domingo, 17 de agosto de 2014

Opinião do dia: Eduardo Campos

"Agora, ao lado da Marina Silva, eu quero representar a sua indignação, o seu sonho, o seu desejo de ter um Brasil melhor. Não vamos desistir do Brasil. É aqui onde nós vamos criar nossos filhos, é aqui onde nós temos que criar uma sociedade mais justa. Para isso, é preciso ter a coragem de mudar, de fazer diferente, de reunir uma agenda. É essa agenda que nos reúne, a agenda da escola em tempo integral para todos os brasileiros, a agenda do passe livre, a agenda de mais recursos para a Saúde, a agenda do enfrentamento do crack, da violência. O Brasil tem jeito. Vamos juntos. Eu peço teu voto."

Eduardo Campos. Últimas palavras no “Jornal Nacional”, TV Globo, 12 de agosto de 2014.

Escolhida candidata, Marina diz ter 'senso de compromisso' após a perda de Campos

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

RECIFE - À espera apenas de um anúncio formal para que seja oficializada como candidata do PSB à Presidência da República, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva desembarcou ontem no Recife para a cerimônia de sepultamento do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos dizendo que a perda do aliado impõe a ela uma "responsabilidade" e um "compromisso". Sem entrar em detalhes, afirmou ainda que o fato de ela, candidata a vice, não estar no mesmo jatinho de Campos, o cabeça de chapa, "foi uma providência divina".

O PSB ainda precisa bater o martelo sobre quem será o vice de Marina. O anúncio dos novos nomes deve ocorrer entre hoje, após o enterro dos restos mortais de Campos, e quarta-feira, quando o partido terá uma reunião de dirigentes em Brasília.

Marina chegou à capital pernambucana às 14h30, antes mesmo de o avião da Força Aérea Brasileira (FAB) que transportaria os restos mortais de Campos decolar de São Paulo. Ela foi uma das primeiras passageiras a entrar no voo 6324, da Avianca. Sentou-se na poltrona 22B, ao lado do marido, Fábio Lima.

A ex-ministra passou a maior parte do tempo calada. Com fones de ouvido ligados ao seu celular, ouvia a pregação de um pastor - ela é evangélica - e lia trechos da Bíblia, entre eles o Salmo 23, que diz "O Senhor é meu Pastor e nada me faltará".

Quando deixava a Bíblia, lia e fazia anotações sobre o livro Em Busca da Política, do sociólogo polonês Zygmunt Bauman.

Resignação. Marina tinha um semblante mais resignado do que na quarta-feira passada, quando, no dia do desastre, foi a público lamentar a morte de Campos e outras seis pessoas - quatro assessores e dois pilotos.

Assim que o avião pousou no Recife, aceitou falar rapidamente com o Estado, desde que não fosse questionada sobre o seu futuro político. Foi quando falou em "providência divina" e repetiu o que havia dito no dia anterior em reunião reservada com aliados. "Sinto o senso de responsabilidade e compromisso que a perda de Eduardo impõe", afirmou a ex-ministra.

Além do marido, as três filhas acompanhavam a ex-ministra. O filho Danilo, que estava com ela em São Paulo, não pode viajar. Um grupo de mais de dez pessoas da Rede Sustentabilidade também estava no mesmo voo para Recife. Fazia parte da comitiva os aliados que escolheu para compor a equipe de coordenação da campanha como Bazileu Margarido, Pedro Ivo, Neca Setúbal e Nilson Oliveira.

Apreensão. Na fila para o embarque, foi impossível não falar da apreensão em ter de pegar um avião depois da tragédia de quarta-feira. Uma das filhas de Marina comentou que a irmã, Mayara, sempre ficava muito ansiosa quando tinha que pegar um voo. Pediu para sentar ao lado das irmãs para ficar mais tranquila.

Marina também não gosta de voar. Disse que sempre traz diversos livros para ler, para passar o tempo. Só consegue dormir quando não há turbulência. Ontem, não pregou os olhos.
Para evitar assédio, a ex-ministra não circulou pela área de embarque do aeroporto de Guarulhos, antes da partida. Ficou em uma sala reservada para autoridades, acompanhada do marido e do deputado licenciado Walter Feldman, porta-voz da Rede.

Poucos passageiros se aproximaram de Marina durante o voo. Um deles foi o senador Eduardo Suplicy (PT), que a cumprimentou antes da decolagem. No fim, ela bateu fotos com um casal e foi abraçada por uma senhora emocionada que disse conhecer Campos "desde criancinha".
Após chegar ao Recife, Marina para a casa da família de Campos. O encontro com a viúva Renata foi "intenso e emocionante", segundo relato dos presentes. / Colaborou Daiene Cardoso

Com medo de Marina, PT prefere Aécio no 2º turno

• Equipe de Dilma define eventual disputa com ex-senadora como "zona nebulosa"

• Petistas acreditam que candidata do PSB pode superar tucano já nas primeiras pesquisas; PSDB revê estratégias

Andréia Sadi, Daniela Lima – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA, SÃO PAULO - Com a entrada de Marina Silva no lugar de Eduardo Campos na chapa liderada pelo PSB, interlocutores do comitê da candidatura petista e do Palácio do Planalto preveem dificuldades no tom do discurso que a campanha da presidente Dilma Rousseff (PT) à reeleição adotará contra a ex-senadora.

Para manter a linha do "nós contra eles"", que vem sendo usada pela petista desde o início da corrida presidencial, aliados de Dilma ouvidos pela Folha admitem preferir enfrentar Aécio Neves (PSDB) em um eventual 2º turno a encarar uma "zona nebulosa e imprevisível"", como definem o enfrentamento com Marina.

Antes do acidente aéreo que matou Campos na última quarta (13), petistas tentavam circunscrever a disputa entre "esquerda e direita", polarizando com o PSDB e isolando o PSB, terceiro lugar nas pesquisas. Aécio era o segundo colocado, atrás de Dilma.

No primeiro turno de 2010, Marina surpreendeu o PT ao conseguir quase 20 milhões de votos. Neste ano, para dilmistas, a ex-senadora se apropriará dos eleitores que se identificaram com a pauta da onda de protestos de junho do ano passado, o que pode ampliar sua votação.

Na avaliação dos aliados da presidente, Marina atrairá parte dos votos brancos e nulos, que registraram altos índices nas últimas pesquisas de intenção de voto.

Esses eleitores, segundo o comitê petista, seriam "órfãos"" da ex-senadora. Além disso, há a crença de que as primeiras pesquisas mostrarão Marina com patamar próximo ou superior ao de Aécio.

Mudança de rumo
A mesma suspeita levou os estrategistas do tucano a refletirem sobre as estratégias que tinham traçado para enfrentar Dilma e Campos.

Apesar de acreditarem que a entrada de Marina no cenário obrigatoriamente levará a uma disputa em dois turnos, aliados de Aécio sabem que o desempenho dela pode tirar o tucano da reta final.

Para minimizar esse risco, a campanha do PSDB passou a estudar qual seria a melhor maneira de combater o crescimento de Marina.

Entre os principais estrategistas do tucano, a avaliação corrente é que ele deve fortalecer o discurso de que é o único capaz de reajustar a economia e promover um "choque de gestão" no país.

Apesar do capital político de Marina, dizem, ainda existem dúvidas sobre a capacidade dela de realinhar o país no momento em que ele vive uma "crise de expectativa".

Aliados de Aécio acreditam ainda que setores importantes da economia, como o agronegócio, resistirão à candidatura da ex-senadora, o que abriria espaço para o tucano navegar sozinho no campo da oposição a Dilma.

Fragilidades
Uma das apostas dos tucanos é que Marina terá dificuldades para manter o fôlego de sua campanha até o fim, uma vez que o PSB não é um partido grande e parte dos palanques regionais foi costurado com empenho pessoal de Campos e a contragosto de sua então candidata a vice.

A expectativa é que protagonistas das alianças fechadas em alguns Estados tendam a abandonar a ex-senadora. A mesma avaliação é feita no comitê de Dilma.

Para alguns assessores da presidente, Marina enfrentará também dificuldades dentro do próprio PSB.

Petistas veem ainda como fragilidades algumas posições históricas dela, classificadas por eles como "conservadorismo comportamental".

Como exemplo, citam que Marina é contra o aborto e já disse ser favorável ao ensino religioso nas escolas, embora admitam que um embate nesse campo corre o risco de resultar em um "déjà vu".

