quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Absolvição de Sarney e saída de Marina estremecem o PT

Adriana Vasconcelos e Gerson Camarotti – Brasília
DEU EM O GLOBO

No mesmo dia em que ajudou a enterrar as investigações contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o PT sofreu uma baixa importante para 2010: a senadora Marina Silva CAC), ex-ministra do Meio Ambiente de Lula, deixou o partido. Marina alegou insatisfação com a política ambiental do PT e do governo e estuda disputar a Presidência da República pelo PV. No Conselho de Ética do Senado, por ordem do Planalto, os petistas Ideli Salvatti, Delcídio Amaral e João Pedro declararam, em voz quase inaudível, o "não" que ajudou a salvar o aliado Sarney. A votação terminou 9 a 6 e desautorizou o líder petista, Aloizio Mercadante, que se recusou a ler a carta do presidente do PT, Ricardo Berzoini, orientando o voto pró-Sarney. Em protesto, o senador Flávio Arns (PR) anunciou que deixará o partido: "O PT jogou a ética no lixo, eu me envergonho de estar hoje no PT." As saídas de Marina, evangélica, e de Arns, ligado à Igreja Católica, representam também um baque no eleitorado petista religioso.

No mesmo dia, PT salva Sarney e perde Marina

Partido enterra investigação por ordem de Lula, sofre duas baixas no Senado e entra em crise

No mesmo dia em que a senadora Marina Silva anunciou sua saída do PT, depois de 30 anos no partido, os petistas seguiram a determinação do presidente Lula e ajudaram a enterrar as investigações sobre o presidente do Senado, José Sarney (PMDBAP), no Conselho de Ética. Marina deixou o PT, rumo ao PV, insatisfeita com a política ambiental do governo Lula, do qual já foi ministra, e era também crítica da defesa de Sarney feita pelos agora ex-companheiros. Após a sessão do Conselho de Ética, a bancada do PT, que tinha 12 integrantes, perdeu mais um senador: Flávio Arns, do Paraná, disse que não suporta mais a vergonha de ficar no partido e anunciou sua saída.

Em pouco mais de 30 minutos, com votação em bloco, os três senadores do PT no Conselho de Ética deram os votos decisivos para engavetar todos os 11 pedidos de investigação de supostos crimes de nepotismo, tráfico de influência, desvio de recursos públicos e envolvimento com atos secretos contra Sarney.

Por nove votos a seis, foram rejeitados os recursos da oposição contra o arquivamento das seis denúncias e cinco representações apresentadas por PSOL e PSDB. Com a voz quase inaudível, os senadores Ideli Salvatti (PT-SC), Delcídio Amaral (PT-MS) e João Pedro (PT-AM) anunciaram o voto “Não” que salvou Sarney.

A operação no Conselho de Ética, que também acabou absolvendo, neste caso por unanimidade, o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), provocou um racha sem precedente na bancada petista: o líder Aloizio Mercadante (SP) foi desautorizado publicamente pelo presidente do partido, o deputado Ricardo Berzoini (SP), e, antes mesmo do fim da sessão, o senador Flávio Arns (PR) anunciou sua saída do PT. Foi a segunda baixa no dia, já que Marina Silva anunciara, horas antes, sua decisão de deixar o partido.

— Hoje é um dia, me perdoe o PT, o dia em que o PT abraça o Sarney e o Collor e em que a Marina sai do PT. Com toda sinceridade, eu não sei quem representa o PT lá na origem hoje.

Se é o Lula do Sarney, ou se é a Marina.

Triste dia este para o senador Sarney — resumiu o senador Pedro Simon (PMDB-RS).

Dilma e Gilberto Carvalho comandaram do Planalto

Para garantir o arquivamento dos 11 processos contra Sarney, os votos dos três representantes do PT no Conselho de Ética eram considerados essenciais. Desde a véspera os líderes Renan Calheiros (PMDB-AL), Aloizio Mercadante, Romero Jucá (PMDB-RR) e Ideli Salvatti se reuniram com Gilberto Carvalho, chefe de Gabinete de Lula, e a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para combinar o script da votação no Conselho.

Caberia a Mercadante ler a carta de Berzoini orientando o voto pró-Sarney. Isso sustentaria a posição dos três petistas. Na hora, Mercadante se recusou a ler a carta, tarefa que coube a João Pedro. E os petistas ainda foram constrangidos por Mercadante, que fez questão de reiterar que a maioria da bancada divergia da posição adotada pelos três.

— A bancada do PT, e acho que falo pela maioria, preferia uma análise seletiva das denúncias contra o presidente do Senado, especialmente a relativa à publicação dos atos secretos.

