quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Merval Pereira: Em busca do confronto

- O Globo

A declaração, no mínimo irresponsável, que no limite pode ser considerada uma incitação à violência, da presidente do PT, senadora investigada Gleisi Hoffmann, de que, para prender Lula, será preciso “matar muita gente”, é o retrato fiel da escalada de radicalização, por enquanto retórica, que os aliados do ex-presidente Lula estão fazendo à medida que se aproxima o dia do julgamento do recurso no Tribunal Regional Federal de Porto Alegre (TRF-4).

Mas também do descontrole emocional que domina as principais lideranças do partido, pois a mesma Gleisi, em entrevista à agência de notícias Bloomberg dias antes, mandara um recado aos investidores estrangeiros para que não se preocupassem, pois Lula, segundo ela, é um líder político conciliador e estaria disposto a publicar uma nova versão da carta aos brasileiros para garantir seus compromissos com o equilíbrio fiscal.

A presidente do PT, por sinal, dá provas, dia sim outro também, de que está fora de sintonia com a realidade, provavelmente devido ao temor de que seu líder máximo acabe o processo em curso na cadeia ou, pior ainda para os planos petistas, impedido de concorrer à Presidência da República.

A senadora petista colocara recentemente no Facebook uma foto da torcida do time de futebol alemão Bayern de Munique onde se leria, segundo sua postagem, uma faixa de apoio a Lula, como se o julgamento estivesse mobilizando até mesmo torcidas organizadas alemãs. Na verdade, a foto mostrava uma faixa onde se lia “Forza, Luca”, comum ultimamente nos estádios da Alemanha devido a um acidente sofrido por um torcedor. O fanatismo provocou uma ilusão de ótica que fez Gleisi ler Lula em vez de Luca, deixando-a no ridículo.

São três episódios da mesma autora que demonstram como o julgamento do dia 24 está mexendo com os nervos da presidente do partido. Mas não só com os dela. A defesa de Lula tenta, de última hora, incluir no processo o que seria uma nova prova, fato de que tratamos aqui na coluna de ontem. A equivocada penhora do tríplex do Guarujá por uma juíza, em processo contra a OAS, pareceu aos advogados de Lula uma prova irrespondível de que o apartamento não é de Lula.

Como se ele não tivesse sido condenado justamente por tentar esconder a posse de fato do imóvel, que, aliás, foi confiscado judicialmente pelo juiz Sergio Moro como produto do crime pelo qual foi condenado. Em outra tentativa de alterar o andamento do processo, a defesa pediu que Lula fosse ouvido novamente no TRF-4 antes do julgamento, pois seu depoimento ao juiz Sergio Moro teria sido indevido pela parcialidade do julgador na primeira instância.

O relator da Lava-Jato no TRF-4, ministro João Pedro Gebran Neto, do TRF-4, rejeitou o pedido, sob a alegação óbvia de que para concordar com ele seria preciso anular o primeiro depoimento, o que só poderia ser feito pelo plenário da corte de apelação. A mais recente trama foi tentar incluir um advogado americano entre os defensores de Lula, mas ele não tem registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para atuar no país.

Além disso, deputados petistas, Wadih Damous e Paulo Teixeira, foram subestabelecidos como defensores de outro réu, Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula. Os dois poderão fazer uma defesa oral durante o julgamento, o que demonstra uma intenção, que não se sabe se concretizarão, de tumultuar o processo. Okamotto, pelo menos, preocupou-se em minimizar a fala de Gleisi sobre mortes em consequência de uma eventual prisão de Lula ao final do julgamento do dia 24, dizendo que foi uma força de expressão da presidente do PT. E que ele, sim, morreria do coração se Lula fosse preso. Okamotto imolou-se simbolicamente para atenuar o disparate da senadora Gleisi Hoffmann, mas isso em nada reduz a irresponsabilidade de conclamar os militantes petistas a reações violentas em caso de condenação de Lula. Os que ameaçaram os juízes do TRF-4 pelo Facebook já foram identificados pela Polícia Federal e podem sofrer as consequências ainda antes do dia do julgamento.

Como se vê, o périplo do presidente daquele tribunal, ministro Thompson Flores, a gabinetes de autoridades em Brasília em busca de garantias para que o julgamento transcorra sob controle das forças de Segurança não foi desmotivado. O apelo ao confronto está por toda parte nas atitudes de militantes e dirigentes petistas. Esperamos que sejam apenas bravatas irresponsáveis, a serem desestimuladas pela ação preventiva das autoridades de Segurança.

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