sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Busca por emprego demora dois anos para 2,3 milhões

Na crise, longa espera atinge 20% dos desempregados no país

Número dobrou desde 2014. Jovens são os mais afetados por dificuldades no mercado de trabalho

A recessão prolongou o tempo que os brasileiros que perderam o emprego levam para reconquistar uma vaga. No ano passado, 20% dos desempregados estavam há pelo menos dois anos sem trabalho. Havia 2,3 milhões nessa situação, e 4,4 milhões procuravam emprego há mais de um ano, segundo dados do IBGE. Especialistas afirmam que os jovens são os mais afetados e alertam que, quanto maior a demora, mais difícil será para o trabalhador se recolocar no mercado.

Espera mais longa

Entre os 11,8 milhões de desempregados, 20% procuram emprego há pelo menos dois anos

Daiane Costa | O Globo

Ainda que pesem os sinais de melhora na economia e a afirmação do ministro Henrique Meirelles de que o país já está saindo da recessão, o desemprego não dá trégua e se torna cada vez mais longo. Em 2016, quase 20% dos 11,8 milhões de desempregados já procuravam uma vaga há pelo menos dois anos. Em relação a 2014, esse grupo explodiu, crescendo 90%: passou de 1,2 milhão de pessoas para 2,3 milhões no ano passado. Uma realidade que, para analistas, dificulta ainda mais a tão esperada retomada da economia.

— Quanto mais se demora para conseguir um emprego, mais aumentam as dificuldades de contratação, pois esses trabalhadores perdem seu capital humano específico e conhecimentos práticos. Ficam enferrujados. E quem está empregado passa a agir como se tivesse sem emprego, freando o consumo, com medo de ser demitido e demorar muito tempo para se reinserir no mercado — analisa Marcelo Neri, diretor do FGV Social.

Também explodiu o grupo de brasileiros que ficou de um ano a menos de dois anos buscando trabalho. Passou de 1 milhão de pessoas em 2014 para 2,16 milhões em 2016, alta de 104%. Somados, são 4,46 milhões de trabalhadores procurando emprego há mais de um ano. Os dados foram divulgados pelo IBGE ontem.

O levantamento mostra ainda que, em 2016, a falta de trabalho atingia um contingente bem maior, de 22,6 milhões de brasileiros, se considerados os 11,8 milhões que estavam desempregadas; outros que estavam disponíveis para trabalhar, mas, por algum motivo, ainda não tinham procurado vaga; e aqueles que queriam trabalhar mais, pois se encontravam subocupadas em empregos que consumiam menos de 40 horas por semana. Esse grupo cresceu 46% entre 2014 e 2016.

— Você tem muito mais pessoas procurando emprego num mercado que praticamente não contrata. Isso leva ao aumento do tempo de procura e prejudica especialmente o jovem, que é o grupo mais atingido pelo desemprego. Eles estão vendo a sua entrada no mercado adiada pela crise, perdendo a oportunidade de adquirir experiência. Uma pessoa que está empregada é mais produtiva, tende a estar sempre atualizada — complementa José Ronaldo de Castro Souza Júnior, coordenador do Grupo de Estudos de Conjuntura e Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea.

Neri também alertou para o custo social do desemprego mais longo. Este gera frustração e adia a entrada no mercado de jovens que, recém-formados, buscam o primeiro emprego:

— O desemprego no Brasil sempre foi de baixa duração, com probabilidade de 40% dos desempregados mudarem de status de um mês para outro.

No ano passado, todos os estados mais o Distrito Federal tiveram taxas recordes de desemprego, se considerada toda a série histórica da pesquisa do IBGE, iniciada em 2012. O estado da Bahia registrou a maior taxa média de desemprego entre todas as unidades da federação, com 15,9%. Em seguida, vieram Amapá, com 15,5%, e Pernambuco, com 14,5%. O Rio de Janeiro ficou praticamente em linha com a média nacional (11,5%), ao registrar taxa de desemprego de 11,7%. Em São Paulo, o índice ficou em 12,3%.

— O desemprego é mais alto na Bahia porque a população preta e parda é maior, e esse grupo tem muito mais dificuldades de se inserir no mercado de trabalho. Não é questão de escolaridade, que nem é tão baixa na Bahia, é a questão da cor — analisa Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Renda do IBGE.

PRETOS E PARDOS GANHAM MENOS
Os números do quarto trimestre do ano passado são uma amostra dessa desigualdade. As taxas de desemprego das pessoas de cor preta (14,4%) e parda (14,1%) ficaram acima da média nacional (12%), enquanto a dos brancos foi de 9,5%.

O rendimento médio real habitualmente recebido pelas pessoas ocupadas no país foi estimado no 4º trimestre de 2016 em R$ 2.043. Ficou estável em relação ao trimestre anterior e ao mesmo período do ano anterior. O rendimento dos brancos, estimado em R$ 2.660, não só ficou acima da média nacional, como bem superior ao de pardos (R$ 1.480) e pretos (R$ 1.461).

— Quando se compara o rendimento, há um abismo em relação à população branca. São diferenças históricas e culturais de falta de oportunidade. E, mesmo quando pretos e pardos se inserem no mercado, têm dificuldades de ter os mesmos direitos dos brancos — comenta Cimar.

Neri, do FGV Social, destaca, no entanto, a estabilização da renda:

— O lado mais difícil da crise é o desemprego de longa duração, mas os salários pararam de cair com a desaceleração da inflação. Quando o mercado de trabalho registrou seu pior momento, no segundo trimestre do ano passado, dois terços da queda da renda eram efeito da inflação.

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