quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

OPINIÃO DO DIA: Zygmunt Bauman

Se Marx e Engels escrevessem o Manifesto Comunista hoje, teriam de substituir a célebre frase inicial – “Um espectro ronda a Europa – o espectro do comunismo” – pela seguinte: “Um espectro ronda o planeta – o espectro da indignação”. Esse novo espectro comprova a novidade de nossa situação em relação ao ano de 1848, quando Marx e Engels publicaram o Manifesto. Falta-nos precedentes históricos para aprender com os protestos de massa e seguir adiante. Ainda estamos tateando no escuro.

Zygmunt Bauman, sociólogo polanês, “Vivemos o fim do futuro”. Entrevista à revista Época, nº 819, 10 de fevereiro de 2014.

Dilma volta a atacar oposição e diz que governo 'sobe um Himalaia a cada dia'

Na abertura oficial da colheita da safra brasileira no Mato Grosso, presidente reafirma que 'pessimistas' serão derrotados e critica política agrícola de FHC

Rafael Moraes Moura

LUCAS DO RIO VERDE (MT) - A presidente Dilma Rousseff aproveitou discurso na cerimônia da abertura oficial da colheita da safra brasileira de grãos para voltar a atacar a oposição e criticar a política agrícola do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). "Os pessimistas de sempre serão derrotados" disse. A presidente cumpriu agenda no Mato Grosso na manhã desta terça-feira, 11, em um aceno ao setor do agronegócio, tradicionalmente refratário ao PT.

Em uma resposta ao governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), a presidente disse que o governo sobe um Himalaia a cada dia e tem de querer "fazer mais" porque "só vamos para frente se não nos conformamos com o que conquistamos". Um dos slogans de Campos é de que "é possível fazer mais".

A fala contra os "pessimistas de sempre" surgiu quando a presidente elogiou a "competência, capacidade e esforço pessoal" de cada um dos produtores presentes ao evento. Dilma chegou até a pilotar uma colheitadeira antes do início do evento.

"(Hoje) É algo que é mais do que um momento de alegria, é a certeza no futuro deste País. E que aqueles pessimistas de sempre serão derrotados por essa força enorme que emana do nosso povo", disse a presidente.

Na segunda, durante evento do PT em São Paulo, Dilma atacou "pessimistas" que "aproveitam alguns desequilíbrios típicos de uma conjuntura internacional muito difícil para todos os países para dizer que o fim do mundo chegou". "O fim de mundo chegou para eles, há muito tempo", afirmou Dilma naquela ocasião.

Dilma também voltou a bater na oposição ao comentar a política agrícola anterior ao governo Lula (2003-2010). "Quando chegamos ao governo em 2003, eu lembro que a política agrícola tinha limitações fortes. Sabe quanto era - a gente esquece as coisas -, sabe quanto era o total de recursos de crédito para agricultura na safra 2002/2003? O que foi realizado: foram R$ 27 bilhões. R$ 27 bilhões hoje é quase todo o programa de armazenagem. Hoje R$ 27 bilhões (de crédito) mostra que não era compatível com as necessidades da agricultura deste País", disparou.

"Ninguém faz agricultura sem crédito e sem juros adequados. Por isso eu fico muito feliz de saber que até dezembro tínhamos liberado R$ 91 bilhões (de crédito para os agricultores para a atual safra)", completou.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Campos usa Facebook para reafirmar críticas ao governo Dilma

Pré-candidato à Presidência citou entrevista de Pedro Passos ao 'Estado' - empresário apoiador de Marina afirma que o modelo petista 'se esgotou'

Angela Lacerda

RECIFE - O governador de Pernambuco e presidenciável Eduardo Campos postou e recomendou, nesta manhã, na sua página do Facebook, a leitura de uma entrevista com o empresário Pedro Passos, publicada pelo Estado no dia 8, em que ele afirma ser "preciso reconhecer que o modelo se esgotou".

Foi uma resposta indireta ao discurso da presidente Dilma Rousseff, na noite de ontem (10), no 34º aniversário do PT, em São Paulo. Ao mesmo tempo, Campos reafirmou suas críticas ao governo federal. Ele avalia que o País "parou" e está sendo comandado por um "pacto mofado". No discurso, a presidente negou que o modelo de governo petista esteja esgotado e chamou seus opositores de "pessimistas" e "caras de pau".

Campos não teve agenda pública nesta terça-feira, 11.

Presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Pedro Passos afirma, na entrevista ao Estado, que a indústria brasileira sofre retração e diz que a política de incentivos não faz mais efeito. Diz ainda que o País precisa abandonar o modelo protecionista e deixar de ser refém do Mercosul.

O governador lembra, na postagem, que o empresário é sócio da Natura e apoiou a ex-ministra Marina Silva, sua aliada, nas eleições de 2010 "por enxergar a importância do desenvolvimento com sustentabilidade, algo que se torna cada vez mais urgente num setor que precisa aumentar sua produção e recuperar sua competitividade".

Fonte: O Estado de S. Paulo

Aécio diz que PT parece ‘um partido à beira de um ataque de nervos’

Senador tucano diz que sua boa formação o impede de rebater no mesmo tom o ‘palavreado’ de Dilma Rousseff

Júnia Gama

BRASÍLIA - O senador e presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG) rebateu nesta terça-feira críticas de petistas no evento realizado na noite de ontem, de aniversário do PT. Para Aécio, o PT teria utilizado a ocasião para, ao invés de fazer um evento partidário, atacar seus adversários. O senador afirmou que o presidente do PT, Rui Falcão, deveria ter usado seu discurso para falar sobre a crise energética, os direitos trabalhistas dos médicos cubanos e o estado da Petrobras.

- O PT usou o evento ontem pra fazer uma patética sucessão de neologismos desencontrados que remontam aos gloriosos tempos dos aloprados. Depois devem vir na sequência mais dossiês fajutos. O PT pareceu protagonizar um filme de Almodóvar, "um partido à beira de um ataque de nervos". Quanto ao palavreado da presidente Dilma, minha boa formação mineira me impede de rebater no mesmo tom - disse o senador.

Aécio participou hoje de reunião da Executiva do PSDB, em que foi aprovada resolução que prevê a possibilidade de intervenção nos diretórios regionais do partido para garantir um alinhamento com o projeto nacional e garantir apoio ao palanque para sua candidatura à presidência da República. De acordo com o tucano, essa é a prioridade do PSDB e a intervenção poderá acontecer “vários locais”.

- Tomamos uma decisão hoje por unanimidade de que todos os entendimentos estaduais, para serem validados, terão de passar pela Executiva nacional. Onde houver candidato ao governo, a questão já está resolvida, mas onde não houver, a coligação tem que preservar o partido localmente, mas não pode ser contraditória com o interesse nacional, que é a prioridade do PSDB - afirmou Aécio.

O tucano admitiu que poderá dividir palanques em alguns estados com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), também pré-candidato à presidência da República. Segundo Aécio, essa situação seria "natural" decorrente de um entendimento de longa data entre ambos.

- Isso (dividir palanque com Eduardo Campos) vai acontecer naturalmente em vários lugares. Por exemplo, em Minas Gerais, há uma naturalidade, um entendimento que existe há mais de dez anos entre os dois partidos. A violência seria outra, se em Minas fôssemos por outro caminho - afirmou.

Fonte: O Globo

Aécio rebate PT e centraliza poder no PSDB

Raquel Ulhôa

BRASÍLIA - Em resposta à presidente Dilma Rousseff e ao presidente do PT, Rui Falcão, que na véspera criticaram a oposição em evento da legenda petista, o senador e presidente nacional do PSDB, Aécio Neves (MG), pré-candidato à Presidência, afirmou que o PT está "à beira de uma crise de nervos" e mostra "desequilíbrio". Para o mineiro, o discurso do dirigente petista lembra o "tempo dos aloprados". Quanto a Dilma, disse que sua "boa formação mineira" o impedia de responder no mesmo tom.

As declarações de Aécio foram feitas em entrevista, ontem, após reunião da Comissão Executiva Nacional do PSDB, em Brasília, na qual foi aprovada, por unanimidade, resolução que condiciona as coligações partidárias dos tucanos nos Estados à aprovação da cúpula do partido, para que não prejudiquem a campanha presidencial.

"Nós assistimos ali, de forma patética, uma sucessão de neologismos absolutamente desencontrados, que remontam aos mais gloriosos tempos dos aloprados. Na sequência devem vir aí mais alguns dossiês fajutos", afirmou o presidenciável.

E continuou: "Infelizmente, acho que o PT protagonizou não uma festa, um evento partidário, mas, eu diria que inspirado talvez em Almodóvar, nós assistimos ali um partido à beira de uma crise de nervos [refere-se ao filme 'Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos', do cineasta Pedro Almodóvar]. E está muito cedo, para um partido que, nós sabemos, está preocupado com o cenário eleitoral, mostrar tanto desequilíbrio".

