & Associados.

Pela manhã, antes da abertura do mercado americano, a Bovespa chegou a cair 2,91%. O Ibovespa acumula queda de 8,48% em apenas cinco pregões.

O valor de mercado da Bolsa paulista encolheu R$ 336 bilhões no período, para R$ 1,99 trilhão, segundo a Bloomberg News. No mês, a queda é de 11,61%, e no ano, de 12,97%. Já o dólar fechou em alta de 0,88%, a R$ 1,838.

Analista: Merkel só piorou a situação

As maiores quedas foram de papéis ligados a commodities, como Vale (2,50%) e MMX Mineração (3,95%). Já o Itaú Unibanco recuou 5,12%, devido ao fato de o Bank of America se desfazer de suas 188,4 milhões de ações PN (preferenciais, com direito a voto) no banco. Para se proteger, os investidores têm buscado ações de empresas ligadas à economia doméstica. Ontem subiram B2W (5,33%), Lojas Americanas (3,75%) e Lojas Renner (3,06%).

A medida alemã, que entrou em vigor ontem e vai valer até 31 de março de 2001, derrubou os mercados de Ásia, Europa e Estados Unidos, mas beneficiou o euro. A moeda única europeia avançou 1,8% em Nova York, a US$ 1,2415. Pela manhã, atingira US$ 1,2144, a menor cotação desde 17 de abril de 2006.

Para João Pedro Brugger, da Leme Investimentos, o discurso de Merkel veio no momento errado e renova incertezas sobre os riscos de insolvência dos países da zona do euro: Quando um chefe de Estado endurece o discurso em meio a uma crise, o mercado acha que a situação pode estar pior do que parece. É uma forma de dizer que a União Europeia precisará tomar medidas duras para evitar o pior.

Monica de Bolle, da Galanto Consultoria, lembra que a medida alemã se assemelha à adotada pelo governo americano após a quebra do banco Lehman Brothers, em setembro de 2008. Para ela, a medida em si tem poucos efeitos práticos, mas o mercado reage negativamente sempre que existe uma intervenção: Os mercados nunca gostam quando os governos interferem no que eles consideram como o bom funcionamento dos mercados.

Operação não é permitida no Brasil

Carsten Brzeski, economista do ING, disse à Bloomberg que a proibição da venda de ações a descoberto (naked short selling) era um ato de desespero político. Eduardo Roche, da Modal Asset, explica que essas operações não são permitidas no Brasil.

Segundo ele, aqui há operações de short selling cobertas, no qual investidores alugam ações para venda no mercado à vista, apostando na queda do papel. Esses contratos movimentaram, de 28 de abril a 18 de maio, R$ 26,2 bilhões no Brasil acima dos R$ 21,9 bilhões de todo o mês de abril, que foi o maior do ano.

Já a proposta de reforma financeira dos EUA atingiu ontem um impasse.

Os democratas não conseguiram o número mínimo de votos no Senado para fechar o texto e enviá-lo à votação final. Um ponto polêmico é a emenda que proíbe os bancos de operarem com derivativos.

Em visita a Portugal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma defesa apaixonada da política econômica brasileira para o premier José Sócrates, criticado por elevar o Imposto de Renda como parte do pacote de austeridade.

Em 2003, quando tomamos a decisão de fazer o ajuste fiscal, houve até companheiros de partido com dúvidas, mas foi graças à coragem que tivemos que conseguimos estar hoje numa posição altamente confortável.

Temos potencial para ajudar a alavancar a economia portuguesa disse Lula no encerramento da X Cimeira Luso-Brasileira, ressaltando, porém, a importância dos investimentos portugueses no Brasil, de C 20 bilhões.

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