segunda-feira, 27 de julho de 2009

Zelaya recua e fica na Nicarágua

Ricardo Galhardo
DEU EM O GLOBO

Presidente desiste de acampar na fronteira; Exército abre caminho para volta pacífica

Depois de anunciar com estardalhaço que ficaria acampado na fronteira da Nicarágua até reunir muitos partidários e conseguir entrar em seu país, o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, mudou de ideia e voltou ao hotel onde está hospedado desde o golpe de estado, em Ocotal, a 26 quilômetros da fronteira.

A mobilização de manifestantes favoráveis a seu retorno também diminuiu. Milhares de militares estão espalhados nas estradas que ligam a capital, Tegucigalpa, à Nicarágua, proibindo a passagem dos partidários de Zelaya. Todos os carros são revistados e os passageiros obrigados a se identificar. Nem a família do presidente deposto consegue atravessar os bloqueios.

O Exército de Honduras, no entanto, assegurou ontem que respalda o processo de negociação política para a crise. Embora Zelaya tenha sido preso e deportado por militares, o Exército reiterou "o apoio irrestrito aos resultados das (negociações em Costa Rica), de acordo com a nossa Constituição e demais leis", abrindo caminho para a volta do presidente.

Depois de receber críticas do governo dos EUA e da Organização dos Estados Americanos (OEA) por tentar voltar a Honduras à força, Zelaya também baixou o tom das declarações. Ontem, sentado sobre o capô de um jipe, com um megafone em uma mão e a carteira de identidade na outra, pediu resistência pacífica ao golpe.

- Esta é a arma dos democratas. Com ela vamos vencer a ditadura - disse ele, brandindo o documento.

Embora tenha se recusado a revelar seus próximos passos, o presidente deposto deu sinais de que não pretende repetir as cenas que protagonizou na sexta-feira e de que vai aguardar a pressão da comunidade internacional sobre o governo golpista encabeçado por Roberto Micheletti.

- Há muitas coisas a serem feitas daqui (da Nicarágua). Temos que falar com muitos governos de muitos países - disse ele a uma plateia que não ultrapassava 50 pessoas, em Ocotal. - Além disso, há a minha família.

Há três dias a mulher de Zelaya, Xiomara Castro, seus dois filhos, sua mãe e sua sogra tentam chegar a Las Manos, na fronteira, mas são impedidos pelas tropas. O comandante das Forças Armadas, Romeo Vásquez, que apoiou o golpe, ofereceu transporte aéreo a Xiomara mas ela recusou.

- Querem me tirar no meu país - acusou ela, que tem passado as noites em casas de partidários à beira da rodovia Panamericana.

Ontem foi a vez do presidente da Costa Rica, Oscar Arias, principal articulador da tentativa de acordo entre Zelaya e os golpistas, criticar seu comportamento midiático.

- Este não é o caminho para a reconciliação do país - disse Arias em entrevista ao jornal "El País".
Presidente cobra postura dos EUA

De cima do capô de seu jipe branco, Zelaya negou que tenha recebido qualquer convite da secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, para uma reunião. Por outro lado, ele cobrou uma postura mais incisiva dos EUA em relação ao governo golpista.

- A secretária Clinton que enfrente a ditadura com força para sabermos verdadeiramente qual é a posição dos EUA diante deste golpe de estado - cobrou Zelaya.

Além da tranquilidade na fronteira, as mobilizações também diminuiram nos pontos de bloqueio onde ocorreram enfrentamentos durante a semana. A única exceção foi a localidade de Vila San Francisco, onde foi enterrado ontem o jovem Pedro Magdiel, de 23 anos, pró-Zelaya, encontrado morto em El Paraíso. Dois homens identificados como policiais infiltrados foram detidos por manifestantes e quase foram linchados durante o enterro. Segundo a Cruz Vermelha internacional, quatro pessoas (dois policiais e dois civis) ficaram feridas nos confrontos do final de semana.

Ontem, pelo menos uma centena de partidários de Zelaya que optaram por atravessar as montanhas para fugir dos bloqueios chegaram à Nicarágua. Com uma perna quebrada devido a uma queda no caminho, a professora Maria Paz Zúniga lamentou a falta de manifestantes:

- Esperava ver mais gente.

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