sexta-feira, 8 de julho de 2016

Opinião do dia – Roberto Freire

Não tendo ele (Cunha) vislumbrado sucesso no recurso apresentado na Comissão de Constituição e Justiça (contra a aprovação do pedido pelo Conselho de Ética), viu como concreta a hipótese da cassação em plenário. É um sinal positivo de que a luta pelo fim da corrupção vem sendo vitoriosa.
Agora precisamos cuidar de eleger um presidente que traga respeito à Câmara.

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Roberto Freire é deputado federal por S. Paulo e presidente nacional do PPS, sobre a renúncia de Eduardo Cunha.

Derrotado pela Lava Jato, Cunha renuncia à presidência da Câmara

Aliados querem mandar de volta processo para o Conselho de Ética

• Acordo que está sendo costurado prevê que presidente da CCJ devolva caso para colegiado em decisão monocrática

- O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A renúncia de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) à presidência da Câmara veio acompanhada de uma estratégia para protelar seu processo de cassação e, desse modo, tentar manter o foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal e evitar que o processo caia nas mãos do juiz Sérgio Moro.

Cunha apresentou, após renunciar à presidência, um requerimento na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para que seu processo de cassação seja revisto, uma vez que ele não é mais presidente da Casa. O acordo que está sendo costurado é para que o presidente do colegiado, Osmar Serraglio (PMDB-PR), seu aliado, devolva, em uma decisão monocrática, todo o processo ao Conselho de Ética e retarde sua cassação. Há controvérsia, porém, se Serraglio pode tomar essa decisão sozinho.

Com o gesto, ele também tenta assegurar que, ainda que seu processo avance, tenha um aliado na presidência da Casa. Ontem, após o anúncio, o presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), convocou novas eleições para a próxima quinta-feira. Mas logo depois líderes da Casa se reuniram e anteciparam a eleição para terça-feira – mesma data da análise do recurso de Cunha na CCJ.

O relatório desse recurso foi apresentado anteontem. Nele, o relator Ronaldo Fonseca (PROS-PR) acatou apenas um dos 16 argumentos de Cunha que pediam a anulação do processo na CCJ. A avaliação de seus aliados e advogados é a de que o recurso sepultou as chances de salvar seu mandato e motivou a renúncia.

Assim, uma eventual cassação de Cunha será conduzida já pelo novo presidente da Casa. Hoje, ela é dividida em quatro grupos. Três deles integram a base do presidente em exercício da República, Michel Temer. O Centrão, no qual Cunha exerce ainda alguma influência e cujos principais partidos são PP, PSD, PSC e PTB; a antiga oposição, formada por PSDB, PPS e DEM; e o PMDB. A quarta força é a oposição, liderada por PT, PDT e PC do B.

No total, 14 nomes se colocam como candidatos, mas são considerados favoritos três deputados: Rogério Rosso (PSD-DF), Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Fernando Giacobo (PR-PR). Com tantos candidatos, o discurso oficial do Palácio do Planalto é de não interferir no processo por ora e esperar que a disputa seja mais restrita.

Anúncio. Cunha chegou ao Congresso por volta das 13h, depois de obter autorização do Supremo Tribunal Federal para poder entrar no Congresso. Foi direto para a Secretaria-Geral da Mesa entregar sua carta de renúncia. No trajeto, ouviu vaias de servidores. Depois, seguiu ao Salão Nobre do Congresso, onde, às 13h25, começou a ler sua carta de renúncia.

Nela, criticou a gestão de Waldir Maranhão (PP-PE) e disse que seu gesto busca trazer estabilidade política à Casa. “É público e notório que a Casa está acéfala, fruto de uma interinidade bizarra, que não condiz com o que o País espera de um novo tempo após o afastamento da Presidente da República. Somente a minha renúncia poderá pôr fim a essa instabilidade sem prazo.”

Destacou a abertura do impeachment da presidente Dilma Rousseff e disse que, por isso, passou a ser alvo de perseguição. “Foi o marco da minha gestão, que muito me orgulha e que jamais será esquecido. (...) Estou pagando um alto preço por ter dado início ao impeachment.”

Voltou a acusar a Procuradoria-Geral da República de seletividade na investigação contra ele e chorou ao citar seus familiares. “Quero agradecer especialmente a minha família, de quem os meus algozes não tiveram o mínimo respeito, atacando de forma covarde, especialmente a minha mulher e a minha filha mais velha. Usam a minha família de forma cruel e desumana visando me atingir.”

Prerrogativas. Como Cunha renunciou ao comando da Câmara, ele perderá algumas prerrogativas que mantinha mesmo afastado do cargo. A residência oficial em Brasília deverá ser desocupada. O prazo para que a casa seja devolvida costuma ser de 30 dias. Cunha deve perder o carro oficial também, assim como a escolta da Polícia Legislativa. A segurança – que pode ser requisitada por qualquer parlamentar – só será mantida se o deputado solicitar.

Cunha renuncia e manobra para tentar salvar mandato

• Acusado chora, mas não convence críticos • Acordo pode devolver processo ao Conselho • Eleição na Câmara é marcada para dia 12

Réu na Lava-Jato, afastado do cargo pelo Supremo e ameaçado de prisão e cassação, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) renunciou ontem à presidência da Câmara para tentar salvar seu mandato e manter o foro especial. Um ano e cinco meses depois de ser eleito para comandar a Câmara, Cunha saiu sob pressão até de aliados e após costurar um acordo que pode mudar a decisão do Conselho de Ética de abrir processo de cassação contra ele. Ao renunciar, o deputado acusado de receber propinas se disse vítima de perseguição e afirmou que a Câmara está “acéfala, numa interinidade bizarra”, referindo-se ao presidente interino, Waldir Maranhão, indicado por ele para a Mesa Diretora. Contrariando seu estilo frio, Cunha chorou ao falar da mulher e da filha, investigadas na Lava-Jato, mas não convenceu seus adversários. A Câmara marcou para a próxima terça-feira a eleição do novo presidente, que terá mandato-tampão até fevereiro do ano que vem.

Renúncia estratégica

• Cunha abre mão da presidência da Câmara para tentar salvar seu mandato

Isabel Braga, Eduardo Bresciani, Evandro Éboli, Letícia Fernandes, Simone Iglesias e Catarina Alencastro - O Globo

-BRASÍLIA- Afastado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), nove meses depois de se tornar alvo de um lento processo no Conselho de Ética, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, renunciou ontem ao cargo, em decisão construída com líderes do centrão. Réu em dois processos por corrupção na Lava-Jato e alvo de quatro inquéritos criminais no Supremo, Cunha tentou uma última cartada para tentar salvar o mandato e continuar com o foro privilegiado no STF, mantendo a rotina de incontáveis manobras que vem usando no processo de cassação.

A decisão, antecipada pelo colunista Ilimar Franco, do GLOBO, abriu a corrida sucessória na Casa e já tem 15 candidatos no páreo. Líderes do centrão, que tem o apoio de 280 deputados, convocaram a eleição para a próxima terça-feira, contrariando decisão do presidente interino da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), que já havia convocado a votação para a próxima quinta, último dia do prazo regimental para a realização da eleição para escolha do sucessor para o mandato-tampão até 1º de fevereiro de 2017.

Para aceitar renunciar, Cunha iniciou a costura de um acordo com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Osmar Serraglio (PMDB-PR), para que o processo de cassação seja devolvido ao Conselho de Ética, com o objetivo de ganhar tempo e atrasar a votação do pedido de cassação do mandato no plenário. No momento da renúncia, na contramão da imagem de frio e controlado, Cunha se emocionou e chorou, ao falar de sua mulher, Cláudia Cruz, e da filha Danielle Dytz, também investigadas na Lava-Jato.

O deputado, também afastado do mandato pelo Supremo, reuniu na madrugada de ontem, na residência oficial da Câmara que ainda ocupa, seus principais aliados e anunciou que renunciaria às 13h. Desde que foi afastado do mandato e da presidência, por suspeita de atrapalhar as investigações e o processo de quebra de decoro contra ele no Conselho de Ética, Cunha estava sendo pressionado pelos aliados para renunciar à presidência da Casa.

Ontem, para o anúncio da renúncia, na qual leu uma carta, ele cercou-se dos principais aliados. Os poucos chegavam, silenciosos, na chapelaria da Casa. O ainda presidente afastado foi recebido em clima de consternação e de pouca euforia.

Cunha contou com todo o aparato de seguranças e funcionários da Câmara para anunciar a renúncia. Depois de ler a carta, recolheu-se em uma sala ao lado e recebeu a solidariedade de alguns líderes e deputados. Minutos depois, usou a rampa do Congresso Nacional para deixar o prédio na sua despedida do cargo, que ocupou por um ano e meio.

O presidente interino, Michel Temer, estava reunido com os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Dyogo de Oliveira (Planejamento) debatendo o déficit fiscal do próximo ano, quando Cunha anunciou a renúncia. Um assessor entrou no gabinete para ligar a TV.