Na eleição passada, Dilma enfrentou resistência entre religiosos após uma polêmica em torno de sua posição sobre o aborto, desgaste apontado como um dos motivos da ida da disputa ao 2º turno.

Dirigentes do PT preveem também que, caso as pesquisas mostrem Marina à frente de Aécio e superando Dilma em um segundo turno, o movimento "volta, Lula" --que pede a substituição da presidente por seu antecessor na chapa-- ficará incontrolável.

Morte de Campos impões compromisso, diz Marina

A Marina o que era de Campos

• PSB prepara "testamento político" a ser seguido por candidata

Fernanda Krakovics, Mariana Sanches e Sérgio Roxo – O Globo

BRASÍLIA e RECIFE - O PSB prepara uma carta com os compromissos de Eduardo Campos, candidato do partido à Presidência da República morto em um acidente aéreo na última quarta-feira, a serem honrados pela ex-senadora Marina Silva, que era vice na chapa e assumirá seu lugar na disputa eleitoral. A ideia é divulgar essa espécie de testamento político na próxima quarta-feira, quando o PSB anunciará oficialmente a candidatura de Marina.

A ex-senadora desembarcou por volta das 15 horas de ontem no aeroporto de Recife para acompanhar o velório e enterro de Campos. Assim que pousou na capital pernambucana, em um voo comercial, Marina declarou ter senso de responsabilidade e afirmou que vai manter os compromissos definidos com seu ex-companheiro de chapa:

- Tenho senso de responsabilidade e compromisso com o que a perda de Eduardo nos impõe - disse, sem dar espaço para tratar das discussões com os socialistas.

O objetivo da carta é legitimar o nome da ex-senadora, assegurar que ela cumprirá os compromissos políticos firmados por Campos e que vai conciliar os interesses do PSB e os da Rede Sustentabilidade, grupo ao qual pertence. Para o público externo, seria um aceno, por exemplo, para o agronegócio. E, internamente, uma promessa de honrar os acordos políticos firmados pelo socialista nos estados.

- É uma carta de desejos e intenções do Eduardo para o Brasil que ela vai honrar - afirmou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).

Documento foi consenso
A elaboração do documento foi acertada em uma reunião de lideranças do PSB na noite de anteontem, em São Paulo. Mais cedo, o presidente do partido, Roberto Amaral, acompanhado de outros integrantes da sigla, havia se encontrado com Marina, que aceitou assumir a cabeça de chapa. Ligado ao PT, Amaral era uma das principais resistências a Marina no partido.

Os compromissos que Marina vai assumir são de mão dupla. Dirigentes do PSB afirmam, por exemplo, que mesmo que Marina seja eleita presidente da República, ela deixará o partido assim que conseguir fundar sua própria sigla, a Rede:

- É estranho, mas não tem nada de novidade. Não tem ninguém enganando ninguém. Esse é o acordo que ela tinha com o Eduardo - afirmou um integrante da Executiva Nacional do PSB.
O mais cotado, no momento, para assumir a vice na chapa é o líder do PSB na Câmara, deputado Beto Albuquerque (RS). Mas também está na mesa o nome do deputado Júlio Delgado e há quem defenda a indicação de um quadro de Pernambuco mais próximo a Campos.

"Ela precisa assumir compromissos"
O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), afirmou, ontem ao chegar a Recife para o funeral de Campos, que Marina deve respeitar os compromissos já firmados nas eleições para governador e senador e nas coligações proporcionais.

O dirigente do segundo principal partido da aliança também afirmou que na coligação não há nenhum outro nome "com a presença de Marina". O partido já havia se posicionado em favor de que a ex-senadora assumisse o a candidatura presidencial:

- A Marina tem as características dela. O que ela não pode é deixar de assumir os compromissos que estão firmados nos estados - disse Freire.

O dirigente do PPS descartou qualquer possibilidade de um outro nome para a cabeça de chapa e afirmou que o seu partido poderia até se afastar da aliança em caso de mudança:

- Ela era vice do Eduardo. Acontece uma fatalidade e você vai inventar o que? Alguém do PSB de raiz? Se inventasse alguém do PSB, o PPS não estava lá.

Freire considera natural que, com a mudança de candidato, algumas características da chapa sejam alteradas, mas destaca que a única condição imprescindível é que seja mantida a postura de oposição ao governo federal:

- Você não pode esperar que a Marina vá ter do ponto de vista econômico a mesma postura contundentemente crítica que o Eduardo tinha

Problemas em São Paulo
A carta compromisso preparada pelo PSB tem o objetivo de tentar superar divergências em estados como São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Além disso, os conflitos de Marina com o agronegócio colocam em risco palanques costurados por Campos em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, Marina foi contra a aliança para a reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB). Mesmo assim, o PSB indicou o deputado Márcio França para vice do tucano.

No Paraná e em Santa Catarina, Campos tinha apoio de candidatos a governador do PSDB - Beto Richa e Paulo Bauer, respectivamente. Marina respeitou a decisão, mas nunca aprovou.

Já no segundo maior colégio eleitoral do país, Minas Gerais, Marina deve herdar o apoio que já era dado a Campos. No processo de formação das alianças, parte do PSB queria apoiar o tucano Pimenta da Veiga para o governo do estado, mas a ex-senadora trabalhou para implodir essa possibilidade. No fim, prevaleceu a candidatura do socialista Tarcísio Delgado.

Apesar de a candidatura de Marina já ser dada como certa, a direção do PSB está consultando integrantes do partido sobre essa saída:

- Tudo indica que vai ser nesse sentido, mas as pessoas precisam ser ouvidas. Precisamos ouvir governadores, prefeitos, porque não somos os donos do partido - disse Carlos Siqueira, integrante da Executiva Nacional do PSB.

A expectativa de dirigentes socialistas é que a ex-senadora Marina Silva tenha um desempenho nas pesquisas de intenção de voto melhor do que Eduardo Campos, tanto pelo recall das eleições de 2010, quando ela teve quase 20% dos votos para presidente da República, quanto pela comoção nacional gerada pela tragédia. Ex-governador de Pernambuco por duas vezes, o principal desafio de Campos era se tornar conhecido nacionalmente.

'Teremos segundo turno', prevê Roberto Freire

Ângela Lacerda – O Estado de S. Paulo

O presidente nacional do PPS, Roberto Freire, afirmou em entrevista ocorrida nesta tarde, no Recife, que a mudança de cenário com a morte do ex-candidato Eduardo Campos PSB) aponta duas certezas: Marina Silva será a candidata à presidência da República e haverá segundo turno na eleição presidencial.

"Esta é a mudança e traz preocupações para quem imaginava que estava tudo consolidado, inclusive os dois candidatos, seja Dilma (Rousseff) ou Aécio (Neves)", afirmou depois de visitar a viúva de Campos, Renata, na sua residência, no bairro de Dois Irmãos.

Ele adiantou que o PPS nada vai reivindicar com a mudança. "O PPS luta pela unidade das oposições e a derrota do lulopetismo", resumiu.

A candidatura à vice-presidência na chapa deve caber ao PSB, defendeu ele. "Até porque não adianta fugir de um dado de realidade: Marina está no PSB por um grande acordo feito, no qual Eduardo mostrou sua dimensão", lembrou. "Ela estava não como socialista do PSB, mas como representante da Rede Sustentabilidade".

Freire observou que quando integrava o velho partido Comunista do Brasil (PCB), seus militantes eram candidatos por outros partidos porque a sigla estava na clandestinidade. "Não podíamos agora, em uma clandestinidade que Marina foi colocada pelo governo Lula, deixá-la numa Democracia sem ter legenda para se candidatar. Foi o que o PSB fez".

Quanto às divergências entre Rede e PSB, ele afirmou que elas existiram até a concretização do programa. "Concretizado, Eduardo era o responsável por dar seguimento ao que foi acordado", disse ao observar que Marina poderia ficar em posição de não participar de algum ato que ela não estivesse concordando, porque Eduardo fazia a política. "Agora ela vai ser chamada para fazer política, não como uma coadjuvante, ela agora é protagonista, vai ter de fazer o que Eduardo fazia".

Freire complementou que a situação agora será diferente, pois ela é outra pessoa, com outras características, mas o projeto terá continuidade. "Não tenho dúvida que ela tem competência e sensibilidade para exercer esse papel, como representante dos acordos políticos firmados com Eduardo".

