segunda-feira, 23 de abril de 2018

Cadastro positivo é vital para reduzir os juros bancários: Editorial | Valor Econômico

Por incompreensão de alguns parlamentares ou por interesses eleitorais, a votação na Câmara dos Deputados do projeto de lei que aperfeiçoa o cadastro positivo do sistema financeiro foi adiada para essa semana e corre o risco de não sair. A proposta é fundamental para ampliar a concorrência no mercado de crédito e estimular a queda dos juros cobrados pelos bancos.

Tradicionalmente, o Brasil teve cadastros negativos de crédito, uma lista que relaciona os maus pagadores, aos quais bancos e comerciantes costumam negar crédito. O cadastro positivo tem objetivos mais amplos: identificar os bons clientes, aqueles que têm histórico de adimplemento, para oferecer mais crédito e juros mais baixos.

O cadastro positivo em vigor foi uma proposta tardia da agenda microeconômica do segundo mandato de FHC e do primeiro de Lula. Medidas como os empréstimos com consignação em folha de pagamento e a alienação fiduciária nos financiamentos de automóveis ajudaram a duplicar o crédito como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) desde então.

Mas o chamado "bancos de dados com informações de adimplemento", criado pela Lei nº 12.414, de 2011, não surtiu os efeitos desejados. Alcançou apenas 5 milhões dos cerca de 100 milhões de brasileiros que poderia abarcar. O principal problema é que, no sistema atual, os gestores dos cadastros têm que obter autorização de cada um dos clientes para inclui-los no banco de dados. O projeto em tramitação na Câmara dos Deputados corrige essa deficiência. Todos aptos para tomar crédito seriam automaticamente incluídos.

O presidente da Camara dos Deputados, Rodrigo Maia (PFL-RJ), havia pautado a votação do projeto do cadastro positivo para a semana passada, mas acabou desistindo ante a resistências de alguns parlamentares e o baixo quorum. Deputados têm feito as mais diversas alegações contra a proposta. Uma das mais recorrentes é que ela fere o direito do consumidor de escolher se quer fazer parte ou não do banco de dados. Outras dizem respeito à segurança do cadastro e eventual manipulação indevida de dados ou quebra de sigilo das informações.

O projeto, porém, permite que as pessoas e empresas que não querem fazer parte do cadastro positivo comuniquem essa opção. Isso assegura o direito de escolha do consumidor. As questões sobre segurança, por outro lado, não se aplicam apenas ao cadastro positivo, mas a todos os bancos de dados de serviços de proteção ao crédito. Deve-se assegurar, de forma geral, que todos sejam protegidos e coibir o uso indevidos das informações. É importante assinalar, porém, que as informações são armazenadas pelos cadastros apenas para fins de cálculo dos ratings das empresas e consumidores - e que apenas essa última informação é repassada aos bancos para aprovação do crédito.

Ultimamente, alguns parlamentares passaram a alegar que o cadastro positivo não vai trazer ganhos aos consumidores em termos de queda nas taxas de juros. Traçam um paralelo com a liberação da cobrança de serviços pelas companhias aéreas, como bagagens. A experiência brasileira, entretanto, mostra que os juros caem quando os bancos têm garantias adequadas e outros instrumentos para mitigar os riscos de inadimplência. Em fevereiro, os juros médios do crédito pessoal foram de 26,3% ao ano nas operações consignadas em folha, bem abaixo dos 125,7% ao ano cobrados nos empréstimos sem consignação.

Em entrevista ao Valor na semana passada (17/04, página C3), o secretário de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência do Ministério da Fazenda, João Manoel Pinho de Mello, argumentou que o cadastro positivo poderá derrubar uma importante barreira de entrada a novos competidores. Entre elas, as empresas que utilizam novas tecnologias para oferecer serviços financeiros (as chamadas "fintechs"). O banco de dados vai baratear o acesso a informações e reduzir o custo de novos entrantes no mercado.

Hoje, quem reina na falta de informações são os grandes bancos, que conseguem identificar os bons pagadores nas suas gigantescas bases de clientes e têm poder de mercado para impor margens maiores para cobrir os riscos. Quem é contra o cadastro positivo, portanto, é a favor do "status quo" com baixa competição no sistema.

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