sábado, 26 de setembro de 2009

Integração e estratégia

Marco Aurélio Nogueira
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Depois do VII Encontro Internacional do Fórum Universitário Mercosul (FoMerco), realizado entre 9 e 11 de setembro em Foz do Iguaçu (PR), pode-se concluir que a integração latino-americana goza de importante apoio da intelectualidade da região, que a interpela com redobrado interesse científico e paixão cívica até certo ponto incomum nos dias de hoje. Apesar disso, enfrenta obstáculos complicados que, se não têm força suficiente para desativá-la ou paralisá-la, conseguem postergar seu desfecho e lhe dificultam a formação de uma consistente base de sustentação.

Se olharmos a questão em escala histórica, é impossível não reconhecer que muito se progrediu desde a assinatura do Tratado de Assunção (1991), marco da criação do Mercosul. O próprio FoMerco é um retrato dessa evolução. De ideia quase isolada em 2000, animada especialmente pela combatividade do jornalista Guy de Almeida, ganhou corpo, peso e densidade com o passar dos anos, a ponto de se converter num espaço acadêmico relevante no subcontinente. A cada encontro têm sido maiores as adesões, não só de brasileiros, mas de argentinos, uruguaios e paraguaios. Na reunião deste ano, sob a presidência de Marcos Costa Lima, o FoMerco reuniu 27 grupos de trabalho, cujos coordenadores selecionaram 216 resumos para debate. É um número expressivo, que aumenta de importância quando se atenta para o teor das comunicações e a representatividade institucional de seus autores.

Também é digna de nota a multiplicação das instituições que se vêm dedicando à integração. No encontro de Foz de Iguaçu, o FoMerco teve o apoio do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, do Colégio Brasileiro de Altos Estudos da UFRJ, da Fundação Alexandre de Gusmão e da Universidade Federal de Pernambuco. As reuniões ocorreram na sede da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), um projeto inovador do governo Lula, cuja prioridade é formar pesquisadores e profissionais que tenham no cerne de suas respectivas áreas de conhecimento a preocupação com uma América Latina (AL) integrada.

O sucesso de reuniões acadêmicas não é indicador suficiente, mas com certeza reflete a existência de uma disposição crítica e alguma disponibilidade de quadros e ideias. Por que, então, a integração não avança com firmeza e ainda não se converteu em agenda efetiva para os Estados da região?

Processos de integração são construções políticas inevitavelmente lentas e complexas, fato que fica mais dramático na América do Sul, tendo em vista a quantidade de problemas, a heterogeneidade e a desigualdade nela existentes. Impulsionados por dinâmicas eminentemente econômicas e comerciais, tais processos penam para adquirir ritmo político e cultural, único terreno em que uma integração de fato se pode completar. Além disso, vivem mais ao sabor de decisões governamentais que de políticas de Estado e nem sempre conseguem orientar-se por uma estratégia abrangente, sistemática, sustentável. Como se não bastasse, sofrem a concorrência, muitas vezes "desleal", de outras dinâmicas integracionistas, de turbulências econômicas e de operações de hegemonia internacional ou regional.

Nenhuma integração se faz em abstrato. Enraíza-se na História da região que se quer integrar, na comunhão cultural de seus povos e nos interesses comuns de suas sociedades. Reflete suas possibilidades e suas dificuldades. Está determinada, evidentemente, pela situação concreta dos diferentes países e pelo modo como se vive no mundo. Hoje, por exemplo, a integração se ressente da situação de crise e enfraquecimento da política, comum a todas as sociedades contemporâneas.

Pode-se dizer assim: a ideia de integração é uma construção política que se depara hoje com um cenário de difícil politização, no qual escasseiam sujeitos (grupos, partidos, movimentos, associações) qualificados para propor uma estratégia comum de ação e dar-lhe sustentação. Para vencer ela necessita desesperadamente daquilo que mais falta: política, atores políticos, organização política. Por um lado, há o peso desproporcional do econômico, o poder de sedução e cooptação do mercado. Por outro, os governos perderam potência e os Estados nacionais viram diminuir suas margens de manobra. Na vida, há muita diferenciação social, luta por identidade e individualização, ou seja, muita dispersão e fragmentação. E a esfera política, pressionada por sua própria crise, não se mostra forte o suficiente para unir o social e fornecer-lhe uma direção. Dado o déficit de subjetividade política, cresce a tentação do voluntarismo e do populismo.

Vista por esse ângulo, a integração latino-americana poderia sugerir a imagem de um projeto destinado ao fracasso. No entanto, ela continua viva e desponta como uma utopia típica deste início de século. É preciso, pois, reconhecer o que a faz respirar e fluir.

Em boa medida, a integração é uma espécie de imposição da realidade globalizada do mundo. Na vida atual - veloz, comunicativa, surpreendente -, pequenos atos ou gestos podem desencadear verdadeiros tsunamis em questão de dias. Os sistemas políticos estão em crise, mas a política não se resume a eles. Há coisas acontecendo e potência sendo armazenada fora deles. Numa sociedade da informação, existe sempre mais espaço para iniciativas inteligentes, quer dizer, culturais, educativas, não-maximalistas, processuais e dialógicas, centradas na negociação e na articulação.

A combinação cruzada desses fatores impulsiona a integração latino-americana, fazendo com que ela se torne categoricamente factível, ainda que sempre tensa e difícil. E se, numa das curvas surpreendentes da vida, alguém conseguir injetar fantasia política na dinâmica da integração e demonstrar que ela é boa não somente para os negócios e os Estados, mas para a vida cotidiana dos cidadãos, aí, então, poderá haver uma adesão em massa e outra História começará.

Marco Aurélio Nogueira é professor titular de Teoria Política da Unesp

Poderes em disputa

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO

A situação política "inusitada" criada pela presença do presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, na embaixada brasileira en Tegucigalpa, numa trama urdida pelo protoditador venezuelano Hugo Chávez que teve a conivência do governo brasileiro, como acusa o governo provisório hondurenho, ou a aceitação de um fato consumado, como alega o Itamaraty, tem questões colaterais que confundem o quadro e impedem uma análise desapaixonada.