Entrevista Luiz Werneck Vianna:Marina terá de encarnar Campos, diz sociólogo

• Professor da PUC do Rio diz que ex-senadora deve assumir compromissos de ex-governador para alavancar candidatura

• Segundo Vianna, presidenciável do PSB pode atrair votos dos indecisos e descrentes com a classe política

Italo Nogueira - Folha de S. Paulo

RIO - Escolhida pelo PSB para disputar a Presidência, Marina Silva terá de "encarnar" compromissos de Eduardo Campos, candidato da sigla morto na quarta-feira (13) num acidente aéreo.

A avaliação é do sociólogo Luiz Werneck Vianna. Para ele, Marina precisa manter os compromissos do ex-governador de Pernambuco para ter apoio dos empresários.

"[Ela pode] dizer que a candidatura original era dele, que eles conceberam a candidatura juntos e agora tem que se fiar mais às convicções dele do que particularmente às dela", afirmou na sexta (15).


Folha - Que impacto essa tragédia pode ter na eleição?

Luiz Werneck Vianna - Mudou tudo. Para onde, não se sabe.

Com o nome de Marina confirmado, que cenário o sr. vê?

Ela tem problemas no PSB, tem problemas em setores empresariais, é bem aceita nas camadas médias, como ficou provado em 2010.

Campos era bem aceito pelo empresariado. Acha que ela pode herdar essa aceitação?

Ela vai ter que encarnar o Campos. Tem inclusive uma saída honesta para essa encarnação: dizer que a candidatura original era dele, que eles conceberam a candidatura juntos e agora ela tem que se fiar mais às convicções dele do que particularmente às dela. Esse é o maior desafio.

Que outros desafios ela tem?

Mostrar à população que [a encarnação] é verdadeira.

Em 2010 o vice dela era o empresário Guilherme Leal. Não é suficiente para ter aceitação?

Era um nicho empresarial. Não há como imaginar nesta altura que o agronegócio vá escolher o nome dela.

O sr. vê possibilidade de Marina compor com o agronegócio, como fez Campos?

Se ela se convencer e convencer o grande público de que ela é o legado de Campos, aí é possível.

A comoção pelo episódio tem impacto [nas pesquisas]?

Vai ter, mas o problema é saber para que direção. O maior impacto de morte que já ocorreu foi o suicídio de Vargas: em 24h mudou o país. Para saber para qual direção haverá impacto, é melhor procurar um mago.

A candidatura de Marina tira mais votos de quem?

Ela pode provocar uma atração forte sobre os indecisos, o pessoal do "não me representa".

Do movimento das ruas?

Não digo o movimento das ruas, mas algo dessa cultura que vicejou ali pode encontrar expressividade nela, algo que Campos não conseguiu. Eduardo era muito terno e gravata, a pauta dele era responsável: economia, desenvolvimento... A pauta da Marina, como ela mesma diz, é "sonhática".

Qual é o impacto da morte de Campos sobre a política?

É ruim. Uma liderança jovem. O regime militar não favoreceu o surgimento de lideranças novas. Mas PT e PSDB também não favoreceram. Os quadros diretivos dos dois partidos são homens para além da meia idade. Eles se comportaram como uma oligarquia. Principalmente o PT.

Campos conseguiu se descolar desse problema?

De certo modo sim, mas ele tinha o aval do avô [Miguel Arraes, ex-governador de Pernambuco], que abriu a política para ele.

E a Marina?

Ela tem uma trajetória de aventura singular, história de vida particular.

Essa falta de nomes novos preocupa para 2018?

Sim, porque o nome falado para 2018 pelo PT qual é? É o Lula. Não tem quadro novo.

O PT tenta renovar com Haddad, Padilha, Lindbergh...

A emergência de quadros novos é a partir de luz própria, e não vinda de um poste. O PT tem vida orgânica? Não tem. Sem isso os quadros não são selecionados. O PSDB também não tem vida orgânica.

Líder do PSB na Câmara é favorito para ser vice na chapa

João Domingos, Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

RECIFE - O nome do líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque (RS), é o favorito para ocupar a vaga de vice-presidente na chapa que deverá ser encabeçada pela ex-ministra Marina Silva. De acordo com dirigentes do PSB, Albuquerque só não foi anunciado ainda porque o partido quer ouvir a viúva Renata Campos, visto que a candidatura dela é defendida por uma pequena ala da legenda.

Segundo a cúpula do partido, todos os fatores levam para a escolha de Albuquerque. Ele é um militante orgânico do PSB, teve uma forte ligação com Eduardo Campos, tem diálogo fácil, é respeitado por Marina e teria a capacidade de, sempre que for preciso, fazer com que a ex-ministra se lembre de que é do PSB e não da Rede Sustentabilidade. Albuquerque já disse que Marina terá de esquecer a Rede nesse período. Os dois tiveram um encontro na quinta-feira, um dia depois do acidente aéreo que matou Campos.

Candidato ao Senado pelo Rio Grande do Sul, Albuquerque aparece em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de votos. À frente dele estão Lasier Martins (PDT) e Olívio Dutra (PT). Ele disputa o Senado numa coligação com o PMDB. Sendo o escolhido para a vice, deverá deixar a vaga para o senador Pedro Simon (PMDB), que tinha cedido o lugar para ele.

A direção do PSB descartou a possibilidade de anunciar hoje, após o enterro de Campos, a decisão sobre a chapa. De acordo com integrantes do partido, mesmo o anúncio de Marina ainda depende de alguns ajustes e fechamento de compromissos, como o de que ela não vai interferir em alianças regionais patrocinadas por Campos, como a de São Paulo, onde o PSB lançou o deputado Márcio França a vice do tucano Geraldo Alckmin, e do Rio, onde o partido apoia a candidatura do petista Lindbergh Farias.

A intenção do PSB é anunciar a chapa Marina Silva-Beto Albuquerque na próxima quarta-feira, durante reunião da Executiva nacional da sigla, em Brasília.

Na família de Campos não há resistências ao nome de Albuquerque. Amigos de Renata, a viúva, e do irmão Antonio Campos, o primeiro a lançar o nome de Marina para a cabeça de chapa, relatam que ambos apoiam a escolha de Albuquerque. O nome de Renata foi cogitado - e ainda é - para a vice porque representaria a lembrança constante do ex-governador. Mas ela tem um filho de seis meses e teria dificuldades de se ausentar para a campanha, segundo pessoas que conversaram com ela. Além disso, há o desgaste emocional causado pela perda do marido.

Outro nome do grupo ligado a Campos cotado é o ex-deputado Maurício Rands, responsável pelo programa de governo do PSB. Ele era do PT, mas abandonou o partido quando os petistas e Campos romperam as relações.

'Marina faz política de um jeito que não é o nosso'

• Vice na chapa de Alckmin, Márcio França diz que agora é o PSB que terá crédito por aceitá-la como candidata

Júnia Gama, Eduardo Bresciani e Cristiane Jungblut – O Globo

SÃO PAULO - Protagonista de um duro embate com Marina Silva dentro do PSB, o candidato a vice-governador de São Paulo, na coligação com o PSDB, e tesoureiro da campanha de Eduardo Campos, Márcio França afirmou que o trágico acidente inverteu a relação do partido com a candidata e a Rede de Sustentabilidade. França venceu a queda de braço com Marina quando ela defendia a candidatura própria do PSB ao governo paulista, mas ele era favorável à aliança com o PSDB. Segundo França, Marina precisa dizer que quer ser candidata.

- Ela (Marina Silva) era a principal puxadora de votos. Agora ele (Eduardo Campos) é o grande puxador. O que ficou dele, as falas, a entrevista ao Jornal Nacional, serão usados como nosso mantra. Ser candidata depende mais dela. Marina precisa expressar que quer ser candidata. Ela não disse "quero ser". Marina tem um outro jeito de fazer política, que não é o nosso. É dela e do partido dela - afirmou.

França lembrou que, na condição de vice, Marina não era responsável por decisões financeiras tomadas na campanha, pois está sendo usado apenas o CNPJ do PSB (a Rede de Sustentabilidade, partido de Marina, não existe formalmente)

- É o mundo real que tem de ser colocado para que ela faça sua escolha. Seria injusto colocá-la como candidato sem que saiba. Marina não era responsável por nada na campanha. Ela não sabe nem quanto custa o aluguel do comitê - afirmou.

França lembra que Marina teria imposto aos candidatos do PSB que não usassem a imagem dela em suas campanhas sem o seu consentimento expresso, o que havia sido aceito pelo partido. Para que não ocorresse o contrário, Marina Silva apresentou ofício ao partido.

