segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Na boleia da dívida pública – Editorial: O Estado de S. Paulo

Caminhão sem freio e dívida pública sem controle são prenúncios de desastre. Por isso, conter a dívida brasileira é uma das prioridades do governo desde a mudança no Palácio do Planalto, no ano passado. Por enquanto, o empenho vai dando resultado, como confirmam os números acumulados no ano, mas o trabalho à frente é longo e complicado. O presidente Michel Temer encerrará seu mandato, no fim do próximo ano, sem ter arrumado completamente o passivo do Tesouro Nacional. Mas, se o esforço der certo, entregará ao sucessor contas públicas em melhor estado e com risco muito menor de uma catástrofe. Isso dependerá tanto do Executivo como da base parlamentar, porque a arrumação das finanças federais, a partir de agora e nos próximos anos, dependerá de importantes medidas legislativas, a começar pela reforma da Previdência.

No mês passado o estoque da dívida pública federal atingiu R$ 3,43 trilhões, com aumento de 0,79% em relação ao valor de agosto. Pelo programa oficial, no fim do ano o valor devido pelo Tesouro deverá ficar na faixa de R$ 3,45 trilhões e R$ 3,65 trilhões.

A expectativa é terminar 2017 com o estoque dentro do intervalo definido no Plano Anual de Financiamento (PAF), disse há dias o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Leandro Secunho. O pessoal da Fazenda tem conquistado alguns pontos importantes. Exemplo: o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) devolveu em setembro R$ 33 bilhões ao Tesouro. Isso é a maior parte da devolução acertada para este ano, de R$ 50 bilhões. Os R$ 17 bilhões restantes devem ser pagos até 15 de novembro.

Os pagamentos do BNDES representam uma pequena parcela do total devido pelo governo central, mas contribuem para a melhora da composição das contas. Uma fatia do valor pago ao Tesouro – R$ 15 bilhões – foi entregue na forma de títulos. O cancelamento desses papéis diminui o estoque da dívida. A parte paga em dinheiro serve para eliminar operações compromissadas do Banco Central (BC).

Durante anos, a partir de 2009, o Tesouro se endividou para ampliar a capacidade de operação do BNDES. Foram emitidos cerca de R$ 500 bilhões em títulos, transferidos ao banco. Esse endividamento sobrecarregou o Tesouro e agravou as condições das contas públicas. Mas o esforço resultou em benefício de um número restrito de empresas, com pouco ou nenhum efeito em termos de crescimento econômico geral. O Produto Interno Bruto (PIB) pouco cresceu nos primeiros anos de mandato da presidente Dilma Rousseff e em 2015 e 2016 o País enfrentou a pior recessão registrada nas contas nacionais.

Outro avanço recente foi a redução do peso dos juros. O custo médio da dívida acumulado em 12 meses caiu de 10,62% em agosto para 10,47% em setembro. Mas, apesar disso, a dívida aumentou e continuará aumentando. Ainda por alguns anos, a receita federal continuará insuficiente para custear o funcionamento do governo, permitir algum investimento e, além disso, cobrir os juros vencidos no ano e, talvez, amortizar o principal.

Enquanto isso, algumas condições se deterioram. A parcela da dívida com vencimento em 12 meses passou de 16,32% em agosto para 17,22% em setembro. De um mês para outro o prazo médio dos títulos diminuiu de 4,37 para 4,34 anos.

A gestão da dívida no dia a dia é parte de um grande esforço de reconstrução das contas. A tentativa de contenção do gasto público é limitada, inevitavelmente, pela rigidez do Orçamento federal. A recuperação da economia, ainda moderada, começou a beneficiar a arrecadação de impostos e contribuições nos últimos dois meses. Receitas atípicas, como as prestações iniciais da nova renegociação de créditos fiscais em atraso, têm ajudado. Mas o governo ainda terá de se esforçar para chegar ao fim do ano com um déficit primário – isto é, sem a conta de juros – no limite de R$ 159 bilhões. Lá por 2022 a dívida poderá estar controlada. Mas isso deverá envolver muito mais que o esforço da atual equipe do Executivo.

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