A primeira é o protagonismo de Chávez em todos os episódios, a começar pelas cédulas do referendo pela Constituinte, confeccionadas em Caracas, até a operação de retorno de Zelaya ao país. Outro ponto polêmico é o exílio do presidente deposto, com o detalhe sensacionalista de ter sido colocado em um avião no meio da noite, de pijamas e sob a mira de fuzis, e mandado para a Costa Rica.

Parece estar havendo um consenso sobre o episódio entre os especialistas: o processo de deposição de Zelaya obedeceu aos princípios constitucionais, o que não aconteceu no caso do exílio.

Um estudo do advogado paulista Lionel Zaclis, publicado no site Consultor Jurídico e já referido aqui na coluna de ontem, acompanhou todo o processo de destituição, a partir da Constituição, que prevê:

1. A mera tentativa, por parte de todo e qualquer servidor público, de alterar o sistema de eleição do presidente da República implica imediata perda do cargo (artigo 239 e alínea);

2. São intangíveis as disposições constitucionais concernentes ao período presidencial e à proibição de que alguém seja presidente da República por mais de um mandato (art. 374).

No caso de Honduras, foram os seguintes os fatos, de acordo com o advogado Lionel Zaclis:

- O presidente da República baixou um decreto propondo a realização de uma consulta sobre a convocação de uma assembleia constituinte, sendo público e notório o propósito de alterar a cláusula pétrea que proíbe um novo mandato;

- O presidente da República não obedeceu à decisão do juiz competente, confirmada em segunda instância, que suspendeu a execução do decreto;

- O presidente da República destituiu o chefe do Estado Maior das Forças Armadas, no que foi desautorizado pela Suprema Corte;

- A Suprema Corte acolheu a denúncia formulada pelo Ministério Público, decretando a prisão preventiva do presidente da República;

- Com a vacância do cargo, este foi preenchido pelo presidente do Congresso Nacional, de acordo com o disposto no artigo 242 da Constituição;

- Houve respeito ao princípio do devido processo legal, pelo menos quanto ao seu conteúdo mínimo (contraditório, juiz natural, motivação das decisões, prova lícita, etc).

Segundo o advogado Zaclis, "é certo que as Forças Armadas, ao executarem o mandado de prisão, extrapolaram os limites aos quais se deviam circunscrever, ao expulsarem do país o presidente Zelaya".

Essa atitude também fere a Constituição hondurenha, que, no seu artigo 102, diz que nenhum hondurenho poderá ser expatriado nem entregue pelas autoridades para um Estado estrangeiro".

No entanto, diz Zaclis, "embora esse excesso configure uma nítida e inadmissível ilegalidade, não tem, à evidência, o condão de contaminar o processo constitucional da substituição presidencial, de modo a convertê-lo num "golpe de Estado".

A conclusão semelhante chegou uma agência independente que analisou a questão a pedido da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, que diz que nem o exílio nem a volta de Zelaya ao poder tem respaldo legal. A solução seria entregá-lo à Justiça hondurenha, para que seja julgado pelos crimes de que é acusado. Essa posição também foi defendida em editorial do "Wall Street Journal".

Essa constitucionalidade da destituição de Zelaya é contestada pelos que compartilham da visão de que a verdadeira democracia deve ser exercida pelo "poder constituinte" do povo, que a "democracia burguesa" neutraliza com as diversas intermediações, seja do Congresso, seja das várias instâncias do Poder Judiciário.

Para o filósofo italiano Antonio Negri, autor do livro "Poder constituinte", que o próprio Chávez anuncia como um de seus orientadores ideológicos, "a divisão de poderes e o controle recíproco dos órgãos de Estado, a generalização e a formalização dos processos administrativos consolidam e fixam esse sistema de neutralização do poder constituinte".

O deputado do PSOL Chico Alencar, que, embora oposicionista, apoia a ação do Itamaraty nesse caso, lembra que também o sociólogo Boaventura de Sousa Santos defende um processo plebiscitário e eleitoral, que chama de "democracia de alta intensidade", "com ampliação da participação popular e empoderamento de setores marginalizados, o que sempre provoca violenta reação conservadora".

Para Chico Alencar, "os sistemas políticos tradicionais de "nuestra America" impedem que as maiorias sociais se traduzam em maiorias políticas". Zelaya, por ser originário desse esquema, estava cometendo o "crime de traição de classe".

O sociólogo Nelson Paes Leme considera que a maneira como o presidente eleito Manuel Zelaya foi exilado se configura em uma quebra das regras democráticas tão grave quanto as posições bolivarianas de perenização do poder por via da convocação extemporânea do poder constituinte.

E lembra o que chama de "outro conceito pétreo das democracias modernas, que é a exigência da alternância de poder como dado indispensável para a estabilidade democrática e para o pleno exercício da representação, cláusula essa que, a toda evidência, fica prejudicada pelo apelidado "golpe constitucional" da convocação extemporânea e frequente do plebiscito por quem já detém o poder". (Continua amanhã)

Azeite, não é meu parente

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Na noite de quinta-feira, o presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, Eduardo Azeredo, disse na televisão que falou com o chanceler Celso Amorim sobre a crise em Honduras e ficou "tranquilo".

Azeredo só não é o único, porque a maioria de seus pares no Parlamento também parece bastante sossegada, alheia até. Aliás, como de resto se mantém indiferente aos assuntos importantes para o País, ocupada que está em assegurar cadeiras extras para 7.700 vereadores Brasil afora, burlar a regra antinepotismo e arrumar um jeito de aumentar os próprios salários.

Se o Congresso fosse um Poder realmente autônomo, ciente de suas prerrogativas e responsabilidades, o senador Azeredo deveria ser o primeiro a alimentar em sua comissão a boa inquietação.

Não para organizar trincheiras nem para tão somente criticar a posição do governo brasileiro, mas para participar - e, se possível, ajudar - na redução dos danos para o Brasil nesse episódio.

Por exemplo, auxiliando no esclarecimento sobre a participação brasileira na volta de Manuel Zelaya a Tegucigalpa. Num primeiro momento, o chanceler Celso Amorim saudou a chegada o presidente deposto à Embaixada do Brasil como "um sinal da importância" do País na cena internacional, assegurando que o Itamaraty foi pego de surpresa com a chegada de Zelaya e 70 agregados.