- Ela tem de nos acolher e temos de acolhê-la. Antes ela criou crédito, pois era a mais famosa. Neste instante, criou o débito. Nós é que iremos acolhê-la para ser candidata a presidente. Agora ela se torna nossa candidata para dirigir o pais - afirmou.

Nas mãos de Marina

• A morte súbita de Eduardo Campos recoloca a ex-ministra no centro da arena eleitoral e muda o rumo da eleição presidencial

Ricardo Mendonça – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A queda do avião de Eduardo Campos mal havia sido confirmada quando a Prefeitura de Santos começou a receber políticos e jornalistas angustiados por informações.

Na tarde da quarta-feira trágica, o local funcionou como quartel-general da crise, com gente nervosa andando para lá e para cá, falando sem parar nos celulares, quase todos tentando obter ou confirmar fragmentos de notícias.

Foi para lá que a ex-senadora Marina Silva dirigiu-se para fazer seu pronunciamento público de pesar.

A chegada de Marina, circunspecta e visivelmente abalada, silenciou o ambiente.

"A imagem que quero guardar dele é a da nossa despedida de ontem: cheio de alegria, cheio de sonhos e cheio de compromissos", disse ela.

Ao terminar, Marina levantou e caminhou em silêncio para fora do salão. Quando a porta fechou, o falatório e a movimentação nervosa voltaram a tomar conta do lugar.

A reverência solene dos presentes diante de Marina explica-se por duas razões.

Primeiro, por sua conhecida proximidade com Campos. Uma convivência política que se intensificou há dez meses quando, esgotada a chance de oficialização do partido Rede, ela surpreendeu até os mais próximos ao anunciar sua filiação ao PSB.

Segundo, pelo ensejo político que a tragédia produziu. A morte súbita de Campos colocou nas mãos de Marina a possibilidade de determinar o rumo da atual eleição.

Embora não tenha relação fluida com caciques do PSB, o entendimento político que se firmou é o de que Marina só não será candidata no lugar de Campos se não quiser.

Mas depois de passar meses tentando criar um partido para tal e ter feito a arrojada operação que a colocou como vice de Campos, como iria explicar agora que não quer?

Agraciada com 19,6 milhões de votos em 2010, Marina sempre obteve melhor desempenho que Campos nas pesquisas. Num período, isso chegou a ser visto como ameaça ao presidenciável do PSB.

Nos levantamentos do Datafolha que a incluíam no rol de possíveis candidatos, Marina Silva aparecia invariavelmente em segundo lugar.

Em abril, alcançava 27%, 11 pontos a frente do senador Aécio Neves (PSDB) e 12 pontos abaixo da presidente Dilma, que concorre à reeleição.

Na época, a hipótese de viabilização da Rede Sustentabilidade ainda não havia sido descartada. Marina era identificada como a única figura do sistema político preservada (ou até beneficiada) dos enormes protestos que tomaram conta do país em junho do ano passado.

Repetição
Com a volta de Marina para o centro da arena, a disputa de 2014 tende a ficar mais parecida com a de 2010, com o possível retorno de temas que pautaram aquela eleição. O aborto é um deles.

No início da campanha de 2010, a evangélica Marina era a única constantemente cobrada sobre isso. Ainda que sempre tenha cultivado a imagem de progressista, ela é contrária à ampliação das situações em que a interrupção da gravidez é permitida.

O surpreendente crescimento de sua candidatura no final, combinado com uma entrevista em que Dilma não deixava explícita sua posição, contribuiu para que o tema aborto fosse alçado como principal assunto eleitoral.

Outro tópico com potencial de ganhar impulso é meio ambiente, área em que também é reconhecida pelas fortes convicções. Apesar de o governo Dilma ser severamente criticado nesse setor, é um tema que seus rivais não vinham demonstrando muito apetite para explorar.

Na economia, a aproximação de Marina com economistas de pensamento liberal, como André Lara Resende e Eduardo Giannetti, afastou dúvidas sobre como seria um governo seu nessa área.

Seringueira alfabetizada só aos 15 anos, discípula do ambientalista Chico Mendes, assassinado no Estado do Acre em 1988, senadora negra, primeira ministra nomeada pelo ex-presidente Lula em 2003, Marina sempre foi vista como uma predestinada.

A atual circunstância, fruto de nova tragédia, deve reforçar essa imagem. Se a Rede tivesse sido viabilizada, ela provavelmente seria agora a candidata de uma sigla nanica com tempo irrisório de propaganda na TV.

Merval Pereira: O novo grid

- O Globo

A corrida está apenas começando, o que mudou foi o grid de largada. Com essa imagem, um assessor do tucano Aécio Neves define o ambiente no PSDB a partir da nova realidade eleitoral que presumivelmente surgirá das próximas pesquisas, fortemente influenciadas pela comoção provocada pela morte do candidato do PSB à Presidência da República, Eduardo Campos.

Definida como a candidata substituta do PSB, Marina Silva deve aparecer no novo grid de largada à frente de onde estava Campos, talvez até à frente de Aécio Neves, que era o segundo colocado. Sondagens telefônicas nos últimos dias sugerem que Marina estaria empatada tecnicamente com o tucano, mas à frente numericamente. Se, mesmo assim, Aécio mantiver seu índice, é sinal de que tem votos cristalizados.

Todo o ambiente político está impregnado da tragédia, que hoje terá seu ápice no enterro em Recife, com a viúva Renata ao lado de Marina, protagonistas da nova cena eleitoral. Mesmo que não venha a ser a candidata a vice, o mais provável, Renata terá papel fundamental na campanha que recomeçará já amanhã.

Marina já deu o seu tom, ao afirmar que foi a “providência divina” que a tirou do avião, e que tem “compromisso com a perda que Eduardo nos impõe”. Na verdade, a razão de não estar no avião fatídico é bem mais prosaica e humana: ela não queria encontrar o deputado Márcio França (PSB), candidato a vice do governador tucano Geraldo Alckmin (coligação a que ela se opunha em SP) e que esperava o grupo em Santos.

Mas sem dúvida esse ar místico que envolve a ex-senadora dará à campanha o tom de escolhida pelo destino para presidir o país. Se se confirmarem as informações preliminares, Marina ganha força política para comandar uma campanha que será em tudo diferente da de 2010. Ela terá a apoiá-la partido mais bem estruturado do que era o PV, mas em compensação não terá unidade partidária no comando da campanha.

O presidente do PSB, Roberto Amaral, que foi obrigado a ungi-la candidata, terá o mesmo papel secundário do presidente do PV, José Luiz Penna, na campanha anterior, mas outros interesses partidários ao longo da campanha podem afastar os aliados de hoje, que engolem as diferenças devido à expectativa de poder que ela exibe nessa largada.

Se, porém, os caminhos da campanha a levarem a discordâncias programáticas com o que chama de “velha política”, ou com o agronegócio, corre o risco de ser cristianizada, ficando sem a estrutura hoje já precária. Num primeiro momento, ela representa a grande novidade, do mesmo modo que quando se uniu a Campos.

Com o tempo, o encanto do eleitorado foi se desvanecendo, e ela, que marcara 27% em uma pesquisa do Datafolha, acabou se transformando em uma possibilidade de transferência de votos para Campos que até agora não tinha se realizado.
A situação atual muda a perspectiva de Dilma, que contava ainda poder se eleger no 1º turno e agora tem pela frente um 2º turno praticamente certo. Já Aécio, que precisava de pouco para chegar ao 2º turno, terá que recomeçar a campanha dentro de uma nova dimensão.

Antes, disputava com um candidato que tinha a metade de seus votos e a metade de seu tempo de propaganda eleitoral. Agora enfrentará uma candidata que, tudo indica, começa com o mesmo tamanho eleitoral e metade da propaganda, mas que é o dobro do que teve em 2010, quando fez 20% dos votos.

Aécio tem a tradição de oposição do PSDB e uma máquina partidária que até agora tem feito a diferença. Vai disputar contra duas mulheres e na condição de ser o mais desconhecido. Mas tem a vantagem de ser diferente de Dilma e Marina e ser mais próximo da figura política de Eduardo Campos, conciliador e negociador.

Se Marina tirar mais votos de Dilma do que dele, há até mesmo a possibilidade, remota embora, de que o 2º turno seja contra Marina, e não contra Dilma.

Mas entrou na pista de corrida possibilidade que era quase inexistente antes, a de Marina ir ao 2º turno contra Dilma, deixando ao PSDB o papel de grande eleitor. Nas pesquisas anteriores, tanto Campos quanto Aécio cresciam muito num 2º turno contra Dilma, sendo que o tucano chegou a empatar tecnicamente com ela.

