quinta-feira, 3 de março de 2016

Opinião do dia – Dora Kramer

Duas hipóteses poderiam explicar o comportamento de Lula da Silva na crise: ou o ex-presidente é portador daquele traço de personalidade que ignora o mundo ao redor do próprio umbigo ou a adversidade afetou-lhe o raciocínio.

Consideremos cenário alternativo já que tolo ele não é, embora esperteza não seja sinônimo de inteligência, e o narcisismo patológico dependeria de diagnóstico médico para justificar a conduta temerária adotada nos ataques que Lula escolheu como estratégia de defesa. Dele e do PT.

Uma combinação das duas hipóteses como premissas de um encadeamento lógico, leva à tese bastante condizente com a realidade: o ex-presidente prepara terreno, em ambiente de radicalização, na expectativa de que o pior esteja por vir.

----------------------------
Dora Kramer é jornalista, ‘Trem descarrilado’, O Estado de S. Paulo, 2.3.2016

Ex-presidente da OAS decide fazer delação premiada e deve citar Lula

Mario Cesar Carvalho, Graciliano Rocha - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO, CURITIBA - O empresário Léo Pinheiro, ex-presidente e sócio da empreiteira OAS condenado a 16 anos de prisão naOperação Lava Jato, decidiu fazer um acordo de delação premiada, segundo a Folha apurou junto a profissionais e investigadores que acompanham as negociações. Pinheiro deve relatar casos envolvendo o ex-presidente Lula, como as reformas do apartamento tríplex no Guarujá (SP) e do sítio de Atibaia (SP), e pagamentos de suborno que teriam sido feitos pela Odebrecht e para parlamentares que defendiam interesses da OAS.

Pinheiro era um dos empreiteiros mais próximos de Lula e de políticos de Brasília. Por envolver parlamentares com foro privilegiado, a negociação está sendo feito com a PGR (Procuradoria Geral da República), de Brasília, e não com a força-tarefa de procuradores federais de Curitiba. A expectativa dos investigadores é que será a delação mais bombástica da Lava Jato, que já soma 40 colaboradores.

Outros executivos da empreiteira, como Agenor Franklin Magalhães Medeiros, também vão participar do acordo, relatando casos de corrupção.

No último domingo (28), a colunista Mônica Bergamo revelou que executivos da OAS estudavam fazer a delação.

Nos esboços das declarações, que estão sendo escritos nesta semana, Pinheiro deve dizer que a empresa preparou o apartamento do Guarujá para Marisa, mulher de Lula, e que, posteriormente, ela não quis ficar com o imóvel. Ele confirmará que a OAS bancou parte das reformas no sítio –a Folha revelou que a obra foi tocada por uma espécie de consórcio informal de amigos de Lula, formado por OAS, Odebrecht e a Usina São Fernando, do pecuarista José Carlos Bumlai.

A Odebrecht já confirmou que um de seus funcionários, o engenheiro Frederico Barbosa, atuou na reforma, mas não explicou até agora de onde veio o dinheiro para as obras.

Pinheiro contará, segundo a Folha apurou, que pagou dívidas da campanha de Dilma Rousseff de 2010, para a agência Pepper. Foram pagos pela OAS R$ 717 mil para a agência que cuidava da imagem de Dilma nas redes sociais, como o Facebook. Nesta última terça (1º), a Folha revelou que a Andrade Gutierrez relatou em acordo de delação ter pago cerca de R$ 6 milhões à Pepper, também em 2010, por meio de caixa dois. A empresa afirma que prestou os serviços e nega ter recebido pagamentos ilícitos.

A OAS e a Odebrecht ganharam em consórcio dois dos maiores contratos da Petrobras, os quais somam pouco mais de R$ 7 bilhões. Eles envolvem a construção de parte da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e da Repar (Refinaria Getúlio Vargas), no Paraná. Segundo o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, as empresas pagaram R$ 7,06 milhões em suborno para a diretoria de Abastecimento, ocupada por ele entre 2004 e 2012. No caso da refinaria no Paraná, a UTC também fazia parte do consórcio.

Mensagens
Pinheiro começou a negociar a delação em dezembro, quando vieram à tona milhares de mensagens em que Pinheiro discutia pagamentos a políticos com outros dirigentes da OAS, por meio do aplicativo WhatsApp. A estimativa da PF é que tenham sido apreendidas cerca de 80 mil mensagens, muitas delas comprometedoras para o executivo.

Por causa dessas mensagens, o executivo temia ser preso novamente por decisão do juiz Sergio Moro.