Depois, quando o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, admitiu que o "truque" para enganar o governo de facto e permitir a entrada de Zelaya em Honduras foi arquitetado por ele, o presidente Luiz Inácio da Silva assumiu o discurso de que o principal não é "a embaixada em que ele está o como chegou lá".

Agora que o próprio Manuel Zelaya disse à rádio Jovem Pan que sua decisão de abrigar-se na representação brasileira foi precedida de consultas ao chanceler e ao presidente Lula, é de se perguntar quem está mentindo.

Isso na hipótese generosa de haver alguma dúvida. Se houver, é preciso considerar a possibilidade de o Brasil cobrar do aliado Chávez e do hóspede Zelaya uma satisfação à altura da arapuca que os dois armaram para um país tão amigo.

Faz cinco dias que a embaixada brasileira serve como "bunker" de uma das partes em conflito e o Congresso até agora não se deu ao trabalho de tratar do assunto. No máximo emitiu nota de repúdio ao cerco das forças do governo de facto ao prédio da embaixada. Puro formalismo.

Um debate profundo e profissional na casa (em tese) de ressonância dos assuntos de interesse nacional poderia ajudar a entender se há alguma saída razoável para o Brasil em mais uma história em que se envolve de maneira torta atrás de firmar a posição de protagonista que naturalmente já ocupa na região.

Um dos senadores a se pronunciar de modo contundente durante a semana, Demóstenes Torres, presidente da Comissão de Constituição e Justiça, não vê como o Brasil possa se sair bem.

"Hoje, na realidade, Zelaya é o embaixador do Brasil em Honduras. Coordena a distribuição de alimentos, dorme no sofá, dá as ordens como se ali não fosse território de outro país", diz, preocupado de o Brasil vir a ser alvo de reparos internacionais caso se confirme a versão de que Zelaya comunicou seus planos com antecedência às autoridades brasileiras.

"Somando-se a isso a armação de Chávez, temos um verdadeiro conluio", conclui o senador, para quem o Brasil erra nas suas repetidas tentativas de se firmar como líder do terceiro mundo.

"Só perdemos e não entendemos que, vencidos os nossos déficits social e educacional, nossa tendência é integrar o primeiro mundo. Em segundo lugar, não compreendemos que esse pessoal que a política externa tenta conquistar não quer o Brasil como líder porque escolhemos outro caminho: aumentamos nossa projeção mundial e fizemos uma opção pelo desenvolvimento e a economia do mercado internacional."

Por "esse pessoal" entenda-se desde os latinos Chávez, Evo Morales, Raphael Correa e adjacências até os ditadores africanos, passando por governos autoritários do Oriente, cuja companhia não rendeu uma só vitória ao Itamaraty.

Ciranda

A senadora Marina Silva não perdeu a chance de criticar o pronunciamento do presidente Lula na Assembleia-Geral da ONU, foi criticada pelo sucessor Carlos Minc, a quem havia criticado no dia anterior, e já começa a sofrer ataques de setores do PSDB por causa de sua gestão no Ministério do Meio Ambiente.

Efeitos de uma candidatura presidencial que dá sinais de vir a se tornar competitiva. Se isso se confirmar, os adversários começarão a tratar Marina de igual para igual: na base do tiroteio.

Dizendo aos modernos que ela é contra o aborto e partidária da tese criacionista para a origem do Universo, e, junto aos conservadores, tirando partido de sua identificação com os movimentos sociais, como o MST. A ideia é carimbá-la como "fundamentalista".

Imperdoáveis incoerências

Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


PITTSBURGH - Se o governo Luiz Inácio Lula da Silva pretende ser realmente um ator de peso na cena global, vai ter que definir-se mais claramente em relação a determinados temas e abandonar a parte "amor" do slogan "Lulinha, paz e amor".

Paz, tudo bem. Amor, reserva-se apenas para quem o merece.

Vejamos o caso do Irã. Tudo bem que Lula tenha cobrado, em privado, a negação do Holocausto, esse crime que o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, comete com inquietante frequência. Mas o que adianta se, depois, em público, diz aos jornalistas que negar o Holocausto "é problema dele"?

Passemos agora a Marco Aurélio Garcia, o assessor diplomático de Lula, que reclama que, na falta de uma "atitude enérgica" em relação ao golpe em Honduras, o mau exemplo vai se disseminar pela América Latina.

Bom, nesse caso todo o mundo fica autorizado a imaginar que o mau exemplo de negar o Holocausto vai se disseminar pelo mundo muçulmano. Não obstante, o governo Lula, em vez de uma "atitude enérgica", convida Ahmadinejad para visitar o Brasil e se dispõe a ir ao Irã, como a natural contrapartida.

Claro que não é o caso de romper relações com Teerã, até porque há poucos santos no mundo real para que as relações de Estado sejam apenas com eles.

Mas tampouco é o caso de lavar as mãos, o que vale também para o problema nuclear.

Marco Aurélio justificou a aceitação pelo Brasil da explicação iraniana de que seu programa é exclusivamente para fins pacíficos, alegando que o Brasil não é a Agência Internacional de Energia Atômica, xerife nesse âmbito.

Não é mesmo, mas acabou passando por bobo quando se revelam instalações nucleares antes ocultas, o que levou o presidente Nicolas Sarkozy -aliado estratégico do Brasil- a dizer que "já estamos em uma séria crise de confiança".

Os desconhecidos

Fernando Rodrigues
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - O pré-candidato tucano a presidente José Serra é conhecido por apenas 66% dos eleitores, segundo revelou a última pesquisa Ibope, divulgada nesta semana. Os demais postulantes pontuam sempre abaixo dos 50%.

O segundo mais conhecido é Ciro Gomes, do PSB, cuja imagem é lembrada por 45% dos eleitores. O percentual de Dilma Rousseff (PT) é só 32%. O tucano Aécio Neves tem 27%. Em último lugar está a neófita Marina Silva (PV), com 18%.

Esses números dão um recado simples. Falta pouco mais de um ano para a eleição do ano que vem e o eleitor ainda não está nem aí para o assunto. A chance de imprevistos ocorrerem são enormes.

