terça-feira, 6 de junho de 2017

Destino traçado | Merval Pereira

- O Globo

O destino do presidente Michel Temer começa a ser definido hoje no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas depende não apenas da decisão, que pode ser dada em três dias se não houver um pedido de vista por parte de um dos ministros, o que seria normal em outra situação, mas vergonhoso no caso presente.

Não apenas porque os ministros, mesmo os novatos, já tiveram tempo suficiente para se inteirar do processo, como a situação política do país que não permite que se ganhe tempo com medidas basicamente procrastinatórias.

Outra espada de Dâmocles paira sobre a cabeça de Temer, essa mais afiada ainda: um provável pedido iminente de abertura de processo contra o presidente da República por parte do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

A situação de Temer é tão precária que, em questões de dias, ele passou a contar votos para impedir um processo, e não para aprovar as reformas estruturantes que eram o fundamento de sua proposta de governo.

Ao perder a capacidade de articulação no Congresso, Temer perdeu o trunfo que potencializava sua legitimidade em permanecer no Palácio do Planalto. Dizer que Temer é um presidente ilegítimo por ter assumido o governo em decorrência do impeachment de Dilma é apenas um truque retórico da oposição, sem base na realidade que o próprio PT criou ao colocar Temer duas vezes na vice-presidência da República.

Depois da revelação da gravação da conversa clandestina com Joesley Batista, porém, essa legitimidade foi corroída, assim como Dilma perdeu a possibilidade de continuar governando, embora tão eleita pelo voto quanto Temer, ao se constatar que abusara de seu poder político para cometer desvios de função ao quebrar o equilíbrio fiscal utilizando-se de métodos ilegais.

Da mesma maneira, no decorrer das investigações da Operação Lava-Jato, ficou comprovado que a eleição de 2014 foi corrompida pelo abuso do poder econômico e político, mesmo que se tenha descoberto posteriormente que também a campanha tucana comprou apoio de partidos políticos com dinheiro proveniente de financiamentos ilegais.

É essa maneira de financiar campanhas políticas que está em análise a partir de hoje no TSE, e existem provas suficientes para impugnar a chapa vitoriosa mesmo que não sejam aceitas as delações provenientes dos executivos da Odebrecht e as dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura.

Há uma tendência no plenário do tribunal a considerar que essas novas provas foram aceitas pelo relator Herman Benjamin sem base na legislação, ou pelo menos com base em uma interpretação alargada que caracterizaria um abuso da função de relator.

O que pode parecer uma vitória para a defesa de Dilma e Temer, hoje compreensivelmente unidos na desgraça, na verdade é uma formalidade que não terá influência na decisão dos juízes, já que todos vivem no mundo real e tomaram conhecimento de todos os dados das delações que podem ser retiradas hoje do processo.

O ditado latino que define que “o que não está nos autos, não está no mundo”, indicando que os juízes só podem se utilizar do que está provado nos autos para a decisão final, continua valendo, pois as delações em questão são apenas mais elementos para a acusação, mas não os únicos.

Existem provas documentais nos autos que demonstram o abuso do poder político e econômico que campeou na campanha vitoriosa em 2014, e a boa vontade para separar presidente e vice na interpretação alargada da legislação, que já beirava o escândalo, hoje está escassa. Não há mais espaço político para uma cegueira jurídica deliberada.

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