Temer já sabia desde a noite de quarta-feira sobre a renúncia. Osmar Serraglio, da Comissão de Constituição e Justiça, esteve no Palácio do Planalto para avisá-lo e informar sobre as negociações para o retorno do processo contra Cunha para o Conselho de Ética.

Integrantes do governo disseram que foi um processo construído ao longo das últimas semanas e que, ontem, o que ocorreu foi “o ato final”. Na avaliação do Planalto, a renúncia foi um gesto de desespero, porque Cunha perdeu o “timing”. Agora, disseram auxiliares de Temer, ele dificilmente escapará da cassação. Na conversa que tiveram no Palácio do Jaburu, há duas semanas, Cunha pediu a Temer que interviesse, ajudando a conquistar votos contra o seu afastamento. O presidente, no entanto, disse que não poderia se comprometer.

— Cunha queria que o governo fosse o fiador da sua salvação. Mas o governo não poderia garantir votos de deputados na frente do microfone com pressão da população. Temer sugeriu a ele que combinasse com os líderes partidários — disse um auxiliar presidencial.

Cunha terá 30 dias para deixar a residência oficial da Câmara dos Deputados. Também perderá o direito a usar o avião da FAB, os carros e os seguranças da Casa. A renúncia dele poderá complicar ainda mais sua situação no Supremo. A partir de agora, os processos contra o deputado vão ser julgados na Segunda Turma da Corte, e não mais no plenário do tribunal. Nas turmas, as decisões costumam ser mais rápidas, o que vai contra a estratégia dos advogados de defesa do deputado.

Acordo que levou à renúncia teve aval de Temer e PMDB

• Processo de cassação de Cunha deve voltar ao Conselho de Ética

Júnia Gama e Isabel Braga - O Globo

-BRASÍLIA- O acordo que possibilitou a renúncia do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) à presidência da Câmara consistiu na promessa de lhe dar uma sobrevida com a devolução de seu processo ao Conselho de Ética. Em uma articulação que contou com o aval do presidente interino, Michel Temer, e da qual participaram o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Osmar Serraglio (PMDB-PR), além de outros parlamentares do PMDB e de partidos da base, ficou decidido que, em troca da renúncia, o processo de cassação do mandato seria devolvido, de ofício, ao conselho.

O acordo foi fechado na noite de quarta-feira. Logo após anunciar sua renúncia, no início da tarde de ontem, Cunha se dirigiu à CCJ, onde protocolou um aditamento pedindo que seu processo seja devolvido ao Conselho de Ética, com o argumento de que seu julgamento no colegiado ocorreu levando em conta que ele presidia a Câmara, situação que agora mudou. O ofício será encaminhado ao relator do processo de Cunha na CCJ, deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), que, de acordo com a negociação, daria parecer favorável ao pedido. Em seguida, Serraglio daria despacho favorável à devolução do processo.

Após receber o ofício de Cunha, Serraglio cancelou a sessão da CCJ da próxima segunda-feira. Com isto, as chances de votação do processo de cassação de Cunha antes do recesso parlamentar se tornaram praticamente nulas.

— Cancelei para que não haja nenhuma nulidade — alegou Serraglio.

Por meio de assessoria, o Palácio do Planalto negou “terminantemente” qualquer interferência na articulação pela renúncia de Cunha. Na terça-feira, O GLOBO mostrou que Temer aconselhou Cunha a renunciar ao cargo.

Para os participantes da articulação, está claro que a manobra não salvará Cunha da cassação do mandato, mas lhe dará uma sobrevida para trabalhar sua defesa no Supremo Tribunal Federal e negociar uma saída para sua mulher, Cláudia Cruz, também ré na Lava-Jato, e sua filha Danielle Dytz, investigada na operação. Há uma forte preocupação, tanto no Planalto, quanto entre os parlamentares, com a possibilidade de Cunha tomar “atitudes desesperadas” para proteger sua família.

— Sabemos que haverá reação contrária a esta articulação, mas é preciso calcular o custo-benefício. Ele renunciou, que é o que todos desejavam, e ganhará um tempo para trabalhar em sua defesa. Sabe-se lá que reações pode ter um animal que está encurralado. Acaba sobrando para todo mundo – afirmou ao GLOBO uma fonte a par das negociações.
Ronaldo Fonseca negou que já tenha decidido dar parecer favorável ao pedido de Cunha. Segundo o deputado, ele foi procurado ontem por Osmar Serraglio e informado de que chegaria à comissão o aditamento, alegando que Cunha foi julgado como presidente, e não como deputado.

— Serraglio terá que me notificar e serei obrigado a me pronunciar. Assinar para devolver para a estaca zero? Está louca? Eu teria que mudar do Brasil — disse Fonseca.

Oposição agora espera cassação e prisão

• Cardozo vai anexar carta de renúncia à defesa de Dilma no impeachment

Cristiane Jungblut e Leticia Fernandes - O Globo

-BRASÍLIA- A manobra envolvendo a renúncia de Eduardo Cunha à presidência da Câmara foi explorada pela cúpula do PT, que usou o fato para atacar o governo interino de Michel Temer e reforçar a guerra contra o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. No início da noite de ontem, Dilma se reuniu com a cúpula do PT e dirigentes do PCdoB, do PDT e de movimentos sociais no Palácio da Alvorada. Ela estava reunida com assessores à tarde, no momento da renúncia de Cunha. Como primeira reação, o ex-ministro José Eduardo Cardozo, advogado de defesa da presidente afastada na comissão do impeachment, disse que vai anexar a carta de renúncia de Cunha como prova na defesa de Dilma.

No encontro à noite, Dilma fez uma avaliação da conjuntura e, segundo relatos, falou sobre suas viagens pelo país e encontro com senadores indecisos.

— Sabemos que essa renúncia faz parte de um acordão maior. A simples renúncia não impacta muito (nos trabalhos da comissão do impeachment). Vamos lutar para que Cunha seja cassado no plenário, e vamos denunciar os partidos que defenderem o mandato dele — disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que esteve no Alvorada.

AO GLOBO, Cardozo disse que Cunha confessou ter agido por vingança contra Dilma quando declarou que foi perseguido por ter aberto o processo de impeachment na Câmara.

— Isso mostra o caráter de vingança dele, porque o PT não fez qualquer tipo de acordo com ele. É mais uma prova, há evidências de desvio de poder — disse Cardozo.

O líder do PT na Câmara, Afonso Florence (BA), esteve no Alvorada e disse que a luta “anti-golpe” continua. Num ato falho, ao fazer a associação entre Temer e Cunha, o petista chamou o deputado afastado de “Michel Cunha”.

— É um acordo entre Eduardo Cunha e Michel Temer. É uma renúncia prevista que tem por objetivo blindá-lo para preservar o seu mandato e continuar a servir ao governo que ele elegeu — disse Florence.

As críticas não partiram só da oposição. O líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM), reagiu à manobra de adiamento da sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para votar o recurso de Cunha:

— Já cancelaram a sessão da CCJ. Isso é muito sintomático. Não podemos concordar com essas coisas. Afinal, estaremos elegendo o presidente da Câmara e o vice-presidente da República.

O mais fiel aliado de Cunha, Carlos Marum (PMDB-MS), se disse triste, mas com a consciência tranquila.

— Eu fico triste porque tenho medo de que exista nisso tudo uma grande injustiça. Não havia como resistir a esse tsunami de pressões que o deputado vinha recebendo.

O líder do PSOL na Câmara, Ivan Valente (SP), comemorou duas vitórias:

— A primeira vitória é o fim da desmoralização da Câmara dos Deputados. E a segunda vai ser a cassação e prisão de Eduardo Cunha. Eduardo Cunha não comove ninguém.

O vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC) , disse que Cunha expôs as "vísceras" da crise gerada pelo impeachment :

— O grande artífice, o grande engenheiro do impeachment hoje renunciou.

Sucessão já tem pelo menos 15 candidatos

• Disputa pela vaga de Cunha começa concorrida, e falta de consenso provoca briga até sobre data da votação

Júnia Gama, Leticia Fernandes, Eduardo Bresciani e Evandro Éboli - O Globo

-BRASÍLIA- A largada para a sucessão do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi dada ontem mesmo, imediatamente após sua renúncia à presidência da Câmara. Até o momento, já são nada menos que 15 candidatos à vaga, sendo que pelo menos dez deles integrantes da base aliada do governo do presidente interino, Michel Temer. Há a expectativa, no entanto, de que esse número seja reduzido para menos de cinco candidatos até o início da sessão de votação, na próxima terça-feira, quando será escolhido o deputado que comandará a Câmara em um mandato-tampão de seis meses.

Foram os líderes dos partidos que marcaram a eleição terça-feira, depois de se reunirem para derrubar a decisão inicial do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), que havia convocado o pleito para quinta-feira, último dia do prazo regimental (de cinco dias úteis após a renúncia).