Em todas as disputas presidenciais diretas pós-ditadura, o candidato favorito só se consolidou no primeiro semestre do ano eleitoral -nunca antes. Foi assim com Fernando Collor (1989), com FHC (1994) e com Lula (2002). As reeleições de FHC (1998) e de Lula (2006) são histórias diferentes.

Há também agora um fator destruidor de análises baseadas em fatos passados. Lula não estará presente pela primeira vez na lista de candidatos. A existência da candidatura constante do petista funcionava como um eixo organizador. A partir de um dado momento, formava-se uma onda a favor e outra contra o PT e o radicalismo lulista.

Em tese, José Serra poderia desempenhar esse papel antes ocupado por Lula. Afinal, o tucano será, de longe, o mais experiente de todos os postulantes ao Planalto -não só por ser o mais velho, mas também por ser quem ocupou os cargos de maior relevância entre os possíveis candidatos.

Ocorre que Serra não é Lula, como se sabe. Tampouco se assemelham ao petista os dois nomes do campo governista, Dilma e Ciro. Se o quadro de candidaturas se mantiver assim, nada impede Lula de continuar a dar as cartas nesse oceano de quase desconhecidos.

As etapas da sucessão

Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


Com a ausência do presidente Lula, entregue aos muitos compromissos de líder internacional e patrono de Honduras, a crise do escândalo do Congresso avança nos cofres da Viúva em estripulias como a decisão da Mesa Diretora do Senado que, com o descaro de legislar em causa própria, autorizou os seus ilustres e endinheirados membros e os 11 líderes partidários a designar três funcionários comissionados para os respectivos escritórios políticos, em suas bases eleitorais. Cada um, enriquecido com dois assessores técnicos de coisa nenhuma, com salários de R$ 9.900 e um secretário legislativo, com R$ 7.600 mensais para trabalhar na campanha, atendendo eleitores, cavando votos com a gana de quem também cuida dos próprios interesses, pois eleito o chefe terão a mamata garantida, com os reajustes da gratidão.

O miniescândalo foi justificado pela Mesa Diretora com a alegação de que todos os líderes partidários, sem exceção, haviam solicitado o pequeno obséquio para facilitar a reeleição de senadores, inclusive dos senadores de garupa, que nunca viram a cor de um voto e agora terão que correr atrás dos eleitores. E numa temporada em que a ousadia pode custar uma chuva de pedras.

Nem todos os líderes ficaram mudos. Poucos protestaram, alegando que não foram consultados nem concordam com uma decisão que não tem amparo legal. O senador José Agripino (RN), líder do DEM, estrilou: “Não fui consultado e não concordo”.

Um tom abaixo, o senador Aloizio Mercadante (SP), líder do PT, alegou que não foi consultado sobre o assunto.

E, para fechar a ciranda, cirandinha, o líder do PSB, senador Renato Casagrande (ES), ficou entre a malícia e a ingenuidade: “Acho que esse é um assunto que pode parecer que estamos dando passos atrás”. Acha, senador? O que preciso é para que acredite? Mas, vá lá. A campanha ainda não começou para valer, embora as preliminares sejam decisivas para a montagem das chapas, as alianças partidárias e as amiudadas pesquisas que sinalizam as tendências do eleitorado.

Junho é o mês das convenções. A propaganda eleitoral nas emissoras de rádio e nas redes de TV começa em 15 de agosto. E mais a intensa participação da internet. É quando a campanha incendeia até as eleições, em 3 de outubro.

E esta é uma campanha que reserva surpresas, pois nada está decidido. A referência para a especulação é o presidente Lula, que seria o favorito absoluto no caso do terceiro mandato que morreu na praia, com a sua coerente recusa. E daí em seguinte, com os muitos escândalos em que se enroscou como arame farpado enferrujado em esteio de cerca – do caixa 2 com dinheiro escuso para financiar a campanha de candidatos do partido ao mensalão - o Partido dos Trabalhadores perdeu pontos no respeito do presidente. Na hora de escolher candidato, o PT nem tinha um favorito destacado, e a lista dos possíveis era francamente decepcionante.

Lula foi para o tudo ou nada escolhendo, à revelia do PT, a ministra Dilma Rousseff, chefe do Gabinete Civil e com escassa experiência política. E a ministra caminha em sinuosa linha de contradições que, se adivinhadas por Lula, não correria o risco que ainda causa a apreensão do câncer linfático. Submetida com rigor espartano à quimioterapia, com a série de sessões que a obrigavam a viagens quinzenais a São Paulo, dona Dilma pode comemorar a cura com 90% de êxito absoluto e os 10% da cautela dos especialistas.

Mas a candidata e o seu patrono têm cometido erros primários e evitáveis, com a mistificação das viagens pelo país a pretexto de acompanhar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o apêndice do Minha Casa Minha Vida, com a promessa da construção de 1 milhão de moradias populares sem data para a inauguração da milionésima residência. Mas são duas poderosas alavancas de voto, ajudadas pelo Bolsa Escola, o Bolsa Família, o Bolsa Educação e outros programas que atendem às urgentes necessidades fundamentais da imensa mancha da extrema pobreza em todo o país, das favelas nas grandes cidades aos barracos pendurados nos morros do interior.

Não teremos que esperar muito. A campanha para valer não demora a separar o joio dos aventureiros do trigo que o diabo não amassou.

Becos da Vida (poema)

Graziela Melo

Dobrei
Os becos da vida
Busquei
A infância perdida
No fundo do poço
Na escuridão

Lavei
A alma na chuva
Sequei
O pranto no vento
Na branca
Areia da praia
Aqueci
O coração

Caminhei
De encontro ao sol
Espantando a solidão

Pois
Entre o céu
E a terra
Existe um mar de
Paixão

Percorri
Tantas estradas!!!
Tarde
Noite
Manhã...
Andei,
Andei,
Andei...