O senador disse considerar "lamentável" que o discurso de Rui Falcão não tenha citado a crise de energia, os direitos trabalhistas de médicos cubanos -"que nós defendemos", afirmou Aécio -, o "estado de calamidade" da Petrobras, que perdeu mais de 50% de seu valor de mercado, ou a crise de confiança que se abateu sobre o Brasil.

Aécio terminou a entrevista comentando a declaração de Dilma, que considerou a oposição "cara de pau" - por dizer que o ciclo do PT no governo já acabou - e disse que "o fim do mundo chegou, sim, e há muito tempo, mas para eles". O senador afirmou: "Em relação às ofensas ou ao palavreado da presidente da República, a minha boa formação mineira me impede de respondê-la no mesmo tom".

A resolução aprovada pela Executiva Nacional do PSDB, por unanimidade, determina que o lançamento de candidaturas e a formalização de coligações para as eleições nos Estados "deve garantir a difusão da doutrina e princípios partidários, refletir a imagem da sua unidade nacional e resguardar o interesse partidário tendo em vista a sua candidatura a Presidente da República".

Determina que a composição de chapas para concorrer nas eleições e a formação de coligações serão submetidas à aprovação da Executiva Nacional, que poderá "intervir na escolha de candidatos e na celebração de coligação". Os diretórios estaduais terão de encaminhar à Executiva Nacional a análise do quadro político no Estado e a situação das alianças negociadas até 30 de março.

"Em vários locais, é preciso que haja uma orientação nacional. Na verdade, poderia se fazer amanhã uma intervenção se houvesse alguma decisão contrária ao interesse nacional do partido. É uma medida preventiva. É um sinal claro de que o PSDB tem uma prioridade hoje, que supera todas as outras: eleger o próximo presidente", afirmou Aécio. "O que não podemos é, em determinado Estado, atender à viabilização de uma coligação que eleja um deputado, mas cause prejuízo à campanha nacional "

A cúpula do PSDB decidiu tratar a denúncia da Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal contra o deputado e ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB) por suposto envolvimento no caso conhecido como "mensalão mineiro" como uma "questão local e pessoal".

Com essa estratégia, os tucanos esperam reduzir o impacto de uma eventual condenação de Azeredo na candidatura de Aécio. Para reduzir a contaminação, o assunto nem foi tratado na reunião da Comissão Executiva Nacional do partido, realizada em Brasília nesta terça-feira. A decisão de deixar o "mensalão mineiro" restrito a Azeredo foi tomada antes da reunião.

"A questão de Azeredo não foi debatida [na reunião], porque não é uma questão da Executiva Nacional do partido. Vamos aguardar o julgamento. Essa não é uma questão que envolveu o partido. Vamos aguardar o julgamento, respeitar a decisão do Supremo e ver o que fazer", afirmou Aécio, após a reunião da executiva nacional.

Fonte: Valor Econômico

Comando nacional do PSDB decidirá sobre palanques regionais

Decisão permite intervenção nos estados para tentar assegurar alinhamento

BRASÍLIA - A exemplo do que já fez o PT, a Executiva nacional do PSDB aprovou nesta terça-feira resolução que estabelece que todas as coligações estaduais terão de ser validadas pelo comando nacional do partido e que prevê a possibilidade de intervenção nos diretórios regionais, se necessário, para garantir alinhamento com o projeto nacional e apoios à candidatura presidencial do senador Aécio Neves (MG). De acordo com Aécio, que é presidente nacional do partido e comandou a reunião, a decisão tomada por unanimidade reforça que o PSDB está unido em torno do projeto nacional, que é a sua candidatura.

— Tomamos uma decisão por unanimidade de que todos os entendimentos estaduais, para serem validados, terão de passar pela Executiva nacional. Onde houver candidato ao governo, a questão já está resolvida, mas onde não houver, a coligação tem que preservar o partido localmente, mas não pode ser contraditória com o interesse nacional, que é a prioridade do PSDB — afirmou Aécio.

Segundo o senador, onde o PSDB não tiver candidatos ao governo estadual, os tucanos terão que atender a duas especificidades:

— Uma delas, a preservação da bancada do partido, seja nas Assembleias, seja na Câmara Federal ou eventualmente no Senado. E, ao mesmo tempo, não ser contraditória ao interesse nacional do partido.

O tucano admitiu que poderá dividir palanques em alguns estados com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), também pré-candidato à Presidência da República, e que isso é até natural em alguns locais, como Minas Gerais.

Fonte: O Globo

PSB promete elevar o nível

Um dia após ataques de Dilma, dirigente socialista diz que sigla não está disposta a responder crítica. Já Aécio eleva o tom

Gabriela López

O PSB do governador-presidenciável Eduardo Campos (PSB), reagiu - pelo menos publicamente - de forma comedida às críticas feitas pela presidente Dilma Rousseff (PT) durante o ato de comemoração dos 34 anos do PT, na última segunda-feira (10), quando ela avaliou que a oposição é "cara de pau" e "pessimista". Coube ao secretário-geral nacional socialista, Carlos Siqueira, declarar que o partido não quer "baixar o nível" do debate político.

"Não estamos dispostos a responder este tipo de crítica", resumiu Siqueira. Ele também afirmou que o PSB nunca fez ataques pessoais aos petistas. "A proposta da candidatura de Eduardo Campos é elevar o nível da campanha de 2010 e discutir os rumos do País", disse.

Ontem, durante todo o dia, a reportagem do JC tentou contato com as principais lideranças socialistas, sem sucesso. O governador Eduardo Campos esteve em Brasília, onde se reuniu com a cúpula da legenda.

Em sua página no Facebook, o governador reiterou indiretamente as críticas que tem feito ao governo federal ao recomendar, em uma postagem, a leitura de uma entrevista com o empresário Pedro Passos, em que ele afirma ser "preciso reconhecer que o modelo se esgotou".

Também integrante da oposição, o PSDB assumiu uma postura mais ofensiva aos ataques petistas. O presidente do PSDB e presidenciável da legenda, senador Aécio Neves (MG), considerou que o PT está "à beira de uma crise de ataque de nervos".

Aécio acusou Dilma Rousseff de ser protagonista de um evento partidário, confundindo sua atuação com a de presidente. "Está muito cedo para um partido, preocupado com o cenário eleitoral, mostrar tanto desequilíbrio. Em relação às ofensas, a minha boa formação mineira me impede de respondê-la no mesmo tom", afirmou.

Numa crítica ao presidente nacional do PT, Rui Falcão, Aécio disse que o petista deveria falar sobre a crise de energia que atinge o País e as deserções no programa Mais Médicos e não usar seu discurso no evento para atacar a oposição. "Assistimos de forma patética uma sucessão de neologismos desencontrados que remontam aos mais gloriosos tempos dos aloprados. Devem vir (na eleição) dossiês fajutos. O PT protagonizou não uma festa, um evento partidário, mas inspirado talvez em Almodóvar. Assistimos ali um partido à beira de uma crise de nervos", disparou o tucano.

No ato de aniversário do PT, a presidente Dilma disse que é "mentira" e uma agressão ao bom senso e à autoestima dos brasileiros declarar que o modelo de governo do PT está esgotado, como Aécio Neves e Eduardo Campos vêm sustentando.

No mesmo evento, Rui Falcão discursou que a oposição se divide em dois grupos que, segundo ele, são especialistas em "mofo" e "doutores em bolor", apesar de fazerem discursos de mudança e renovação.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

O impacto da morte de cinegrafista nos protestos

O ataque com rojão responsável por matar o cinegrafista Santiago Andrade desencadeou reações em série e tem potencial para alterar o rumo dos protestos que ganharam as ruas em junho passado. O impacto não se resumiu à comoção popular. Pôde ser sentido até no Congresso Nacional, onde dois projetos de lei devem ser votados em breve: um tipifica o crime de terrorismo para enquadrar black blocs, outro prevê punição à prática de desordem e proíbe máscaras em manifestações. José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, propôs uma "política de Estado de proteção ao jornalista".

Andrade captava imagens em um protesto contra o aumento da tarifa de ônibus no Rio, na quinta-feira, quando foi atingido pelo artefato, que teria sido acionado pelo foragido Caio Silva de Souza. O velório de Andrade será realizado amanhã, entre 7h e 11h. Ao meio-dia ocorre a cremação.

O episódio repercutiu no Exterior. A Associação Mundial de Jornais (WAN-IFRA), que representa 18 mil publicações, 15 mil sites e mais de 3 mil empresas, e o Fórum Mundial de Editores enviaram carta à presidente Dilma Rousseff manifestando indignação. Na correspondência, as duas entidades lamentam a morte do cinegrafista, manifestam a expectativa de que os responsáveis sejam levados à Justiça e requisitam que o trabalho dos jornalistas seja exercido com segurança no Brasil.

O que pode acontecer

Ação policial
O governo federal promete interferir mais efetivamente no combate à violência durante protestos. Depois de a presidente Dilma Rousseff determinar que a Polícia Federal apoie as investigações sobre a morte do cinegrafista, outras medidas devem ser tomadas nos próximos dias. Ontem, em um encontro de representantes das empresas de comunicação, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anunciou para amanhã uma reunião sobre propostas de reação. Uma delas pode ser impedir o anonimato dos manifestantes.

