quarta-feira, 14 de junho de 2017

Derrocada histórica dos investimentos – Editorial | Valor Econômico

Apesar de o Produto Interno Bruto (PIB) ter subido no primeiro trimestre, após dois anos seguidos de baixa, a taxa de investimento não reagiu. Enquanto o PIB avançou 1% do quarto trimestre de 2016 para o primeiro deste ano, a formação bruta de capital físico (FBCF) recuou 1,6%, frustrando as expectativas de crescimento, ainda que modesto. Em comparação com o primeiro trimestre de 2016, o PIB recuou 0,4%; e a FBCF, nada menos do que 3,7%. Em relação ao PIB, a taxa de investimento encolheu para 15,6%, o menor patamar da série histórica, ou seja, em 21 anos - muito menor do que o dos países do grupo dos Brics, onde a China brilha com 44%, a Índia, com 31,4%; a Rússia, 25,6%; e até a África do Sul está à frente, com 19,5%.

O investimento cai há 12 trimestres seguidos no Brasil. Desde o último ano do primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2014, despencou cinco pontos. Justificativas teóricas de diversos matizes, como a taxa de câmbio apreciada, pouco incentivo ao investimento, escassez de poupança, baixa competitividade no mercado internacional e infraestrutura precária também perderam espaço. No primeiro trimestre, até a taxa de poupança aumentou de 13,9% para 15,7%, sem reflexo positivo no investimento. Há analistas que explicam que os recursos disponíveis estão sendo canalizados para pagar dívidas.

Prevalece a avaliação de que as incertezas políticas realçam as dúvidas econômicas e inibem o investimento. A nova turbulência política provocada pela implicação do presidente Michel Temer na delação dos donos da JBS agrava o quadro. Há agora dúvidas a respeito do encaminhamento das reformas econômicas no Congresso; e o receio de impacto no custo do financiamento em consequência do aumento do risco, mesmo com a manutenção da tendência de queda dos juros, garantida pelo recuo da inflação.

Com o próprio PIB deprimido e o consumo interno idem, não há estímulo para se investir -ainda mais que a economia brasileira convive com uma elevada ociosidade. Um exemplo bastante claro é o da indústria automobilística, cujos estoques chegaram a 41 dias de venda em abril e recuaram no mês passado para 33 dias, patamar ainda elevado. A ociosidade desestimula a compra de equipamentos, a construção de novas plantas ou até mesmo a expansão das fábricas. O registro de compra de equipamentos cresceu no setor agropecuário, que se equipou para dar conta da supersafra deste ano. A construção civil sofre as consequências da Operação Lava-Jato, que apurou casos de corrupção entre as maiores empresas do setor.

À medida que a crise política se aprofunda, aumenta ainda o receio de que uma das raras vertentes de investimentos - a infraestrutura - também pode ficar pelo caminho. Com sérias restrições fiscais, o governo já decidiu que vai limitar seus próprios investimentos aos projetos que podem ser concluídos até 2018. Podem causar maior impacto as concessões de infraestrutura do Projeto Crescer, que engloba 55 empreendimentos entre rodovias, ferrovias, terminais portuários e linhas de transmissão de energia, que exigirão investimentos da ordem de R$ 45 bilhões. Na primeira leva do Crescer, foram anunciados os leilões de quatro aeroportos (Porto Alegre, Salvador, Florianópolis e Fortaleza), além dos editais para estudos de saneamento básico.

As concessões de infraestrutura têm atraído participação mais ampla do capital estrangeiro que, curiosamente, vem demonstrando maior força do que o investidor doméstico, seja por uma visão de mais longo prazo, custos mais baratos de financiamento ou pelo forte atrativo do amplo mercado doméstico. Levantamento recente da Unctad (Valor 8/6) registra que o Brasil é o sexto destino de investimento preferido dos presidentes de multinacionais. O país avançou em relação ao sétimo posto em que estava em 2016, mas perdeu atrativo em comparação com 2014, quando ocupou o quarto lugar na preferência. Em 2014, 23% dos executivos interrogados mencionaram o país. Em 2015, foram 11% e desta vez só 9%.

De toda forma, não dá para se esperar muito em relação a uma recuperação do investimento a curto prazo. Além do cenário político turbulento e sem perspectiva de desanuviar a curto prazo, há a capacidade ociosa. Os dois fatores combinados devem fazer deste ano o quarto consecutivo de queda dos investimentos.

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