Se Marina surge na primeira pesquisa como capaz de vencer Dilma no 2º turno, torna-se automaticamente a candidata a ser vencida, condição que já foi de Aécio. A consistência dessa situação, só o desenrolar da campanha dirá.

Dora Kramer: Presença de Marina

- O Estado de S. Paulo

O candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, aponta dois movimentos imediatos no cenário eleitoral em decorrência da substituição de Eduardo Campos por Marina Silva como titular da chapa do PSB.

O primeiro, a consolidação do segundo turno. "O que era uma tendência passa a ser um fato". O segundo diz respeito às perdas e ganhos em termos de intenções de voto.

Na opinião do tucano, na largada só Marina ganha. Ele prevê que no primeiro momento, em boa parte devido ao clima de comoção, a ex-senadora talvez apareça nas pesquisas com o dobro dos índices registrados por Campos, previsão esta coincidente com as expectativas de políticos do PSB.
O senador mineiro acha que a presidente Dilma perde um pouco, ele próprio acredita que deva ter uma pequena queda nos índices ("isso vai atrasar meu crescimento"), mas imagina que a maior fonte de votos da ex-senadora esteja no grupo dos pesquisados dispostos a anular ou deixar o voto em branco.

O fato de o quadro se alterar, na visão de Aécio não quer dizer que a mudança será radical. "Não tem essa história de que o jogo ficou zerado".

Obviamente ele continua trabalhando com o cenário de um segundo turno entre ele e a presidente Dilma Rousseff, embora reconheça que a vaga agora será mais disputada. Este pensamento é traduzido assim por um companheiro dele de partido radicado em São Paulo: "Antes haveria segundo turno sem o risco de Aécio ser ultrapassado, agora já não podemos ter tanta certeza".

Voltando ao candidato, para ele a "grande incógnita" é saber como Marina vai se posicionar uma vez assumida a candidatura: se terá um discurso franca e nitidamente de oposição ao PT, a Dilma e a Lula ou se vai se concentrar em falar de si, de suas propostas e concepções sobre grandes temas de interesse nacional deixando de lado o embate mais agressivo.

E por que isso é importante? Justamente por causa do segundo turno. Aécio não se concentra na possibilidade de ter ou não o apoio pessoal de Marina. Até porque há certo consenso no PSDB de que pelo histórico de 2010 e pela personalidade dela o mais provável é que caso fique de fora da fase final não apoie nenhum dos dois concorrentes.

A preocupação do tucano é herdar o eleitorado dela. Se não na totalidade, a maior parte. Por isso a intenção dele será manter a sintonia com o eleitor de oposição, imaginando que quem escolhe Marina Silva não vota no governo.

Neste aspecto, não há mudança estratégica no rumo da campanha. A avaliação é a de que os setores do PSB próximos ao PT ficarão com Dilma e os que já têm boas relações com o PSDB em vários estados não têm motivo para romper acordos já fechados.

O que muda nesse momento e pelas próximas duas semanas é o grau de atritos. Haverá uma "baixada" de alguns decibéis no tom dos discursos. A morte de Eduardo Campos abalou a todos; até que o efeito do choque se amenize não há clima para beligerância.

Apaga a luz. Ao contrário da avaliação do presidente do PT, Rui Falcão, sobre a necessidade de a presidente Dilma se reeleger para o ex-presidente Lula "voltar em 2018", um ministro de fino tino político acha que a reeleição encerra um ciclo.

Na opinião desse integrante do primeiro escalão do governo, caso Dilma consiga mais um mandato o PT terá gastado seus últimos créditos junto ao eleitorado.

Pálida ideia. Na rodada estadual do Datafolha divulgada sexta-feira Geraldo Alckmin continua firme no patamar de 55% de intenções de votos.

O governo é considerado ótimo ou bom por 47% dos entrevistados. Mas, quando perguntados sobre quais as melhores áreas da administração, 22% responderam "nenhuma" e 24% não souberam dizer. Juntos, somam 46%.

Ou seja, o paulista vota em Alckmin, mas não sabe por quê.

João Bosco Rabello: Da utopia à realidade

- O Estado de S. Paulo

A síntese que melhor definiu o drama político do PSB e da ex-senadora Marina Silva foi do ex-secretário de Meio Ambiente de Pernambuco, Sérgio Xavier, para quem "é hora de chorar e trabalhar ao mesmo tempo".

Possivelmente essa dura realidade removeu parcialmente o constrangimento do partido e, ao final, da própria Marina, para que o passo incontornável de consolidá-la candidata em substituição a Eduardo Campos fosse dado antes dos rituais de despedida do ex-governador.

O que isso determina, por ora, é a garantia de um segundo turno, muito embora ele já fosse dado por certo antes da tragédia, pela lógica da soma dos votos dos candidatos de oposição no cenário de queda da candidata Dilma Rousseff.

O raciocínio que leva a esse prognóstico se baseia no maior patrimônio eleitoral de Marina, mas desconhece que o ex-governador ainda iniciaria a campanha na televisão, que além de torná-lo mais conhecido, o vincularia à ex-senadora, consolidando a transferência de votos que se estimava desde a aliança que os uniu.

O dado novo é a tragédia que ganha justificadamente tom emocional e molda o cenário em que a adversidade não subtrai, mas soma. Eduardo se vai, mas deixa o sonho de um novo país que embalará a campanha da coligação.

Não há dúvida do impacto dos acontecimentos para as candidaturas de Dilma Rousseff e Aécio Neves. No primeiro caso, dissipa-se a esperança, ainda que tênue, da vitória no primeiro turno. No segundo, está ameaçada a liderança que o garantia como representante da oposição no segundo.

De imediato, Aécio é o mais atingido se considerada a votação de Marina em 2010, quando teve desempenho melhor nas regiões onde o PSDB se mostra mais forte que o PT. Mas Dilma pode sofrer duro revés com a migração para Marina dos votos brancos e nulos atraídos pelo discurso do novo.

Nesse contexto, profecias estão desautorizadas, mas as especulações são naturais. E nos últimos dias elas incluíram mesmo a possibilidade de um segundo turno sem governo, hipótese baseada na previsão de um efeito avassalador da tragédia política.

O enredo, no entanto, se desenvolverá passo a passo, como impõem as circunstâncias. As chances de Marina serão tanto maiores quanto à sua capacidade de agregar a coligação que tinha em Campos seu poder moderador.

É um desafio ao equilíbrio da ex-senadora, se considerada a necessidade de assimilar que sua "nova política" começa pela convivência com a velha, posto que transformação é processo. O que testará sua capacidade de conciliar utopia e realidade nas doses certas.

Eliane Cantanhêde: Não ao voto nulo!

- Folha de S. Paulo

As manifestações de junho de 2013 foram uma explosão de insatisfações. O acidente do Cessna 560 XL foi uma explosão que repõe as coisas no devido lugar.

A grande maioria dos brasileiros ou não conhecia ou tinha uma vaga ideia de quem era Eduardo Campos, este que aliados, adversários e jornalistas, antes tão críticos, agora descrevem (descrevemos) como um político excepcional e uma pessoa afável, virtuosa, de vida exemplar.

Em algum ponto entre a paixão destrutiva da eleição e a comoção endeusadora da morte, se encaixa o candidato Campos, com seus defeitos, suas qualidades e suas potencialidades. E é exatamente nesse ponto que devemos também ajustar os candidatos à nossa disposição, esses que tentam sobreviver às pressões deletérias pré-eleitorais.

O governo produz uma profusão de dados preocupantes na economia (portanto, para o futuro), mas Dilma é uma mulher honesta, bem intencionada, empenhada fazer o que julga melhor para o país.

O jeitão alegre, de festas e noitadas, gera desconfiança em relação a Aécio Neves, mas, tal como Campos, seu avô fez história e seus dois governos em Minas estão no topo dos mais bem avaliados do país.

Eduardo Jorge (PV) tem ótimos serviços prestados à saúde e à mulher. Luciana Genro (PSOL) tem o frescor dos idealistas. Até o Pastor Everaldo (PSC), goste-se ou não, representa um forte segmento.

E vem aí Marina Silva, com um carimbo conservador, mas a promessa de um "novo jeito de fazer política" e de um país equilibrado entre o crescimento econômico e a distribuição mais equitativa do bem-estar. Se preferirem, entre PSDB e PT.

A prateleira de opções é rica, variada e expõe os melhores produtos do mercado político. Depende de você, eleitor, escolher o melhor para o país e o futuro. A crítica é construtiva, a descrença é estéril.