O governo federal já vinha estudando maneiras de enfrentar a violência nos protestos, alarmado com a perspectiva de que eles se intensifiquem com a aproximação da Copa do Mundo. Em breve, a Força Nacional de Segurança Pública, formada por policiais militares e civis voluntários, terá 10 mil homens à disposição para intervir caso as polícias locais precisem de apoio. As Forças Armadas também ficarão de prontidão, para agir em caso de solicitação direta da Presidência ou dos governadores. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) manterá centros nos locais dos jogos.

Como não há forma de evitar manifestações, a estratégica das polícias será a de esgotar a negociação e intervir somente se houver vandalismo ou crime. Para essa eventualidade, o Ministério da Justiça já investiu R$ 40 milhões em armas de baixa letalidade, como bombas de gás lacrimogêneo.

No Estado, o secretário da Segurança Pública, Airton Michels, diz que a Brigada Militar (BM) age de forma adequada nos protestos. Ele diz que não haverá mudança de estratégia, mas contingentes podem vir do Interior para aumentar o policiamento durante atos na Capital. O Estado está preparado para trazer 2 mil homens com rapidez.

– Achamos que o procedimento da BM é absolutamente correto. Tem sido modelo para o país, até agora não tivemos a integridade das pessoas ferida e nem mortes – defende.

Legislação
Em meio a manifestações de repúdio e de cobranças por punições exemplares, o presidente do Senado, Renan Calheiros, decidiu colocar em votação em plenário, em duas semanas, o projeto de lei que define o crime de terrorismo para enquadrar black blocs. Senadores chegaram a defender que se use a norma para enquadrar ações de vandalismo e depredação cometidas nas manifestações de rua, mas abrandaram o discurso diante da preocupação do governo em passar uma imagem de insegurança no ano da Copa. Atualmente, não há legislação específica para o crime de terrorismo. Sem uma lei, crimes têm sido submetidos à Lei de Segurança Nacional, da época da ditadura militar.

Pela proposta que deve ir a votação, o crime de terrorismo será punido com 15 a 30 anos de prisão em regime fechado. As penas poderão ser elevadas se houver morte ou uso de artefato explosivo, como no caso de Santiago Andrade. Se aprovado pelo Senado, o texto terá de passar pela Câmara.

Na reunião de ontem com representantes de empresas de comunicação, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, defendeu a elaboração de uma "política de estado de proteção ao jornalista" por um grupo de trabalho, formado por profissionais da imprensa, advogados e especialistas em segurança pública, que deve se reunir já na terça-feira. O objetivo do ministro é chegar a um consenso sobre medidas que possam estar valendo até a Copa.

Na próxima quinta-feira, em Aracaju (SE), Cardozo participará de uma reunião com secretários de Segurança dos Estados para discutir medidas a serem tomadas para coibir a violência nos protestos. Titular da pasta no Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame elaborou, com juristas, um projeto de lei para punir a incitação ou prática de desordem em local público e a proibição do uso de máscaras em manifestações. A proposta deve ser votada pelo Congresso.

Opinião pública
Especialistas atribuem o esvaziamento dos protestos iniciados em junho à intensificação da violência. A morte do cinegrafista Santiago Andrade tende a aumentar o receio daqueles que já estavam distanciados das ruas devido às estratégias agressivas dos black blocs e ao enfrentamento com a polícia.

– Vai haver, sim, um aumento do temor entre aqueles que saíam para protestar. Foi um ataque covarde. O cidadão que ia protestar com os filhos na cacunda, levando o chimarrão, não vai mais – comenta José Luiz Bica de Melo, professor de Sociologia e Teorias Políticas da Unisinos.

Rodrigo Stumpf González, professor do programa de pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), acredita que a ampla repercussão do caso envolvendo o profissional da Bandeirantes também vai contribuir para afastar as pessoas que não são ligadas a movimentos sociais.

– A vítima foi um jornalista, mas poderia ter sido qualquer um. Isso deve desmobilizar parte da população, e os grupos mais violentos vão acabar ficando mais visados, mais isolados, perdendo o apoio de quem via a violência como saída – afirma.

González também crê que a comoção resulte no arrefecimento dos ânimos diante de fatores com potencial, como no ano passado, para reunir multidões – a inauguração de obras para a Copa do Mundo e o reajuste das tarifas do transporte público, por exemplo.

– Se não tivesse acontecido esse episódio, teríamos, a partir de agora, um retomar daquelas manifestações. Em Porto Alegre, vamos ter um grande descontentamento se o fim da greve significar aumento das passagens. Seria natural ocorrerem mobilizações. Com a tragédia, essas mobilizações passarão a ser limitadas a grupos mais organizados – prevê o docente da UFRGS.

Manifestantes
Grupos organizados que estão à frente dos protestos de rua afirmam que a morte de Santiago Andrade não vai interferir nas mobilizações. Eles lamentam o ocorrido, mas atribuem a violência praticada por manifestantes à necessidade de reagir à repressão policial. Em Porto Alegre, integrantes do Bloco de Luta pelo Transporte Público, que tem realizado atos frequentes, garantem que os protestos não devem diminuir ou mudar por causa do cinegrafista.

– Enquanto não forem resolvidos os problemas, não vamos sair das ruas. Pode ser que os ânimos se acirrem – diz Lucas Fogaça, do Bloco de Luta e militante do PSTU.

O uso de rojões, comum em protestos na capital gaúcha, é algo que, diz Fogaça, não pode ser impedido.

– Nunca orientamos a jogar rojões. Muitas vezes é um estímulo da própria pessoa e, por isso, não vamos sugerir que deixem de levar – explica Fogaça.

A postura de grupos como os Black Blocs tem sido colocar o caso de Andrade como um episódio isolado de violência praticada por manifestantes, em meio a inúmeros casos de agressões policiais menos badalados. Citam exemplos como o do jovem que morreu após cair de um viaduto, durante ato em Belo Horizonte, e do homem baleado pela polícia em uma abordagem após um ato contra a Copa, no Rio.

Apesar de os grupos afirmarem que nada muda com o caso do cinegrafista, a professora visitante do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Alba Zaluar, acredita que adeptos da tática black bloc devem, naturalmente, recuar. Em manifestação na segunda-feira, no Rio, a socióloga identificou mudanças na postura dos participantes mais violentos.

– Eles já não se comportaram daquela forma excessiva, quebrando tudo. Nossa batalha agora é essa: convencê-los de que isso não está levando a lugar nenhum. É um transtorno muito grande para a cidade – comenta Alba.

Fonte: Zero Hora (RS)

Máquina partidária de suporte aos mascarados

Integrantes do Psol e do PCO defendem a atuação dos black blocs como forma de proteger as manifestações. Artistas também criticam a repressão policial

André Shalders

A morte do cinegrafista Santiago Andrade, da TV Bandeirantes, colocou em primeiro plano, mais uma vez, a violência dos black blocs. Até o fim do ano passado, no entanto, a ação mascarada era vista com simpatia por alguns setores da esquerda. É o que mostra um texto publicado na página do PSol por Edilson Silva, integrante da Executiva Nacional do partido, no fim do ano passado. “Para quem pretende mudar o mundo de verdade, não deve parecer utópico ou ingênuo demais querer ver os movimentos e partidos da esquerda coerentes, como o PSol, dialogando com a tática black bloc (...)”, conclui o texto, que foi removido da página da legenda no fim da tarde de ontem, depois de um contato do Correio com a comunicação do partido.

Embora faça ressalvas ao voluntarismo e a outras debilidades dos black blocs, o texto descreve a tática dos encapuzados como detentora de um “inegável charme político”. Em nota oficial publicada ontem, a Executiva do partido diz que “apoia de forma irrestrita o direito à livre manifestação e recrimina a postura repressiva do aparato estatal. Mas, ao mesmo tempo, não concorda e nem participa de ações efetuadas por pequenos grupos presentes em alguns atos”. Procurado, o PSol informou que a posição oficial da legenda é a exposta na nota.

Mesmo depois da morte de Santiago, algumas organizações políticas seguem apoiando, mesmo que apenas verbalmente, a ação dos black blocs. É o caso do Partido da Causa Operária (PCO). Em editorial publicado na segunda-feira pelo jornal do partido, a organização diz que a morte de Santiago deu origem a uma “campanha” contra os manifestantes e os black blocs, com o objetivo de “aumentar a repressão contra as manifestações, evidentemente, justificando o uso da força policial como uma medida para ‘evitar mais mortes’”.

Em outro editorial publicado em outubro passado, o jornal Causa Operária conclui que “é preciso seguir o exemplo do Sindicato dos Professores do Rio de Janeiro, que tirou uma nota em apoio aos black blocs, e defender esses manifestantes. É preciso pedir o fim da perseguição e realizar uma campanha contra a tentativa de tornar crime os movimentos de luta.” Os black blocs também receberam apoio em nota publicada pela União Popular Anarquista (Unipa). Procurado, o PCO preferiu não se manifestar sobre o assunto.