Divergências na reunião
Irritados com a antecipação do pleito, PSDB, DEM, Rede e PSB se retiraram da reunião de líderes. Mesmo assim, segundo integrantes da base aliada de Temer, a decisão teve respaldo de 280 deputados, mais que os 257 necessários para derrubar a data determinada por Maranhão. A eleição começará às 13h59m de terça-feira, e o prazo de inscrição de candidatos vai até meio-dia.

Com isso, fica inviabilizada a realização da sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) que analisaria o recurso de Cunha contra a aprovação de sua cassação no Conselho de Ética. Isso porque o presidente da CCJ, Osmar Serraglio (PMDB-PR), cancelou a sessão da CCJ marcada para segunda-feira e convocou nova reunião para terça à tarde. Como O GLOBO informou, Serraglio também aceitou um acordo, articulado junto a parlamentares da base, de devolver o processo de Cunha ao Conselho de Ética em troca da renúncia do peemedebista da presidência.

O líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), defendeu uma sucessão rápida para o lugar de Cunha. A exemplo do líder do PSD, Rogério Rosso (DF) — a favor de quem o Planalto trabalha discretamente —, Moura queria que a eleição ocorresse segunda-feira. O argumento é que, dessa forma, seria possível ainda votar projetos de interesse do governo na próxima semana, antes do recesso branco.

O motivo real, no entanto, é viabilizar a eleição de um aliado de Cunha, que seria Rosso ou o líder do PTB, Jovair Arantes (GO), que estão há semanas em campanha velada para a presidência da Câmara. Com a antecipação da eleição, os demais candidatos terão pouco tempo para fazer campanha.

— Esperamos que seja da forma mais rápida possível. O regimento fala em até cinco sessões de prazo, mas nós esperamos que os líderes e o presidente interino, Waldir Maranhão, entendam a importância disso para termos estabilidade e para a pauta do governo, que é a do país — disse Moura.

Na avaliação de fontes do Palácio do Planalto, haverá “uma depuração natural” no número de candidatos até a data da eleição. Muitos nomes são colocados apenas como moeda de troca para pleitos junto ao governo ou para acordos internos na Câmara. O Planalto tentará evitar uma fragmentação de sua base.

Por esse motivo, os candidatos mais cotados ainda negam que estejam na disputa, aguardando que saia um consenso da base aliada. Os partidos da antiga oposição — PSDB, DEM, PPS e PSB — negociam um acordo para eleger agora um nome do Centrão em troca de receberem o apoio do governo e do PMDB para o comando na Câmara no biênio 2017-2018. O assunto foi objeto de conversa entre Temer e o presidente do PSDB, Aécio Neves (MG).

— Não sou candidato. Entendo que precisamos procurar o maior consenso possível. Não serei o vigésimo primeiro candidato. O ideal é buscar consenso na base, mas acho difícil — disse Rosso.

Jovair Arantes também negou veementemente ser candidato:

— Eu não sou candidato a esse mandato, é coisa decididíssima. Vou discutir a possibilidade de ser candidato em fevereiro, para o próximo biênio — disse.

Centrão sem consenso
Um dos mais próximos aliados de Cunha, o deputado Marcelo Aro (PHSMG) admite que o centrão não tem um nome de consenso, e que é preciso construir candidatura da base aliada:

— Que teremos um candidato do centrão, é certo. Mas é preciso encontrar um nome que una a base aliada de Temer. Se tivéssemos 100% de unidade no centrão, não precisaríamos negociar.

No PMDB, há os que defendem que o partido tenha um candidato, mas os líderes do centrão afirmam que é hora de o PMDB ceder. Segundo interlocutores, Temer fará uma articulação discreta em relação à disputa. Embora publicamente o discurso seja de que ele não deve se envolver com o assunto, aliados argumentam que o cargo é algo fundamental para a boa atuação do governo, e Temer não pode deixar “correr solta a disputa”.

“Momento histórico”
O Planalto espera que o próximo presidente esteja “à altura do momento político”. Auxiliares de Temer lembraram a solução encontrada após a renúncia de Severino Cavalcanti. O então deputado Aldo Rebelo (PCdoB) foi eleito para mandato-tampão. De partido pequeno, tinha bom trânsito na Casa.

— É preciso alguém com estatura que o momento histórico exige — disse um interlocutor de Temer.

A deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) foi uma das que formalizaram sua candidatura. Única mulher na disputa, ela defendeu mais representação feminina no Parlamento e afirmou já ter iniciado conversas com a bancada evangélica, com deputados do centrão e com a bancada feminina atrás de apoios:

— Já estava na minha cabeça me colocar como candidata, é impressionante essa sub-representação feminina. Por que não presidir o Legislativo? Tenho condições. Agora que existe uma vacância real, tenho uma candidatura real.

O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) resumiu o clima da disputa:

— Essa será a gestão da cadeira elétrica com colonoscopia. (Colaboraram Catarina Alencastro e Simone Iglesias)

Renúncia de Cunha foi decidida de madrugada junto com aliados

• Segundo depoimentos, Cunha ouviu que, pelo bem da Câmara, sua saída era indispensável porque a situação havia chegado ao limite

Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A decisão de renunciar à presidência da Câmara foi tomada entre o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e seus aliados na madrugada desta quinta-feira, 7. Cunha ouviu um por um e decretou, às 3h da madrugada: "Todo mundo concorda? Então será feita amanhã às 13h". Nesta quinta, Cunha foi recebido pelos aliados na Câmara e ao final do pronunciamento recebeu os cumprimentos dos deputados em uma sala reservada.

As conversas sobre a renúncia já vinham acontecendo nas últimas semanas devido ao agravamento da instabilidade política na Câmara e aos problemas causados pelo presidente interino Waldir Maranhão (PP-MA), mas nenhuma até então tinha sido conclusiva. À medida que a decisão de renunciar foi amadurecendo, Cunha começou a preparar a carta de renúncia.

Segundo depoimentos, Cunha ouviu que, pelo bem da Câmara, sua renúncia era indispensável porque a situação havia chegado ao limite. Fontes afirmam que ele está consciente de que dificilmente conseguirá escapar da cassação. "Nem ele acha que a renúncia é suficiente para salvar o mandato dele", disse um parlamentar.

Participaram da reunião da madrugada os líderes Jovair Arantes (PTB-GO), Baleia Rossi (PMDB-SP), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), André Moura (PSC-SE), Aelton de Freitas (PR-MG), Marcelo Aro (PHS-MG) e Rogério Rosso (PSD-DF), este último o mais cotado para suceder Cunha na presidência. O peemedebista marcou o horário do anúncio para as 13h desta quinta porque precisaria comunicar ao Supremo Tribunal Federal (STF) de manhã sobre sua ida à Câmara.

"Ele tomou a decisão no tempo certo, na hora certa. A Casa tem que entender como um gesto positivo", disse o líder do PTB, Jovair Arantes, referindo-se ao processo de cassação em andamento. Jovair afirmou que a decisão de Cunha mostrou "respeito" pela Casa e que fez questão de manifestar solidariedade ao peemedebista.

O deputado Marcelo Aro disse que só viu Cunha aos prantos como nesta quinta em uma situação: no dia em que o STF decidiu pelo seu afastamento do cargo. "Nem na busca e apreensão foi assim", contou.

A deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) destacou o papel do peemedebista na aprovação do afastamento da presidente Dilma Rousseff. "Ele teve seu papel, engrandeceu o Legislativo e nos ajudou a nos livrarmos da 'democratura' do PT", declarou.

Sucessão. Com a renúncia de Cunha, está oficialmente aberta a temporada de disputa pela presidência da Câmara. Entre os 12 nomes cotados, Rosso é o que mais agrada aos partidos do centrão (bloco formado por 13 partidos) por se tratar de um perfil conciliador e com capacidade de unir os partidos da base governista. O grupo quer agora se aproximar do PSDB.

Até o momento, 12 parlamentares se colocaram para a disputa, incluindo Rosso. Do PSB: Hugo Leal (RJ), Heráclito Fortes (PE) e Júlio Delgado (MG); do DEM: Rodrigo Maia (RJ) e José Carlos Aleluia (BA); além de Esperidião Amin (PP-SC), Carlos Manato (SD-ES), Beto Mansur (PRB-SP) e Fernando Giacobo (PR-PR). O líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA), também foi mencionado e como uma ala do PMDB acredita que deve assumir a vaga, o nome do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Osmar Serraglio (PMDB-PR), também entrou na bolsa de apostas.

A preocupação do centrão é a mesma da antiga oposição ao governo Dilma Rousseff: não indicar nenhum investigado da Operação Lava Jato. "Isso é consenso e eliminou alguns nomes do processo", contou um parlamentar.

Cientes de que a disputa pode se transformar numa "guerra" se não houver consenso entre os aliados, a palavra de ordem no centrão é "não dormir". "Cabe à base ter juízo de achar um nome que dê governabilidade", pregou Aro. Os próximos dias serão de negociações para a escolha do sucessor de Cunha.