Como pregou Campos, "não desista do Brasil!". Não ao voto nulo!

Cristovam Buarque: Não desistiremos, Eduardo


  • O nome de Eduardo Campos não estará nas urnas, e isso fará uma dramática diferença nas expectativas de milhões de eleitores

- Folha de S. Paulo

A primeira notícia foi a de que os ventos de agosto derrubaram o avião que levava Eduardo Campos e outras seis pessoas, apagaram a chama de uma esperança para o futuro e espalharam perdas pelo Brasil.

A primeira perda foi familiar. A dor da mãe, da avó, da mulher, dos filhos, do irmão e dos parentes de Eduardo. Para estes não é preciso tinta escrita, só lágrimas.

A segunda perda é dos amigos e conhecidos. Era impossível estar junto de Eduardo e não ter uma razão para deslumbrar-se com sua simpatia e suas histórias sobre a cultura nordestina e a vida política. Ao saber da notícia de sua morte, quem o conheceu sentiu um vazio pessoal, sem contar sua liderança política.

Ele era um líder político, e a terceira perda é a da esperança que representava para seu povo, sua pátria. Eduardo carregava a esperança de uma alternativa à polarização que domina a política brasileira nas últimas décadas.

Mesmo reconhecendo qualidades no PT e no PSDB, ele conseguia ser diferente dos dois blocos que dominam a política nacional.

Era a alternativa viável à mesmice da política atual, em que a discordância ideológica foi substituída pela raiva mútua que impede a capacidade de dialogar. Era capaz de conversar com todos os lados, sem perder a firmeza de suas posições. Como dissera o poeta Ferreira Gullar sobre Gregório Bezerra, "era feito de ferro e de flor".

A quarta perda é a da chance de mudança nos rumos do país para atender ao desejo coletivo por uma alternativa que supere o esgotamento da democracia sem ética; o sistema de transferência de renda que não transforma o modelo excludente; uma estabilidade monetária claudicante; um crescimento econômico interrompido.

Sem propor rupturas, Eduardo defendia uma inflexão no rumo do Brasil para consolidar as bases da estabilidade monetária; utilizar a educação integral como porta de saída para os beneficiados pelo Bolsa Família; e criar os instrumentos necessários para retomar o crescimento de uma economia moderna baseada no conhecimento científico e tecnológico. Ele era firme e radical em seu compromisso com uma reforma política, capaz de robustecer nossa degradada democracia.

A quinta perda é a do exemplo, da coerência sem intransigência e da coragem de servir a um projeto político e dele se afastar quando percebeu que o modelo perdeu seu vigor transformador, abandonou seus princípios e deixou de atender aos anseios da nação que pede mudanças.

A sexta perda é do futuro. Já sentimos perdas com as mortes de vários líderes: Getúlio Vargas, Leonel Brizola, Tancredo Neves, Miguel Arraes, Ulysses Guimarães --mas eram líderes que já tinham dado a contribuição que o país esperava deles. Aos 49 anos, Eduardo estava começando a saltar do que fez por Pernambuco para fazer para o Brasil inteiro. Adiante estava o futuro, dele e do país.

A sétima perda é eleitoral. O nome de Eduardo Campos não estará nas urnas, e isso fará uma dramática diferença nas expectativas de milhões de eleitores que viam nele o candidato da novidade, da reforma política, da afirmação da República sobre os partidos, do tratamento do patrimônio público compromissado com o povo, o Estado e a nação; da construção de um modelo econômico sem exclusão; que esperavam dele utilizar todos os recursos federais necessários para fazer a revolução na educação que o país adia há séculos.

Fica, porém, o legado e a chama que um vento de agosto não é capaz de apagar. Até porque, na véspera da sua morte, as últimas palavras públicas de Eduardo foram: "Não desistam do Brasil".

Cristovam Buarque, 70, é senador pelo PDT-DF e professor da Universidade de Brasília
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Ferreira Gullar: Bagunçou o coreto

• Pode ser que a candidatura de Marina introduza na disputa o fator emocional que estava faltando

- Folha de S. Paulo / Ilustrada

A notícia da morte de Eduardo Campos, na manhã da quarta-feira (13), sacudiu o país como um terremoto. Isso se deve, sem dúvida, ao fato de ser ele um dos principais candidatos à Presidência da República mas também à sua juventude, à sua personalidade positiva, envolta de um charme especial.

Para mim, pelas circunstâncias mesmas em que soube do fato, foi como algo absurdo, quase impossível de crer. Estava vendo na televisão a notícia da queda de uma aeronave, na cidade de Santos.

Ninguém sabia ao certo qual avião era aquele --diziam inicialmente que se tratava de um helicóptero. Mais tarde a Aeronáutica informava que o avião acidentado era um jato particular, que decolara do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro.

O noticiário falava de algumas pessoas que haviam sido feridas pelo impacto do avião contra um prédio mas nada dizia a respeito de quem estaria dentro dele. Imaginei que o choque do avião contra o prédio fora tão violento que não dava para saber quantas pessoas estavam nele e muito menos quem eram elas.

Fui para o escritório, liguei o computador e fiquei ali durante algum tempo. Quando voltei à sala recebi o golpe: Eduardo Campos, candidato do PSB à Presidência da República estava no avião e havia morrido no acidente.

Mal acreditei no que ouvia o locutor afirmar. Ao aparecer o rosto de Eduardo na tela, não suportei, desliguei a televisão. "Mas que país louco é este nosso!", disse a mim mesmo, andando pela casa.

Tomei um gole de café, liguei de novo a televisão para saber os detalhes do que, de fato, ocorrera. Logo começaram os telefonemas de parentes e amigos, igualmente estarrecidos com a notícia.

Uma dessas pessoas achava que poderia ser uma sabotagem para matar o candidato, hipótese que descartei de imediato. Já outros cogitavam sobre consequências daquela morte na campanha eleitoral e no resultado dela.

Essa foi a primeira pergunta que me fiz, passado o impacto inicial da notícia. Que sua morte teria influência nas eleições de outubro era o óbvio, já que se tratava de um dos três principais candidatos.

Mas qual seria essa a influência e as consequências dela? Beneficiaria Dilma ou beneficiaria Aécio? Não era possível saber, mas o impacto emocional que aquela inesperada morte provocaria nas pessoas, pensei, talvez favoreça Aécio, o outro candidato da oposição. Dificilmente beneficiaria Dilma, contra cujo governo ele se manifestava a cada entrevista, a cada pronunciamento que fazia.

Mas surgiu outra hipótese: a candidatura de Marina Silva seria a substituição natural à de Eduardo Campos e poderia arrastar, emocionalmente, uma parte considerável do eleitorado, alterando significativamente a correlação de forças, levando quem sabe à derrota de Dilma.

Eram tudo suposições, uma vez que, naquele dia, nem Aécio, nem Marina, nem Dilma, nem ninguém de qualquer dos partidos políticos queria, naturalmente, tocar nesse assunto. Mas a questão estava sobre a mesa.

Tudo bem, aquele era um tema que iria dar muita discussão dentro do PSB e com o pessoal de Marina Silva. Também ninguém sabia que atitude tomaria a própria Marina. Se aceitasse assumir o lugar de Eduardo Campos, o futuro das eleições presidenciais seria imprevisível e perturbador.

Tanto Dilma quanto Aécio, na hipótese de Marina se candidatar, terão de rever seu projeto de campanha eleitoral. Digo isso porque, até aqui, um dos principais problemas dos candidatos é a indiferença de grande parte do eleitorado.

Quase a metade dele se mostra desinteressada das eleições, uma vez que nenhum dos candidatos tem conseguido empolgá-la.

É que nem Dilma, nem Aécio, nem Eduardo têm significado, para essa parte do eleitorado, a alternativa capaz de mudar de fato o rumo tomado pela política no país e impor-se como uma alternativa renovadora.

Em circunstâncias normais, tampouco Marina Silva representaria isso; no entanto, em face da morte trágica de Eduardo Campos, pode ser que a candidatura dela introduza no combate eleitoral o fator emocional que estava faltando. Mas uma coisa é certa: no primeiro turno ninguém ganhará as eleições presidenciais de outubro.