E foram tantos
Os suores
Que de meu corpo
Desceram
Até o chão
Que rios se formaram
Por onde passei


Rio de Janeiro, 2002

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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PMDB passa a fazer oposição a Aécio

Fábio Fabrini
DEU EM O GLOBO

Partido se une ao PT e ao PCdoB na Assembleia; acordo visa à aliança em 2010

BELO HORIZONTE. A bancada do PMDB na Assembleia Legislativa de Minas Gerais decidiu ontem entrar para o bloco de oposição ao governador Aécio Neves (PSDB). Em comunicado divulgado à tarde, os líderes do partido, do PT e do PCdoB informam que, em nome da convergência política que os une, resolveram atuar juntos no Legislativo. A adesão dos nove peemedebistas visa a uma aliança com os petistas nas eleições para o Palácio da Liberdade em 2010, em detrimento dos tucanos.

Com a decisão dos deputados - que sempre se intitularam independentes, apesar do histórico de fidelidade a Aécio em votações -, a oposição conta agora com 20 das 77 cadeiras da Assembleia. A revoada para a esquerda foi acertada quarta-feira num almoço com o ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias, mais próximo do PMDB que o ex-prefeito de BH Fernando Pimentel.

PMDB quer cabeça de chapa em aliança com PT

Os dois medem forças para concorrer pelo PT. O pré-candidato pelo PMDB é o ministro das Comunicações, Hélio Costa, que lidera as pesquisas. Apesar da aproximação, os parlamentares disseram ontem que o acerto sobre quem terá a cabeça de chapa numa provável composição ficará para o ano que vem.

- É uma discussão que se dará a partir de março. Depende do acordo nacional e de outros fatores, como as pesquisas. Se o PT tiver o candidato à Presidência, temos um crédito nos estados - afirmou o deputado Sávio Souza Cruz (PMDB).

- A união contribui para uma aliança em 2010. Mas isso (quem será o candidato) não está posto - disse o líder do PT, deputado Padre João.

Hélio Costa tem acenado para o Palácio da Liberdade, o que funciona como pressão aos petistas. Em visita recente a Aécio, afirmou que sairia candidato numa aliança com o PT ou o PSDB. Mas o casamento com os tucanos é improvável. O governador vai se desincompatibilizar do cargo em abril para concorrer ao Senado ou à Presidência. Cederá lugar ao vice, Antônio Augusto Anastasia, que é seu plano A para concorrer à reeleição.

Hoje, Fernando Pimentel lança oficialmente sua pré-candidatura ao governo em evento que reunirá caciques do partido. A promessa é de reunir 1,5 mil pessoas em um clube de BH. Ele se desgastou com o PMDB nas eleições para a prefeitura de Belo Horizonte, em 2008, quando se uniu a Aécio para bancar a eleição de Marcio Lacerda (PSB). Hélio Costa foi preterido no acerto e lançou o deputado federal Leonardo Quintão

Ciro assume candidatura e tenta superar Dilma no papel de anti-Serra

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Deputado sustenta que decisão de concorrer ao Planalto não depende do aval do presidente Lula

O deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) reiterou ontem a intenção de ser candidato à Presidência e, em encontro com sindicalistas, deu uma mostra do tom de seu provável discurso de campanha de 2010: elogiou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criticou as negociações eleitorais entre PT e PMDB e atacou o tucano José Serra.

Ao discursar para líderes da Força Sindical, em São Paulo, Ciro disse, em tom de brincadeira, que Serra é "feio para caramba, mais na alma que no rosto". Depois, em entrevista, acusou o governador de São Paulo de ter uma "atitude destrutiva" em relação aos adversários. "A conduta dele é feia, de não enfrentar o adversário com linguagem civilizada. No meu caso é uma coisa terrível, até minha conta-salário ele conseguiu que um juiz de São Paulo bloqueasse."

O bloqueio ocorreu em 2008. Dois anos antes, Ciro foi condenado a pagar uma indenização de cem salários mínimos por ter chamado Serra de "candidato dos grandes negócios e negociatas".

Ontem, o deputado apontou o tucano como representante de "forças criptoconservadoras" da política nacional. "Essa gente quer uma volta ao passado e tem a apologia neoliberal como seu mito."

Os ataques foram feitos três dias depois da divulgação da pesquisa CNI/Ibope que mostrou Ciro empatado com a ministra Dilma Rousseff, pré-candidata do PT. "A grande novidade da pesquisa é que o lado de lá (Serra) já não aparece ganhando no primeiro turno", comentou ele.

CENÁRIOS

Na reunião com sindicalistas, o deputado do PSB arrancou risos ao dizer que, enquanto critica o adversário do PSDB, Dilma aparece em fotos "agarrada" com ele - referência ao encontro entre os dois em um evento do setor imobiliário, anteontem, na capital paulista.

Depois de afirmar que o governo Lula representa "um avanço muito grande em todas as áreas" e de destacar a ação estatal no combate à crise econômica, Ciro repetiu que não concorda com a avaliação do presidente de que a base governista deve ter Dilma como única representante na disputa eleitoral.

Para o deputado, é melhor que uma das candidaturas governistas - a dele próprio - possa se apresentar aos eleitores como desvinculada de peemedebistas como José Sarney (AP), que recentemente esteve no centro da crise dos atos secretos no Senado. "Daqui a pouco, e é só o que falta, eles (do PSDB) vão vir falar de ética, vão querer nos condenar por estarmos agarrados com Collor e Sarney."

O ex-ministro da Integração Nacional também fez uma crítica indireta ao discurso de Dilma, centrado nas realizações do governo. "O debate de 2010 não pode ser conservador, nem mesmo conservador do bom caminho em que nós estamos, e a atual coalizão PT-PMDB tende a isso."

Na entrevista concedida após o evento, Ciro voltou a abrir fogo contra o provável acordo que prevê o lançamento de um peemedebista como candidato a vice na chapa de Dilma. "Uma aliança precisa ter um sentido moral e intelectual defensáveis. E acho que a hegemonia moral e intelectual que preside a relação do PT com o PMDB é frouxa."

Questionado sobre a hipótese de transferir o domicílio eleitoral para São Paulo e concorrer ao governo do Estado, Ciro afirmou que a decisão será do comando de seu partido. "Mesmo que venha a transferir, vou reiterar que minha intenção é concorrer à Presidência."

Sobre a possibilidade de Lula insistir na apresentação de Dilma como única presidenciável da base governista, o parlamentar deixou claro que sua candidatura não depende do aval do presidente. "A última palavra será do meu partido."