Governo Temer vê saída de Cunha com alívio

• Às vésperas de completar dois meses no cargo, o próprio presidente em exercício conversou com o deputado e o aconselhou a renunciar ao comando da Câmara para tentar preservar o mandato

Vera Rosa - O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A renúncia do deputado afastado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), à presidência da Câmara nesta quinta-feira, 7, foi encarada pelo Palácio do Planalto como solução para distensionar o clima de instabilidade que tomou conta da Casa. A saída de Cunha representa, na prática, a retirada de mais uma pedra no sapato do presidente em exercício, Michel Temer, que aposta no afastamento definitivo de Dilma Rousseff.

Às vésperas de completar dois meses no cargo, o próprio Temer conversou com Cunha, acossado por investigações da Operação Lava Jato, e o aconselhou a renunciar ao comando da Câmara para tentar preservar o mandato. Nos bastidores do Planalto, a avaliação é que o governo só tem a ganhar com essa queda, pois, apesar da briga que se seguirá pela presidência da Câmara, o cenário não parece mais tão imponderável para Temer.

Mesmo com 12 deputados da base aliada disputando a cadeira de Cunha, Temer não terá mais um “bode na sala” durante as votações nem Waldir Maranhão (PP-MA) atazanando sua vida. O discurso oficial é que o governo não tem candidato, já que a ideia é não levar para o Planalto esse embate. Hoje, no entanto, o nome que conta com a maior simpatia do governo para ocupar a vaga de Cunha é o de Rogério Rosso (PSD-DF), também ligado ao ex-presidente da Câmara.

Temer ficou muito irritado com a derrota sofrida na quarta-feira, 6, na Câmara, quando o governo não conseguiu aprovar a urgência constitucional do projeto que trata da renegociação das dívidas dos Estados com a União. No Planalto, o comentário é que, se Cunha não saísse o mais rápido possível da presidência da Câmara, outras votações seriam contaminadas. Na contabilidade do governo, Temer já possui 60 dos 81 votos de senadores para derrotar Dilma e aprovar o impeachment, em agosto. O presidente em exercício tem feito todas as articulações políticas possíveis para não pôr em risco essa maioria. O Placar do Impeachment do Estado, no entanto, aponta 38 votos favoráveis ao afastamento e 18 contrários.

Deputados disputam vaga de Cunha

Por Raphael Di Cunto, Thiago Resende e Maria Cristina Fernandes - Valor Econômico

BRASÍLIA E SÃO PAULO - A renúncia de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) à presidência da Câmara dos Deputados, antecipada ontem pelo Valor, deixa a Casa frente a uma eleição com vários candidatos. Pelo menos dez nomes da base aliada se lançaram candidatos. Hoje, os quatro nomes mais fortes são: o líder do PSD, Rogério Rosso (DF); o segundo-vice-presidente da Câmara, Fernando Giacobo (PR-PR), Heráclito Fortes (PSB-PI) e Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Ainda à espera da definição do processo de impeachment no Senado, o presidente interino, Michel Temer, tem seu cacife diminuído para influenciar a sucessão naquela Casa. O substituto de Cunha terá um mandato tampão, uma vez que a Câmara vai eleger um novo presidente na abertura do biênio legislativo em 2017. Quem suceder Cunha vai se tornar o presidente em exercício na ausência de Temer.

Terá ainda a responsabilidade de comandar a Casa na tramitação de projetos cruciais ao ajuste fiscal, como a proposta de emenda constitucional que fixa um teto para os gastos públicos, o projeto que renegocia as dívidas dos Estados e a reforma da Previdência.

A disputa principal será dentro da base de Temer, entre o centrão (PP, PR, PSD, PTB, PRB, PSC) e a antiga oposição (PSDB, DEM, PPS e PSB). No acerto com aliados para anunciar a renúncia, Cunha negociou ajuda para salvar seu mandato da cassação - e evitar que as ações nas quais é réu sejam encaminhadas para a Justiça Federal em Curitiba, onde as condenações têm sido

Chorando, Cunha renuncia à presidência da Câmara

Débora Álvares, Gabriel Mascarenhas, Daniela Lima, Rubens Valente, Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Eduardo Cunha (PMDB-RJ) renunciou nesta quinta-feira (7) à presidência da Câmara dos Deputados. Ele anunciou a decisão em uma coletiva de imprensa, durante a qual chorou.

Agora, a Casa tem cinco sessões para realizar novas eleições para o cargo.

"É público e notório que a Casa está acéfala", afirmou, acrescentando que só sua renúncia poderia pôr fim ao impasse. "Estou pagando um alto preço por ter dado início ao impeachment."

O peemedebista disse que vai continuar defendendo sua inocência e acusou a Procuradoria-Geral da República de agir com seletividade abrindo inquéritos e apresentando denúncias com o intuito de desgastá-lo como presidente da Câmara.

A decisão de enfim deixar o cargo em definitivo ocorreu em reunião na noite de quarta (6), após a divulgação do voto de Ronaldo Fonseca (Pros-DF) na Comissão de Constituição e Justiça, que acatou apenas um dos 16 questionamentos de Cunha à tramitação de seu processo no Conselho de Ética, que recomendou a cassação de seu mandato.

Com a renúncia, Cunha pretende ter um aliado comandando a Câmara durante a sessão em que será votado o seu processo de cassação, já que Waldir Maranhão (PP-MA) rompeu com ele havia algum tempo.

O nome pelo qual ele tem predileção para ocupar o mandato-tampão pelos próximos meses é do deputado Rogério Rosso (PSD-DF), mas há pelo menos 12 candidatos informais na Casa para disputar o pleito.

Até aliados do peemedebista dizem acreditar, porém, que as chances de o deputado escapar da punição são pequenas. Desde que foi afastado do cargo e do mandato pelo STF, Cunha vem perdendo força pouco a pouco na Câmara. Mas ainda reúne apoio político para influenciar a sua sucessão.

E mesmo com a avalanche de acusações de envolvimento no petrolão e com o afastamento determinado pelo STF, Cunha conseguiu obter 9 votos favoráveis a ele no Conselho de Ética (de um total de 20) e tinha, segundo aliados e até adversários, 30 dos 66 votos da Comissão de Constituição e Justiça.

Além disso, conseguiu apesar de todo o cenário desfavorável a ele ser recebidohá alguns dias no Palácio do Jaburu por Michel Temer, mesmo nunca tendo tido uma relação de proximidade com o presidente da República interino. Ministros de Temer também atuam nos bastidores a favor do peemedebista.

Cassação do mandato é a resposta apropriada - Merval Pereira

‘‘O resultado da eleição para a presidência da Câmara será uma boa medida de como vão as coisas’’

- O Globo

Só a cassação daria ao governo nova perspectiva. É um despautério do advogado da presidente afastada afirmar que a renúncia de Eduardo Cunha ajuda sua cliente, embora seja compreensível que José Eduardo Cardozo tente de tudo para criar um ambiente favorável a Dilma.

Nem mesmo se a renúncia ficar caracterizada como um acordo espúrio para salvar o mandato de Cunha, a presidente afastada será beneficiada. Se acordo houver, e acobertado pelo presidente interino, Michel Temer, a Câmara aprofundará sua desmoralização diante da opinião pública, e Temer confirmará que está mais para um político oportunista do que para um estadista com a exata noção dos desafios que tem pela frente.

Mas isso não trará de volta a presidente Dilma, pois ela não representa, embora finja, a nova política deslocada do poder pela velha. Ela simplesmente tentou fazer a velha política com hegemonia do PT, deixando de lado os demais partidos da base aliada, como se eles se satisfizessem apenas com o dinheiro desviado das estatais e órgãos públicos.

Não, eles queriam também repartir o poder político, coisa que o PT nunca deixou, e Temer faz com prazer. Confirmado o chamado “acordão”, teremos a confirmação também de que a velha política continua mandando, mas isso não absolve Dilma dos crimes que cometeu. Passaremos então a ter as mesmas preocupações, agora com o governo Temer, que não estará à altura do momento.

Mas, se ao contrário, se tivermos a prova de que o presidente interino agiu no interesse do país, ao recomendar que Cunha renunciasse, podemos estar diante de um momento inaugural em que os representantes da velha política do PMDB retomam o papel de defensores da democracia, entendendo que o momento é de colocar os interesses do país acima dos pessoais.

Parece improvável, mas a situação em que estamos metidos também o é. O resultado da eleição para a presidência da Câmara será uma boa medida de como vão as coisas. A vitória de um candidato ligado a Cunha aprofundará a crise. Ganhando um nome desligado do centrão, o governo Temer pode ter nova configuração.

Somente a cassação do mandato de Eduardo Cunha, para que seja julgado por seus crimes sem a proteção do foro privilegiado, será resposta apropriada da Câmara aos anseios da sociedade.

E o governo Temer poderá então começar, aproveitando a chance que recebeu, sob uma nova perspectiva histórica.