Gaudêncio Torquato: Apaga-se a estrela da geração pós-64

- O Estado de S. Paulo

O imprevisível ronda o planeta da política. Quando menos se espera, chega devastador, trazendo consigo o poder de gerar perplexidade, assustar, causar comoção. Poder que se expande às alturas quando o ator é um candidato ao posto mais alto da Nação, esbanjando jovialidade, vitalidade, dinamismo, confiança, e desaparece de cena vitimado por uma tragédia aérea. A morte de Eduardo Campos, no fatídico 13 de agosto - a mesma data em que faleceu seu avô Miguel Arraes, em 2005 -, é um forte golpe na fisionomia política brasileira, eis que o perfil do ex-governador, estruturado sobre uma sólida, coerente e vitoriosa carreira pública, reunia potencial para puxar o cordão de mudanças no processo político nos próximos anos.

 Um quadro da geração pós-64 (nasceu em 1965), alimentava um sonho, confessado a este escriba há cerca de dois anos, em Comandatuba, na Bahia, por ocasião de um evento reunindo empresários e políticos.

Dizia: "Meu sonho é reunir a geração pós-64 (chegou a citar alguns nomes de grupos e partidos diferentes), fazermos uma grande aliança e tomar as rédeas do País, deixando os nossos mais velhos, que já deram sua cota de sacrifício, descansando com sua aposentadoria". O tom da conversa, incisivo, não deixava dúvidas. Campos achava viável agrupar os representantes de sua geração, compor um formidável programa de mudanças, realizar um pacto com o sistema produtivo e incentivar o ingresso dos jovens na política. A mudança dos costumes políticos tinha de vir de baixo, pela via da formação da juventude, e não por decreto. Ele mesmo, em Pernambuco, diferentemente da escola de seu avô, implantara uma metodologia de gestão voltada para resultados e promovendo, segundo ele, "revolucionária" política educacional. Parecia comprometido com um diferenciado modus faciendi na administração pública. 

O fato de ter procurado Marina Silva para compor sua chapa, na condição de candidata a vice-presidente da República, revela a inclinação por perfis inovadores, mesmo sabendo que o escopo da sustentabilidade, defendido com vigor pela ex-senadora, constitui um cardápio pouco palatável ao gosto das massas. A parceria construída expressava avanço e coerência. Ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, essa semente haveria de frutificar, na onda da conscientização sobre o planeta sustentável.

Dito isto, vem a interrogação: e agora, o que acontecerá com a moldura eleitoral, saindo o terceiro grande competidor do pleito presidencial? A primeira resposta parte da ideia de que a comoção com o seu repentino desaparecimento, a começar por Pernambuco, deverá estender-se até as urnas.

Veremos, pois, um forte voto emotivo, ao lado da escolha racional, essa que encontra guarida na cabeça crítica do eleitor disposto a não mais se deixar levar pelo "lero-lero" eleitoreiro. Em segundo lugar, a confiança de Eduardo Campos em Marina Silva, opção que fez questão de bancar contra forte resistência de alas do PSB, a credencia para ser sua substituta. O partido teria de indicá-la candidata da legenda e ela, sob o empuxo das correntes comovidas que banharão o território nacional, ganhará ampla visibilidade, suprindo o estreito espaço na mídia eleitoral (menos de dois minutos).

A natural locução nas ruas e os debates midiáticos formarão ondas de redundância, alçando-a ao primeiro plano da imagem. Sob o manto estético da evangélica Marina estará visível a imagem exuberante de Eduardo, formando um sistema de signos na cabeça do eleitor. É razoável supor que o voto será carreado por dois fenômenos da psicologia, a identificação e a projeção, com os quais os olimpianos e ídolos atraem a atenção das massas.

Será essa carga simbólica suficiente para alterar profundamente o quadro eleitoral? Vai depender do humor social mais adiante. E isso tem que ver com a economia. Algumas hipóteses se apresentam. Se Marina assumir a posição do titular, a maior parcela de votos de Eduardo migrará para ela. Pode, até, vir a encostar em Aécio Neves, reforçando a tese do segundo turno.

E se ela não for indicada pelo PSB ou não aceitar?

Nesse caso, o PSB perderia a condição de terceira via, pelo fato de rejeitar o único nome capaz de galvanizar apoios. Marina, por sua vez, se recolheria ao silêncio. Parcelas do eleitorado iriam para o tucano Aécio e para a presidente Dilma Rousseff (PT). Já se Marina substituir Eduardo, a urna governista terá menos votos. Veríamos, ainda, remodelagem dos discursos e da agenda de candidatos. Sob o véu da perplexidade que cobrirá as próximas etapas da campanha, os candidatos se obrigariam a ser mais contritos, menos extravagantes, mais comprometidos com ideias, menos propensos às firulas.

O fato é que a morte de Eduardo Campos mexe com o ânimo de múltiplas plateias, inclusive a que não o admirava. Identificou-se com as marcas da boa gestão na administração pública.

Resta, ao final, a impressão de que o País perde uma das alavancas de sua modernização institucional. Não por seus feitos em Pernambuco, restritos a quem acompanhou a administração, mas pelos potenciais que reunia e tencionava usar. Seria forte candidato em 2018, caso não fosse vitorioso este ano. Era a estrela de seu partido. Não há perfis à sua altura ou nomes capazes de pegar o bastão que ele empunhava. Não deu tempo de formar quadros, uma de suas metas. Se o Leitmotiv da política é despertar a esperança que dorme na cabeça dos cidadãos, a morte trágica do ex-governador de Pernambuco bate no coração das pessoas como um desalento. Esgarça-se mais uma bandeira da esperança, expande-se a descrença. E, assim, a campanha mais contundente de nossa contemporaneidade perde um dos seus três maiores guerreiros.

O fato é que, se quiser preservar parte do seu legado, o PSB terá de pedir a Marina que segure a onda e torne viável a terceira via. Qualquer outro caminho será mais estreito.

Jornalista, professor titular da USP,

Elio Gaspari: O PR-AFA de Eduardo Campos acertou Dilma

• Se Aécio também foi atingido, é uma dúvida, mas o dano causado à campanha do PT é uma certeza

- O Globo

A conta é simples: em agosto do ano passado, antes de ter o registro de seu Rede negado pelo Tribunal Superior Eleitoral, Marina Silva tinha 26% das intenções de voto na pesquisa do Datafolha. Tendo-se abrigado no PSB, acabou numa chapa que era encabeçada por Eduardo Campos. Há um mês, tinham 8%.

Os números de uma nova pesquisa do Datafolha estarão nas ruas nos próximos dias. Partindo-se dos 8%, somando-se o efeito da comoção provocada pelo acidente do jatinho PR-AFA, ela poderá surpreender. Para que Dilma saia incólume, qualquer ponto percentual que vá para Marina precisará sair do acervo de Aécio Neves, e essa hipótese é absurda. Dilma certamente perde quando fortalece-se a possibilidade de um segundo turno. Se Aécio Neves perde algo com a nova situação, é uma dúvida.

Manejando-se apenas percentagens vai-se a lugar nenhum. Falta saber o que Marina proporá para transformar preferências em votos. No primeiro turno de 2010 ela teve cerca de 20 milhões de votos (19,33%). Até agora, o programa de sua chapa foi ralo e confuso. Fala em "eixos programáticos", "brasileiros socialistas e sustentabilistas", "borda de desfavorecidos", "democracia de alta intensidade", em "ampliar a dimensão dos controles ex post frente à primazia dos controles ex ante". Propõe plebiscitos e "um novo Estado". Isso pode dar em qualquer coisa.

Com dois minutos no programa eleitoral gratuito contra 11 de Dilma e quatro de Aécio Neves, só as redes sociais e a internet poderão socorrê-la. Tomara que isso aconteça e que ela ponha carne no feijão. A ideia de uma candidata a líder espiritual reconforta o eleitor desencantado com a polaridade PSDB-PT, com seus mensalões mineiro e federal. Para o primeiro turno isso é um bálsamo. Para o segundo, uma aventura.

Tiro na doutora
Na quinta-feira o presidente do PSB, Roberto Amaral, anunciou que o partido só decidiria a substituição de Eduardo Campos depois do seu sepultamento.

O PSB é soberano, mas, se alguém no Palácio do Planalto acreditou que, derrubando-se Marina Silva dentro da grande área ajuda-se a doutora Dilma, enganou-se.

O efeito da jogada seria um pênalti contra a meta de Dilma. Quem derruba jogador sempre espera que o juiz não veja o lance. No caso, os juízes serão os eleitores, sobretudo os indecisos ou parte daqueles que pensavam em anular o voto.

Dilmês
Levando um texto escrito e falando da tribuna do Palácio do Planalto, a doutora Dilma tratou do desaparecimento de Eduardo Campos e disse o seguinte:

"Uma morte tirou a vida de um jovem político promissor".