Apoio
As organizações de esquerda não foram as únicas a flertar com os mascarados. Durante uma entrevista ao grupo Mídia Ninja, em setembro passado, o cantor Caetano Veloso foi fotografado com uma blusa preta em torno do rosto, à moda dos manifestantes. Na legenda, uma frase atribuída a Caetano dizia que “é uma violência simbólica proibir o uso de máscaras. Em 7 de setembro, todos deveriam ir às ruas mascarados!”. Procurado, Caetano não quis comentar a imagem. Atores, como Marcos Palmeira e Mariana Ximenes, também repudiaram a repressão às manifestações. “Se fala em vandalismo de um lado só, de que está se manifestando, dos black blocs. Na verdade, eu acho que existe um vandalismo também do outro lado”, disse a atriz Bianca Comparato.

Três perguntas para Chico Alencar, deputado federal pelo PSol-RJ

O artigo do Edilson Silva, integrante da Executiva Nacional do PSol, reflete uma opinião recorrente dentro do partido?

O artigo é um livre pensar do Edilson, que não expressa nenhuma posição do partido. A nossa posição é a que está expressa na nota da Executiva Nacional. De qualquer forma, é possível que os responsáveis pela morte do cinegrafista nem sejam adeptos da tática black bloc. Nós do PSol não temos qualquer relação com eles, até porque os BBs não dialogam com grupos organizados e muito menos com partidos políticos. Ao nosso ver, os black blocs estão se tornando um fim em si mesmo, uma celebração da própria força bruta muito mais que uma forma de defender os manifestantes da truculência policial, como alegado de início.

Os black blocs ajudam ou atrapalham os protestos?

Essa tática se arrisca a mandar pelo ralo a energia transformadora das manifestações iniciadas em junho, contribuindo para afastar as pessoas das ruas. E os últimos acontecimentos foram a “gota de sangue”. É claro que há também leituras interessadas, de gente avessa aos questionamentos feitos pelas manifestações e às demandas das ruas. A gente vê um recrudescimento do conservadorismo e um esvaziamento das manifestações, com efeitos muito negativos para a democracia. Esperamos que esse triste acontecimento seja um ponto de inflexão para o movimento voltar a ganhar as ruas.

Como evitar que episódios como a morte do cinegrafista se repitam?

O momento também exige uma mudança de postura das autoridades e na atuação da polícia. Não podemos esquecer que o acidente ocorreu num momento de conflito: ele foi pego de costas enquanto registrava a ação da PM. Se a polícia tivesse efetivamente garantido um protesto pacífico, será que isso teria ocorrido?

Fonte: Correio Braziliense

Projeto enquadra protesto de rua como ato terrorista

Proposta em tramitação no Congresso permite enquadrar como terrorista quem participa de protestos violentos, com pena que pode chegar a 30 anos de prisão. Texto, no entanto, ainda não tem consenso entre os parlamentares

Amanda Almeida

O Senado prepara a votação de projeto que, segundo especialistas, abre brecha para a condenação de manifestantes como terroristas, com pena de 15 a 30 anos de reclusão. A proposta virou prioridade na pauta dos senadores na esteira da morte do cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, atingido com um rojão durante um protesto no Rio de Janeiro. O PT se posicionou ontem contrário ao texto pronto para votação em plenário, mas, afinado ao Palácio do Planalto, admitiu que tem pressa na apreciação de alguma matéria em relação ao tema, por causa da proximidade da Copa do Mundo e da repercussão negativa na mídia estrangeira sobre a segurança pública no país.

O texto, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), não tem consenso entre os senadores, mas o apoio de bancadas expressivas, como a dos próprios peemedebistas, que devem ficar com a relatoria do projeto no plenário. A matéria já passou por comissão especial e está pronta para a análise dos senadores. Em reunião ontem, os líderes partidários decidiram deixar a votação para daqui a 15 dias e, enquanto isso, tentar “ajustar” o texto de maneira que agrade à maioria das legendas. Uma das ideias é fazer um substitutivo à proposta, incorporando trecho do relatório sobre o novo Código Penal, que ainda aguarda votação e também trata do tema.

O texto de Jucá diz que terrorismo é “provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa”. Para especialistas, o conceito é vago. “Tal como esta redigido, o texto implicará não apenas a possibilidade de incriminar movimentos sociais, mas também violará diretamente o princípio da legalidade. Para que uma lei penal seja legítima, é preciso que ela defina de forma iniludível a conduta criminosa. Não basta dizer simplesmente que constitui crime infundir terror ou medo coletivo, porque esses conceitos são muito fluídos e incapazes de serem absorvidos pelos cidadãos”, avaliou Juarez Tavares, professor titular de direito penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e subprocurador-geral da República aposentado.

Para a advogada criminal Fernanda Tórtima, pelo texto, “até mesmo uma briga de torcidas em estádio de futebol poderia ser considerada terrorismo”. “Afinal, há um pânico generalizado e ofensa à integridade física de pessoas. O mínimo que se pode esperar é que o legislador identifique a motivação do suposto agente terrorista”, comentou. Ela diz, ainda, que a necessidade da tipificação do terrorismo como crime é questionável. “Outra questão a ser pensada diz respeito à desnecessidade de criar um tipo penal de terrorismo em um país como o Brasil, que não tem nenhuma tradição nesse tipo de crime”, afirmou. Hoje, o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, reapresentará projeto que tipifica o crime de desordem em local público.

AI-5
Líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE) é outro crítico ao projeto. “Uma lei geral demais, como essa do terrorismo, pode levar a excessos do Estado contra o cidadão. O Brasil não precisa de outro AI-5.”

Jucá, entretanto, defende o projeto. “No meu texto, há especificamente a definição do que é o crime de terrorismo. Esse texto foi aprovado por unanimidade na comissão mista do Senado e da Câmara”, disse o senador, acrescentando reiteradas vezes que o caso do cinegrafista morto no Rio não é terrorismo. O peemedebista diz que deve ser criada a tipificação do terrorismo, mesmo sem casos no Brasil, porque “o país tem que estar preparado para qualquer eventualidade”.

Embora tenham feito um esforço para desvincular a morte de Santiago e as manifestações pelo país de atos terroristas, o Planalto e os petistas cobraram agilidade na votação de matéria sobre o tema, frisando a aproximação da Copa. “A intenção é votar nas próximas semanas. Mas, na verdade, um entendimento é importante porque estamos nos aproximando da Copa e todos nós sabemos que podem acontecer muitas coisas para as quais precisamos estar preparados, tanto para não permitir que se caracterize manifestações como terrorismo, como para prevenir diante daqueles que, organizadamente, desejem espalhar o medo na população”, comentou Humberto Costa.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reforçou o discurso, dizendo que o Brasil precisa de uma lei antiterrorismo, mas com cuidado para que a “elasticidade da expressão não seja semelhante à dada pela ditadura”. “Redação de lei não pode se tomar com o assodamento, mas tem que se fazer com rapidez. Há que se dar a resposta.”

O que muda
Confira os principais pontos do PL nº 499/2013

Terrorismo
» Provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa.

Pena
» 15 a 30 anos de reclusão

» Aumenta a punição em um terço, se o crime for praticado: com emprego de explosivo, arma química, biológica ou radioativa, ou outro meio capaz de destruir em massa; em meio de transporte público ou sob proteção internacional; por agente público, civil ou militar, ou pessoa que aja em nome do Estado; em locais com grande número de pessoas; contra os presidentes da República, da Câmara, do Senado ou do Supremo Tribunal Federal; contra chefe de Estado estrangeiro.

Palavra de especialista

Uma reação oportunista

Não há terrorismo no Brasil. O terrorismo como fenômeno de criminalidade está assentado em bases fundamentalistas, sejam religiosas sejam ideológicas. Terrorismo é muito mais do que as manifestações populares no país. O risco desse projeto em discussão no Senado é que permite interpretações equivocadas sobre terrorismo. O conceito usado está muito vago. É um cheque em branco. O que é provocar pânico? Não dá para ficar à mercê de interpretações. Do jeito que está, permitirá que pessoas que jamais praticaram terrorismo sejam punidas com penas altíssimas. Parece-me muito mais uma lei para atender a Fifa do que para atender uma demanda interna. É uma reação oportunista que decorre da aproximação da Copa, já que a morte do cinegrafista leva à repercussão negativa mundo. As leis existentes sobre crime já são suficientes para punir a prática da violência.(Cléber Lopes de Oliveira é professor de direito processual penal do UniCeub)

Tragédias
Os protestos que começaram em junho passado foram palco de 11 mortes. Santiago Andrade, entretanto, é a primeira vítima atingida diretamente por ato de violência. Saiba mais:

Belém
» Em 21 de junho, a gari Cleonice Vieira de Moraes foi atingida por gás lacrimogêneo lançado pela Polícia Militar, enquanto trabalhava durante protestos em Belém, passou mal e morreu.

