sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Nova fase da Lava-Jato no STF atinge o PMDB

Por André Guilherme Vieira e Murillo Camarotto | Valor Econômico

SÃO PAULO E BRASÍLIA - O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Edison Lobão (PMDB-MA), foi o alvo indireto da Leviatã, a nova fase da Operação Lava-Jato deflagrada ontem pela Polícia Federal (PF). Lobão foi descrito como um operador de propinas para o PMDB pelo delator Flavio Barra, ex-presidente da Andrade Gutierrez Energia. O senador teria participado de desvios de recursos nas construções da hidrelétrica de Belo Monte (PA) e da usina nuclear Angra 3 (RJ), quando ministro de Minas e Energia.

Deflagrada com ações de busca e apreensão no Rio, Distrito Federal e em Belém (PA), a Leviatã teve como alvos diretos o executivo Márcio Lobão, presidente da Brasilcap (empresa de capitalização cujo maior acionista é o Banco do Brasil), e o ex-senador Luiz Otávio Campos (PMDB-PA), ligado ao senador Jader Barbalho. Barra disse à Procuradoria-Geral da República (PGR) que tanto um quanto o outro teriam sido designados pelo PMDB para recolher propinas.

As buscas foram autorizadas pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Em endereços de Márcio Lobão, a PF encontrou cerca de 1,2 mil quadros e o equivalente a R$ 40 mil em dólares e moedas estrangeiras. Na casa de Luiz Otávio os federais acharam R$ 135 mil em espécie.

Barra apontou pagamento de R$ 20 milhões em propinas envolvendo a hidrelétrica de Belo Monte, no período de 2009 a 2013.

Segundo o delator, em 2010, o então deputado federal e um dos coordenadores da campanha de Dilma Rousseff, Antonio Palocci (PT-SP), chamou o presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo (também delator), para uma reunião. No encontro teria dito que o projeto da empresa para a obra era o preferido do governo, e que tomaria as medidas para que fosse contratada pelo grupo vencedor do leilão.

Palocci está preso e é processado por corrupção e lavagem na Justiça Federal de Curitiba, em ação penal relacionada à Petrobras. Segundo Barra, ele teria colocado como condição que fosse pago 1% do valor total do contrato, sendo divididos em 0,5% para PMDB e 0,5% ao PT.

Em 2014, Lobão teria informado Barra "que o intermediário do recebimento de vantagens indevidas destinadas ao PMDB não seria mais Márcio Lobão, mas sim Luiz Otávio Campos". A mudança de interlocutor teria ocorrido devido à negativa das empresas de pagarem um aditivo contratual de 5%. A questão foi resolvida, de acordo com Barra, que contou também ter apresentado Luiz Otávio aos representantes das demais empresas integrantes do consórcio construtor de Belo Monte.

O delator esclareceu ainda que empreiteiras repassaram entre R$ 4 milhões e R$ 5 milhões a Edison Lobão, como contrapartida por contratos obtidos para obras da Usina de Angra 3, que totalizaram R$ 600 milhões até 2013, de acordo com o delator. Barra disse ter havido pagamento em dinheiro de R$ 600 mil, entregues na casa de Márcio Lobão, no Rio, referente à propina da hidrelétrica de Belo Monte.

Ouvido na ação judicial que pode cassar a chapa presidencial Dilma Rousseff-Michel Temer, Flávio Barra ratificou sua delação premiada, afirmando que a base de pagamento de propina nos contratos da Eletronuclear era de 2% para o PMDB e 1% para o PT.

"Existia uma parte desse compromisso com o PMDB, em relação ao senador Romero Jucá [RR]", disse. Jucá nega as acusações.

Barra falou que as propinas eram pagas por doações de campanhas em períodos eleitorais. "Calculava-se, mediante o valor faturado até aquele momento, a porcentagem e se aplicava esse número. E isso era transformado numa doação eleitoral. Sempre ao diretório nacional do partido".

Ele afirmou que houve pagamento de propina por Belo Monte para os diretórios nacionais de PMDB e PT, em 2014, ano em que a hoje ex-presidente Dilma foi eleita, tendo o atual presidente Michel Temer como vice.

Sobre a cota de propina para o PMDB, Barra disse que os interlocutores eram Jucá e Lobão e que contratos fictícios também foram usados para repassar os valores, inclusive com um escritório de advocacia do Maranhão.

Procurado, Edison Lobão não quis comentar a nova fase da Lava-Jato. Seu advogado, Antonio Carlos de Almeida Castro, manifestou indignação. "Mais uma vez o que move a arbitrariedade é unicamente a palavra do delator, que se vale da delação premiada para ferir a honra das pessoas, em troca de benefícios", disse. Já o filho do senador, Márcio Lobão, afirmou, por meio de seus advogados, "não ter conhecimento das razões que justificaram a drástica medida judicial". Ele garantiu estar seguro "de que não cometeu nenhum ilícito". O presidente do Banco do Brasil, Paulo Caffarelli, disse que a Brasilcap "não coaduna com qualquer tipo de ato que seja ilegal".

Outro episódio delatado por Barra narra que ele foi informado por Otávio Azevedo, em 2012, sobre a necessidade de atender a um pedido de Palocci. O ex-ministro Antonio Delfim Netto deveria receber R$ 15 milhões, o que segundo ele foi feito, "proporcionalmente à sua participação no consórcio construtor".

Tal repasse, segundo Barra, ocorreu por meio de transferências usando contratos fictícios de prestação de serviços da LS, empresa de consultoria de Luiz Apolônio - sobrinho e representante de Delfim -, além de pagamentos à consultoria do economista, a Aspen.

Em nota ao Valor, os advogados Ricardo Tosto e Maurício Silva Leite declararam que Delfim Netto não praticou nenhuma irregularidade, e "todos os seus recebimentos existiram em decorrência de prestação de serviços de consultoria na área econômica". (Colaboraram Vandson Lima e Fabio Murakawa, de Brasília, e Vinicius Pinheiro, de São Paulo)

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