O empresário, no entanto, só tomou a decisão final após entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), em 17 de fevereiro, que determinou o início do cumprimento da pena de prisão após a condenação em segunda instância.

Léo Pinheiro foi preso em novembro de 2014, na fase da Lava Jato que apurou o envolvimento dos dirigentes das empreiteiras contratadas pela Petrobras com o pagamento de propina a dirigentes da estatal e a políticos. Foi solto por ordem do STF e preferiu o silêncio.

Em agosto do ano passado, o juiz Sergio Moro condenou-o a 16 anos de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e por integrar organização criminosa. Ele recorre em liberdade.

Se a condenação for confirmada pelo TRF (Tribunal Regional Federal) de Porto Alegre, que julga as sentenças do Paraná em segunda instância, Pinheiro corre o risco de ser preso. Desta vez, não poderá aguardar em liberdade os recursos aos tribunais superiores.

Outro lado
A Pepper disse à reportagem que não recebeu nenhum pagamento da OAS em 2010.

Procurados, a Odebrecht e o Instituto Lula não haviam se manifestado até este momento.

Colaborou David Friedlander, de São Paulo

Imposto sindical bancou campanha de Lula, diz ex-gerente da Petrobras

João Pedro Pitombo – Folha de S. Paulo

SALVADOR - O ex-gerente de Responsabilidade Social da Petrobras Armando Tripodi afirmou em depoimento concedido ao site institucional "Memória Petrobras"que petroleiros da Bahia usaram o imposto sindical na campanha de Lula à Presidência em 2002.

"Montamos um comitê no sindicato. Aprovamos na assembleia uma contribuição. A categoria aprovou todo imposto sindical da categoria ser destinado à campanha de Lula", disse Tripodi, recordando a participação do Sindicato dos Químicos e Petroleiros da Bahia na eleição.

A prática é vedada pela legislação eleitoral, que proíbe que sindicatos e entidades de classe façam doações eleitorais. A prestação de contas da campanha de Lula naquele ano não registra nenhum repasse do sindicato.

Tripodi é suspeito de receber propina de um operador da Petrobras por meio da reforma de um apartamento, segundo a Polícia Federal, e prestou depoimento na fase Acarajé da Lava Jato.

No site, Tripodi, que é conhecido como Bacalhau, afirma ainda que o imposto sindical foi um "recurso fantástico" usado em comunicação e aluguel de veículos para a campanha. "Montamos uma lojinha, fizemos todo um trabalho de mandar matéria para o interior, montar carro, alugamos carro", afirmou o ex-gerente da Petrobras.

Ele lembra que na campanha presidencial anterior, em 1998, conseguiu doação para a compra de um carro de som, "quase um trio elétrico", que depois teria sido doado ao PT.

Mestre em direito público e advogado especializado em direito eleitoral, Tiago Ayres diz que, além de proibir doações de sindicatos a campanhas, a legislação também veta que entidades sindicais arquem diretamente com custos de campanha.

"Tal conduta seria completamente ilegal. Todas despesas de campanha devem ter sua origem identificada", diz.

Trajetória
O depoimento de Tripodi ao "Memória Petrobras" foi apagado do site no último dia 23, um dia após a operação da PF, e restabelecido após questionamentos da Folha.

No perfil dele, há a transcrição de 13 páginas de um depoimento de 2003, em que ele conta sua trajetória na Petrobras, no sindicalismo e no PT, onde foi um dos fundadores da "Articulação dos 113", grupo precursor da tendência Construindo um Novo Brasil, de Lula e José Dirceu.

Dá destaque à chegada de Lula ao poder em 2003, levando o grupo de sindicalistas ligados a ele aos principais postos da República.

Tripodi diz que foi escolhido como membro não oficial da equipe de transição. Depois, foi alçado ao cargo de chefe de gabinete da presidência da Petrobras entre 2003 e 2012, nas gestões de José Eduardo Dutra e José Sérgio Gabrielli.

Fala também de um encontro com Lula após as eleições de 2002: "Estava eu e o (Wilson) Santarosa nos corredores ali do início da transição, aí Lula passa. Aí: 'Santa, me belisca, me belisca, me chama de meu presidente, me belisca, me acorda'".

Outro lado
Em nota, a Petrobras informou que Tripodi foi destituído da função de gerente no último dia 22 e que iniciou uma apuração interna sobre as suspeitas contra o funcionário. No mesmo dia, o contrato de trabalho foi rescindido a pedido de Tripodi.

Questionado sobre o suposto uso de imposto sindical na campanha de 2002, o PT não respondeu. A reportagem não conseguiu contato com Tripodi.

