quarta-feira, 5 de abril de 2017

Delações fundamentais | Merval Pereira

- O Globo

As delações premiadas do marqueteiro João Santana e sua mulher, Mônica Moura, homologadas ontem pelo ministro Edson Fachin no Supremo Tribunal Federal, vão esclarecer muitas coisas, e não apenas sobre a campanha eleitoral de 2014, cujo julgamento de contas iniciou-se ontem no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas foi interrompido para que sejam ouvidas novas testemunhas — especialmente os dois novos delatores, que estão entre os cinco que receberam mais dinheiro ilegal da Odebrecht.

Quem fez essa avaliação foi o ex-coordenador do Departamento de Operações Estruturadas Hilberto Mascarenhas, o homem que controlava o fluxo das propinas. A primeira informação de que os responsáveis pela propaganda política do PT haviam feito as delações veio do vice-procurador eleitoral, Nicolao Dino, durante a primeira sessão do julgamento do TSE.

Como era um fato novíssimo, e certamente decisivos para esclarecer o uso de dinheiro ilegal na campanha presidencial, ele pediu para que os dois fossem ouvidos, reabrindo o processo. O novo prazo de cinco dias dado para as alegações finais, aceito até mesmo pelo relator Herman Benjamin, acabou ficando em importância secundária, já que os novos depoimentos, inclusive do ex-ministro Guido Mantega, é que ditarão o novo ritmo do processo.

Os depoimentos de João Santana e Mônica servirão também para reafirmar ou desmentir uma declaração de Hilberto Mascarenhas, feita em sua delação premiada. Mascarenhas, que a partir de 2006 se tornou chefe da área de propinas da Odebrecht, afirmou que a empreiteira evitava pagar propina em dólar e nos Estados Unidos.

“Não só não pagava nos Estados Unidos, como a gente propunha sempre a quem tinha que receber dinheiro no exterior que recebesse em euro. É uma boa moeda e não passa pelo Fed americano [banco central dos Estados Unidos].”

Até onde se sabe, foram em paraísos fiscais todos os pagamentos feitos a Feira e Xepa, codinomes dos dois responsáveis pelo marketing político do PT no Brasil e nos países vizinhos, onde também a influência das ilicitudes da Odebrecht está sendo questionada, por desvirtuarem as eleições presidenciais, numa ação conjunta da empreiteira com o PT para ajudar governos amigos.

Essa confirmação de que a Odebrecht não usava o sistema bancário dos Estados Unidos para pagar seus subornos pode desmentir a reportagem da revista “Veja” desta semana, que atribui pagamento de propinas ao senador Aécio Neves em uma conta bancária em Nova York em nome de sua irmã Andrea Neves.

O ex-diretor da empreiteira Benedicto Júnior, conhecido como “BJ”, teria feito a denúncia, que ontem foi desmentida mais uma vez, agora da tribuna do Senado, por um Aécio indignado. Sua irmã Andrea chegou a chorar em um vídeo divulgado na internet. Alexandre Wunderlich, advogado de “BJ”, porém, teria afirmado a Alberto Toron, defensor de Aécio, que seu cliente não fez aquela afirmação em delação.

Hoje o presidente do PSDB vai ao ministro Edson Fachin pedir que libere o sigilo da delação de Benedicto Júnior, para que possa se defender. Curiosamente, a mais grave acusação já feita ao senador Aécio Neves, pois contêm elementos factuais claros — uma conta em um banco de Nova York no nome de Andrea Neves —, pode servir para inocentá-lo.

Basta que a denúncia não faça parte da delação premiada do ex-diretor da Odebrecht ou que não exista a indicação do nome do banco e da conta, em que o dinheiro foi depositado. O próprio Benedicto Júnior, na parte da delação em que fala de João Santana, disse que todas as contas em que as propinas foram depositadas foram entregues aos procuradores de Curitiba.

O mesmo procedimento tem que ter sido seguido em relação ao senador Aécio Neves, se é verdade que ele fez a denúncia nos termos em que a revista divulgou.

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