quinta-feira, 3 de agosto de 2017

A real política do presidente | Paulo Celso Pereira

- O Globo

Uma das máximas atribuídas a Antônio Carlos Magalhães era de que na política é necessário saber dar a cada aliado o que ele espera de você: alguns querem dinheiro, outros poder, outros proteção. E é fundamental não confundir as demandas. O resultado da sessão desta quarta-feira coloca o presidente Michel Temer no panteão dos detentores dessa arte da política.

Desde que tornou-se alvo da delação da JBS, revelada pelo GLOBO, Michel Temer usou tudo o que tinha em mãos: distribuiu cargos, abriu os cofres públicos a demandas duvidosas, entregou um mar de emendas parlamentares para as bases políticas de deputados, recebeu no gabinete presidencial todo tipo de deputado, sem qualquer linha de corte.

Quando montou seu quartel-general para tentar se defender do impeachment, Dilma Rousseff já havia se consagrado como uma presidente que tentava exercer um poder imperial sobre o Congresso. Durante todo seu primeiro mandato e o início do segundo, distanciou o quanto pode os parlamentares do gabinete presidencial e restringiu o acesso ao Alvorada, onde residia, apenas aos amigos pessoais. Proibiu deputados e senadores de acompanhá-la no avião presidencial durante as viagens pelos estados e tratava seus pedidos de auxílio, mesmo os legítimos, como se fossem puro fisiologismo.

Temer é o exato oposto. Desde o primeiro dia de seu governo fez questão de dizer publicamente que faria uma gestão parlamentar. Nomeou 12 deputados e dois senadores para seu ministério, recebeu dia e noite todo tipo de parlamentar no Palácio do Planalto ou no Jaburu. Nas viagens que fez, mesmo as internacionais, carregou a tiracolo até os mais folclóricos dos integrantes do baixo-clero.

A conduta ao longo de seus mandatos se mostrou decisiva quando o inverno chegou para ambos. Os métodos de Dilma ao longo do processo de impeachment não foram menos fisiológicos que os de Temer agora. A petista, como o peemedebista, fez tudo o que estava a seu alcance para garantir votos que preservassem seus mandatos. Apenas a título de exemplo, na mesma delação que deu origem ao pedido de investigação contra Temer, o empresário Joesley Batista disse ter sido procurado na véspera da votação do impeachment na Câmara com pedido de R$ 150 milhões para comprar 30 votos pró-Dilma.

A diferença está na sólida relação que havia sido construída antes e na intimidade do núcleo político de Temer — liderado pelo próprio, ao lado dos ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco — com a massa média da Câmara. O resultado desta quarta-feira explica, em boa medida, como Temer conseguiu presidir durante 15 anos o mais complexo partido do Brasil e chegar três vezes à presidência da Câmara.

Há, no entanto, outro fator inolvidável. Não fosse a absoluta falta de mobilização popular, talvez essa diferença de capacidade política tivesse sido insuficiente para Temer se segurar no poder. Se entre 2013 e 2016, tornou-se costumeiro ver no Brasil centenas de milhares de pessoas ocuparem as ruas pelos mais diversos motivos, no início da tarde desta quarta-feira apenas três militantes — sim, três — apareceram na frente do Congresso — e dois deles acabaram abandonando o local, tamanha solidão. Do alto de seus 5% de popularidade, Temer terá agora que reorganizar sua pinguela até as eleições presidenciais - ou até a próxima crise.

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