José Dirceu
Pelas suas contas, o comissário José Dirceu acredita que em outubro deixará o regime semiaberto, dormindo em casa.

Felizmente, tanto ele como José Genoino abandonaram o comportamento teatral que exibiram no dia em que se apresentaram à prisão. Ambos de punho cerrado, e Genoino envolto numa cortina que servia-lhe de manto para sabe-se lá o quê.

Fritura de Obama
Outro dia Hillary Clinton deu uma entrevista atirando na testa do companheiro Barack Obama.

O casal Clinton mostrou que pretende esfolá-lo. Se Hillary acerta nas testas, Bill corta jugulares. Em novembro realizam-se eleições parlamentares e tudo indica que os republicanos mantêm a maioria na Câmara e arriscam levar também o Senado.

Os Clinton querem distância desse legado.

Bombas atômicas
Começou a contagem regressiva para os 70 anos das manhãs em que os Estados Unidos jogaram duas bombas atômicas sobre duas cidades japonesas, em agosto de 1945.

É uma grande história diplomática, industrial, tecnológica e militar. Está na rede o livro "Hiroshima Nagasaki - The Real Story of the Atomic Bombings" ("A História Real dos Bombardeios Atômicos"), do jornalista australiano Paul Ham. Sai por US$ 16,99. Cada aspecto da carnificina vale um livro, mas Ham conseguiu juntar todos num só. Era um tempo em que o presidente da Dupont relutava em participar da produção da bomba. Tendo aceitado construir a usina que produziria o plutônio que explodiu em Nagasaki, estabeleceu que a empresa não ganharia um tostão com isso.

Narrativa emocionante, sustenta que o uso das bombas em cima de duas cidades foi uma demasia. Coisas da vida. Passados 70 anos, muita gente pensa assim. Em 1945 ocorria o contrário, e a tardia rendição do Japão foi festejada em todo o mundo.

Recordar é viver
Rompimentos e alianças políticas são coisas fugazes, mas Eduardo Campos, falando da sala em que seu avô recebeu os militares que o prenderam no dia 1º de abril de 1964, informou a Lula que não pretendia mais ter relações políticas com ele.

Espiral
O ministro Ricardo Lewandowski assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal e imediatamente vestiu o manto de presidente do sindicato dos magistrados.

Defendeu um aumento salarial para os juízes usando uma expressão capaz de assombrar Lula e a doutora Dilma. Segundo ele, há no Brasil uma "espiral inflacionária".

Vieralves, o Vanderbilt da UERJ
Em plena campanha eleitoral, caiu em cima da candidata a deputada federal Benedita da Silva a denúncia de que em 2010 dois de seus filhos, funcionários da Câmara Municipal desde 1987, foram pendurados na folha de pagamento da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Faturaram R$ 143 mil.

À primeira vista, isso faz parte do tiroteio da campanha. Olhando-se bem, há meses a comissária Benedita, seus dois filhos e mais o reitor da Uerj, companheiro Ricardo Vieiralves de Castro, sabiam que estavam encrencados. O caso estourou agora porque não foi esclarecido direito enquanto era investigado pelo Ministério Público. Os dois filhos da deputada ficaram lotados no gabinete de Vieiralves. Diligências revelaram que eles lá não iam e em seus depoimentos deram explicações contraditórias a respeito de serviço que faziam. Os dois, mais Vieralves, tornaram-se réus na 1ª Vara da Fazenda Pública, acusados de improbidade administrativa. Benedita, não.

Filhos de maganos pendurando-se em Câmaras Municipais e transferindo-se para outras paragens são costumes antigos. Quando esse abrigo é uma universidade, dá pena. Quando nela é o gabinete do reitor, dá raiva. Desde que o processo foi aberto a Uerj manteve solene silêncio. Em busca da posição da universidade, no dia 12 os repórteres Cassio Bruno e Fábio Vasconcelos enviaram-lhe uma mensagem com perguntas. Passados dois dias depois, Vieiralves não se dignara a responder. O doutor pegou a linha de Alice Vanderbilt, a milionária americana que entrou no carro, disse o nome da dona da casa onde ia jantar, percebeu que o motorista tomou um caminho errado, mas ficou calada. Ela não falava com criados. Com uma diferença, madame Vanderbilt cuidava do dinheiro dela. Vieralves mexeu com dinheiro da Viúva.

Miriam Leitão: Natureza da política

- O Globo

A política tem a capacidade de embaralhar todas as peças e derrubar as certezas. A economia tem oscilações que influenciam o rumo político, às vezes. O papel da economia pode crescer, mas determinante é a política em si mesma. Estão agora todos os candidatos andando sobre gelo fino, e qualquer erro cobrará sua conta. A campanha ficou inesperadamente tensa e difícil.

Não faz muito tempo, o marqueteiro da presidente Dilma fez a previsão que já era temerária na época e agora revela amadorismo. Segundo João Santana, a presidente iria "ganhar no primeiro turno porque ocorrerá uma antropofagia de anões. Eles vão se comer lá embaixo e ela, sobranceira, vai planar no Olimpo". Quando foi dita, a frase era arrogante. Agora, é estúpida.

Os "anões" que se comeriam "lá embaixo" seriam Marina, Eduardo Campos e Aécio Neves. Eles não se atacaram e dois deles se uniram até que a morte os separou. A presidente teve uma queda súbita de popularidade com as passeatas de junho do ano passado. Seus índices de intenção de votos rodam num nível mais baixo e nada confortável para quem contava em liquidar a fatura no primeiro turno, ainda que permaneça na frente, nas pesquisas.

O acaso acaba de fazer ao Brasil uma dolorosa surpresa. De luto, brasileiros falaram intensamente da tragédia que nos levou um precioso quadro político no momento em que ele alçava seu voo nacional. A história da República brasileira é marcada por comoções que alteraram o rumo dos acontecimentos. Historiadores e cientistas políticos mostram que a coleção dessas cicatrizes é maior do que se imagina. "Mas o Brasil é bom nas crises", disse Maria Celina D"Araújo, professora da PUC-Rio. Defendeu a tese de que nesses momentos o país cresce e surpreende.

Na economia, é assim também. Nos distúrbios agudos foram tomadas decisões difíceis. Quando a crise é crônica, como agora, a tendência dos gestores e políticos é adiar as medidas impopulares. O volume de problemas que se acumula na economia é assustador. Falarei de um só, como exemplo, porque é impossível esgotar numa coluna a lista de bombas a desarmar.

Nos últimos tempos, o governo conseguiu refazer um perigoso embaralhamento dos balanços de entes públicos. A Eletrobrás, que deve à Petrobras, pegou dinheiro emprestado no Banco do Brasil e na Caixa, para pagar apenas uma parte, e pendurou o resto. O Tesouro não tem repassado à Caixa todos os valores devidos para o Bolsa Família e o seguro-desemprego. As distribuidoras de energia elétrica, privadas, receberam empréstimos de BB, Caixa, bancos estaduais, BNDES e bancos privados em operações financeiras intermediadas por uma câmara de empresários, por ordem do governo, e tendo como garantia o aumento futuro da tarifa. O Tesouro deve bilhões ao FGTS e ao FAT. O BNDES deve R$ 400 bilhões ao Tesouro. É um emaranhado de dívidas cruzadas. Isso já ocorreu no Brasil, e o saneamento das empresas e bancos deu muito trabalho ao governo Fernando Henrique.

Quem se sente flanar no Olimpo pode achar que nada disso chega ao eleitor comum. Mas esses e outros mal feitos gerenciais minam a confiança na economia, murchando investimentos em todos os níveis. Um taxista me disse dias atrás que adiou a compra do carro novo para trabalhar porque não sabe se terá clientes. Ele vê os consumidores perdendo fôlego. Os sinais da economia se propagam dos grandes aos pequenos.

Da economia, não virá o impulso para que Dilma ganhe no primeiro turno. Ela enfrentou segundo turno até quando o PIB crescia a 7,5%, em 2010. E o ex-presidente Lula, grande encantador de plateias, também passou por isso duas vezes.
O historiador José Murilo de Carvalho conta que a República presidencialista do Brasil tem sido afetada por sucessivos eventos, trágicos ou inesperados, que alteram o cenário eleitoral. A lista é longa e vem do século XIX, mas é da natureza da política brasileira.

Estamos vivendo mais um desses eventos em que tudo mudou, exigindo novas atitudes e estratégia de todos os atores. A economia será subsidiária.