Ex- presidente da OAS cogita delação

Ex- presidente da OAS avalia delação premiada

• Advogados de Leo Pinheiro fizeram consulta informal a investigadores

Renato Onofre e Cleide Carvalho - O Globo

- SÃO PAULO- O ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, voltou a cogitar a possibilidade de fazer uma acordo de delação premiada. Os advogados fizeram uma consulta informal a investigadores em Brasília para saber qual a redução na pena o empreiteiro teria, caso colaborasse.

Outras consultas já haviam sido feitas durante a Operação Lava- Jato. Condenado a mais de 16 anos de prisão, Pinheiro estaria preocupado com a decisão do Supremo Tribunal Federal ( STF) em determinar que condenados sejam presos antes do fim do processo, caso a sentença seja confirmada em segunda instância.

A preocupação tem um motivo: os executivos da OAS devem ser os primeiros empreiteiros condenados pelo juiz Sérgio Moro a terem recursos julgados no Tribunal Regional Federal da 4 ª Região. Se o tribunal mantiver a condenação, Léo Pinheiro deve começar a cumprir a pena imediatamente. Hoje, ele recorre em liberdade.

Investigadores da força- tarefa da Lava- Jato ouvidos pelo GLOBO estão céticos sobre a possibilidade de acordo. Para eles, não é a primeira vez que Pinheiro sinaliza um acordo:

— Parece que ele está mandando recado — afirmou um integrante da força- tarefa.

Apesar do ceticismo, uma delação de Léo Pinheiro é vista na Lava- Jato como “muito interessante”. O empreiteiro está no centro das principais investigações conduzidas pela Polícia federal tanto em Curitiba quanto em Brasília.

Pinheiro foi flagrado numa troca de mensagens orientando funcionários da OAS sobre a reforma do tríplex no Guarujá, que foi do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além disso, teria comprado móveis, segundo os investigadores, para o sítio Santa Bárbara, em Atibaia ( SP), usado pela família de Lula. A Lava- Jato investiga se o ex- presidente ganhou favores de empreiteiras em troca de influência política.

Léo Pinheiro era amigo de Lula. Em nota, o Instituto Lula admitiu que o ex- presidente e sua mulher, Marisa Letícia, visitaram o tríplex junto com o empreiteiro. A Lava- Jato investiga se o dinheiro usado pela OAS nas reformas saiu da Petrobras.

Pinheiro ainda pode colaborar com as investigações envolvendo políticos de foro privilegiado. Em janeiro, o GLOBO mostrou uma séria de trocas de mensagens entre eles e parlamentares sobre pautas de interesse da construtora. Os advogados do empreiteiro negam o acordo:

— Não há delação — garante Edward de Carvalho, advogado de executivos da OAS.

Odebrecht fez mais repasses a marqueteiro

Lava- Jato acha indícios de mais repasses da Odebrecht a Santana

• Movimentação em dinheiro teria sido feita em 2014, fora de contabilidade oficial

Thiago Herdy*, Renato Onofre e Cleide Carvalho - O Globo

- CURITIBA E SÃO PAULO - A força tarefa da Operação LavaJato identificou novos indícios de pagamentos da Odebrecht ao marqueteiro João Santana em dinheiro e fora de contabilidade oficial de campanha eleitoral. Os pagamentos teriam sido feitos no Brasil e constam de novas anotações localizadas pelos investigadores na última fase da operação.

Os documentos deverão ser levados hoje ao juiz Sérgio Moro, que decidirá pela prorrogação ou não da prisão do marqueteiro e de sua mulher e sócia, Mônica Moura. Ontem, a defesa do casal protocolou pedido de revogação da prisão e argumentou que o dinheiro recebido foi fruto do trabalho em campanhas, sem que soubessem a origem dos valores. Nos novos arquivos e em documentos apreendidos em fase anterior da Lava- Jato, há menções ao termo “feira”, que a polícia entende se tratar de João Santana e de sua mulher, vinculado a pagamentos realizados aos dois, ligados a campanhas.

Na última sexta-feira, ao pedir prorrogação da prisão do casal, a PF já havia mencionado pagamento da Odebrecht no valor de R$ 4 milhões a “Feira”. O documento estava na casa de Maria Lúcia Tavares, funcionária da Odebrecht presa na última fase da operação e libertada ontem.

A força tarefa da Lava- Jato não conseguiu ter acesso ao sistema onde a tabela foi gerada e impressa. Os investigadores acreditam se tratar de contabilidade paralela da Odebrecht. Os pagamentos, em reais, teriam ocorrido em 2014, durante o período em que Santana trabalhava para a campanha de reeleição da presidente Dilma .