À tarde, Ciro esteve em outro encontro com sindicalistas, da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), entidade ligada ao PC do B. Recebido como candidato, foi aplaudido ao definir o neoliberalismo como "ideologia de quinta categoria".

Quércia chama acordo de Temer de "arbitrário"

Catia Seabra
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Defensor da candidatura do governador José Serra (PSDB), o presidente do PMDB de São Paulo, Orestes Quércia, negou ontem que o partido tenha fechado uma aliança em apoio à candidatura da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil).

Quércia repetiu que é arbitrária uma decisão fora da Executiva do partido. "A decisão do presidente [licenciado] Michel Temer [PMDB] não é a decisão do partido. Sou membro da Executiva e não fui consultado. Como decidem sem uma reunião?"

Na semana passada, Temer cobrou do PT e do presidente Lula uma definição rápida sobre uma aliança nacional com o PMDB para apoiar Dilma. Ele pressionou ainda para que o PMDB ficasse com a vice, posição para a qual é o mais cotado.

O PT concordou em anunciar o acordo, provavelmente em outubro. Temer embarca para a Dinamarca na próxima quarta-feira com Lula, na comitiva que defenderá a Olimpíada no Rio em 2016. A ideia é que, na volta, o acordo se torne público.

Ontem, Temer voltou a defender definição imediata, uma "pré-aliança". Argumentou que foi cobrado por outras lideranças do partido e que, "se não houver a possibilidade da aliança, o que nós vamos sugerir é que o PMDB saia do governo".

Quércia disse que não reconhece a decisão de Temer. "Esse é o desejo de pessoas físicas.

Não é uma decisão do partido". Em reunião com o PMDB nacional, sugeriu que a proposta fosse submetida ao partido. "Cadê as bases?"

Questionado sobre a divergência, Temer disse que ela será resolvida na convenção do partido no ano que vem. E lembrou o fim da verticalização, ou seja, que a aliança nacional não tem mais que ser reproduzida nos Estados.

O deputado Ibsen Pinheiro (RS) foi outro que questionou. "Como podemos decidir a vice se nem escolheram o candidato? Sei que não se pode esperar a convenção. Mas não podemos decidir em setembro", disse.

... E Ciro diz que Serra é feio

Adauri Antunes Barbosa
DEU EM O GLOBO

Outro pré-candidato à Presidência, o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) atacou a aliança PT-PMDB e o governador José Serra (PSDB-SP), também pré-candidato: “É feio pra caramba! Mais feio na alma que no rosto. Tem uma truculência com seus adversários”.

Ciro diz que Serra é "feio pra caramba"

Pré-candidato à sucessão de Lula, deputado ataca tucano chamando-o de truculento

SÃO PAULO. Depois de voltar a defender duas candidaturas governistas na disputa presidencial de 2010, o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) atacou ontem em São Paulo o governador paulista José Serra (PSDB), pré-candidato da oposição. Segundo ele, o tucano "é mais feio na alma do que no rosto" por ser "truculento" com os adversários.

- Ele é feio pra caramba! Mais feio na alma do que no rosto. Ele tem uma truculência ao se relacionar com seus adversários. Até minha conta pessoal de salário ele conseguiu que um juiz de São Paulo bloqueasse - disse Ciro, sem entrar em detalhes.

Falando em reunião da direção executiva da Força Sindical, para cerca de 200 sindicalistas, Ciro acusou Serra de inibir o diálogo com "atitude destrutiva":

- A conduta pessoal dele em relação aos adversários é uma conduta feia, de não enfrentar com linguagem civilizada. Uma atitude destrutiva, que inibe o diálogo. Para mim, é horrível.

Procurada, a assessoria de Serra não havia retornado até a conclusão desta edição.

Durante o discurso aos sindicalistas, em tom de brincadeira criticou até a ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, pré-candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

- Ontem (quinta-feira) estava eu falando mal do Serra, e a Dilma agarrada com ele - brincou, referindo-se às fotos nos jornais de ontem que mostravam clima de cordialidade entre ambos.

- Dilma está seguindo o estilo "Lulinha paz e amor" - disse Ciro.

Ciro classificou a aliança entre PT e PMDB como "frouxa" do ponto de vista "moral e intelectual" e com tendências ao conservadorismo. Para ele, o fato de concorrer sem aliança com o PT o livra de ter de defender políticos como o presidente do Senado, José Sarney (PMDB):

- O PT é o principal partido do Brasil, e o PMDB é um partido tão bom e tão ruim como qualquer outro. Uma aliança tem que ter sentido moral e intelectual defensável. Mas acho que a atual hegemonia moral e intelectual que preside a relação entre PMDB e PT é frouxa.

Segundo sua tese, o governo teria a candidatura do PT com o PMDB para ocupar espaço na TV e outra "livre" para ir "para o meio da rua".

- Tudo bem se ficar PT com PMDB. Eles ficam com o tempo de TV e o poder do mundo todo. A outra parte vai para o meio da rua, livre, sem ter de homenagear Sarney. Se não, eles (da oposição) vão acusar a gente de estar agarrado com (o senador Fernando) Collor (PTB) e Sarney e nós não vamos poder dizer nada.

Ao lado do deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, presidente da Força Sindical, e do jogador de futebol Marcelinho Carioca, que deve se filiar ao PDT, Ciro ajudou a inaugurar o "Placar das 40 horas", que acompanha a posição dos deputados paulistas sobre o projeto de redução da jornada de trabalho.

Dilma: “Homens não assumem suas posições”

Tatiana Farah
DEU EM O GLOBO

Pré-candidata do Planalto para 2010, a ministra Dilma Rousseff ironizou sua fama de durona com uma crítica aos colegas do sexo masculino no governo Lula: “Participo de um governo no qual nenhum homem é assertivo; não assumem suas posições”.

"No governo, eles não têm posição"

Dilma diz que ganhou fama de durona porque no Planalto nenhum homem é assertivo

Aministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, afirmou ontem que os homens do governo não assumem suas posições e, com isso, seu jeito "assertivo" acaba lhe rendendo uma fama de durona e "ranzinza". Em uma entrevista coletiva apenas para correspondentes estrangeiros em São Paulo, a ministra queixou-se da forma como as mulheres são tratadas na política.

