quinta-feira, 22 de março de 2018

Luiz Carlos Azedo: Supremo vexame

- Correio Braziliense

O caso Lula está gerando muita tensão no STF, cuja sessão de ontem foi suspensa por causa de um bate-boca entre os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso

Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Cármen Lúcia marcou para hoje o julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de fortes pressões de seus pares para colocar a matéria em votação. Estão em jogo não apenas a iminente prisão de Lula, condenado a 12 anos e 1 mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), mas também a jurisprudência da Corte que determina a execução imediata da pena para condenados em segunda instância de toda ordem, do político corrupto ao estuprador. Como o julgamento do embargo de declaração da condenação da defesa de Lula pelos desembargadores federais de Porto Alegre foi marcado para segunda-feira, a ministra Cármem Lúcia decidiu pautar o habeas corpus.

O caso Lula está gerando muita tensão na Corte, cuja sessão de ontem foi suspensa por causa de um bate-boca entre os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Os dois ministros já andavam se estranhando. Gilmar Mendes criticava decisões intempestivas do Supremo, sobretudo a proibição de doações eleitorais de empresas, quando fez referência à decisão da Primeira Turma de 2016 que revogou a prisão preventiva de cinco médicos e funcionários de uma clínica de aborto. O voto de Barroso orientou a decisão. Gilmar aproveitou para insinuar que o colega havia manobrado para pôr em votação a questão do aborto: “Ah, agora, eu vou dar uma de esperto e vou conseguir a decisão do aborto, de preferência na turma com três ministros. E aí a gente faz um 2 a 1”, disse o ministro.

Barroso levou o comentário para o lado pessoal. Reagiu duramente: “Me deixa de fora desse seu mal sentimento, você é uma pessoa horrível, uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia. Isso não tem nada a ver com o que está sendo julgado. É um absurdo vossa excelência vir aqui fazer um comício cheio de ofensas, grosserias. Vossa excelência não consegue articular um argumento, fica procurando, já ofendeu a presidente, já ofendeu o ministro Fux, agora chegou a mim. A vida para vossa excelência é ofender as pessoas, não tem nenhuma ideia, nenhuma, nenhuma, só ofende as pessoas”, disse.

Diante do confronto, Cármen Lúcia suspendeu a sessão. Mesmo assim, Gilmar retrucou: “Presidente, eu estou com a palavra e continuo, presidente. Continuo com a palavra, presidente, eu continuo com a palavra. Presidente, eu vou recomendar ao ministro Barroso que feche seu escritório, feche seu escritório de advocacia”. A sessão acabou aí. Foi o maior vexame. Gilmar e Barroso estão em polos opostos na questão do habeas corpus de Lula. O primeiro era a favor da execução da pena após condenação em segunda instância, mas mudou de entendimento. Com isso, a possibilidade de a jurisprudência ser alterada no julgamento de hoje parece predominante, uma questão a conferir logo mais.

Sob pressão
O Supremo está sob forte pressão dos políticos enrolados na Lava-Jato, não somente Lula. Os demais envolvidos não querem que o petista seja preso, temem que isso ocorra com eles também. Há mais de 400 políticos com foro privilegiado denunciados no Supremo, aguardando julgamento. Os políticos que estão sem mandato, porém, estão sendo julgados e condenados, alguns já estão cumprindo pena na cadeia. Com a proximidade das eleições, o risco de não serem reeleitos assombra os políticos e acirra as contradições no Supremo. Gera também uma cadeia de solidariedade em relação ao ex-presidente Lula.

O presidente Michel Temer também pressiona os ministros diretamente envolvidos nos processos nos quais está sendo investigado, principalmente o relator da Lava-Jato, Edson Fachin, de quem cobra acesso às investigações. Suas pressões se dão por meio dos advogados, nos termos do devido processo legal, mas também ocorrem nas articulações de bastidores do tribunal. A discussão de ontem começou por causa da atual legislação de financiamento de campanha, uma vitória inequívoca de Barroso no Supremo. Voto vencido no caso, Gilmar criticou duramente o fim das contribuições de empresas para candidatos com o argumento de que a nova legislação terá efeito contrário e estimula o uso de caixa dois.

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