terça-feira, 25 de abril de 2017

Boff defende que PT faça ‘autocrítica séria’

Teólogo diz que partido corre risco de ‘nunca se redimir’ se não reconhecer erros nos governos Lula e Dilma

Gabriel Cariello | O Globo

Apoiador dos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, o teólogo Leonardo Boff defendeu que o PT faça uma “séria autocrítica” em sua próxima reunião nacional para não correr o risco de “nunca se redimir” por erros cometidos enquanto esteve no comando do país. O PT tem uma reunião da Executiva Nacional marcada para o próximo dia 2, em Curitiba.

Ontem, depois de ir a público para negar ter feito críticas a Lula em seu site, o teólogo afirmou ao GLOBO que o petista vai receber “duras lições pela frente” e “se dar conta de que um ciclo se encerrou”. Boff afirmou ainda que o país passa por um momento turbulento, no qual as reformas não serão “suficientes”. E defendeu uma união entre Lula, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e o presidente Michel Temer (PMDB) para “repensar a nação”.

O teólogo, que no ano passado criticou o processo de impeachment contra Dilma, disse que o PT precisa se refundar e buscar um discurso “construtivo”.

— Eu acho que o partido, se na próxima reunião nacional, não fizer uma séria autocrítica que nunca fez antes, nunca vai se redimir. Ele não é mais uma referência global. Foi uma vez, pela bandeira ética, dos mais empobrecidas. Ou ele refaz esse caminho com muita humildade, e diz: “fomos mordidos pela mosca do poder”... O PT tem que se refundar. Não é se remendar. É fazer autocrítica e voltar às suas origens, que são as bases populares. Num sentido construtivo, não criticando o Estado, o sistema, mas começando a fazer coisas novas — disse o teólogo, citando que temas como ecologia e combate às mudanças climáticas deveriam ser adotadas pelo PT. — Eu mandei cartas para que usassem essa questão, mas nem lhes ocorre (incluir os temas como bandeiras do partido).

O teólogo foi envolvido em uma polêmica depois que compartilhou em seu blog, na sexta-feira, um artigo da jornalista Carla Jiménez, do jornal espanhol El País, com críticas a protagonistas do cenário político citados na delação da Odebrecht, entre eles Lula. Na ocasião, Boff escreveu uma introdução para o artigo, na qual dizia que não defendia o PT, mas sim “políticas sociais que beneficiaram milhões de excluídos, realizadas pelos dois governos anteriores, do PT e de seus aliados”. Ontem, Boff publicou um novo texto afirmando que não compartilhava da crítica feita pela jornalista a Lula.

PAÍS PRECISA DE PACTO SOCIAL
Carla Jiménez escreveu que Lula, “mais do que os crimes a que responde, feriu de golpe a esquerda no Brasil”. Segundo ela, isso aconteceu porque o petista ajudou “a estigmatizar as bandeiras sociais e contribuiu diretamente para o crescimento do que há de pior na direita brasileira.” Ontem, Boff elogiou Lula, mas disse que o petista precisa aprender com os erros políticos:

— Ele vai ter duras lições pela frente. Vai se dar conta que um ciclo se encerrou. Não dá mais para se repetir. Mas é um homem aberto a aprendizagens. Eventualmente, se ganhar (as eleições em 2018) não pode mais fazer as alianças com os partidos, precisa de um pacto social.

Boff criticou o presidencialismo de coalizão como modelo de governo. Para o teólogo, Lula incorreu no erro de seus antecessores de “dar as costas para o povo”.

— Acho que devemos fazer uma crítica radical ao paradigma de Estado que reinou e se mostrou absolutamente inviável. As classes dominantes sempre fizeram reconciliações (entre elas) de costas para o povo, inclusive o Lula, com o presidencialismo de coalizão. Essa política se extenuou. É o momento de fazer uma crítica global do sistema brasileiro. Que tipo de sociedade, que tipo de Estado (queremos)?

O teólogo defendeu, ainda, o diálogo entre Lula, Fernando Henrique e Temer:

— As reformas são insuficientes. Temos que refundar o Brasil, reinventar o país. Esquecer ideologias e partidos. Quem puder pensar junto, começando por Fernando Henrique, Lula e Temer. Ou aproveitamos essa chance, ou afundaremos como países falidos.

O teólogo explicou que escreveu o segundo texto após receber mensagens de amigos perguntando se ele havia abandonado o partido:

— Isso viralizou nas redes sociais, saiu de um jornaleco que eu conheço em Vitória da Conquista (BA). Não me chateio com essas coisas. Quem se expõe publicamente está exposto à incompreensão. Acho ruim quando se faz uma divulgação para ofender a pessoa.

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