Mas também tenho de reconhecer que a decisão do governo tem sido diferente da bancada — salientou Mercadante, diante dos olhares perplexos de Renan e Jucá.

Imediatamente, o senador João Pedro passou a ler a nota de Berzoini e admitiu que cumpriria a decisão sem discutir. O presidente do PT orientava a bancada do Senado a votar pelo arquivamento das denúncias contra Sarney alegando que a crise enfrentada pela instituição estaria sendo alimentada pela oposição em função da disputa eleitoral do próximo ano.

“(...) Oriento os senadores do PT que fazem parte do Conselho de Ética que votem pela manutenção do arquivamento das representações em relação aos senadores representados, como forma de repelir essa tática política da oposição, que deseja estabelecer um ambiente de conflito e confusão política, no momento em que os grandes temas do Brasil, como o marco regulatório do pré-sal e as estratégias para superação da crise internacional, são propostos pelo presidente Lula como pauta para o necessário debate nacional”, escreveu Berzoini na nota lida por João Pedro.

Foi o estopim para protestos da oposição.

— Trata-se de uma dramática confissão da falta de coerência do PT, que deveria ter assumido desde o primeiro momento que iria proteger o presidente do Senado — disparou o presidente do PSDB e titular do Conselho de Ética, Sérgio Guerra (PE).

Arquivadas as 11 representações contra Sarney, o Conselho passou então à análise do processo contra Virgílio. Apesar da sinalização do plenário de arquivar também a representação contra ele, o líder tucano fez questão de rebater cada uma das denúncias apresentadas pelo PMDB. A mais grave delas, de que teria mantido empregado em seu gabinete por 18 meses um funcionário que estava morando na Espanha.

— Já admiti o meu erro e estão aqui as guias de recolhimento mostrando que devolvi aos cofres do Senado os R$ 328.723,67 gastos pela instituição com esse funcionário — disse Virgílio.

O processo foi arquivado por unanimidade, com 15 votos não. Virgílio ainda recebeu a solidariedade de praticamente todos os integrantes do Conselho, como de outros parlamentares que só passaram pela reunião para elogiar sua postura de enfrentar as acusações. Entre eles, Flávio Arns, que aproveitou a oportunidade para lamentar de forma enfática a atitude dos colegas de partido contra a investigação sobre Sarney.

Sarney comemora e se diz aliviado

Demóstenes Torres (DEM-GO) confirmou que a oposição pretende recorrer ao plenário contra o arquivamento das investigações sobre Sarney.

O líder do PSOL, José Nery (PA), ficou de reunir as nove assinaturas necessárias para isso. Mas o líder do governo no Senado, Romero Jucá, disse que não há amparo regimental: — Acaba-se uma etapa aqui, não pode se olhar o tempo todo para trás. Pelo regimento do Conselho, não cabe recurso para o plenário. Entendo que, se fizerem isso, a Mesa do Senado não dará guarida. É preciso haver a recuperação e, se possível, a ressurreição do Senado.

Caso a Mesa rejeite o recurso da oposição, o líder do PSOL antecipou que pretende apelar ao Supremo Tribunal Federal: Com o Senado fechado pela segurança, no início da tarde, cerca de 30 manifestantes e estudantes com os rostos pintados com as cores verde e amarela, e com dizeres “Fora Sarney”, fizeram um protesto em frente ao Congresso.

Carregavam um caixão e faixas pedindo: “Investiguem, julguem e prendam Sarney”.

Naquele momento, Sarney estava no Salão Nobre para receber o presidente de Serra Leoa, Ernest Bai Koroma. Embora os seguranças tentassem afastar os manifestantes, Sarney não desceu a rampa para receber o visitante.

O senador e o convidado assistiram ao protesto do Salão Nobre. Ao presidente de Serra Leoa, Sarney explicou que estava acompanhado de poucos senadores porque naquele momento não havia sessão. Os autores do protesto seguiram em marcha pela Esplanada dos Ministérios, e Sarney pôde receber o convidado sem problemas.

Sarney encerrou o dia comemorando o engavetamento total das denúncias. Alheio às manifestações nas ruas por sua saída da presidência, passou sorridente pelo plenário e disse acreditar que terá uma fase de tranquilidade.

— Acho que todos nós ficamos (aliviados), porque ultrapassamos uma fase. Acho que vai normalizar a Casa — afirmou.

Na véspera, ele coordenara em seu gabinete reunião sobre a estratégia da tropa de choque para o dia seguinte.

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