domingo, 22 de janeiro de 2017

Cármen Lúcia avalia homologar delações da Odebrecht

• Presidente do STF pode assumir ‘questões urgentes’ até 31 de janeiro

Temer confirma que vai esperar decisão da Corte sobre relator da Lava-Jato para só então escolher substituto do ministro Teori Zavascki, enterrado ontem em Porto Alegre

A presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, já avalia a possibilidade de homologar delações de executivos da Odebrecht, que estavam em fase final de análise pelo ministro Teori Zavascki. O regimento prevê que a presidente da Corte assuma questões urgentes no período de recesso, que termina em 31 de janeiro. Teori, morto em acidente aéreo, foi enterrado ontem em Porto Alegre. Juristas, entre eles um ministro do Superior Tribunal de Justiça, defendem que Cármen valide os acordos. O presidente Temer confirmou que vai esperar o STF escolher o novo relator, para só então indicar o substituto de Teori.

Delações na mira de Cármen

• Presidente do Supremo avalia brecha aberta pelo recesso para homologar acordos

Maria Lima, André de Souza e Tiago Dantas* | O Globo

-BRASÍLIA, PORTO ALEGRE E SÃO PAULO- Mesmo antes do fim do recesso do Judiciário, que vai até 31 de janeiro, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, avalia chamar para si a responsabilidade de homologar as delações premiadas dos executivos da empreiteira Odebrecht, que estão em fase final no gabinete do ministro Teori Zavascki. A delação integra a Operação Lava-Jato e põe na lista de investigados cerca de 120 políticos, com mandato no Congresso ou com vaga na Esplanada dos Ministérios.

A possibilidade de Cármen avocar para si a homologação, antecipada ontem pelo colunista Merval Pereira, levará em conta a gravidade e a excepcionalidade do momento. O regimento interno do STF lista que, entre as atribuições da presidente do tribunal, está “decidir questões urgentes nos períodos de recesso ou de férias”. A partir de 1º de fevereiro, com a corte voltando a funcionar plenamente, essa possibilidade já não existe mais. Não há previsão legal de que a presidente do tribunal possa avocar para si esta tarefa.

De volta a Brasília na segunda-feira, o roteiro de Cármen Lúcia será: estudar, refletir e conversar para tomar essa decisão. A ministra também precisará decidir sobre a escolha do novo relator dos processos da Lava-Jato. O caminho da presidente do Supremo será inspirado no regimento, mas ela enxerga alternativas, já que a lei deve ser interpretada.

DOCUMENTOS VÃO PARA SALA-COFRE
Os documentos das delações da Odebrecht que estavam sendo analisados pelos juízes auxiliares sairão do gabinete de Teori e serão devolvidos à sala-cofre do tribunal. Mesmo no recesso, eles vinham atuando em regime de esforço concentrado, analisando os documentos e cerca de 800 depoimentos de 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht.

Havia a expectativa de que a decisão de homologar ou não as delações seria tomada em fevereiro pelo ministro Teori. Os delatores seriam ouvidos para comprovar que decidiram colaborar sem coações e assistidos por advogados. Com a morte de Teori, a relatoria fica indefinida e, portanto, os servidores não poderão continuar examinando o material.

Ainda não houve julgamentos condenando ou absolvendo réus da Lava-Jato no STF. Por enquanto, o tribunal tem analisado pedidos de liberdade de réus presos e denúncias do MPF. Nos dois casos, os investigados têm levado desvantagem. O ministro Teori Zavascki tinha o costume de manter prisões determinadas pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que conduz as investigações na primeira instância.

Juízes e advogados que foram ontem ao velório do ministro Teori Zavascki em Porto Alegre defenderam que a relatoria dos processos da Lava-Jato seja distribuída entre os demais ministros por meio de sorteio eletrônico. Os ministros do Supremo evitaram tocar no assunto. Presidente da Corte, Cármen Lúcia não deu declarações à imprensa.

— Não há nada decidido nesse momento. O regimento tem as previsões necessárias para essas hipóteses e isso será objeto de análise. Nesse momento, vamos falar apenas do querido amigo e colega Teori. É momento de luto e tristeza. As questões institucionais serão resolvidas num momento oportuno — afirmou o ministro Ricardo Lewandowski.

MINISTRO DO STJ DEFENDE POSSIBILIDADE
Edson Fachin também disse que não era momento de falar sobre o substituto.
— Estamos aqui com o olhar e o coração voltados para o presente, que é da perda de um amigo. É um momento de prestar respeito a essa circunstância e prestar homenagem ao ministro Teori. Das circunstâncias que decorrem dessa vacância, o Tribunal se encarregará dela o mais breve possível — declarou Fachin.

Para o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo de Tarso Sanseverino, Cármen Lucia homologar a delação seria uma decisão “acertada”. Segundo ele, o regimento do Supremo permite várias interpretações para a redistribuição dos processos da Lava-Jato, embora acredite que o melhor seria o sorteio entre os demais ministros.

— Cármen Lúcia assinar as homologações seria acertado. Sobre a relatoria dos casos, acho que não se deve deixar a repara o ministro que for assumir. Seria uma situação política extremamente delicada ele ter que participar da sabatina no Senado — disse Sanseverino.

Gilmar Mendes, como Cármen, não deu declarações à imprensa.

Rubens Glezer, professor de direito constitucional da FGV-SP, diz a que ministra Carmen Lúcia poderia perfeitamente homologar as delações ainda pendentes, como a da Odebrecht. Para isso, diz, bastaria que o Ministério Público Federal (MPF) se manifestasse junto ao Supremo pela urgência da homologação.

— Nesse caso ela poderia deliberar sobre a homologação e depois redistribuir o processo — diz Glezer, observando que pelo regimento da Corte a ministra não pode ser a relatora do processo.

Para o professor de Direito Constitucional do Mackenzie Antonio Carlos Rodrigues do Amaral, um atraso no processo da Lava-Jato no Supremo é quase inevitável. Mas algumas medidas poderiam evitar que ele fosse muito grande, como o novo ministro relator aceitar trabalhar com a equipe montada pelo então ministro Teori Zavascki.

— O principal é o ponto de vista prático da estruturação da administração do processo. Se o ministro que escolhido relator decidir que vai montar uma nova equipe para esse trabalho aí poderemos ter um atraso de quatro, seis meses. Mas se o novo relator aceitar trabalhar com os assessores que estavam com Teori, o atraso pode ser bastante reduzido — avaliou Amaral. (*Enviado especial)

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