sábado, 15 de abril de 2017

Opinião do dia - Sérgio Bruno Cabral Fernandes

"São 300 milhões que foram gastos sei lá com o quê, seja com campanha, com santinho, com tempo de televisão, com marqueteiro, que podia ter sido (gasto) construindo escola, hospital e todo esse Brasil que o senhor sonha e quer viver. Esse dinheiro poderia estar lá. Então vamos agora deixar de historinha, de conto de fada, e falar as coisas como elas são. Está na hora de a gente dizer a verdade, de como a coisa suja é feita. Não é possível que um ministro da Fazenda fique pedindo todo mês (dinheiro) a um empresário. Isso não é admissível. Por mais que a gente esteja acostumado com isso, isso não é o correto e o senhor sabe disso."

*Sérgio Bruno Cabral Fernandes é promotor da PGR falando na delação premiada de Emílio Odebrecht.

Planalto monta plano para apressar reformas

Para governo, inquéritos contra ministros só terão desfecho em 2018

Temer fará reunião amanhã, e estratégia é aprovar regime de urgência para votar mudanças na legislação trabalhista e no projeto de socorro a estados, além de acelerar a discussão sobre a Previdência

O presidente Temer decidiu apressar o andamento das reformas para reagir à crise das delações da Odebrecht. A estratégia é aprovar no Congresso, na terça-feira, regime de urgência para o projeto que altera as leis trabalhistas e para o de socorro aos estados em dificuldades financeiras. No mesmo dia, o relatório sobre a reforma da Previdência deve ser apresentado. Na avaliação do governo, os inquéritos contra ministros no STF não devem ter qualquer conclusão este ano.

Governo decide pedir urgência em reformas para reagir à crise

Foco deve ser nas mudanças das regras trabalhistas e da Previdência

Júnia Gama | O Globo

Os maiores esforços do governo se voltarão para acelerar a votação das reformas no Congresso. Em reunião nos últimos dias, o presidente Michel Temer combinou com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), que eles tentarão aprovar na próxima terça um regime de urgência para tramitação da reforma trabalhista e o projeto que institui um Regime de Recuperação Fiscal para os estados.

Avalanche no Supremo

Ministros avaliam que tribunal não tem estrutura para lidar com inquéritos da Odebrecht

Carolina Brígido | O Globo

BRASÍLIA - Depois do impacto inicial provocado pela abertura de 76 novos inquéritos na Lava-Jato, de conteúdo tão volumoso quanto explosivo, quatro ministros do Supremo Tribunal Federal ouvidos pelo GLOBO avaliam que a corte não tem estrutura para lidar com a enxurrada de processos criminais que se seguirão.

Para dois desses ministros, existe um risco real de prescrição de boa parte dos casos — o que poderia significar o arquivamento de processos antes mesmo de serem julgados.

As regras de prescrição estão expressas no Código Penal. Por exemplo: quem responde a inquérito apenas por caixa dois, cuja pena é de até cinco anos de prisão, pode ser beneficiado pela prescrição 12 anos depois do fato. Esse prazo é reduzido à metade se o investigado tem mais de 70 anos.

No STJ, os processos ainda nem começaram

Pedidos contra governadores foram enviados na terça-feira e ainda não foram lidos

Carolina Brígido | O Globo

BRASÍLIA - Enquanto a delação da Odebrecht já foi transformada em 76 inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), o ritmo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) está em compasso mais lento. Como o relator da Lava-Jato no STF, ministro Edson Fachin, só autorizou o encaminhamento dos pedidos de abertura de inquérito contra governadores ao STJ na terça-feira, véspera de feriado no Judiciário, os documentos ainda não chegaram lá. O relator da Lava-Jato no STJ, ministro Luiz Felipe Salomão, está participando de um seminário em Portugal e só deve examinar o material na próxima semana.

Quando se debruçar sobre os pedidos, Salomão deve decidir se abre ou não os inquéritos contra nove governadores, como pediu o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Estão no grupo os governadores Luiz Fernando Pezão, do Rio de Janeiro; Geraldo Alckmin, de São Paulo; Paulo Hartung, do Espírito Santo; Fernando Pimentel, de Minas Gerais; Beto Richa, do Paraná; Flávio Dino, do Maranhão; Marconi Perillo, de Goiás; Raimundo Colombo, de Santa Catarina; e Marcelo Miranda, do Tocantins.

