segunda-feira, 24 de julho de 2017

Governo eleva tributos e aperta contingenciamento – Editorial | Valor Econômico

Entre uma péssima medida e uma medida muito ruim, o governo optou pela segunda - aumentar impostos. Modificar a meta de ajuste fiscal, déficit de R$ 139 bilhões, no ano de estreia do teto de gastos e realizar um rombo ainda maior fulminaria as já baixas expectativas em relação ao governo de Michel Temer. O aumento do PIS-Cofins sobre combustíveis ajudará a compensar parte da frustração de receitas advindas de uma economia que se recupera muito devagar. Elevar impostos é o expediente de todos os governos desde a redemocratização do país. No entanto, sem cortar ou congelar salários, demitir, eliminar subsídios e melhorar a gestão pública, o único e óbvio caminho que resta para atingir a meta foi o aumento de tributos.

O contingenciamento de gastos foi ampliado em R$ 5,95 bilhões, para R$ 44 bilhões. Como as despesas obrigatórias são R$ 1,05 trilhão de um orçamento de R$ 1,28 trilhão, a contenção de gastos tem sido forte sobre a parcela "livre" dos recursos - a penúria recaiu especialmente sobre os investimentos, que já diminuíram quase 50% no ano até maio. As despesas discricionárias recuaram 35%.

Entre as despesas que se apoderam do orçamento, as da previdência (incluindo Loas) seguem sua trajetória previsível. Como proporção dos gastos primários, somavam 47,9% em 2010, saltaram para 53,7% em 2016 e se prevê que cheguem a 56,8% este ano, segundo o Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do 3º Bimestre, divulgado na sexta-feira. Em termos nominais, o rombo previdenciário será de R$ 185 bilhões, enquanto que o Tesouro deve obter no ano um superávit de R$ 40 bilhões.

Como a cota dos sacrifícios foi mal distribuída desde o início, em 2016, quando Michel Temer assumiu oficialmente a Presidência, lançar mão de aumento de impostos era uma fatalidade prevista pela maioria dos analistas privados. Não foram previsões de cenário otimistas para o Orçamento de 2017 que explicam as dificuldades - as expectativas do setor privado iam na mesma direção das oficiais nesse ponto. Além disso, a equipe econômica foi o mais realista possível nas projeções e a previsão orçamentária deixou de ser a ficção tradicional.

O erro original, que talvez impedisse a alta de impostos agora, foi a concessão generalizada de aumentos salariais para o funcionalismo público, em especial sua elite mais bem remunerada. O presidente Temer, ao assumir em meio a uma crise política, não quis problemas para seu lado. Concedeu 10,8% de reajuste em dois anos para a base do funcionalismo e de 27,9% a 53% para as carreiras de Estado, distribuídos por 4 anos. E já em 2017 houve equiparação de categorias não contempladas no acordo, de 21,3% a 27,9% também em 4 anos (Zeina Latif, O Estado de S. Paulo, 20 de julho).

A letargia econômica colabora obviamente para a ruína das contas públicas. Há sinais de melhora, porém. As receitas federais tiveram aumento real de 3% em junho e de 0,77% no semestre. A arrecadação de vários impostos reagiu, como o IPI, com variação real de 14,8%.

Nesse quadro, as renúncias fiscais têm peso desmedido. No ano, devem chegar a R$ 280 bilhões, ou 20% das receitas totais previstas. Só as desonerações retiraram R$ 42,2 bilhões dos cofres públicos no semestre. E pela fraqueza política do governo, acuado por denúncias, o fim das desonerações na folha não passou no Congresso, que as aceita mas apenas para 2018.

Pelas contas do FMI, o déficit primário será zerado apenas em 2021, um ano depois da previsão oficial do Brasil. O Fundo recomenda que o rombo seja reduzido a 0,6% do PIB já em 2018 (a LDO aprovada fixa em 1,8% do PIB), e haja superávit em 2019. Se a economia estiver em melhor forma no ano que vem, o FMI recomenda esforço extra fiscal de 1 a 2 pontos percentuais do PIB. A meta é atingir superávit de 2,5% do PIB em 2021, ou seja, uma virada heróica, e para o FMI, plausível, de 4,6 pontos do PIB em cinco anos - o dobro da velocidade prevista pelo governo brasileiro.

Para isto, entre medidas exemplificadas, seria preciso acabar com aumentos reais para o funcionalismo, congelar admissões, eliminar ampla gama de subsídios e fazer a reforma da previdência. Analistas privados chegam à necessidade de esforço dessa magnitude, que terá de ser feito na maior parte pelo lado das despesas, com aumento marginal de impostos. A missão ficará para o próximo governo, caso resolva assumi-la. Com a LDO de 2018 dada, ao governo Temer caberá zelar pelas metas e tentar realizar a reforma da previdência.

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