O fim da lenda Cunha - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

A renúncia de Eduardo Cunha à presidência da Câmara põe um ponto final na lenda urbana segundo a qual seus poderes seriam ilimitados, sua rede de proteção inexpugnável e sua influência no mundo político inesgotável. Conforme já sobejamente demonstrado na derrocada do PT, e de Lula em particular, poderosos podem muito, mas não podem tudo. Há limite para o erro, que se localiza exatamente na perda de apoios à medida que aliados vão percebendo que determinadas alianças rendem mais prejuízos que benefícios.

Cunha afastou-se com um discurso cujo prazo de validade estava vencido. Não mencionou as agruras que enfrenta, não fez referência à pá de cal posta sobre ele no dia anterior na sessão da Comissão de Constituição e Justiça, não falou sequer em “renúncia”. Procurou dar a impressão de que se afastava para permitir que a Câmara pudesse se livrar de uma presidência “bizarra”, referindo-se ao antigo parceiro Waldyr Maranhão.

A ideia era construir uma saída menos desonrosa, como se fosse possível. Na verdade, uma hipótese levantada pelo presidente em exercício Michel Temer, nas conversas que teve com ele a respeito do tema. Um conto da carochinha, relatado apenas para conseguir quebrar a resistência dele à renúncia. Outras histórias contadas a fim de que a fera ferida não se sentisse irremediavelmente sem saída foram as de que ele poderia com seu gesto levar seus pares a lhe preservar o mandato (medida protetiva contra a aproximação do juiz Sérgio Moro)e também influir na eleição do próximo presidente da Câmara.

Duas tolices. Na verdade, três, pois a primeira subjacente às outras duas seria a garantia dada a ele pelo Palácio do Planalto. O governo quer vê-lo longe. E, ainda que não quisesse, não teria instrumentos para transformar a influência do repúdio da sociedade a Cunha sobre os deputados em votos eleitoralmente suicidas. A menos que o plano da Câmara seja assinar um contrato de desmoralização coletiva, Cunha será cassado. Quanto à hipótese de ingerência na eleição do próximo presidente, trata-se de uma possibilidade inexistente, risível mesmo.

Eduardo Cunha hoje é visto como má companhia. Além disso, não dispõe mais de instrumentos para manter unida uma tropa. Acabou-se, perdeu tudo, entre outros motivos porque o excesso de auto-confiança o fez esticar a corda muito além dos limites suportáveis por possíveis aliados. Ele não é mais referência que, agora, volta a ser o Palácio do Planalto e seus eficientes mecanismos de convencimento.

Na aflição, a renúncia induzida por Temer - José Casado

- O Globo

Temer é o maior beneficiário da decisão de Cunha. Depois de ler a carta de Eduardo Cunha, um eleitor distraído poderia acreditar que o deputado fluminense, no sofrimento de “muitas perseguições”, como escreveu, foi vitimado numa espécie de assassinato político que acabou por levá-lo a renunciar à presidência da Câmara.

Puro embuste, por variadas razões. Uma delas é porque ele não caiu em cilada, mas se tornou prisioneiro do enredo de pabulagens que vem construindo desde o final dos anos 80, quando intensificou a mistura de política com negócios, sob orientação do falecido PC Farias, tesoureiro do ex-presidente Fernando Collor.

O senador Collor e o deputado Cunha hoje dividem a atenção de policiais, procuradores e juízes encarregados dos inquéritos sobre corrupção e lavagem de dinheiro em contratos da Petrobras.

Além disso, a “exumação” inicial dessa renúncia revela que o deputado do PMDB fluminense cometeu o equivalente a um suicídio político por causa dos “apelos generalizados dos meus apoiadores”, como escreveu.

Cunha apenas omite que foi induzido pelo principal beneficiário político da sua imolação na presidência da Câmara: Michel Temer, presidente interino da República.

Temer livrou-se de seu maior problema no Legislativo — a trava imposta à Câmara, que estava “acéfala” numa “interinidade bizarra”, como, aliás, admitiu Cunha no texto de despedida. O Supremo não apenas o havia afastado como o proibira de pisar na Casa.

A cerimônia do adeus começou a ser desenhada de forma involuntária na quarta-feira, em Brasília. Cunha estava na luta pela salvação do mandato, em conversas na residência oficial da presidência da Câmara, quando recebeu um telefonema.

Foi surpreendido e contagiado pela aflição da mulher, Cláudia, investigada por lavagem de US$ 1 milhão em parceria com o marido. Estava visivelmente abalado ao desligar, testemunharam.

Mais tarde, Cunha telefonou a Temer. Não se conhece o teor da conversa. Sabe-se que foi suficiente para instigá-lo a rasgar a madrugada rascunhando a carta-renúncia, recebida às 13h11m de ontem pelo presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão.

Sabe-se, também, que Temer usou esse telefonema para completar uma cartada iniciada numa noite da semana passada, quando Cunha foi visitá-lo no Palácio da Alvorada. O nome desse jogo: renúncia.

Perdeu o timing - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

O deputado Eduardo Cunha fez a coisa certa, na hora errada. Ao renunciar à presidência da Câmara, ele tenta desesperada e inutilmente salvar o mandato, mas é tarde demais. Ele já estava fora da presidência de fato, já tinha perdido apoios em todos os partidos e já se transformara num estorvo para o Palácio do Planalto do correligionário Michel Temer. Logo, sua renúncia é um alívio para todos, menos para ele próprio, pois não deve lhe conferir nenhum voto a mais nem na CCJ nem no plenário.

Cunha acabou e o mundo político nem discute mais o que fazer ou o que vai acontecer com ele. O que interessa agora é o que fazer com a presidência da Câmara, que foi entregue primeiro a ele, apesar de toda a sua biografia e as nuvens de suspeitas que carrega em sua vida pública, e depois a Waldir Maranhão, considerado por dez entre dez parlamentares como o homem errado, no lugar errado, na hora errada.

A última tacada espetacular tentada por Cunha é justamente fazer o seu sucessor, mas as chances encolhem na proporção inversa da sua desgraça. Até para Temer, ou principalmente para Temer, é impensável ter um apadrinhado de Cunha simultaneamente na liderança do governo (André Moura) e na presidência da Câmara (Rogerio Rosso?).

Contra um candidato de Cunha e do “Centrão”, há uma dúzia de candidatos que têm um único ponto em comum: são todos contra Cunha. Se há tantas opções é porque não há nenhuma efetivamente, mas o perfil parece estar traçado: não pode ser do PT, do PSDB nem do PMDB, não pode ser um óbvio ficha suja, nem pode ter sido gritantemente pro nem contra o impeachment de Dilma Rousseff. Por que? Porque precisa ser minimamente consensual, não um reforço ao grave racha da Câmara.

O fato é que, quanto mais alto, maior o tombo. A queda de Cunha, portanto, é um tombo fenomenal, porque ele foi o presidente mais forte da Câmara em décadas e sai do cargo isolado, abatido, com os olhos cheios de lágrimas e, pior, enrolado até o último fio de cabelo na justiça.

Sem a presidência, Cunha não tem mais força política para manter o mandato. Sem o mandato, perde o foro privilegiado. Sem o foro privilegiado, sai do Supremo direto para… o juiz Sérgio Moro. Para muitos, é sinônimo de estar a caminho da cadeia.

Renúncia não resolve o problema - Míriam Leitão

• “A Câmara está ferida e, para uma restauração, precisaria de uma pessoa sobre a qual não pairassem dúvidas éticas”

- O Globo

Cunha não resume o drama político do país. A renúncia de Eduardo Cunha à presidência da Câmara dos Deputados fecha um ciclo, mas não resolve o problema. O longo processo até sua queda revelou muito da fragilidade institucional da Casa, que ele comandou de forma imperial demais, por muito tempo. A Câmara está ferida e, para uma restauração, precisaria de uma pessoa sobre a qual não pairassem dúvidas éticas.

O governo tentará escolher um candidato que una a base, mas é preciso mais que isso. O processo de representação política no Brasil está em frangalhos, após todas as revelações que os investigadores da Lava-Jato fizeram sobre os parlamentares.

Cunha tentou fazer o país inteiro de bobo negando a titularidade dos recursos no exterior. Um “trust” é apenas um produto financeiro que o cliente do banco escolhe. Ele pode ter conta-corrente, ou escolher outra modalidade de depósito na instituição. Com essa confusão deliberada, e primária, o deputado manipulou o Conselho de Ética da Casa por longos meses.

Ao renunciar, ele apresentou mais uma vez a versão de que está sendo punido por ter tido a coragem de conduzir o processo que tirou o poder o PT. Do que falou, a única verdade foi que o governo Dilma deixou como herança 12 milhões de desempregados e a desordem fiscal. Por isso, os próprios petistas não querem a volta da presidente. Sabem que a administração ruinosa deixa poucas possibilidades de sucesso ao governante, seja ele qual for. Mas, evidentemente, não foi por aceitar a denúncia contra a presidente que ele foi levado à renúncia. Cunha caiu pelos seus muitos erros, alguns cometidos em consórcio com o governo contra o qual investiu.