Odebrecht: Dilma foi avisada sobre propina

Empreiteiro afirma que a ex-presidente sabia de pagamentos a PT e PMDB por contratos da Petrobras

Amanda Almeida, com informações do Jornal Nacional | O Globo

Marcelo Odebrecht, dono da empresa, disse que contou à então presidente Dilma que pagara propina a PMDB e PT por contrato na Petrobras. Dilma sempre negou que soubesse. Ex-presidente do Grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht afirmou, em delação premiada, que avisou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e a ex-presidente da Petrobras Graça Foster sobre pagamentos de propina a políticos do PT e do PMDB por contratos firmados com a empresa.

O delator narrou um encontro com Graça Foster em que contou que a empresa pagou propina relacionada a um contrato de prestação de serviços ambientais em dez países, no valor de US$ 840 milhões. A negociação teria acontecido em 2010 com a diretoria internacional da Petrobras, e o acerto, concretizado, segundo Marcelo, entre o ex-diretor da empresa Márcio Faria e os então deputados peemedebistas Eduardo Cunha (RJ) e Henrique Eduardo Alves (RN).

Delator da Odebrecht diz ter pago mesada a presidente do Instituto Lula

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O ex-executivo da Odebrecht Alexandrino Alencar afirmou em depoimento ao Ministério Público Federal que pagou, durante "cinco ou seis meses", mesada de R$ 10 mil ao presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto.

Os pagamentos são objeto de um capítulo específico da colaboração de Alencar, que era um dos dirigentes do grupo mais próximos do ex-presidente e da instituição que leva o nome do petista.

Alencar diz ser um dos responsáveis, por exemplo, por ter formulado - ao lado de Okamotto - o modelo das palestras que Luiz Inácio Lula da Silva passou a oferecer depois de deixar o Planalto.

Segundo seu relato, a relação entre ele e Okamotto se estreitou ao final do mandato de Lula. A proximidade fez com ele percebesse que Okamotto "estava com alguma dificuldade financeira".

"Me propus a ajudá-lo durante um período finito, com recursos, e durante cinco ou seis meses, alguma coisa assim, eu dei para ele R$ 10 mil por mês, em espécie."

Nas planilhas, Okamotto tinha o codinome "Tóquio".

Odebrecht doou para Marina após encontro em hotel

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Um hotel perto do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, foi o local do primeiro encontro em 2014 entre Marina Silva (Rede), então presidenciável pelo PSB, e Marcelo Odebrecht, herdeiro e ex-presidente da empreiteira.

Quem relata o encontro é Alexandrino Alencar, ex-diretor de relações institucionais da empreiteira. O depoimento integra a delação do executivo à Lava Jato, divulgado na quarta-feira (12).

"A partir daí, houve uma conversa de Marcelo com ela, onde foram colocados posicionamento e valores -valores culturais, não monetários-, e estratégias", diz.

Alencar contou que, após as conversas, a empreiteira acertou doação de R$ 1,25 milhão à campanha, em recursos declarados à Justiça. "Não teve compromisso [com alguma contrapartida]. Nem Marcelo, nem eu [falamos disso]. Foi muito mais uma conversa de aproximação."

Ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht, Alexandrino era responsável por acertar doações a políticos e a campanhas eleitorais.

Ele conta que, antes de 2010, a empresa "minimizava" os depósitos declarados para não chamar a atenção para o nome do grupo. Mas também relatou que o fato de a empresa passar a depositar às legendas em doações contabilizadas não acabou com a existência do caixa dois.

Em 2014, o executivo teve "atuação bem específica nas doações para as candidaturas da Presidência da República das duas candidatas", Marina Silva e Dilma Rousseff (PT). Marina não é investigada na Lava Jato. Dilma é alvo de inquérito em primeira instância.

Brasil poderá julgar crimes que Odebrecht praticou no exterior

Em determinações sob sigilo, ministro Fachin pede que PGR se manifeste sobre possibilidade; delatores admitiram operações ilícitas da empreiteira em 9 países

Breno Pires | O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A parte sigilosa da lista de Fachin inclui nove determinações ao Ministério Público Federal para que a Procuradoria-Geral da República se manifeste sobre a possibilidade de crimes cometidos no exterior pelo Grupo Odebrecht envolvendo agentes públicos ou privados estrangeiros sejam julgados no Brasil.

Executivos e ex-executivos da empreiteira admitiram que operações da empreiteira em nove países – Argentina, Venezuela, Equador, México, El Salvador, Colômbia, Peru, República Dominicana e Angola – continham práticas ilícitas.