São Paulo
» O estudante Marcos Delefrate, de 18 anos, morreu atropelado por um carro que furou bloqueio de manifestantes em Ribeirão Preto (SP) em 21 de junho.

» Em 26 de junho, o marceneiro Igor Oliveira da Silva, de 16 anos, foi atingido por um caminhão que fugia de uma manifestação numa ciclovia no Guarujá (SP)

Goiás
» Valdinete Rodrigues Pereira e Maria Aparecida foram atropeladas em 24 de junho enquanto bloqueavam uma área de protesto em Cristalina (GO). O motorista avançou, atropelou e fugiu do local.

Minas Gerais
» Durante um protesto em Belo Horizonte, em 26 de junho, Douglas Henrique de Oliveira, de 21 anos, caiu do viaduto José Alencar, na capital mineira. Luiz Felipe de Almeida caiu do mesmo viaduto em 22 de junho, e morreu após ficar internado 19 dias no Hospital João XXIII.

Piauí
» Paulo Patrick, de 14 anos, morreu depois de ser atropelado por um táxi durante manifestação em Teresina, em 26 de junho.

Rio de Janeiro
» Em 31 de julho, o ator Fernando da Silva Cândido morreu depois de inalar gás lançado pela polícia em protesto em 20 de junho do ano passado.

» O vendedor ambulante Tasman Amaral Accioly foi atropelado por um ônibus na manifestação de quinta-feira passada no Rio de Janeiro, a mesma em que cinegrafista Santiago Andrade foi atingido pelo rojão que o matou.

Colaborou Grasielle Castro

Fonte: Correio Braziliense

PSOL reconhece erro em não condenar extremistas

Luciana Nunes Leal

RIO - O PSOL saiu ontem em defesa do deputado estadual Marcelo Freixo, que emprega em seu gabinete um assessor que também atua na defesa de presos em protestos, mas reconheceu o erro do partido ao não condenar com veemência os grupos radicais responsáveis por depredações e uso de explosivos, como o rojão que matou o cinegrafista Santiago Andrade.

Na autocrítica, líderes do PSOL do Rio disseram que o partido devia ter ido além do repúdio genérico à violência. "Nunca dialogamos ou fizemos acordo com grupo minoritário e de orientação anarquista como os black blocs. Discordamos da tática e desconhecemos a estratégia. Temos de demarcar com mais nitidez essas posições", disse o deputado federal Chico Alencar. Para o parlamentar, um possível efeito eleitoral negativo "é o que menos importa nesse momento", mas a morte do cinegrafista "deve levar a uma reflexão geral".

Freixo também diz que a crítica deve ser veemente. "Houve uma escalada da violência de todos os lados, do Estado e de parte dos manifestantes. Isso trouxe enorme prejuízo para a democracia, afastou as massas e o debate ficou secundário."

A revelação de que um assessor de Freixo, Thiago de Souza Melo, diretor executivo do Instituto de Defensores dos Direitos Humanos, atua na defesa de presos nos protestos, foi mais um fator de desgaste do PSOL. O deputado reagiu e negou que seu gabinete ofereça ajuda jurídica a manifestantes. "Thiago me atende no plenário, é um advogado muito competente. Fora do mandato, ele atua onde quiser", afirmou Freixo.

No fim de semana, o deputado já tinha sido vinculado ao caso do cinegrafista pelo advogado Jonas Tadeu Nunes, defensor do tatuador Fábio Raposo, que confessou ter entregue a outro manifestante o rojão que atingiu Andrade. Nunes disse ter ouvido da manifestantes que os responsáveis pelo ataque ao cinegrafista eram ligados a Freixo. O deputado negou vínculo com os acusados.

Ontem, a ativista Elisa Quadros, conhecida como Sininho, prestou depoimento à polícia no procedimento criado para investigar a suposta oferta que teria feito em nome de Freixo a Nunes para auxiliá-lo na defesa do tatuador. Após deixar a delegacia, quando lhe foi perguntado sobre o envolvimento de Freixo na suposta oferta de ajuda, Sininho disse apenas que "está tudo esclarecido".

CPI. O PSOL tem sido presença frequente nas manifestações, o que é estimulado pelos líderes como o ex-deputado Milton Temer, desde que sem envolvimento em atos violentos.

Na Assembleia, o deputado Bernardo Rossi (PMDB) conseguiu ontem as 24 assinaturas necessárias para criação da CPI do Vandalismo. Rossi disse que o foco será a atuação dos grupos violentos, mas disse que o trabalho do assessor parlamentar de Freixo também será apurado.

Fonte: O Estado de S. Paulo

José Álvaro Moisés: Incertezas e apreensões com o momento político

Não estou seguro que os responsáveis pelo País - incluindo meus colegas da universidade, como os cientistas políticos - estão se dando conta completamente das implicações e das consequências do retorno da violência na vida pública brasileira. Só não está vendo quem não quer que o clima de mal-estar com o funcionamento de algumas instituições democráticas - e também com o governo de Dilma Rousseff e do PT - está dando lugar a inúmeras iniciativas de ação direta que, antes de se apoiar no diálogo, na negociação e nas instituições de representação, adotam a violência como forma de protesto e de expressão válida.

A morte de um jornalista, depredações do patrimônio público e privado, ônibus queimados, abusos das polícias despreparadas, crimes das milícias e pânico da população - tudo está dando sinais de que, aos poucos, em diferentes esferas da vida social e política, o conflito legítimo de sociedades complexas como a nossa está sendo tratado como se a única solução fosse o uso da força, da violência e do desprezo pela lei. Não digam, por favor, que governos de esquerda ou seus opostos estão sabendo o que fazer nem que os partidos de qualquer orientação estão sendo capazes de tirar a população da sua perplexidade.

Rostos cobertos em manifestações são sinal de reconhecimento de que se quer praticar atos ilegais, anti-humanos, da mesma forma que a prática da corrupção política mostra o desprezo pelas necessidades do povo e por regras de competição eleitoral equânime. Ambos são crimes contra a democracia. Mesmo sem exagerar o diagnóstico, o que está ocorrendo no Brasil contemporâneo assusta. O que têm a dizer os líderes da situação e da oposição sobre as incertezas do momento?

José Álvaro Moisés é professor de ciência política da USP

Fonte: O Estado de S. Paulo

Elio Gaspari: A histeria dos comissários

Manifestante é manifestante, delinquente é delinquente, bandido é bandido e terrorista é terrorista

Os surtos histéricos diante da violência urbana dão em nada. Se dessem, ela já teria acabado há décadas. Já os surtos de histeria política, quando dão em alguma coisa, acabam mutilando as liberdades públicas.

O senador Jorge Viana defendeu a aprovação em regime de urgência de um projeto de seu colega petista Paulo Paim que classifica como terrorismo os atos de violência física praticados durante manifestações de rua. Depredações e mesmo desacato à autoridade policial são delitos previstos no Código Penal. Isso para não se mencionar o homicídio do cinegrafista Santiago Andrade.

O projeto petista define assim o ato terrorista:

"Provocar ou difundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoas".

A pena iria de 15 a 30 anos de prisão. Se a ação resultar em morte, sobe de 24 a até 30 anos. Fica por aí porque esse é o limite máximo da pena de reclusão nas leis brasileiras.

Deixando-se de lado o caráter vago do que seria "provocar ou difundir terror ou pânico generalizado" e a precisão da pena mínima (15 anos de reclusão), pode-se buscar um caso semelhante de histeria, com danos historicamente conhecidos.

Que tal assim?

Será crime "comprometer a segurança nacional, sabotando quaisquer instalações militares, navios, aviões, material utilizável pelas Forças Armadas, ou ainda meios de comunicação e vias de transporte, estaleiros, portos, aeroportos, fábricas, depósitos e outras instalações:

Pena: reclusão de 8 a 30 anos."

Essa era a redação do artigo 11º da Lei de Segurança Nacional, baixada a 21 de outubro de 1969, no auge da ditadura, pouco depois do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick.

A pena mínima para um sabotador de quartel ou aeroporto (imputações específicas) era de 8 anos. Para assalto a banco ou sequestro de avião ela ia de 10 a 24 anos. Nos dois casos, as penas eram inferiores às que prevê o surto petista. Caso o delito resultasse em morte, a pena seria de fuzilamento. Apesar de ter havido uma condenação, ninguém foi executado dentro das normas legais.

O comissariado quer expandir a definição de terrorismo precisamente numa época em que sexagenários que militaram em organizações da esquerda armada aborrecem-se quando alguns de seus atos são chamados de ações terroristas. 

O atentado do aeroporto dos Guararapes, por exemplo, quando explodiu uma bomba no saguão, matando duas pessoas e ferindo 14. Ele ocorreu em 1966, dois anos antes da edição do Ato Institucional nº 5. Oito meses antes do AI-5, um documento do Comando de Libertação Nacional, o Colina, dizia que "o terrorismo, como execução (nas cidades e nos campos) de esbirros da reação, deverá obedecer a um rígido critério político". 