O vice-presidente da Caixa Econômica Federal, Fábio Cleto, foi nomeado por ele no governo Dilma. E a presidente afastada aceitou que ele o nomeasse sem fazer maiores perguntas sobre seus propósitos no cargo, que tem o poder de aplicar o dinheiro do trabalhador brasileiro. A extrema perversidade desse episódio é que o dono do dinheiro não pode ter acesso ao seu patrimônio, mas, por delegação de Dilma, Cunha pôde. Cleto é apenas um personagem da cleptomania que sangra o país, mas é emblemático pela cadeia de transmissão de interesses que revelou na sua delação premiada. O vice-presidente da Caixa foi escolhido por um condenado da Justiça, Lúcio Bolonha Funaro, indicado por Eduardo Cunha e nomeado por Dilma. No cargo, ele assaltou o patrimônio do trabalhador no governo do Partido dos Trabalhadores.

A presidente afastada, Dilma Rousseff, defende a versão de que o impeachment é obra de Cunha. Esquece a aliança que os uniu por tanto tempo. Esquece os erros que levaram ao descalabro fiscal. De todo modo, seria preferível que o Supremo Tribunal Federal tivesse afastado Cunha, quando o procurador-geral da República pediu. O país teria sido poupado da dúvida que se instalou no processo de impeachment e que vem sendo explorado pelo PT.

A renúncia de Cunha não resolve o problema porque, por mais nefasta que fosse a sua presença no comando da Câmara dos Deputados, ele não resume todo o drama político vivido pelo país. O eleitor não confia mais nos eleitos, a Câmara não conseguiu se defender dos desmandos, e nada a protege contra outra escolha insensata.

Chorando se foi – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

Na história recente do Brasil, é difícil encontrar outro personagem com a ousadia, a ganância e a ambição de Eduardo Cunha. As três características o ajudaram a se tornar um dos políticos mais poderosos das últimas décadas. Ao mesmo tempo, aceleraram sua queda, consumada nesta quinta (7) com a renúncia à presidência da Câmara.

Cunha construiu a carreira nos bastidores, à sombra de padrinhos como Fernando Collor, Anthony Garotinho e Michel Temer. Aprendeu a manejar o submundo do Congresso e forjou alianças com lobistas e grandes empresários. Assim se transformou em intermediário entre os donos do dinheiro e políticos em busca de financiadores de campanha.

A desarticulação do governo Dilma abriu espaço para voos mais altos. O deputado farejou a oportunidade, candidatou-se à presidência da Câmara e impôs uma derrota humilhante ao Planalto. Ao assumir a cadeira, criou uma bancada particular maior do que qualquer partido e passou a sonhar até com a Presidência.

A Lava Jato interrompeu a ascensão meteórica, mas Cunha não jogou a toalha. Chantageou governo e oposição e, ao se sentir rifado pelo PT, abriu o processo de impeachment como ato deliberado de vingança.

A ousadia que o ajudou a abrir portas já havia começado a atrapalhá-lo. O deputado se fragilizou ao travar brigas simultâneas com o Planalto, o presidente do Senado e o procurador-geral da República. Conseguiu derrubar o governo, mas não foi capaz de parar as investigações. Ao virar a bola da vez, acabou abandonado pelos aliados de ocasião.

Sua queda era negociada havia semanas, mas ele insistia em negar as articulações. Ontem voltou a mentir ao dizer que sai para "pôr fim à instabilidade" na Câmara. Na verdade, seu único objetivo é tentar evitar a cassação e uma mudança forçada para Curitiba. No último ato, Cunha só surpreendeu numa coisa: conhecido pela frieza, embargou a voz e chorou diante das câmeras.

Renúncia e denúncia como estratégias - César Felício

• Nem sempre corrupção gera consequências

- Valor Econômico

A renúncia de Eduardo Cunha ao cargo de presidente da Câmara dos Deputados é o primeiro capítulo que se encerra no volumoso tomo das consequências políticas da Operação Lava-Jato.

Cunha deu a largada ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, em dezembro, ao perceber que não teria a solidariedade do PT contra a representação que respondia no Conselho de Ética. Foi acusado de promover uma vendeta. Ontem, devolveu a acusação, no ofício que enviou para ser lido no plenário da Casa, argumentando que a principal causa de seu afastamento foi a reação do procurador geral da República, Rodrigo Janot, às suas iniciativas para afastar a presidente.

As quedas de Dilma e de Cunha estão entrelaçadas em uma simbiose destrutiva, como comprova a cronologia, mas o pemedebista não é vítima se não de seus próprios gestos. A razão essencial de seu afastamento do cargo e do mandato, em maio, foi a de que um réu não pode estar na linha sucessória.

A renúncia de Cunha é uma estratégia óbvia, que se revelou nos agradecimentos feitos pelo deputado na despedida. O parlamentar tenta capitalizar a própria sucessão para escapar da cassação em plenário. Daí seus votos de sucesso a Michel Temer, seu partido, os deputados que o apoiaram e à família também envolvida em seus descaminhos. São todos os que podem fulminá-lo, se quiserem.

A corrupção é um fato, que do ponto de vista político não necessariamente gera consequências. Se aqui no Brasil os escândalos desestabilizam o jogo do poder, é porque há um ambiente que proporciona isso.

A solidez institucional é o primeiro dado. O roubo é um insumo presente em qualquer estrutura política, do condomínio de um edifício ao Vaticano. O que é inerente às democracias é o escândalo. Não há registro, no tempo e no espaço, de ditadura derrubada por ser corrupta. Só em uma democracia um caso de corrupção é um fator de desestabilização política, que este ano não poupou sequer a Islândia, cujo primeiro-ministro se envolveu no escândalo "Panama Papers".

Existe no Brasil uma condicionante básica, que é um sistema de controle razoavelmente eficiente. O Poder Judiciário não se apequena diante do Executivo, como acontece na Argentina, e nem um investigador se mata horas antes de apresentar uma denúncia. A mídia é relativamente independente e crítica frente ao governo. É uma estrutura institucional que paradoxalmente foi reforçada nos governos Lula e Dilma.

Dois pilares apareceram nos últimos três anos: a Lei 12.850, que disciplinou a delação premiada; e a 12.846, que dispôs sobre os acordos de leniência. "Estas mudanças explicam em grande parte o que acontece agora. O sistema de controle brasileiro hoje é muito mais evoluído que era o da Itália no período da Operação Mãos Limpas", opinou um especialista no tema, o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro.

Antes do aparecimento deste vetor, outras variáveis já existiam que tornavam o escândalo um motor para a mudança, dos quais, de longe, o mais relevante é a fragmentação do sistema político, em vários partidos que internamente são muito divididos. Estas particularidades são objeto de estudo desde a década passada do cientista político argentino Manuel Balán, professor da Universidade McGill, de Montreal. Especialista na análise comparativa de corrupção no Cone Sul da América, Balán deu para um de seus trabalhos um título autoexplicativo: "A denúncia como estratégia".

O sistema eleitoral brasileiro favorece o escândalo. "A lista aberta no voto proporcional estimula a competição dentro dos grupos de poder. O Congresso tem alto nível de fragmentação e os arranjos para as eleições obedecem lógicas regionais", diz Balán, em entrevista por e-mail. A consequência é disputa interna e uma divisão de poder altamente complexa, em que o uso de denúncias para mover as peças torna-se uma tentação forte para os grupos que se sentem prejudicados.

O terceiro ingrediente da fórmula do escândalo, além do funcionamento das estruturas de controle e da divisão dentro do grupo governista, é o da intersecção entre as esferas do público e do privado nas atividades em que há regulação do Estado. A corrupção viceja com mais força em modelos intermediários, em que nem existe a estatização absoluta da atividade e nem um jogo totalmente livre das forças do mercado. Onde existe uma concessão a ser regulada, uma licitação a ser feita, abre-se uma janela de oportunidades.

O quarto ingrediente presente no caso brasileiro é o de uma oposição forte, coesa e intransigente. A oposição não detona o escândalo, mas influi em sua propagação e amplifica suas consequências.

O fator preponderante para a desestabilização, na opinião de Balán, são as dissensões dentro do grupo de poder. É algo que se pode questionar no caso da Lava-Jato, onde a investigação começou entre os operadores do esquema, migrou para as empresas e só agora chega na classe política. Mas é fato que a disputa interna potencializou a corrupção, sobretudo nas esferas dependentes de Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa, que trocaram de patrocinador durante o governo Lula para permanecer à frente de diretorias da Petrobras.

No caso específico de Eduardo Cunha, sua queda passou a interessar a muitos. É algo que o distingue do presidente do Senado, Renan Calheiros, que responde a vários inquéritos relacionados à Lava-Jato, mas com blindagem maior. "Renan na presidência do Senado consegue atender a interesses tanto do PT quanto de Temer. Ele interessa ao sistema político e isto o torna mais forte não apenas em comparação a Cunha, mas ao próprio presidente interino", afirmou Praça.

Nada indica, entretanto, que Renan consiga converter sua força no sistema político em uma ação desestabilizadora contra o arcabouço legal que viabilizou o Lava-Jato. Previsões são prematuras, mas a tendência por uma espécie de empate é forte: nem o sistema partidário se depura com a ação dos sistemas de controle, nem será capaz de lancetá-lo.