Os valores descritos nas decisões do relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, somam US$ 65,68 milhões – apenas uma fração do total que o grupo já admitiu ter pago em propinas internacionalmente.

Eleição na França tem 4 nomes para 2º turno

Apenas três pontos percentuais separam os líderes Marine Le Pen e Emmanuel Macron de Jean-Luc Mélenchon e François Fillon de acordo com pesquisa Ipsos-Sopra Sterna

Reuters | O Estado de S.Paulo

PARIS - A corrida presidencial da França pareceu ficar mais acirrada nesta sexta-feira, 14, nove dias antes do início da votação, depois que uma pesquisa de opinião mostrou os quatro principais candidatos com chances de chegar ao segundo turno, disputado pelos dois mais votados.

A sondagem Ipsos-Sopra Sterna feita para o jornal Le Monde colocou Emmanuel Macron, de centro, e Marine Le Pen, líder da extrema direita, empatados com 22% cada no primeiro turno de 23 de abril, seguidos pelo candidato de extrema esquerda Jean-Luc Mélenchon e o conservador François Fillon, com 20% e 19%, respectivamente. A distância de 3 pontos percentuais entre os quatro está dentro da margem de erro, o que insinua uma disputa bastante indefinida.

O baixo clero | Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

Todos os políticos são iguais. Será? Evidentemente que não. Os mais novos, porém, ainda estão engatinhando na grande política

Como diria Ulysses Guimarães, em uma de suas tiradas famosas, não existe bobo no Congresso. Por isso mesmo, não é o caso de se pôr a mão no fogo por ninguém, até porque as investigações estão apenas começando nos estados. Mas, fato é que somente 42 deputados estão relacionados na lista do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, o relator da Operação Lava-Jato, de um total de 513 representantes — 471 ficaram de fora. No Senado, embora a proporção de enrolados seja maior, são 29 senadores citados de um total de 81, isto é, 52 senadores não estão investigados na Lava-Jato.

Depois da Crise | Cristovam Buarque

- O Globo

É possível esperar que as empresas pós-crise serão mais eficientes, e o eleitor, mais cuidadoso

As crises demonstram o esgotamento dos estilos de governo e de seus projetos de desenvolvimento que enfrentam a resistência de grupos beneficiados pelo velho modelo, sem aceitar as reformas necessárias. A reação dos latifundiários contra a reforma agrária levou à explosão urbana e manteve a pobreza no campo. Nossa crise atual é o resultado do esgotamento dos recursos fiscais, usados sem restrições para atender às reivindicações de cada grupo social no curto prazo; e sem respeito às regras da boa gestão, nem aos interesses da Nação no longo prazo, sem adaptar a economia ao avanço das técnicas produtivas.

Como era previsível, acabou a possibilidade de considerar os recursos públicos ilimitados e o costume de evitar que os anseios e reivindicações de cada grupo social organizado fosse atendido. O esgotamento de recursos públicos e do protecionismo ao velho modelo levam à crise e seus sofrimentos, mas oferecem otimismo para o que poderá ocorrer de positivo quando a crise passar.

A saída é política | João Domingos

- O Estado de S. Paulo

Marcelo Odebrecht poderia invocar Luís XIV e dizer: ‘O Estado fui eu’

Os poderes da República, os políticos, os empresários e a sociedade, enfim, o Brasil inteiro, não têm outra alternativa nesse momento a não ser levantar a cabeça e buscar uma saída política para a crise. Crise que vem se arrastando por tanto tempo que é até difícil imaginar o País sem uma, agora agravada pelas delações da Odebrecht.

A saída é política porque é a única dentro do estado democrático de direito. Qualquer outra que se pense será autoritária, uma ameaça às conquistas democráticas que, em menos de 30 anos, possibilitaram a realização de uma Assembleia Constituinte, eleições diretas em todos os níveis, alternância de poder e o impeachment de dois presidentes, com assunção do vice, exatamente como manda a Constituição.

A banalização da corrupção | Merval Pereira

- O Globo

Tão nauseabunda quanto a tentativa patética dos seguidores do PT de naturalizar a escandalosa relação do ex-presidente Lula e dos seus principais assessores com a empreiteira Odebrecht, aí incluída a ex-presidente Dilma, é a maneira quase debochada como o patriarca do grupo, Emílio Odebrecht, surge nos vídeos, contando, com um permanente sorriso, suas peripécias nos bastidores dos governos petistas, peemedebistas, tucanos.