Assim, quatro meses antes da edição do AI-5 mataram um major alemão que pensavam ser o capitão boliviano que estivera na operação que resultou no assassinato do Che Guevara. Nessa organização militava, com o codinome de Wanda, a doutora Dilma Rousseff. Tinha seus 20 anos e nunca foi acusada de ter participado de ação armada.

Como diria Ancelmo Gois: "Calma, gente".

Fonte: O Globo

Fernando Rodrigues:O centro invisível

Ontem a Folha promoveu um debate na sua página A3 sobre violência e direitos humanos. O pano de fundo: um adolescente negro acusado de praticar furtos em série no Rio acabou agredido e preso nu, pelo pescoço, a um poste.

A apresentadora de TV Raquel Sheherazade escreveu a favor do direito de cidadãos se defenderem e de prenderem quem os ameaça. O deputado federal Ivan Valente, do PSOL paulista, rebateu dizendo que "ressuscitou-se o Pelourinho 125 anos após o fim da escravidão".

Gostei de ler os dois artigos com opiniões bem antagônicas. Mas ficou para mim uma dúvida: onde está o centro? Afinal, o Brasil não é só a busca do direito de prender pessoas com as próprias mãos. Tampouco é um país no qual a escravidão seja cotidiana, apesar do lamentável e bárbaro episódio do Rio.

Tem havido uma polarização exacerbada nos grandes debates brasileiros. É sempre fácil enxergar as posições nos dois extremos do espectro político-ideológico. Só o centro parece invisível. Até porque uma análise moderada será logo classificada "de direita" pelos mais liberais. Ou de "condescendente com a esquerda" por quem luta na trincheira do conservadorismo.

A grande vantagem --alguns dirão desvantagem-- da história de conchavos sociais do Brasil foi ter colocado de pé uma nação quase sem conflitos sangrentos generalizados. A disposição para encontrar saídas pactuadas deu-se em vários momentos, como no fim da ditadura militar. Na cultura brasileira, o extremismo de direita ou de esquerda nunca teve tanto espaço como em países vizinhos na América Latina.

Nesta semana, a morte do cinegrafista Santiago Andrade também produziu grande polarização. Sem contar a tentativa de alguns querendo se apropriar da tragédia alheia. Há hoje muitas ideias fora do lugar no Brasil. É um enigma aonde isso vai dar, sobretudo em ano eleitoral.

Fonte: Folha Online

Merval Pereira: Terrorismo em debate

O Brasil corre o risco de realizar uma Copa do Mundo de futebol, dentro de cerca de quatro meses, sem ter uma legislação que tipifique o crime de terrorismo, embora nossa Constituição se refira a esse crime em várias situações e diversos tratados internacionais obriguem o país a se posicionar sobre o tema. Mas, como vários assuntos, este também não foi regulamentado, e, portanto, não existe lei para combatê-lo, a não ser a Lei de Segurança Nacional do tempo da ditadura, que não se quer utilizar em tempos de democracia.

A questão chegou ontem ao plenário do Senado, oriunda justamente de um grupo de trabalho para tratar de assuntos que, embora incluídos na Constituição de 1988, ainda não saíram do papel por falta de regulamentação.

A primeira coisa que se tentou fazer foi dissociar a discussão do combate ao terrorismo do trágico assassinato do cinegrafista da TV Bandeirantes no Rio, embora o texto original tenha sido impulsionado pelos acontecimentos de junho do ano passado.

Mas o que emperrou mesmo a discussão foi a preocupação do Palácio do Planalto em não criminalizar as ações dos chamados “movimentos sociais”. O projeto de lei em discussão, cujo relator foi o senador Romero Jucá, define terrorismo da seguinte maneira: “Provocar ou difundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa”.

O projeto inclui previsão de pena maior quando há emprego de “explosivo, fogo, arma química, biológica ou radioativa, ou outro meio capaz de causar danos ou promover destruição em massa”. Esse texto enquadra perfeitamente a ação de vandalismo de black blocs nas manifestações de protesto desde junho, e em especial o assassinato do cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Andrade.

Mas surgiu um movimento, insuflado pelo gabinete do ministro Gilberto Carvalho e liderado pelo PT, para incluir no texto da lei uma ressalva que já existe no projeto do novo Código Penal, que está sendo debatido há um ano, mas que não entrará em vigor tão cedo.

O relator da comissão especial do Código Penal foi o senador Pedro Taques (PDT-MT), que inseriu em seu texto final um capítulo que trata dos “crimes contra a paz pública” e estabelece penas que podem chegar a 20 anos para os casos mais graves de terrorismo. No projeto relatado por Jucá, as penas são mais pesadas, variam de 15 a 30 anos de reclusão.

Mas o projeto do Código Penal tem um item denominado “Exclusão de crime”, assim redigido: “(...) Não constitui crime de terrorismo a conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios, desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à sua finalidade”.

Alega o senador Pedro Taques que atos como o que matou o cinegrafista no Rio de Janeiro não são o objetivo da manifestação, e que quem desvirtuou seu sentido deve ser enquadrado no Código Penal de acordo com as circunstâncias de cada caso.

O senador tucano Aloysio Nunes Ferreira, mesmo que concorde que no caso do cinegrafista da Bandeirantes não foi caracterizada uma ação terrorista, mas um homicídio, rejeita a ressalva do novo Código Penal, dizendo que não existe “terrorismo do bem”.

Há, no entanto, um temor dos políticos num ano eleitoral de serem acusados pelos “movimentos sociais” de perseguição política. Até mesmo o senador Renan Calheiros, que nas manifestações de junho levou adiante a discussão sobre o projeto de lei sobre o terrorismo, ontem fazia questão de separar os dois temas.

Já o petista Jorge Viana considerava que a lei antiterrorismo seria um “sinal concreto” à sociedade de que crimes como o que resultou na morte de Santiago Andrade vão ser punidos “com mais de 30 anos de cadeia”. Ele estava trabalhando para compatibilizar os dois textos, a fim de que o consenso no Senado permita a aprovação do projeto.

No entanto, é quase impossível que se chegue a um acordo que inclua a blindagem dos chamados “movimentos sociais”. O governo terá que mobilizar sua base para aprovar a legislação a seu modo se quiser ter uma lei antiterrorismo antes da Copa do Mundo. Mas de que servirá essa lei se os black blocs e que tais estiverem protegidos?

Fonte: O Globo

Luiz Carlos Azedo: A um passo do terror

A outra face da moeda é o endurecimento das leis e o cerceamento das liberdades individuais

Atribui-se ao ex-deputado Vladimir Palmeira, então o principal líder estudantil carioca, a palavra de ordem que incendiou corações e mentes nas manifestações de 1968: “Mataram um estudante, podia ser seu um filho”. Edson Luís de Lima Souto era um secundarista paraense, filho de lavadeira, assassinado em 28 de março daquele ano. Cursava o supletivo e sonhava com uma faculdade de engenharia. Era frequentador do Calabouço, como era chamado o Restaurante Central dos Estudantes, localizado onde é hoje o trevo de acesso ao Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Criado por Getúlio Vargas, fornecia refeições baratas para estudantes pobres.

Foco de agitação estudantil, o Calabouço ficava ao lado do Instituto Cooperativo de Ensino, onde o mártir das manifestações de 1968 estudava. O término das reformas do restaurante e a melhor qualidade da comida eram bandeiras dos protestos. Os estudantes organizavam uma passeata quando a Polícia Militar chegou ao local e dispersou os jovens, que se refugiaram no restaurante. Policiais invadiram o local e o comandante da tropa da PM, Aloísio Raposo, matou Edson com um tiro à queima-roupa. Outro estudante, Benedito Frazão Dutra, ferido gravemente, morreu no hospital. Os estudantes não permitiram, porém, que o corpo de Edson Luís fosse levado para o Instituto Médico Legal (IML); foram com ele em passeata para a Assembleia Legislativa, onde foi velado. Dali, saiu para o enterro no Cemitério São João Batista, com 50 mil pessoas protestando. Edson Luís foi enterrado ao som do Hino Nacional, cantado pela multidão. O Rio de Janeiro parou.

O desdobramento do episódio foi a Passeata dos Cem Mil, em 26 de julho, que revelou profunda divisão entre os oposicionistas. Parcela considerável dos estudantes cantava a palavra de ordem “só o povo armado derruba a ditadura”, enquanto os mais moderados respondiam com “o povo unido jamais será vencido” e “o povo organizado derruba a ditadura”. Por trás da retórica, havia o “racha” do Partido Comunista Brasileiro, liderado por Carlos Marighella e outros líderes dissidentes, que defendiam a luta armada contra o regime militar. O resto da história é conhecida: a maioria dos líderes dos protestos aderiu à guerrilha urbana e rural; muitos foram presos, torturados, exilados ou simplesmente executados.