A última encenação de uma ópera bufa - Jorge Bastos Moreno

- O Globo

Difícil remover os escombros do monstro. Não há mal que perdure. Liderança construída em cima de interesses escusos e subalternos, todos inconfessáveis, acaba sucumbindo ao tempo. A de Eduardo Cunha demorou até mais do que prevê a literatura política, embora nos últimos meses tenhamos assistido a cenas de bravatas, que foram se tornando patéticas com a evolução dos fatos, como as de “não tenho contas no exterior” e “não existe renúncia”.

Mas essa própria renúncia é a última encenação de uma ópera bufa, cujo primeiro ato começou com a ascensão do deputado à liderança do PMDB na Câmara e terminará, certamente, na cassação do seu mandato. A manobra é estúpida e inútil: o país não quer Cunha fora apenas da presidência da Câmara, mas quer varrê-lo da política, tirando-lhe o mandato parlamentar. Cassar o mandato, a esta altura, não será difícil. Impossível será tê-lo fora da política, até porque já dizia o maior líder que o partido de Cunha já teve, Ulysses Guimarães: “Mais difícil do que matar um monstro é remover seus escombros”.

Essa alma penada continuará vagando por aí, usando agora seu último recurso de influência, a chantagem, contra todos aqueles que foram contemplados com as suas benesses nada republicanas. E o que mais instiga é que essa sua “influência” não se limita apenas ao Congresso, onde sempre existiu um terreno fértil para as suas ações caridosas, mas, principalmente, ao Palácio do Planalto.

Por isso, já passou da hora também de o presidente Michel Temer mostrar à nação que não existe cordão umbilical ligando-o a Cunha. Não basta dizer. Tem que demonstrar. E que não venha o governo provisório com a argumentação de sempre de que, para manter-se permanente, tem que negociar com qualquer um. Isso fere o preceito da moral pública, tão repetido pelo próprio Temer.

É trágico, também, ver a Câmara ter a sua disputa mais importante pautada por quem saiu escorraçado da cadeira de presidente. O chamado “novo centrão”, uma reedição moderna do ajuntamento ideológico de direita criado na Constituinte, que, sem dúvida, tem hoje a maioria na Casa, patrocinou o acordo da renúncia de Cunha, em troca da manutenção do seu mandato. Ou seja, a de eleger um outro pau-mandado seu, entre tantos paus-mandados que se multiplicam em funções e cargos importantes na Mesa e nas comissões técnicas.

É o caso de se repetir o que dizia Ulysses acima: “será muito difícil remover os escombros do monstro”.

O agosto de Dilma e Cunha - Eliane Cantanhêde

- Estado de S. Paulo

É incrível como os arqui-inimigos Dilma Rousseff e Eduardo Cunha vão caminhando para o ocaso político, lado a lado, semana a semana, e podem chegar juntos ao cadafalso em agosto, o mês do cachorro louco na política brasileira, quando Getúlio Vargas se matou, Jânio Quadros renunciou, Juscelino Kubitschek morreu.

Dilma não foi pessoalmente se defender na Comissão de Impeachment e enviou uma carta em que fala menos para os senadores, que já têm seus votos bastante definidos, e mais para sua biografia e para a opinião pública. Nessa carta, disse que errar é humano, mas, no seu caso, sem “desonestidade, covardia ou traição”. O impeachment, acusou, é uma “injustiça” e uma “farsa”.

Quanto a Cunha: ele renunciou à presidência da Câmara para ganhar ainda mais tempo e principalmente para tentar salvar o mandato, mas é tarde demais: não vai escapar da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), nem do plenário da Câmara e muitíssimo menos da Justiça.

No máximo, ele e seus seguidores vão tentar manobrar com os prazos. Por exemplo, marcando para o mesmo dia, a próxima terça-feira, a votação da cassação de Cunha na CCJ e a eleição do novo presidente no plenário da Câmara. Cria-se, assim, uma relação direta de causa e efeito: elege-se o sucessor para livrar a cara de Cunha? Mas pode ser em vão.

Ambos, Dilma e Cunha, sabem que estão perdidos. O mundo político considera pule de dez que o impeachment dela será aprovado em agosto pela comissão e em seguida pelo plenário do Senado. E trabalha ativamente para evitar que Cunha, já ferido de morte, tenha fôlego para definir como e quando será seu próprio enterro.

Há um esforço suprapartidário especialmente para evitar que possa fazer o sucessor na presidência. Seria como morrer num dia e reencarnar no outro na pele de um aliado. Faria, assim, uma dupla pressão sobre o Planalto, com o líder do governo, André Moura, e com um futuro presidente da Câmara tirado do Centrão.

A estratégia de Dilma, de Lula e do PT é adiar ao máximo a votação final do impeachment, não para tentar reverter votos ou chegar a um resultado surpreendente a favor dela, mas sim para manter uma excelente plataforma para enfraquecer e minar as chances de sucesso do interino Michel Temer.

Temer, porém, não sangra sozinho. Enquanto o Brasil tiver dois presidentes e ainda houver dúvidas quanto à sua confirmação, por mínimas que sejam, mais lenta e mais difícil é a recuperação da confiança, dos investidores e, portanto, da economia – e dos empregos.

Quanto a Eduardo Cunha: seus dois problemas agora são os prazos e suas contas com a Justiça. Ele está estrebuchando, mas tenta empurrar o fim para agosto, aproveitando-se do início do recesso branco do Congresso na próxima quinta-feira. E, na Justiça, ele dá murro em ponta de faca.

Sem a presidência da Câmara, seus muitos processos no Supremo Tribunal Federal saem do plenário para uma das turmas e podem ganhar mais celeridade. E, quando perder o mandato de deputado, ele perderá o próprio direito a foro privilegiado. Trocando em miúdos: vai sair do Supremo e cair nas garras do juiz Sérgio Moro, já implacáveis com sua mulher, Claudia Cruz.

Em resumo, há uma grande simbiose entre Dilma e Cunha, mas por motivos muito diferentes e com destinos também bastante distintos. Dilma faz o caminho de volta para Porto Alegre, de onde nunca deveria ter saído. Cunha está com um pé na prisão, para onde já poderia ter ido há anos, talvez décadas. Eles já são cartas fora do baralho e o Brasil quer saber como, para onde e com que peças esse jogo vai continuar.

P.S.: Com a Olimpíada, em agosto, bilhões de pessoas mundo afora vão estar olhando para tudo isso sem entender nada. Se nem a gente entende...

Deputados têm o dever de recuperar a confiança do eleitor – Editorial / O Globo

• Nova diretoria da Câmara precisa ter biografia inquestionável e capacidade de conduzir ainda este ano as votações das reformas vitais à reconstrução da vida nacional

Era previsível, inevitável mesmo. A renúncia do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) à presidência da Câmara é mais um daqueles fatos preestabelecidos na vida política à espera das circunstâncias apropriadas para realização.

Nas crises do poder, protagonistas acossados, como Cunha, acreditam que conseguem manipular e transformar a realidade a seu favor. Nunca há final feliz para eles, ensina a História.

Os eleitores anteveem, com habitual sagacidade. Em abril, por exemplo, três em cada quatro brasileiros adultos (ou seja, 73%) achavam imprescindível a renúncia do presidente da Câmara, registrou em sondagem de opinião da época o Instituto Datafolha.

Cerca de um ano antes, Cunha havia sido denunciado pela Procuradoria-Geral da República por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Em dezembro, a PGR pediu seu afastamento do cargo por promover e integrar organização criminosa e usar o mandato e cargo de presidente da Câmara “com manifesto desvio de finalidade” para “constranger e intimidar” pessoas e “com o escopo de embaraçar e impedir” as investigações.

Desde então, a percepção coletiva tem indicado um epílogo nada favorável ao deputado fluminense. Segundo todas as pesquisas dos últimos seis meses, mais de dois terços dos eleitores entendiam ser necessária não apenas a renúncia como, também, a cassação do seu mandato parlamentar. Em maio, o Supremo foi ao limite da fronteira institucional e decidiu afastá-lo das funções e do mandato, proibindo-o até de pisar na sede da Câmara.

A renúncia à presidência, ontem, libera o deputado para uma luta pela salvação do seu mandato, certamente inglória porque, hoje, isso é percebido no Parlamento como acontecimento improvável. Ao mesmo tempo, transforma, de fato, esse caso em detalhe do processo legislativo: Cunha já é página virada.

Agora, os deputados federais têm a oportunidade e o dever de resgatar a Câmara. Passo preliminar, essencial, é a eleição na próxima quinta-feira de uma Mesa Diretora e de um presidente com biografias inquestionáveis, reconhecíveis pela liderança e pela capacidade de devolver a instituição à estabilidade perdida.

A seguir, os escolhidos precisam demonstrar — em harmonia, mas com independência do Executivo e do Judiciário — capacidade de conduzir ainda este ano as votações do conjunto de medidas pendentes e vitais à reconstrução da vida nacional.

