terça-feira, 31 de março de 2009

Ciro embaralha campo governista

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Ciro Gomes já foi o candidato de Lula à Presidência da República. Isso foi em 2005, época de mensalão, quando a popularidade do presidente andava pelas tabelas e ele pensou em não concorrer à reeleição, no ano seguinte. O que o PSB quer agora é que Ciro seja uma opção a mais do campo governista no primeiro turno das eleições de 2010, e nada indica que o deputado cearense possa estar em algum palanque de oposição ao presidente.

Ciro tem afinidades com o governador mineiro Aécio Neves, mas à esta altura do jogo sucessório ninguém imagina que eles possam estar coligados no próximo ano, até porque é pouco provável que Aécio seja o candidato do PSDB ou que ele venha a trocar de partido para disputar a eleição. Ciro faz gestos para Aécio por cálculo político.

Ele joga na divisão dos tucanos, ao insistir que eles têm um candidato com mais condições de compor com outras forças políticas que o governador José Serra (SP), e faz acenos seguidos para Minas Gerais, o terceiro maior colégio eleitoral do país. Incensar Aécio também é discurso para Minas.

Ciro voltou com vontade ao jogo eleitoral, uma reclamação recorrente do PSB que o sentia um tanto "apático" no processo. O próprio Ciro reconhece que passou por uma fase pessoal difícil, mas que está pronto para avançar no projeto do PSB: convencer Lula e o PT que polarizar desde agora com José Serra embute um risco de derrota para o tucano. Duas candidaturas, por outro lado, assegurariam a passagem de um dos nomes governistas para a etapa seguinte, com possibilidades de composições no segundo turno.

O PSB recorre a três exemplos, nas duas últimas eleições, para ilustrar o acerto da estratégia de dois ou mais candidatos do campo governista. Um caso de sucesso e dois de insucessos. O primeiro é a eleição de Eduardo Campos para o governo de Pernambuco, em 2006, quando a base saiu com dois candidatos e, no segundo turno, PSB e PT se uniram contra a coligação PMDB-PFL.

Já em São Paulo e no Rio Grande do Norte, em 2008, ocorreu o contrário. Em São Paulo capital, o Palácio do Planalto pressionou para a retirada da candidatura do deputado Aldo Rebelo (PCdoB) em favor de Marta Suplicy, as oposições se uniram, a eleição foi para o segundo turno, mas ficou sem gás na fase decisiva da disputa eleitoral, pois já não tinha mais espaço por onde compor e ampliar. Em Natal, a candidata única Fátima Bezerra (PT) nem passou de fase.

Lula já conversou com o governador Eduardo Campos, que detém o controle do PSB. Está prevista agora uma reunião do presidente com a Executiva Nacional do partido e, mais tarde, uma conversa individual com Ciro. Enquanto isso, o deputado mantém a agenda de viagens.

Sábado Ciro esteve em Manaus, a convite da federação local da indústria. Na sequência deve ir a Cuiabá (MT), Juiz de Fora (MG), Porto Alegre (RS) e Rio Branco (AC)

Nessas viagens, quando é questionado sobre sua vontade política para concorrer, Ciro costuma dizer que foi "candidato pelo PPS quando o PPS tinha dois deputados e um senador". Agora está num partido que tem 30 deputados (29, para ser exato), três governadores estaduais e dois senadores, além de uma conjuntura que considera mais favorável que as de 1998 e 2002, quando foi candidato a presidente. Ou seja, não está "fazendo fita". Mas também costuma ressaltar que só vai ser candidato dentro de um projeto coletivo.

Segundo o raciocínio exposto por Ciro, a candidatura do tucano José Serra já bateu no teto, ficará por volta dos 41% e, depois, só vai para baixo. Ele acredita que Dilma Rousseff, a candidata de Lula, atinge facilmente os 25% nas pesquisas - resultado do prestígio de Lula e o PT, juntos, combinados. Quando ganhar a visibilidade que Dilma atualmente dispõe, quando for para a campanha, Ciro, que já anda na frente da ministra da Casa Civil, acredita que vai crescer ainda mais. Sobretudo porque terá um discurso forte sobre a crise.

"É claro que muita água vai rolar debaixo dessa ponte até a decisão final", diz o líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF). "Agora, nós do PSB temos claro o entendimento que para a continuidade e o aprofundamento do projeto político do presidente Lula é preciso que alguém da base do governo ganhe a eleição - A melhor tática é nos termos mais de uma candidatura da base. Eu não tenho a menor dúvida disso".

"Trata-se de um candidato de continuidade política, mas não necessariamente de continuidade do projeto de governo", diz o vice-presidente do PSB, Roberto Amaral, numa evidente referência à política econômica e financeira.

Duas medidas

Há um tsunami se "agigantando vindo em direção do PT", diz um especialista nos assuntos da sigla. Trata-se da questão da refiliação de Delúbio Soares, o ex-tesoureiro petista que pretende sair candidato a deputado federal por Goiás. O problema todo é que chegou ao PT informação segundo a qual Lula considera que isso é um tiro no pé. Mexer neste assunto, agora, poderia causar complicações desnecessárias para a candidatura Dilma Rousseff.

Ocorre que, por outro lado, o PT vê o ex-ministro José Dirceu atuar com desenvoltura nas composições regionais para fechar a aliança com o PMDB. A pedido de Lula. O mesmo José Dirceu que, em outras épocas, foi vetado por Tarso Genro para compor a direção nacional do partido.

Então há muito muxoxo e ranger de dentes, especialmente entre as pessoas atingidas pelo mensalão e outros escândalos do PT. O choro é que Lula não teria o direito de exercitar duas políticas: vetar Delúbio e dar missões políticas para Dirceu. Um "protesto silencioso" de quem acha que está sendo usado por debaixo dos panos: ninguém quer que eles apareçam, mas precisam deles para controlar o partido.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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