Vítima
O funeral do cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Andrade, 49 anos, não terá, provavelmente, a mesma dimensão do enterro de Edson Luís. Apesar da consternação que o caso provocou na sociedade, os protestos serão sobretudo dos colegas de profissão. Poderia ser o pai de um dos manifestantes que participaram dos protestos contra aumentos de passagens, na Central do Brasil, há uma semana, ocasião em que foi atingido na cabeça por um rojão disparado por um manifestante. Atualmente, jornalistas não são bem-vindos nas manifestações, são hostilizados por policiais e por manifestantes porque registram os excessos de cada um, ou seja, revelam a irracionalidade e a violência que vêm dominando os atos de rua nas principais cidades brasileiras.

Nas rede sociais, a “mídia comercial”, como é chamada até em reuniões de sindicatos de jornalistas profissionais, virou uma espécie de Geni para os militantes de esquerda, de todas as idades. Quem ousa questionar os métodos violentos adotados pelos militantes black blocs e outros arruaceiros é virulentamente atacado. Defende-se a legitimidade da violência nos protestos como uma espécie de autodefesa dos manifestantes, embora o vandalismo tenha virado um fim em si mesmo. Velhos teóricos de ultraesquerda, como Antônio Negri, ideólogo das Brigadas Vermelhas, voltam a ser lembrados nas reuniões e debates.

Curioso é que o governo é quase omisso em relação à atuação desses grupos violentos, mantendo distância regulamentar das manifestações. O desgaste da repressão fica para os governadores, com polícias despreparadas para lidar com o fenômeno. A repressão reforça o discurso de que a reação violenta é uma respostas legítima dos manifestantes, numa espiral crescente. Glamouriza-se a violência, da mesma forma como se faz a apologia da luta armada contra o regime militar, que foi um equívoco político crasso.

O jurista italiano Norberto Bobbio, em artigos para os jornais La Stampa e Avanti, travou um memorável debate com a esquerda do país europeu sobre a violência política e as raízes do assassinato do primeiro-ministro democrata-cristão Aldo Moro, pelas Brigadas Vermelhas, que adotaram a luta armada em plena democracia italiana, em maio de 1978. Criticava os grupos revolucionários que justificavam a própria violência como uma resposta possível à violência do Estado.

Essa é a lógica perversa que leva ao terrorismo. Começa com um rojão e não se sabe como vai acabar. A outra face da moeda é o endurecimento das leis contra manifestações políticas e o cerceamento das liberdades individuais, com o fortalecimento do chamado “partido da ordem”, que não precisa necessariamente ser de direita, sem falar no surgimento de bandos fascistas e de justiceiros.

Como dizia Bobbio em outro de seus artigos, “a política não pode absolver o crime”, como aconteceu com Cesare Battisti, terrorista das Brigadas Vermelhas condenado na Itália e que recebeu refúgio no Brasil.

Fonte: Correio Braziliense

Dora Kramer: Antiga forma

Dia de aniversário no PT é sempre um acontecimento. Em fevereiro de 2013, com dois anos de antecedência, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva lançou a candidatura da presidente Dilma Rousseff à reeleição durante a comemoração de uma década dos petistas no poder.

Anteontem, na festa de 34 anos de vida do partido, estava previsto que Lula lançaria Dilma de novo. Mas, mudou os planos, viajou para os Estados Unidos segundo consta para "melhorar o humor" de um grupo de investidores.

Enquanto o chefe animava o auditório por lá, aqui Dilma e os companheiros faziam um ensaio geral do discurso eleitoral pintados para a guerra com a oposição. Pelo que se depreendeu do tom, aquele modelo 'paz e amor' que levou à vitória em 2002 está de novo trancado no armário.

Foi substituído pelo figurino mais adequado aos embates de vale-tudo. Vale inclusive - ou melhor, principalmente - adaptar radicalmente a realidade para que ela atenda da forma mais adequada às conveniências.

Embora não tenha sido essa a intenção, de maneira invertida os oradores acabaram fazendo uma reflexão no espelho. A presidente Dilma Rousseff chamou seus opositores de "caras de pau". Ou seja, cínicos, dados à desfaçatez, a afirmar coisas que não são verdadeiras, que agridem os fatos. Mentirosos, pois.

Vamos deixar de lado águas passadas - aquelas em que um partido de oposição navegava atacando a política econômica para incorporar a mesmíssima política e ainda chamá-la de sua assim que virou governo - para nos atermos ao discurso atual do presidente do PT, Rui Falcão.

"Neopassadismo" e "novovelhismo" foram os neologismos inventados para emoldurar em sarcasmo as candidaturas adversárias, apresentadas como "farinha do mesmo saco". Ambas, na análise de Falcão, escoradas em "dinossauros" da política, todos integrantes das "velhas oligarquias" às quais os oponentes estariam enfeitando com "paetês" e "falsas alegorias" a fim de apresentarem-se ao eleitorado como representantes da renovação.

Bem, farinha por farinha, dividiam até meses atrás do mesmo "saco" o PT e o PSB de Eduardo Campos, o destinatário "novovelhismo" no dizer da novilíngua. O tucano Aécio Neves seria o "neopassadista".

Quanto aos dinossauros, às oligarquias e aos balangandãs nelas pendurados, se Falcão referiu-se aos avós dos dois candidatos, Miguel Arraes e Tancredo Neves, respectivamente, fez homenagem póstuma a dois personagens que fizeram cada qual à sua maneira, História.

Diferente das maneiras com que Paulo Maluf, Fernando Collor, José Sarney, Jader Barbalho, Renan Calheiros e companhia protagonizam muitas histórias sob os olhares embevecidos e as palavras sempre agradecidas do PT.

Antes de finalizar mais uma vez atacando o Supremo Tribunal, no que seria acompanhado com entusiasmo pela plateia em saudação aos "guerreiros do povo brasileiros" presos na Papuda, Falcão criticou os adversários por fecharem os olhos a denúncias de corrupção.

A presidente Dilma tem razão, o caradurismo grassa.

Vantagem nenhuma. O governo trata as críticas do empresariado com desdém. Aqueles que não são qualificados como pessimistas, são incluídos na lista dos politicamente engajados em candidaturas presidenciais da oposição.

Fica faltando, porém, uma justificativa para as reiteradas recusas de empresários simpáticos ao Planalto em assumir a pasta do Desenvolvimento no lugar de Fernando Pimentel. Dois exemplos mais recentes, Josué Gomes da Silva e Abílio Diniz.

O último empresário de grande porte a participar do governo, Jorge Gerdau, ficou falando sozinho quando apontou a impossibilidade de se administrar o País com 39 ministérios.

Fonte: Estado de S. Paulo

Jairo Nicolau: A menos paulista das eleições presidenciais

Oposição contará com dois importantes líderes estaduais

Apesar das muitas dúvidas que gerou na época, a escolha do presidente Lula pela candidatura de Dilma Rousseff em 2010 foi um sucesso. No primeiro turno, Dilma obteve 47%, praticamente repetindo o percentual que Lula obteve quatro anos antes (48,6%). E o mais surpreendente é que a distribuição da sua votação pelo território nacional também foi semelhante à de Lula em 2006.

Os pleitos de 2006 e 2010 caracterizam-se ainda por uma divisão estadual mais acentuada do que a das disputas anteriores. Em 1989, 1994, 1998 e 2002 o eleito perdeu em no máximo três unidades da Federação. Em 1989, Collor de Mello foi derrotado nos dois turnos no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal. Fernando Henrique perdeu apenas em duas Unidades da Federação em 1994 (Rio Grande do Sul e Distrito Federal), e em três em 1998 (Ceará, Rio de Janeiro - por apenas 2 mil votos - e novamente no Rio Grande do Sul). Em 2002, Lula perdeu em três Estados no primeiro turno: Ceará, Rio de Janeiro e Alagoas, e apenas neste último no segundo turno.

Nas últimas duas eleições a oposição venceu em número muito maior de Estados. Em 2006, Alckmin venceu em 11 Estados no primeiro turno e em oito no segundo. Nas eleições seguintes, Serra conseguiu derrotar Dilma em oito Estados no primeiro turno e em 11 no segundo. É importante lembrar que Dilma abriu 12 pontos em relação à Serra no segundo turno. Por que a vitória em um número tão grande de Estados por parte da oposição não se traduziu em uma eleição mais disputada?

A vitória de Lula em 2006 e Dilma em 2010 deve-se à enorme vantagem que eles conseguiram na Região Nordeste - particularmente Bahia, Ceará e Pernambuco -, em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Ainda que a oposição tenha conseguido vencer nos Estados da Região Sul e em São Paulo, elas o fizeram por margens muito menores de voto.

Vejamos, por exemplo, o resultado do primeiro turno das eleições de 2010. Com 101 milhões de votos válidos, cada 1 milhão de votos equivale a um ponto percentual. Por ordem de diferença (em milhões) eis o volume de votos que Dilma obteve a mais do que Serra: Bahia (2,8); Ceará (2,1); Pernambuco (2,0); Rio de Janeiro (1,8); Minas Gerais (1,7); Maranhão (1,7). Somente nestes Estados a candidata petista obteve 12 pontos a mais do que o candidato tucano. Por outro lado, Serra conseguiu apenas 700 mil (0,7) a mais em São Paulo, o principal reduto eleitoral do PSDB.

