segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Remendo útil – Editorial | Folha de S. Paulo

A economia brasileira está sujeita ao risco de que ondas pessimistas realimentem o desânimo de consumir e investir. A liberação do dinheiro das contas inativas do FGTS pode ser um antídoto efetivo contra a depressão, mesmo que modesto.

É que uma recessão ainda mais duradoura combinada à ausência de estímulos econômicos concretos poderia levar o país a uma nova espiral descendente.

Os meios sensatos e tecnicamente aceitáveis de evitar a nova baixa são escassos quando se leva em conta o curto prazo.

O FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) representa uma alternativa criativa, com efeitos colaterais quase imperceptíveis.

No final da semana, o governo Temer havia praticamente decidido que trabalhadores poderão sacar o dinheiro de suas contas inativas de março a julho, pela ordem de seus aniversários, em calendário a ser especificado.

São recursos que, por restrições legais, não puderam ser sacados e ficaram estacionados em contas que deixaram de receber contribuições do empregador devido ao fim de contratos de trabalho.

É importante que os recursos irriguem a economia já neste semestre, para o qual ainda se previa estagnação, na melhor das hipóteses.

Mesmo que vista com maus olhos por alguns economistas, a medida parece não ter contraindicações.

Não há risco de abalos no patrimônio do FGTS, de mais de R$ 470 bilhões (nas contas dos trabalhadores, o saldo é de R$ 370 bilhões). Estima-se que esse saque excepcional das contas inativas não seja muito superior a R$ 30 bilhões.

Entidades representativas da construção civil se queixam do risco de que diminuam os financiamentos do fundo para o setor. A redução não está prevista e, dado o caráter excepcional da medida, não ameaça tal fonte de recursos para os próximos anos.

O valor total do saque, estimado pelo governo, equivale atualmente a quase 0,5% do PIB, montante próximo ao de um ano de benefícios do Bolsa Família. É bastante razoável supor que essa cifra movimentará a atividade econômica.

Quer sirvam para abater dívidas, quer se destinem ao consumo, tais recursos terão contribuído pelo menos para contrabalançar o desânimo de uma economia estagnada em um nível muito baixo.

Em suma, será um remendo útil, um paliativo enquanto não começam a fazer efeito as políticas de fundo –a saber, a volta de mínima ordem nas contas do governo federal e, ora mais importante, a queda acelerada das taxas de inflação e de juros.

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