quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Há um bom espaço para o BC testar o piso dos juros – Editorial | Valor Econômico

No curto prazo, fora surpresas, não há nada que impeça a consolidação do cenário de queda da inflação e, com ele, de redução dos juros básicos. Em uma das atas mais simples e mais explícitas, o Comitê de Política Monetária (Copom) indicou que em sua próxima reunião fará um corte de um ponto percentual da taxa Selic, para 8,25%, desde que as condições do cenário permaneçam como as de hoje. Com isso, abre-se a possibilidade real de que a taxa básica caia abaixo de 8% pela segunda vez em duas décadas, com maiores chances de aí se manter.

O IPCA desabou mais rapidamente do que se previa, de forma que o juro real da economia, mesmo com os sucessivas reduções da Selic, quase não se moveu. As hesitações sobre o ritmo e intensidade de corte por parte do Banco Central foram as mesmas dos analistas do mercado. A princípio, não havia certeza sobre os efeitos que a enorme instabilidade política, acoplada à maior recessão da história republicana, poderiam ter sobre o comportamento dos preços. O BC foi conservador nessa situação, como recomendam os manuais.

A resposta a essa questão veio de forma clara na ata do Copom. A crise política, que abateu o ímpeto das reformas, em especial da Previdência, não provocou oscilações fortes e para cima nem da taxa de câmbio nem do CDI - passado o pico ao redor da delações dos irmãos Batista - e muito menos houve debandada de capitais. Por esse lado, ao contrário do que se temia, o tumulto político não foi inflacionário. Por outro, havia receio de que, com a queda dos índices de confiança impulsionada pelo atoleiro em que se meteu o governo Temer, a economia continuasse mergulhada em recessão, com sérios efeitos deflacionários. Isso também não ocorreu.

Para o Banco Central, a economia está no limiar entre uma recessão que ficou para trás e uma recuperação que mal começou e tende a ser bastante lenta. Os últimos indicadores, como a queda do desemprego, o crescimento da indústria no trimestre, a melhoria do poder de compra dos salários pelo desabamento da inflação, o incipiente e desconfiado aumento da oferta de crédito, sugerem que o crescimento poderá se reforçar na segunda metade do ano, embora isso ainda não seja uma certeza.

A redução da Selic em 5 pontos percentuais no atual ciclo de distensão monetária, é um fator poderoso para reanimar uma economia que ainda convive com taxas de juros reais muito altas. Por outro lado, não há milagres a caminho. Os investimentos não puxarão a recuperação, pois as incertezas políticas turvam o horizonte de curto e médio prazo. Mais do que a duração do governo Temer e ou a de seu substituto constitucional, é a eleição presidencial de 2018 que surge no horizonte como uma incógnita - tudo pode acontecer.

O BC ainda coloca a "incerteza sobre a velocidade do processo de reformas e ajustes na economia (principalmente fiscais e creditícios" como o fator de risco principal. O peso dessa afirmação, porém, parece agora mais suave no conjunto da ata. Afinal, a emenda do teto de gastos está em vigor e está sendo cumprida, ainda que o governo não esteja tendo sucesso em domar o déficit primário devido à reação até agora anêmica das receitas. De qualquer forma, seria difícil caracterizar como expansionista o desempenho fiscal, como era nítido durante o período em que a Selic pousou em 7,25% no primeiro mandato de Dilma Rousseff.

Além do teto, o BC conta com a aprovação de ajuste (fiscal e creditício) de peso, aprovação da Taxa de Longo Prazo, que substituirá a TJLP. Ao aproximar os empréstimos do BNDES do custo real das captações do Tesouro, os subsídios serão muito menos penosos e entrarão no raio de ação indireta da política monetária. Com isso se espera que as decisões do BC tenham uma eficácia maior do que tiveram até o passado recente.

As projeções do mercado mostram que com os cortes efetuados a inflação prevista está bem abaixo da meta (caso de 2017, 3,6%), pouco abaixo da meta (caso de 2018, 4,3%) ou na meta (4,25% em 2019 e 4% em 2020). Os aumentos de PIS-Cofins nos combustíveis (0,45 ponto percentual) e da bandeira de energia (0,15 ponto) sobre o IPCA "não têm implicação relevante para a condução da política monetária", aponta o Copom. Há, portanto, um bom espaço - e a necessidade - para derrubar o juro real, cuja magnitude é incompatível com a debilidade das atividades econômicas.

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