quarta-feira, 10 de maio de 2017

Valls busca filiação a partido de Macron e expõe racha do PS

Ex-premier de Hollande diz que Partido Socialista ‘está morto’

Fernando Eichenberg | O Globo

PARIS - A fratura no Partido Socialista (PS) se agravou ontem com a manifesta intenção de Manuel Valls, ex-premier do governo François Hollande, de integrar o movimento República em Marcha (RM), do presidente eleito Emmanuel Macron. Valls declarou a morte do PS e instou os demais parlamentares socialistas a seguirem o mesmo caminho. O campo de Macron, no entanto, recebeu a adesão com reservas. Cardeais do PS lamentaram a atitude do ex-premier, definindo-a como “oportunista”, e lançaram as bases de um novo programa para as eleições legislativas de junho.

— Sejamos sinceros: nos reconhecemos na maioria das propostas do projeto de Macron, sim ou não? Sim. Desejo me inscrever no movimento República em Marcha — afirmou o ex-premier. — Sou ligado ao PS, à sua história, a seus valores, mas o PS está morto e é passado. O partido deve se superar, e deveria ser bem mais claro do que é.

Por parte do RM, no entanto, a resposta foi clara: não haverá tratamento especial para Valls, que deverá propor sua inscrição para as legislativas como qualquer outro candidato, para futura avaliação e eventual aprovação. Responsáveis do movimento insinuaram que, na linha de renovação política reivindicada, a adesão do ex-premier de Hollande poderia não ser bem-vinda. A lista de candidatos do RM no total de 577 circunscrições do país será divulgada amanhã. O PS informou que apresentará candidatos em mais de 400 circunscrições.

Valls mandou um recado para os dirigentes socialistas:

— Numa mesma formação política, ter os que apoiam a maioria parlamentar, os que desejam uma aliança com JeanLuc Mélenchon (da frente de esquerda radical França Insubmissa) e, no meio, os que não sabem o que querem... Isso não funciona e não tem nenhum sentido.

O atual premier, Bernard Cazeneuve, disse que os socialistas devem “ter a vontade de fazer com que o quinquênio (de Macron) seja bem-sucedido”, mas ressaltou:

— Devemos estar à altura do momento e não nos deixarmos rumar para divisões que levariam a falar de nós mesmos, quando devemos falar aos franceses.

Membro do PS e também comissário europeu, Pierre Moscovici apelou a uma completa reformulação do partido:

— Não sei se o PS está morto ou não, em todo caso, ele deve ressuscitar. Há um trabalho de refundação considerável a ser feito. Tudo deve ser repensado, pois o programa socialista, social-democrata do século XXI, deve ser agora reinventado.

Ontem, o PS estabeleceu as linhas de um novo programa, abandonando proposições de seu candidato nas eleições presidenciais, mas também refutando medidas anunciadas pelo presidente eleito, como a reforma trabalhista por meio de decreto.

Para o analista Marc Crapez, da Universidade Paris-Nanterre, o PS está exaurido, mas não em vias de extinção:

— Há uma fadiga das figuras importantes da legenda, que não se entendem. Mas no passado já se viram situações semelhantes. Michel Rocard, nas eleições europeias de 1994, e Lionel Jospin, nas presidenciais de 2002, tiveram péssimo desempenho, e muito se falou na época do fim do PS. Mas não acredito nesse discurso de que o PS está morto. Penso, inclusive, que ele surge exatamente para evitar seu desmoronamento e estimular a reconstrução.

RECOMEÇO PARA VELHOS PARTIDOS
Na sua opinião, a RM não conseguirá obter sozinha a maioria parlamentar, nem o PS alcançará o satisfatório, sem que isso determine seu fim:

— O PS não deverá fazer um bom placar, o que poderá provocar a tentação de uma nova onda de partida de seus deputados, mas tem condições de se recuperar, tem recursos e uma quantidade de eleitos locais. Há toda uma série de fatores para que não seja um partido em seu esgotamento.

O partido conservador Os Republicanos também reuniu ontem suas lideranças, e optou por virar a página do contestado programa de seu candidato no pleito presidencial, François Fillon, principalmente em relação à redução do número de funcionários públicos e à reforma fiscal.

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