domingo, 5 de julho de 2009

Posição dos Estados Unidos é crucial para destino do país

Leonardo Valente e Marília Martins*
DEU EM O GLOBO

Mudança de atitude por Obama fortalece pressão continental contra golpe

NOVA YORK e RIO. O golpe de Estado em Honduras mostrou uma força diplomática continental inédita contra a instalação de um governo que não foi eleito democraticamente, ao mesmo tempo em que revelou as fraturas do arranjo político interno do país centro-americano. Duas faces bem distintas do mesmo continente: de um lado, a instabilidade política de alguns países e, do outro, a capacidade de articulação cada vez maior entre os grandes Estados da região em prol da estabilidade. O consenso internacional, no entanto, só foi possível graças à condenação do golpe pelos EUA.

— O golpe foi a ruptura de um pacto político de alternância de poder entre dois partidos, ameaçado pelo projeto de reeleição de Zelaya. Mas há uma grande chance de vermos, de forma inédita, a restauração desse pacto a partir de uma pressão conjunta dos países americanos, por meio da OEA, que não admitem o golpe. Neste processo, a modificação da postura americana no governo Barack Obama está sendo fundamental — disse Marcelo Coutinho, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e coordenador do Observatório Político Sul-Americano (Opsa), do Iuperj.

Alberto Gómez, jurista e cientista político da Universidade Nacional Autônoma de Honduras, afirma que o golpe evidenciou a fragilidade institucional do país, que, por um lado, tem um presidente que tenta romper com a estabilidade democrática ao buscar impor a reeleição e, por outro, políticos que, diante do impasse, viram o rompimento da ordem democrática como a alternativa.

— A estabilidade democrática não resistiu a esse impasse, nossas instituições não se mostraram fortes o suficiente. O grande problema é que parte da elite do país e também da população apoiam o golpe — disse ele, afirmando, no entanto, que o país não esperava uma reação regional tão forte. — A pressão dos países vizinhos pode compensar nossas fragilidades políticas e colocar o país novamente numa ordem constitucional e democrática.

Bush não daria apoio a Zelaya, diz analista

A consonância de vozes do continente contra o golpe, no entanto, só foi possível, na visão dos analistas, por causa da mudança de atitude dos EUA, que, com frequência num passado recente estiveram do outro lado, apoiando golpistas em diversos países do continente. Para Susan Purcell, diretora do Centro de Política Hemisférica da Universidade de Miami, a articulação regional em relação ao golpe seria muito mais complicada se este acontecesse durante o governo de George W. Bush.

— Bush não apoiaria a volta de Manuel Zelaya ao poder em Honduras porque veria nele a intenção de usar as regras do jogo democrático para tentar derrubar a democracia e perpetuarse no poder. Obama tende a buscar negociações multilaterais — disse.

Sem o apoio dos EUA, a busca por consenso dentro a OEA se tornaria muito mais difícil e, consequentemente, a pressão seria muito mais fraca.

— Se não fosse a posição de Obama de condenar o golpe, veríamos um continente mais dividido em relação ao tema. Isso poderia fazer com que a reação da Venezuela, por exemplo, fosse mais agressiva. Isso fortaleceria os golpistas e ainda poderia servir de exemplo para outros países, como a Bolívia, que também enfrenta forte instabilidade política — afirmou Gómez.

(*) Correspondente

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