- Participo de um governo no qual nenhum homem é assertivo; não assumem suas posições. Sou uma mulher dura, cercada de homens meigos, mas já me conformei - disse a ministra, segundo a agência Associated Press, que participou da entrevista.

Comparada pelos jornalistas a uma versão sul-americana de dama de ferro, simbolizada na imagem da ex-primeira-ministra britânica Margaret Tatcher e na secretária de Estado dos Estados Unidos Hillary Clinton, Dilma afirmou:

- Elas são mulheres que assumiram a liderança em seus países, com posições que vão do conservadorismo ao liberalismo, mas, por serem mulheres, são tratadas de maneira tendenciosa.

Dilma evitou falar como candidata à sucessão presidencial e, durante toda a entrevista, falou em "candidato do governo", mas disse confiar que o nome escolhido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá aproveitar os índices de popularidade do presidente e do governo, de 80% e 70%, respectivamente, segundo as últimas pesquisas.

- Qualquer que seja o candidato, tem grandes perspectivas para mostrar que fizemos um excelente trabalho - disse ela.

Ministra defende compras para as Forças Armadas

Sobre as pesquisas de intenção de voto, que esta semana a colocam em terceiro lugar na preferência dos eleitores, Dilma disse não estar preocupada.

- O melhor das eleições é que ninguém pode antecipar o resultado. É prudente aguardar que as urnas sejam abertas e os votos, contados - disse ela.

Ainda de acordo com os jornalistas estrangeiros, a ministra defendeu a compra de equipamentos para as Forças Armadas brasileiras como uma política "defensiva" do território continental e marítimo do país.

- O Brasil é um país pacífico e com a cultura de resolver os conflitos sempre através do diálogo, não com guerras, mas há uma modificação da situação do Brasil no cenário internacional. Toda a política de rearmamento tem esse caráter defensivo. Temos a Amazônia e agora uma riqueza inequívoca que é o pré-sal - disse Dilma.

A entrevista da ministra durou cerca de uma hora. Ainda no gabinete da Presidência, em São Paulo, Dilma recebeu o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, e depois seguiu para Brasília.

- Não vou falar nada de eleições com ela. É que na segunda-feira é o encontro da Indústria e quero convidá-la - comentou Skaf, que pode tentar a vaga ao governo paulista, mas ainda não decidiu o partido de filiação.

Por uma nova ordem mundial

Gilberto Scofield Jr.
DEU EM O GLOBO

JÁ SÃO 20 GRITANDO

G-20 promete manter medidas de estímulo e regular o sistema financeiro, com apoio do FMI
Admitindo que o pior da crise parece ter passado, mas que o processo de recuperação econômica global ainda está incompleto, os líderes do G-20 - grupo que reúne as principais economias do mundo - encerraram ontem sua reunião de cúpula em Pittsburgh prometendo manter seus pacotes de estímulo, agir para garantir a volta dos empregos e reforçar a regulamentação do sistema financeiro internacional de modo a evitar novas crises no futuro. Ao mesmo tempo, os presidentes instruíram seus ministros da Fazenda a preparar até novembro as estratégias de saída para, "no momento certo", coordenarem o fim dos pacotes de forma a não afetar o crescimento mundial. A China queria que a discussão começasse agora. O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, chegou a falar em uma nova ordem mundial.

Essas tarefas serão coordenadas e executadas no âmbito do G-20, que passa a ser o grande fórum de discussão das políticas econômicas mundiais, em substituição ao G-8 (o grupo dos sete países mais ricos e a Rússia). O objetivo, segundo a declaração final divulgada ontem, é fazer o mundo voltar a crescer, mantendo a responsabilidade fiscal. Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (Bird) darão apoio técnico às decisões do G-20. As recomendações desses organismos, no entanto, não terão caráter compulsório.

- Houve uma decisão importante de transformar o G-20 no principal fórum de políticas econômicas internacionais, o que significa a criação de uma nova ordem mundial. A volta do crescimento não trouxe de volta o emprego, e ficou estabelecido que nenhum país terá que abrir mão de suas políticas contracíclicas. O sistema financeiro internacional receberá regras adicionais para que não ocorram os desatinos que vivemos nos últimos meses. E houve o compromisso de melhora na participação dos emergentes no FMI e no Bird - disse Lula.

Limite a salários foi concessão à Europa

- Nós precisamos ter certeza de que, quando o crescimento voltar, os empregos vão voltar também. - afirmou o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. - Nós trouxemos a economia global de volta da beira do abismo e fixamos os alicerces para uma longa prosperidade.

O G-20 concordou em estabelecer regras que forcem os bancos a elevarem seu capital e separarem parte de seus lucros para, em tempos de crise, garantir crédito à economia. Os bancos também terão de absorver parte das perdas em operações financeiras mais sofisticadas, o que os obrigará a calcular melhor os riscos. As maiores instituições financeiras mundiais ficarão sob intenso escrutínio, e a remuneração dos executivos ficará ligada ao desempenho.

Este último ponto, que pôs de um lado EUA e Reino Unido (contra os limites) e a União Europeia (a favor), foi a concessão feita pelo país-anfitrião para que europeus concordassem em transferir parte do poder que possuem no FMI e no Bird para os emergentes. A transferência no FMI será de 5%; no Bird, de 3%.

Os protestos de ontem foram pacíficos, ao contrário da véspera. A polícia estimou o número de manifestantes em 4.500, mas para os organizadores foi o dobro. Peter Shell, presidente do Thomas Merton Center, um grupo pela paz, disse que foi a maior manifestação na cidade desde os protestos contra a guerra no Vietnã, nos anos 1970. Um dos cartazes dizia "Sem resgate, sem capitalismo". Mas um grupo de anarquistas cantava "Nós vivemos num Estado fascista" ao som de "Yellow Submarine", dos Beatles.