A Polícia Federal cogita novo indiciamento do empresário Marcelo Odebrecht, ex- presidente da holding. Em nota, a Odebrecht informou que “não se manifesta sobre fatos que envolvem inquérito em andamento”. A assessoria de Santana também não comentou.

Polis vai retificar declaração de 2014
A Receita Federal identificou diferenças entre as informações prestadas pela empresa do marqueteiro, a Polis Propaganda, que recebeu R$ 70 milhões da campanha de Dilma, e as declarações de renda de Santana e Mônica referentes ao exercício de 2014.

Santana informara em sua declaração que recebera R$ 21,9 milhões da Polis Propaganda a título de lucros e dividendos. A empresa, porém declarou R$ 34,1 milhões. Mônica, por sua vez, declarou ter recebido R$ 6,043 milhões da Polis em 2014. A empresa informou R$ 3,7 milhões. Somada, a diferença entre o valor declarado pelo casal e o informado pela Polis alcança R$ 9,5 milhões.

Procurada pelo GLOBO, a assessoria de Santana informou que a Polis Propaganda vai retificar as informações apresentadas ao Fisco em 2014, que estavam equivocadas.

O casal já tinha retificado suas declarações de imposto de renda de cinco anos consecutivos, de 2010 a 2014, durante o ano passado, acrescentando empresas no exterior que não foram informadas inicialmente. A Polis Propaganda também havia informado ter retificado informações do exercício de 2013. Assim como em 2014, os valores não batiam com as declarações de renda do casal. (Enviado especial)

Dilma diz que tentam criar ‘ impeachment cautelar’ de Lula

• Em jantar com o PDT, presidente defende seu mentor político, apesar das relações estremecidas

Leticia Fernandes, Dimitrius Dantas * - O Globo

- BRASÍLIA e SÃO PAULO- Apesar do estremecimento da relação, a presidente Dilma Rousseff defendeu o ex-presidente Lula em jantar com lideranças do PDT na última terça- feira. Ela afirmou, segundo relatos, que estão tentando criar uma “nova modalidade” no país, que seria o “impeachment cautelar” de Lula. Isso significaria desgastar a imagem do ex- presidente para impedi- lo de ser candidato em 2018. Segundo a presidente, o objetivo hoje é “execrar” Lula via Lava- Jato.

O termo “impeachment cautelar” também foi usado pelo presidente do PT, Rui Falcão, para defender Lula. Na reunião do diretório nacional do partido, na última sexta- feira, ele afirmou que o objetivo da campanha contra o ex- presidente é “impedir sua eventual candidatura”.

Os advogados de Lula pediram ao Conselho Nacional do Ministério Público ( CNMP) explicações sobre o vazamento do inquérito que apura um suposto tráfico de influência do petista em favor da Odebrecht. Cópias dos documentos foram publicados pela revista “Época” há duas semanas. O processo é comandado pelo procurador Douglas Ivanowski Kirchner, do 5 º Ofício de Combate à Corrupção do Ministério Público. Além do vazamento, a defesa de Lula questiona o procurador do DF por distribuir o processo para ele mesmo, e não a outro procurador, e de impedir o acesso dos advogados ao inquérito.

A Procuradoria da República do Distrito Federal informou que os membros da investigação agiram de forma legal e amparados pelas regras que disciplinam o rodízio de procuradores.

Na semana passada, a procuradoria já havia declarado que os dados sigilosos publicados pela revista foram obtidos sem sua autorização, e uma investigação foi instaurada para apurar o fato e seus responsáveis. Sobre a falta de acesso aos documentos do inquérito, informou que o havia negado, em dezembro de 2015, pelo caráter sigiloso das investigações no período. Após nova análise, diz a procuradoria, o acesso foi autorizado e os dados concedidos à defesa de Lula.

Sobre o pedido protocolado no CNMP, o procurador Douglas Kirchner preferiu não se pronunciar. A revista “Época” também optou por não se manifestar sobre o assunto.

(* Estagiário sob supervisão de Flávio Freire)

Defesa de petista ao STF altera nota de instituto sobre tríplex

• Advogados de Lula acrescentaram emodificaram informações sobre o imóvel empetição entregue à Corte

Luiz Maklouf Carvalho - O Estado de S. Paulo

Na defesa que entregaram ao Supremo Tribunal Federal no dia 26, os advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva modificaram as explicações do Instituto Lula, presidido por Paulo Okamotto, sobre o tríplex 164-A, no Guarujá. Em nota divulgada no fim de janeiro, o instituto informava que Lula e Marisa Letícia visitaram o imóvel junto com o presidente da OAS, Léo Pinheiro, sem nenhum detalhamento.