A pauta é extensa, complexa, impõe negociações no Legislativo, e abrange desde leis anticorrupção às reformas político-eleitoral, fiscal, trabalhista e previdenciária. Sem isso, será difícil aos parlamentares recuperar seu ativo mais valioso: a confiança do eleitorado.

Com alívio, mas sem perdão – Editorial / O Estado de S. Paulo

“Resolvi ceder aos apelos generalizados de meus apoiadores. Somente esta renúncia poderá pôr um fim a essa instabilidade sem prazo. É público e notório que a Casa está acéfala”, disse o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao renunciar ontem à tarde à presidência da Câmara. Tentava assim apresentar uma motivação institucional para seu gesto, quando tudo indica que, vindo de quem veio, se trata apenas de mais um calculado movimento, entre tantos outros, para salvar seu mandato.

De toda forma, foi com imenso alívio que o País recebeu essa notícia. Se é certo que o afastamento da presidência da Câmara e de seu mandato, determinado no início de maio pelo Supremo Tribunal Federal (STF), trazia dificuldades para que o deputado continuasse usando as prerrogativas do cargo para atrapalhar o julgamento de seu caso no Conselho de Ética, também é certo que a excepcional decisão da Suprema Corte não excluía o grave dano institucional e moral advindo do fato de uma pessoa com o histórico de Cunha ter sido colocada naquela posição – mesmo que tenha sido temporariamente afastada dela.

Ao apresentar sua renúncia, o deputado Eduardo Cunha afirmou ser vítima de perseguições e que seus algozes não respeitaram a sua família. Tudo indica o oposto. As denúncias apontam que foi ele quem não respeitou sua família, envolvendo-a em seus escândalos. Uma de suas filhas é investigada pela Operação Lava Jato. Recentemente, sua mulher, Cláudia Cruz, tornou-se ré em ação conduzida pelo juiz Sergio Moro e responde a processo por lavagem de mais de US$ 1 milhão.

Além de ser acusado de manter contas não declaradas na Suíça e de ter mentido na CPI da Petrobrás sobre a existência delas – acusações que fundamentam o processo de cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar –, Cunha responde por duas ações penais: uma derivada de denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), que o acusa de receber propina em contas na Suíça, e outra de receber propina por contrato de produção de navios-sonda para a Petrobrás.

Segundo a PGR, Cunha recebeu R$ 52 milhões em propinas na obra de um porto no Rio e ainda intimidou testemunhas na CPI da Petrobrás. Recentemente, a Lava Jato protocolou ação civil pública de improbidade contra Cunha, acusado de se beneficiar do esquema na Petrobrás. Os procuradores querem que ele pague uma multa de R$ 270 milhões.

Mas não são apenas as denúncias envolvendo Eduardo Cunha que causam escândalo. É também constrangedor o apoio que, mesmo agora, ele consegue amealhar na Câmara. Basta ver o parecer do deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), apresentado anteontem na Comissão de Constituição e Justiça, recomendando a anulação da votação no Conselho de Ética do processo de cassação de Cunha.

Segundo Fonseca, a votação não poderia ter sido nominal, com chamada no microfone dos conselheiros, pois tal sistema teria prejudicado Eduardo Cunha, ao provocar o “efeito manada” de votos favoráveis à sua cassação. Segundo o ilustre relator, o procedimento correto deveria ser a votação no painel eletrônico.

É por esse tipo de manobra que o processo de cassação de Cunha já é recordista em tempo de duração, com mais de 240 dias. A determinação e a capacidade – sua e de seus aliados – de se comportar dessa maneira ajudam a compreender aquilo que parece incompreensível: como alguém com o currículo de Cunha chega onde chegou e lá permanece por tanto tempo.

A exemplo da presidente Dilma Rousseff, que diz que seu processo de impeachment é fruto do desejo de vingança de Cunha, ele agora diz que está “pagando um alto preço por ter aberto o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff”. Nenhum dos dois está com a verdade. Essas duas tristes figuras são fruto, direto ou indireto, do lulopetismo, no qual a política é mero caminho para interesses privados – pessoais, partidários ou ideológicos.

A renúncia de Eduardo Cunha à presidência da Câmara representou um passo rumo à moralidade pública. Agora, é preciso dar continuidade ao processo de cassação de seu mandato, bem como às investigações e ações penais. Não pode ficar impune tamanho insulto à lei, à democracia e aos bons costumes.

Até que enfim – Editorial / Folha de S. Paulo

Eduardo Cunha (PMDB-RJ) não é mais presidente da Câmara dos Deputados. A renúncia, anunciada nesta quinta (7), atendeu aos anseios de seus adversários, de seus aliados, do governo Michel Temer (PMDB) e da sociedade —cada qual por um motivo diferente.

Réu no Supremo Tribunal Federal em duas ações penais, sob a acusação de corrupção e lavagem de dinheiro, e investigado em pelo menos quatro outros casos de desvio de recursos públicos e distribuição de propina, Cunha personifica o tipo de político do qual a população quer se ver livre.

Não só a imensa maioria dos brasileiros não tolerava a presença do peemedebista fluminense à frente de uma das Casas do Congresso, ainda queafastado por determinação do Supremo.

Também seus adversários há muito desejavam diminuir os poderes de Cunha —se não por apreço às instituições republicanas, por medo de suas práticas sorrateiras e de sua falta de escrúpulos para fazer da intimidação um método.

Alívio semelhante sem dúvida se espraia no Palácio do Jaburu. Imagina-se que à abdicação do peemedebista corresponderá uma redução das notícias dando conta de sua influência no governo Temer.

Além disso, pelo Regimento Interno da Câmara, apenas se realiza nova eleição para a presidência da Casa se o cargo estiver vago. A renúncia cumpre tal função, permitindo que os deputados despachem o folclórico comandante interino, Waldir Maranhão (PP-MA). A nenhum governo interessa um Legislativo sem liderança.

Os próprios aliados de Cunha percebem a oportunidade que se abre com o início dessa disputa. Sendo inegável a ascendência do ex-presidente da Câmara sobre fatia expressiva dos parlamentares, não se descarta que consigatrocar seu apoio pela complacência no processo de cassação.

Trata-se de gesto desesperado, mas não custa lembrar que, em 2007, Renan Calheiros (PMDB-AL) enfrentou situação parecida: às vésperas de perder o mandato, abriu mão da presidência do Senado e foi absolvido por seus pares.

A eleição na Câmara será portanto decisiva para Michel Temer em mais de um aspecto. No mais óbvio, é sua governabilidade que está em jogo. A presidente afastada, Dilma Rousseff (PT), sabe o quanto dói ter um inimigo dirigindo uma das Casas do Legislativo.

Ao mesmo tempo, no entanto, o presidente interino não será perdoado se de fato agir para preservar o mandato de Cunha. Nada menos que 4 em cada 5 eleitores querem a cassação do deputado.

Negociador habilidoso, Temer sempre se saiu bem com sua capacidade de conciliar interesses. Nesse caso, contudo, precisará mostrar de que lado pretende ficar.

A dor virá depois - Ricardo Balthazar

- Folha de S. Paulo

Dias depois de anunciar que preparava medidas dolorosas para reerguer a economia, o presidente interino, Michel Temer, deu a entender que fará devagar as mudanças que considera necessárias.

Ao definir a meta fiscal de 2017, o governo fixou um deficit de R$ 139 bilhões. Ele é menor do que o previsto para este ano, mas ainda assim gigantesco. Ao fazer isso, Temer procurou reafirmar sua determinação de arrumar as finanças do país, mas deixou claro que o Orçamento continuará no vermelho por muito tempo.

É um sinal evidente das dificuldades que o presidente interino tem encontrado para viabilizar politicamente as medidas necessárias para equilibrar as contas do governo.

Já caiu a ficha para todo mundo que será difícil chegar a algum lugar sem aumentar impostos. A aprovação de medidas que podem frear a expansão das despesas do governo deve demorar, e qualquer plano de reforma da Previdência que vier a ser apresentado enfrentará obstáculos.

Temer e seus aliados também já perceberam que não têm força para convencer o Congresso a aprovar aumentos de impostos agora. A aposta do governo é que terá condições de fazer isso mais tarde, em agosto, depois que o processo de impeachment de Dilma Rousseff acabar e Temer puder pregar seu retrato na parede.

Mas trata-se de uma aposta, somente isso. Da disputa pelo controle da Câmara dos Deputados à ansiedade provocada pelos empreiteiros que decidiram a colaborar com a Operação Lava Jato, há inúmeros fatores que tumultuam o ambiente político e o tornam mais imprevisível.

O mais provável é que isso tornará o ajuste das contas do governo ainda mais custoso. Depois que Temer concedeu aumentos a funcionários públicos, socorreu governadores endividados e deu dinheiro para a Olimpíada, a fila à sua porta só aumentou. Para o país, a principal consequência desse processo deverá ser uma recuperação lenta e pouco vigorosa do crescimento econômico.