Misturando alhos com bugalhos, Emílio diz que sempre agiu assim, como se a corrupção que dominava as relações empresariais no país não tivesse mudado de patamar nos anos petistas. Da mesma maneira, a maioria dos executivos da maior empreiteira do país aparecem nos vídeos com uma postura acafajestada de quem se acostumou a chafurdar na lama.

Democracia direta? | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

Há alguns dias, meu colega Vladimir Safatle propôs em sua coluna acabar com o "representativo" de nossa democracia representativa e abraçar uma "democracia real", na qual a população, reunida numa espécie de ágora virtual, decidiria diretamente as questões de seu interesse.

Não sou contra ampliar as ocasiões em que os eleitores se convertam em legisladores por meio de referendos e plebiscitos, mas reservo-me o direito de ser cético em relação às chances de uma democracia direta.

O maior problema, me parece, é que as pessoas não a querem. Como sempre brinco, se democracia direta fosse bom, reuniões de condomínio seriam um sucesso. Não são.

Sai Lula. Entra Luiz Inácio Odebrecht da Silva | Ricardo Noblat

- O Globo

A Suderj informa: substituição no time do PT. Sai Lula, o retirante nordestino que sobreviveu à seca e à miséria, também conhecido como “O Pai dos Pobres”, o “Messias do rio São Francisco” ou simplesmente “O Cara”, assim batizado no melhor de sua forma física pelo ex-presidente americano Barack Obama.

Entra Luiz Inácio Odebrecht da Silva, o garoto descoberto nas greves da região do ABC paulista nos anos 80 do século passado pela maior empreiteira da América Latina, próspero negociante de sua própria fama, e que ao aderir ao chamado mundo da bola preferiu se apresentar sob a alcunha de “Metamorfose Ambulante”.

Ao fazê-lo, forneceu todas as pistas para que afinal fosse decifrado, mas isso estava muito acima da capacidade de compreensão dos seus contemporâneos. Lula, de há muito, deixara de ser apenas um nome. Fora promovido à condição de sobrenome para proteger sua numerosa família que passou a se beneficiar do seu sucesso pessoal.

Confiança quebrada arruína | Suely Caldas

- O Estado de S. Paulo

Uma das mais devastadoras revelações saídas das delações da Odebrecht foi o Brasil e o mundo conhecerem que, em nosso país, o ministro responsável por ações e decisões que dão rumo à economia, aos negócios e têm efeito direto sobre a vida das pessoas pode ser o mesmo que opera o balcão da corrupção, o que troca a sanção de uma lei por propina para financiar campanhas eleitorais – tão milionárias quanto vergonhosas diante da situação de pobreza dos eleitores.

Feitos ministros da Fazenda pelos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff ao longo de 11 anos, Antonio Palocci e Guido Mantega alternavam seu tempo: ora tomavam decisões que poderiam (ou não) atrair investimentos ao País, promover crescimento e gerar empregos, ora distribuíam a propina da Odebrecht, ora recebiam empresários em seus gabinetes para garantir aprovação de leis que favoreciam a empresa do visitante e ferravam com o dinheiro público aplicado em programas sociais, saúde e educação.

Os perigos da vida | Miriam Leitão

- O Globo

Vão se passar muitos anos antes que tudo isso chegue ao fim. Nesse meio tempo, serão feitas separações entre graus diferentes de culpas dos políticos brasileiros. Há os que venderam a função pública, trocaram o financiamento eleitoral por vantagens em contratos públicos ou sobre-preço em obras. E merecem condenação. Há os que, além disso, enriqueceram. E isso será imperdoável.

Nem todos os políticos têm o mesmo grau de culpa, mas só a Justiça saberá fazer a separação. Muitos nomes que apareceram na lista terão seus inquéritos arquivados, outros serão julgados e condenados. Há os que serão punidos por crime eleitoral, e outros fizeram muito pior.

A primeira dúvida é sobre o tempo necessário para essa separação. O mensalão tinha 30 réus e exigiu seis anos do Supremo para se chegar ao julgamento. Nessa avalanche de pedidos de inquérito, quanto tempo o STF levará? Os nomes na lista Janot-Fachin ainda não são réus, mas a partir de agora começará uma complexa investigação.

Carimbador da Previdência | Julianna Sofia

- Folha de S. Paulo

Com o horizonte toldado pela lista de Fachin e pelos vídeos da delação da Odebrecht, a equipe econômica aposta que as reformas dificilmente avancem no Congresso nas próximas duas, três semanas. No Palácio do Planalto, apesar da ladainha ensaiada de acelerar o passo, articula-se suspender o recesso parlamentar e levar as votações julho adentro.

