sábado, 28 de outubro de 2017

O tamanho da liberdade: Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

A melhor vacina contra o cinismo é encarar o mundo como um grande laboratório, no qual testamos continuamente nossos semelhantes com o propósito de conhecer melhor a natureza humana e revelar suas incoerências.

Digo isso para justificar o texto de hoje, no qual vou me indispor com a esquerda e com a direita. Há pouco defendi enfaticamente o direito da mãe que levou a filha à performance "La Bête", na qual a garota interagiu com um artista nu, de educar a menina como preferir, sem dar satisfações às patrulhas moralistas. Recebi elogios de leitores de esquerda.

O que eles talvez não tenham percebido é que, ao comprar minha tese, que tem como alicerce a ideia de que existe uma esfera de privacidade que é indevassável, precisariam colocar-se também contra iniciativas caras à esquerda, como o projeto de lei que pretende punir pastores que pregam contra o homossexualismo.

Assim como a mãe é livre para levar a filha para ver nus, clérigos devem ser livres para dizer o que tiverem vontade em seus púlpitos, sem dar satisfações a grupos gays. O controle, em ambos os casos, está no direito que pais moralistas têm de não levar seus filhos a espetáculos que julgam pedófilos e no direito que homossexuais têm de não frequentar cultos cuja marca seja a intolerância.

Discordo do Vladimir Safatle, que escreveu outro dia que a luta contra o preconceito precisa dar-se em todas as esferas. Esse tipo de combate é legítimo e necessário em espaços públicos, mas não pode se expandir para tudo. É claro que uma escola ou uma loja, que são permissionários de serviços públicos, não podem se recusar a atender minorias. Mas não vejo mal algum num clube exclusivo para mulheres, homens, negros, brancos ou seguidores de uma religião. Já a ideia de que o Estado possa de alguma forma enxerir-se na composição social do grupo que convido para jantar em casa me parece ao mesmo tempo ridícula e odiosa.

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