O documento final

DEU EM O GLOBO

RECUPERAÇÃO DA ECONOMIA

ESTÍMULO CONTINUA:
"O G-20 promete manter os pacotes de estímulo econômico até que esteja assegurada uma recuperação sustentável. (...) Vamos evitar qualquer retirada prematura das medidas de estímulo"

SEM COMPLACÊNCIA: "Uma percepção de normalidade não deve levar à complacência. O processo de recuperação e reforma está incompleto. Em muitos países, o desemprego continua inaceitavelmente alto. (...) Não podemos descansar até que a economia global tenha recuperado sua plena saúde, e famílias trabalhadoras em todo o mundo possam encontrar empregos decentes"

NOVO FÓRUM

G-20 NO COMANDO: "Designamos o G-20 para ser o principal fórum para nossa cooperação econômica internacional. Determinamos que o Conselho de Estabilidade Financeira (FSB, na sigla em inglês) inclua as principais economias emergentes, para coordenar e monitorar o progresso no fortalecimento da regulamentação financeira"

FMI: "Nós nos comprometemos a mudar a divisão de quotas do Fundo Monetário Internacional (FMI) para os mercados emergentes dinâmicos e países em desenvolvimento, em pelo menos 5%, de países sobrerrepresentados para aqueles sub-representados, usando a atual fórmula de quotas"

BIRD: "Adotar uma fórmula dinâmica no Banco Mundial (Bird) que reflita o crescente peso econômico dos países (...), o que gera um aumento de pelo menos 3% do poder de voto de países em desenvolvimento"

DOHA: "Buscar uma conclusão ambiciosa e equilibrada para a Rodada de Doha em 2010"

REUNIÃO ANUAL: "Vamos nos reunir no Canadá em junho de 2010 e na Coreia em novembro de 2010. Devemos nos encontrar anualmente a partir de então e nos reuniremos na França em 2011"

REGULAÇÃO FINANCEIRA

PRAZOS: "Nós nos comprometemos a desenvolver, até o fim de 2010, regras de consenso internacional para melhorar tanto a quantidade como a qualidade do capital dos bancos e para desencorajar uma alavancagem excessiva. Essas regras serão graduais (...), com a meta de implantação total até o fim de 2012"

SALÁRIOS: "Evitar bônus garantidos por vários anos; exigir que uma parte significativa da compensação seja postergada, ligada a desempenho e sujeita a retenção (...); assegurar que a compensação de executivos esteja alinhada com desempenho e risco; tornar as políticas e estruturas de compensação transparentes; (...) assegurar que os comitês de supervisão das políticas de compensação possam agir com independência"

Honduras leva a bate-boca entre Brasil e EUA

Gustavo Chacra
DEU EM O ESTDO DE S. PAULO

Representante americana na ONU critica Amorim por acionar Conselho de SegurançaO chanceler brasileiro, Celso Amorim, bateu boca com a embaixadora dos EUA na ONU, Susan Rice. O incidente ocorreu quando o Conselho de Segurança, a pedido do Brasil, estava deliberando sobre uma declaração condenando o cerco à embaixada brasileira em Honduras. Em conversa privada, Rice disse a Amorim que aquele não era o local adequado para esse tipo de representação, ao que o chanceler respondeu: “Se fosse a Embaixada dos EUA, você estaria muita irritada”. O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, acusou militares de atacarem a embaixada brasileira com gases tóxicos. O governo de facto disse que a informação é falsa.

EUA e Brasil divergem no CS da ONU

Amorim discute com embaixadora americana sobre intimidação à embaixada e denuncia "planos de invasão"

O chanceler brasileiro, Celso Amorim, teve um bate-boca ontem com a embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, Susan Rice, na reunião do Conselho de Segurança. O incidente ocorreu logo depois de o chanceler brasileiro discursar na sessão extraordinária do órgão, solicitada pelo governo brasileiro, em que foi aprovada por consenso uma declaração pedindo o fim das intimidações do governo de facto hondurenho contra a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Em seu discurso, Amorim afirmou que o governo brasileiro tem "indícios concretos" que o regime de Roberto Micheletti tem planos de invadir a embaixada.

O bate-boca com a embaixadora dos EUA foi presenciado por jornalistas brasileiros. "Este não é o local adequado para este tipo de representação", disse Susan a Amorim quando os dois já estavam de pé e parte dos embaixadores havia se retirado para deliberar sobre a questão apresentada pelo Brasil. O ministro brasileiro respondeu: "Não farei uma discussão teórica sobre isso." Depois de uma conversa inaudível, Amorim acrescentou: "Se fosse a Embaixada dos EUA, você estaria muito irritada." Susan retrucou que "ainda assim não faria comentários". Amorim finalizou dizendo "vá em frente, faça sua declaração".

Ao ser questionada pelo Estado sobre a discussão, Susan respondeu: "Tivemos uma conversa privada que não estamos preparados para partilhar com vocês." Horas mais tarde, em entrevista coletiva a jornalistas brasileiros, o ministro citou a resposta da embaixadora para não comentar o assunto.

Depois da discussão, Susan seguiu com outros embaixadores para uma reunião a portas fechadas dos 15 membros do Conselho de Segurança. Amorim não participou. Usando palavras quase idênticas às do ministro brasileiro em seu discurso de introdução, a embaixadora leu a declaração do conselho condenando "os atos de intimidação contra a embaixada do Brasil" e pedindo ao "governo de facto de Honduras que encerre as ameaças".

RECADO A MICHELETTI

Amorim usou termos duros ao descrever os indícios de que o governo de facto pretende invadir a embaixada brasileira. "Primeiro, a decisão de enviar à embaixada um oficial de Justiça munido de um mandado de busca. Evidentemente, os funcionários brasileiros recusaram-se a receber o mandado e não permitiram a entrada do oficial na embaixada", discursou Amorim.

"O regime também mudou o tratamento formal concedido à embaixada, o qual parece implicar que esta teria deixado de gozar do status diplomático", acrescentou.

"O governo de facto enviou uma comunicação diretamente ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil na qual se refere à embaixada como "uma das instalações que o governo brasileiro ainda mantém em Tegucigalpa". Tudo isso parece um prelúdio para outras ações."

Segundo o chanceler brasileiro, "a embaixada tem estado cercada, submetida a atos de assédio e intimidação. Tais atos violam totalmente a Convenção de Viena".

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