Ditada pelo mercado e pelo empresariado, a pressa do governo em ver a reforma da Previdência promulgada pressupõe o atropelo de etapas. Para evitar que o texto a ser aprovado pela Câmara seja depois modificado, exigindo que a proposta de emenda constitucional retorne para apreciação dos deputados, a ideia é negociar já as mudanças com um grupo de senadores. Assim, caberá ao Senado apenas o papel de carimbador da nova Previdência.

Cadê a economia? | Adriana Fernandes

- O Estado de S. Paulo

Se não é para resolver o problema, a reforma pode virar um remendo malfeito

No vale-tudo para aprovar a reforma da Previdência até a metade do ano, o governo já aceitou mudanças significativas na chamada espinha dorsal do texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) enviada ao Congresso.

Como já se esperava desde que o Placar da Previdência do Estadão mostrou votos suficientes para a derrota do governo no plenário da Câmara, as flexibilizações da reforma não vão se restringir aos cinco pontos que o presidente Michel Temer acordou com o relator Arthur Oliveira Maia (PPS-BA).

As resistências dos parlamentares da base aliada são tantas que o relator, a cada dia, chega para as reuniões no Palácio do Planalto com novas ideias de mudanças no texto original. A última delas foi a apresentação de um novo modelo de regra de cálculo do benefício, ponto que vinha se mantendo preservado.

Regenerar a democracia | Ana Maria Machado

- O Globo

O sistema político-eleitoral em que vivemos não está atendendo às exigências democráticas e precisa ser regenerado

Vivemos uma crise na democracia representativa: os eleitores não se sentem representados pelos eleitos. A revelação da profundidade e extensão das manobras corruptas, em sua maioria ligadas ao financiamento das campanhas eleitorais, leva a concluir que a soma de mentira e roubalheira tem servido para desvirtuar completamente o ideal de governo do povo, pelo povo e para o povo. Além disso, não conseguimos mais ouvir o outro. Pessoas que deviam estar acima de qualquer suspeita, por seu histórico comprometimento democrático, de Chico Buarque a Fernando Henrique, têm sido desqualificadas apenas por divergências de opinião.

“Acordão” e teimosia comprometem reconstrução democrática da política | Marco Aurélio Nogueira

- O Estado de S. Paulo

Três perigos rondam a reconstrução da República democrática no Brasil.

Um é o “acordão” que tanta gente saúda e alguns tentam viabilizar: um freio de arrumação, pelas costas da população, de modo a parar o carro da Lava Jato e a permitir que os grandes partidos (PT, PDMD e PSDB) consigam respirar. Seria como dizer que tudo não passou de um pesadelo, que a rotina continua na manhã seguinte, malemolente como sempre. De quebra, para não dar o braço a torcer, adotam-se algumas medidas cosméticas (cláusula de barreira e fim das coligações proporcionais, por exemplo), mas suspendem-se os constrangimentos sobre os políticos. Tudo, a rigor, fica mais ou menos como está.

Passa-se um pano na trambicagem generalizada, perfuma-se o ambiente e toca-se em frente.Vida que segue.

Sonhos de consumo dos defensores deste “acordão” são a anistia ao caixa dois, um novo modelo para o financiamento de campanha eleitoral e o relaxamento de prisões preventivas, com as devidas providências para que se maniete Sergio Moro.

O mantra começa a ser repetido em bom som: é preciso “serenar os ânimos”, “aceitar o outro”, “separar o joio do trigo”, “colocar um limite nos abusos” e “salvar a política”. Expressões que conseguem muitos consensos entre a classe política, o governo Temer e os grandes partidos. Só faltaria comunicar o esquema para o povo, que, como marido traído, será o último a saber. Para desmanchar a lua de mel entre a população (ou parte expressiva dela) e Moro, o mantra inclui, em lugar de destaque, a ideia de que é preciso impedir que os juízes assumam o controle político do país e “exterminem” os políticos corruptos, pois isso seria ainda pior. Ideia que não tem maior evidência empírica, mas cuja lógica serve para turbinar os políticos, enchê-los de brios e aplacar seus receios mais fantasmagóricos.