A questão decisiva é se Dilma conseguirá manter o padrão das votações expressivas no Nordeste em Minas e no Rio de Janeiro, que garantiram a vitória petista em 2006 e 2010. Ao meu ver três novidades desta eleição podem (mas não necessariamente o farão) quebrar este padrão.

A primeira novidade é o lançamento de um candidato com domicílio eleitoral em Minas Gerais. Curiosamente, em nenhuma das cinco eleições disputadas a partir de 1989, o Estado teve alguma de suas lideranças disputando a Presidência (embora Itamar Franco tenha presidido o país). As pesquisas atuais mostram o candidato tucano à frente de Dilma, e o mais provável é que ele vença em seu Estado, quebrando um ciclo de três vitórias petistas. Mas a dúvida é saber a magnitude desta vantagem. Se for pequena, como a aberta por Serra em São Paulo nas últimas eleições, pode terá um impacto pequeno na disputa nacional.

A segunda é a presença de um candidato com domicílio eleitoral na Região Nordeste. Depois do fenômeno Collor, apenas dois candidatos radicados em um dos Estados da região disputaram um pleito presidencial: Ciro Gomes (1998 e 2002) e Heloísa Helena (2006). O primeiro venceu no Ceará nas duas disputas, mas não conseguiu fazer o seu prestígio "transbordar" para outros Estados nordestinos. Heloísa Helena teve votação mediana (13%) em Alagoas, mas muito reduzida nos outros Estados.

A candidatura de Eduardo Campos sairá de patamar superior aos seus antecessores na região. Governador por dois mandatos de um Estado importante sai do governo com alta avaliação positiva. Por esta razão, existe grande probabilidade que vença em Pernambuco. O mais difícil é estimar até que ponto ele conseguirá crescer em outros Estados nordestinos. Creio que esta é uma condição necessária para ele se tornar um candidato competitivo em âmbito nacional.

A terceira novidade é que pela primeira vez o candidato à Presidência apresentado pelo PSDB não é de São Paulo, o maior reduto eleitoral do partido. O PSDB governa o Estado desde 1994 e somente em uma eleição, a de 2002, seu candidato foi derrotado pelo PT na disputa para presidente. A dúvida é até que ponto os tradicionais eleitores paulistas que votaram nos quatro nomes que concorrem pelo partido para presidente e governador (Covas, Fernando Henrique Alckmin e Serra) estariam dispostos a votar em um candidato mineiro. Dito de outra forma: os eleitores do partido são tucanos, ou tucanos paulistas? Como vimos, sem obter uma boa vantagem em São Paulo dificilmente o partido conseguirá compensar as prováveis derrotas em outros Estados.

Neste artigo, fiz um breve exercício considerando apenas os efeitos dos redutos estaduais, em uma disputa em que oposição contará com dois importantes líderes estaduais. Obviamente, estes estão longe de ser os fatores determinantes para o voto em 2014. Para todos os outros - o Estado da economia no segundo semestre, os efeitos das manifestações, as montagens dos palanques estaduais, a rejeição crescente aos partidos, a votação do PSOL - sequer saberia por onde começar a fazer uma estimativa.

Jairo Nicolau é professor titular do departamento de ciência política da UFRJ

Fonte: Valor Econômico

José Nêumanne* : Que tal tirar a máscara de quem quer ficar impune?

Não havia brasileiro razoavelmente informado que já não soubesse que os black blocs sempre fizeram o possível e mais do que o razoável para que os policiais encarregados de reprimir seu vandalismo nas ruas das cidades brasileiras produzissem um mártir. Em 25 de janeiro, Fabrício Proteus Fonseca Mendonça Chaves, de 22 anos, foi baleado num protesto em São Paulo contra os gastos da Copa do Mundo. Poderia ter sido este, mas, socorrido pelos PMs e levado para a Santa Casa de Misericórdia, felizmente ele sobreviveu. Infelizmente, contudo, o cinegrafista da Band Santiago Andrade, de 49 anos, não teve idêntica sorte e morreu em consequência de ferimentos na cabeça, vítima da explosão de um rojão disparado no centro do Rio num protesto violento contra o reajuste da tarifa de transportes públicos. Eis o mártir!

Mas o cinegrafista, que trabalhava na cobertura da manifestação quando foi atingido, não foi vitimado pela violência policial, contra a qual dez entre dez políticos, militantes de direitos humanos, governantes politicamente corretos, acadêmicos bem-pensantes e repórteres apressados esbravejam. O buscapé disparado da calçada a poucos metros de onde a vítima estava foi criminosamente preparado por vândalos cujas feições estavam escondidas por máscaras e panos com os quais encobriam o rosto. O disparo podia não ter como objetivo especificamente aquele profissional. É até possível acreditar que seu alvo seria a tropa policial que procurava conter o quebra-quebra. Mas um repórter, fotógrafo ou cameraman presente na cena para transmitir informações ao público ou um inocente transeunte do anônimo exército das vítimas das balas perdidas na violência metropolitana brasileira fatalmente seria atingido. Pois a vareta que direciona o rojão para explodi-lo nas alturas foi quebrada e quem já soltou fogos de artifício sabe que nessas condições o buscapé não sobe, faz um trajeto aleatório e atinge o que estiver à frente. Assim, feriu a cabeça do jornalista a trabalho.

Naquela quinta-feira ninguém imaginou ser possível inculpar os black blocs pelo crime hediondo. Os telejornais da Rede Globo na noite do crime e na manhã seguinte reproduziram reportagem de Bernardo Menezes, da Globo News, atribuindo aos policiais o disparo do explosivo. Quem pôs o equívoco no ar não atinou para o fato de que a fogueira ateada na cabeça do colega jamais poderia ter sido produzida por bombas de efeito moral ou granadas de gás lacrimogêneo. Faltou um átimo de sensatez para evitar a divulgação do engano. O hábito de denunciar a violência policial levou o erro ao ar. Errar é humano, está certo, mas o jornalismo responsável requer mais diligência.

Depois que a polícia demonstrou o óbvio, William Bonner, o editor-chefe do Jornal Nacional, gaguejou um pedido de desculpas envergonhado e aproveitou para elogiar a humildade de voltar atrás ao reconhecer o erro. O reconhecimento do engano é uma virtude, mas é preciso que a autocrítica tenha relevo similar ao dado à falsidade divulgada.

E mais: é necessário também transmitir a convicção de que equívocos similares serão evitados. Não só pela emissora que engoliu uma "barriga" mastodôntica e cuspiu um mosquito. Mas também por todos os envolvidos na organização das manifestações populares, seja contra o que for; na manutenção da ordem pública nas ruas durante os protestos; na defesa jurídica dos manifestantes; e na cobertura e transmissão dos fatos para conhecimento da sociedade. Todos somos responsáveis. E todos devemos ter noção das evidências de que o cinegrafista foi vitimado pela leviandade geral vigente.

O mesmo Jornal Nacional reproduziu uma enxurrada de manifestações de súbita condenação aos vândalos. Entidades que representam advogados, juízes, donos de meios de comunicação, jornalistas e poderosos da República deixaram de execrar somente a polícia.

"Não é admissível que protestos democráticos sejam desvirtuados por quem não tem respeito pela vida humana", registrou Dilma Rousseff no Twitter - uma platitude de dar dó. É lamentável que do alto do cargo mais importante da República ela se tenha comportado como se fosse apenas a candidata à própria reeleição. Reduzir tal crime a um slogan de campanha, utilizando o velório da vítima como extensão de seu palanque, é absurdo em si. Fazê-lo numa rede social, como numa fofoca de adolescentes, é espantoso. Assim como revolta a justificativa dada pelos vândalos em outra rede social, o Facebook, buscando inculpar a polícia por quatro mortes não noticiadas nem comentadas pelos meios de comunicação, tentando estabelecer uma relação de nexo inexistente e adotando uma contabilidade sinistra e sem sentido. Idêntico afã oportunista levou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a procurar limpar a própria imagem com o sangue da vítima ao propor enquadrar os vândalos por crime de terrorismo.

Quando os políticos que vendem a alma por um punhado de votos descobrirão que os anarquistas que encerram as passeatas ditas pacíficas nas ruas são criminosos comuns que agridem e depredam, devendo ser punidos como tal? E que a eles se acumplicia quem defende o uso de máscaras, porque estas dificultam a identificação deles pela polícia? Os repórteres sempre benevolentes com os mascarados nunca perceberão que lidam com inimigos da verdade? Afinal, isso se comprovou no atentado ao cinegrafista e na agressão a outro que captava imagens em manifestação em defesa do tatuador por cujas mãos passou o rojão e que terminou mentindo descaradamente à polícia ao pedir delação premiada. E advogados menos empenhados em defendê-los do que em aparecer não prestam serviço à lei, mas trabalham pela impunidade de meros quadrilheiros.

Esta não é hora de caçar bruxas. Mas, sim, de tirar a máscara de quem esconde o rosto para delinquir e ficar impune.

*José Nêumanne é jornalista, poeta e escritor.

Fonte: O Estado de S. Paulo