quarta-feira, 12 de julho de 2017

Tempo das reformas | Míriam Leitão

- O Globo

A aprovação da reforma trabalhista não é uma demonstração de força do presidente Temer. Ele está cada vez mais fraco. Mas o projeto teve votos de quem está se afastando do governo. Durante horas o Senado ficou paralisado pelo protesto das oposicionistas. Toda oposição tem o direito de obstruir sessões, mas não pode fazer isso ocupando fisicamente a mesa diretora do Senado fazendo lá suas refeições.

Para entender melhor a sombria cena de ontem, em que senadoras da oposição, às escuras, protestavam, é preciso lembrar que foi o PT que provocou a escalada do desemprego e que os que se apresentam como defensores dos trabalhadores esquecem os milhões da informalidade.

O economista José Márcio Camargo afirma que a CLT exclui os mais pobres e tem dados que ilustram essa discussão.

— Entre os 20% mais pobres do país, 60% deles trabalham na informalidade e 24% estão desempregados. Então 84% dos pobres estão fora da CLT. Entre os 20% mais ricos, acontece o contrário. Só 3,1% estão desempregados e 16,3% estão na informalidade. Então, 80% deles estão sob a CLT — diz o economista, baseando-se em dados do PNAD 2015.

A oposição defende os trabalhadores incluídos, os com emprego e os com carteira. A grande massa sem direitos que vive no subemprego e na informalidade, que não tem sindicato, não está no radar do PT, nem do ex-presidente Fernando Collor, que ontem defendeu a CLT porque seu avô, Lindolfo, foi ministro do Trabalho de Vargas em 1930.

O protesto foi além do aceitável. Em qualquer parlamento há regras que permitem a obstrução pelas minorias. Há casos clássicos de paralisia do legislativo pela atuação da minoria, que toma a palavra prolongando a sessão para impedir o voto da maioria. Mas a ocupação física da mesa diretora não está entre as normas permitidas.

Apesar de ter escolhido o caminho errado, a oposição tem razão em alguns pontos. O governo está em um processo agudo de perda de legitimidade e por isso não é o melhor momento para aprovar reformas. Além disso, foi feita uma manobra para contornar a obrigatoriedade da volta à Câmara. O projeto será de fato alterado, mas através de MP, para não ter que continuar no Congresso. E um dos pontos que será mudado havia sido incluído na proposta do governo por absoluta estupidez. Onde já se viu pôr na lei que as grávidas e lactantes podem trabalhar em local insalubre? Apesar desse desatino, a reforma trabalhista tem várias boas ideias e mudanças necessárias. O problema é que ela ficou prisioneira do tempo político e chegou ontem à votação final com o governo em desagregação.

O projeto quebra alguns pontos de rigidez da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que envelheceram com o tempo. A economia hoje é de serviços, de trabalho flexível, sem a lógica dos turnos das fábricas. A CLT foi pensada para um país que estava se industrializando. Agora, no Brasil e no mundo, a indústria tem um espaço menor na economia e os serviços têm outra forma de organizar o trabalho. Há um infinita variedade de situações no mercado de trabalho que a CLT não cobre e que a nova lei tenta incluir com o princípio do negociado ter força de lei.

O desemprego entrou na escalada de elevação durante o governo Dilma, fruto da crise econômica que sua administração e suas escolhas provocaram. As estatísticas e as séries históricas estão aí para provar. O desemprego atingia 6,4 milhões de trabalhadores quando ela foi reeleita, e no seu curto segundo mandato o número aumentou em mais cinco milhões. Em maio de 2016, quando ela foi afastada para o julgamento do impeachment, havia 11,4 milhões. No governo Temer o desemprego continuou subindo e hoje atinge 14 milhões, mas ele herdou uma dinâmica de difícil reversão.

Entre as mudanças negociadas para serem incluídas via MP está a proibição de que lactantes e gestantes trabalhem em local insalubre, mesmo que seja de risco pequeno ou médio. A jornada de 12 horas e 36 horas de descanso seria negociada entre o trabalhador e a empresa e agora será com a intermediação do sindicato. Haverá critérios mais rígidos para o trabalho intermitente. O fim do imposto sindical também passaria a ser escalonado, mas esse ponto teria sido decidido por negociação direta de Temer com as centrais sindicais.

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