Pedagogia e Reforma Previdenciária | Murillo Aragão

- IstoÉ

Faz parte do jogo democrático respeitar o fato de que somos uma federação e que existem responsabilidades que não são apenas do governo federal

Na lenta trajetória rumo à democracia, o Brasil sempre gostou de um Estado forte e intervencionista, seja à esquerda ou à direita do espectro político. Sempre aceitou o centralismo em detrimento do federalismo. Sempre gostou de um emprego público e de uma verba igualmente pública. Desejou presidentes fortes e voluntariosos que pudessem, tal qual Dom Sebastião, resgatar o futuro brilhante que até hoje nunca chegou. Deu no que deu: temos um Estado inchado, caro e ineficiente.

No entanto, as regras firmadas pelos constituintes impõem alguns limites ao voluntarismo desejado.

Mortos e feridos – Editorial | Folha de S. Paulo

Em seu detalhamento e convergência, o conteúdo das delações feitas por executivos da construtora Odebrecht exerce impacto generalizado sobre o mundo político, indo além do que se possa apurar a respeito de cada caso individual.

O sentimento, que embora subjetivo permanece crucial, é que mesmo havendo casos de atribuição infundada de culpa, dificilmente subsiste a tese de que tudo se resume a um conjunto de elaborações imaginárias.

Um dos principais delatores do caso, aliás, abordou de passagem a razão básica pela qual será inglória a tarefa dos políticos que buscam convencer a opinião pública de sua inocência.

Muito à vontade em seu testemunho, o patriarca da mais notória empreiteira do país, Emilio Odebrecht, apontou que, bem ou mal, já se sabia como o sistema funcionava. "O que nós temos não é de cinco, de dez anos. É de 30 anos," disse, omitindo o que terá acontecido durante a era militar.

Eles não se emendam – Editorial | O Estado de S. Paulo

Os partidos políticos estão se mobilizando para sensibilizar a Justiça Eleitoral a aceitar o dinheiro do Fundo Partidário como meio para quitar as multas que lhes foram impostas por mau uso desse mesmo fundo.

Não contentes em malversar os recursos públicos a eles destinados pelo Fundo Partidário, esses partidos agora pretendem driblar sua responsabilidade atribuindo ao contribuinte a obrigação de lhes financiar a multa devida por seu péssimo comportamento.

O argumento para tão espantosa demanda é que os partidos, em resumo, estão sem dinheiro. Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o financiamento eleitoral não poderia mais ser feito por empresas, mas apenas por pessoas físicas, as agremiações partidárias vêm encontrando dificuldades para fechar suas contas. O dinheiro fácil das grandes companhias, que fez a alegria daqueles que transformaram a política em negócio, estava destruindo a essência da democracia – afinal, o cidadão nada podia, com seu voto, diante do imenso poder de persuasão das grandes empresas, especialmente das empreiteiras. Foi contra isso que agiu o Supremo, para impedir que os partidos se transformassem de vez em meras subsidiárias dessas empresas.

O desatino do financiamento público de campanha – Editorial | O Globo

Não faz sentido sacrificar ainda mais o contribuinte, até porque a última eleição mostrou que a proibição das empresas só estimulou o caixa 2

Faltam pouco mais de cinco meses para o Congresso definir e aprovar as normas para as eleições gerais de 2018. O tempo é curto, e parte das alternativas imaginadas até a primeira semana deste mês, consolidadas no relatório da Comissão de Reforma Política da Câmara dos Deputados se tornou obsoleta na terça-feira, quando o Supremo Tribunal Federal divulgou a lista de novos investigados da Operação Lava-Jato.

A edição extra de duas centenas de páginas que o STF mandou imprimir, no mesmo dia, com as decisões sobre os inquéritos, é o melhor retrato de um modelo político-eleitoral falido.

As confissões documentadas da Odebrecht são relevantes para se entender a dinâmica das relações espúrias, subterrâneas, entre agentes públicos e privados. E, também, para se compreender a dimensão do impasse em que se aprisionou o Congresso, que precisa avançar nas regras para as eleições gerais de 2018, como determina a Constituição.

Belo Belo | Manuel Bandeira

Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.

Tenho o fogo de constelações extintas há milênios.
E o risco brevíssimo — que foi? passou — de tantas estrelas cadentes.

A aurora apaga-se,
E eu guardo as mais puras lágrimas da aurora.

O dia vem, e dia adentro
Continuo a possuir o segredo grande da noite.

Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.

Não quero o êxtase nem os tormentos.
Não quero o que a terra só dá com trabalho.

As dádivas dos anjos são inaproveitáveis:
Os anjos não compreendem os homens.

Não quero amar,
Não quero ser amado.
Não quero combater,
Não quero ser soldado.

— Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.

Teresa Cristina & Grupo Semente - Para um amor no Recife