Na peça enviada ao STF, a defesa acrescentou que a visita foi “a convite” de Pinheiro. “A visita guiada foi certamente uma simples deferência à condição de ex-presidente do aqui autor, através da qual se objetivava convencer a família Lula quanto aos atrativos da unidade”. O Estado perguntou à entidade, depois de divulgada a nota, o motivo de o empresário ter comparecido à visita. O instituto não respondeu.

Outra modificação é sobre a avaliação das condições do imóvel na “visita guiada” com Pinheiro. Diz o Instituto: “Lula e Marisa avaliaram que o imóvel não se adequava às necessidades e características da família, nas condições em que se encontrava”. Diz a defesa: “Nessa ocasião avaliou que o imóvel superava as necessidades e características da família”. A nota não é cristalina quanto à decisão de reformar o apartamento, em consequência de não ter agradado ao casal. Mas afirma que depois da visita com Pinheiro “Marisa Letícia e seu filho Fábio Luis Lula da Silva voltaram ao apartamento quando este estava em obras”.

Ao STF a versão é distinta: “A OAS ainda insistiu em seu esforço pela venda, tendo convidado a esposa do autor a visitar o empreendimento, o que esta fez, acompanhada do filho, mas acabaram por manter a avaliação inicial de que o imóvel não se adequava às necessidades da família”. O instituto informou ontem que o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liminar para impedir a condução coercitiva de Lula e Marisa para depor.

Odebrecht fez pagamentos a empresa de enteada de João Santana

• Empreiteira contratou Digital Pólis cinco meses após firma ser aberta

Andreza Matais e Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

Brasília - Investigada na Operação Lava Jato por desviar recursos da Petrobrás, a Odebrecht fez pagamentos no Brasil a uma empresa da enteada do publicitário João Santana. Os repasses, feitos entre 2013 e 2014, ano eleitoral, somaram R$ 134.652. A empreiteira contratou a Digital Pólis, de Alice Moura Requião, cinco meses após a abertura da empresa, que atua no concorrido mercado de webdesign, criação de sites, blogs, campanhas publicitárias e gestão de redes sociais.

A Digital Pólis também prestou serviços em 2014 à campanha de Alexandre Padilha (PT) ao governo de São Paulo. Ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o candidato registrou ter pago R$ 4 milhões pelo serviço de “criação e inclusão de página na internet”. Em nota ao Estado, no entanto, a empresa disse que “a campanha lhe pagou R$ 1,4 milhão”.

Alice Requião é filha de Mônica Moura, investigada juntamente com o marido, João Santana, na Operação Lava Jato por supostos pagamentos ilegais recebidos da Odebrecht. O casal está preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Há suspeita de que o dinheiro tenha sido desviado de contratos da empreiteira com a Petrobrás.

Em nota enviada ao Estado no ano passado, João Santana e Mônica disseram que a empresa da enteada não tem relação com a deles e que autorizaram o uso do nome “Pólis” como “ajuda familiar, já que haveria um óbvio aporte de imagem à empresa iniciante”. A assessoria do casal, procurada novamente na semana passada, reiterou as informações.

Questionada sobre os repasses à Digital Pólis, a Odebrecht informou, no entanto, que firmou “contratos pontuais de publicidade com empresas de João Santana”. O marqueteiro e sua mulher admitiram à Polícia Federal ter recebido recursos de campanha da Odebrecht no exterior. Mas não reconhecerem pagamentos da construtora no Brasil, o que está sendo apurado pela Lava Jato.

Desde sua criação, em julho de 2013, até maio do ano passado a Digital Pólis recebeu R$ 2,3 milhões em pagamentos. A empresa sustenta que, do total, 76% vieram de campanhas e 24% de “clientes privados”, entre eles a Odebrecht. No período, foram três grandes contratantes: a empreiteira, a campanha de Padilha e Pólis Propaganda e Marketing, de Santana e de Mônica, que pagou R$ 401.838 por supostos serviços.

A Digital Pólis recebeu da Odebrecht Realizações Imobiliárias (R$ 35 mil), da Odebrecht Ambiental (R$ 60,8 mil) e da Ótima Concessionária de Mobiliário Urbano, empresa do grupo da empreiteira (R$ 39 mil). O pagamento no ano eleitoral de 2014 foi para a Odebrecht Ambiental, no valor de R$ 35,8 mil. Em nota enviada ao Estado, empresa justificou que os recursos se referem a serviços de website e apresentações multimídia, efetivamente prestados. O grupo Odebrecht confirma os contratos.

As empresas de Mônica e Santana dizem atuar apenas para campanhas políticas. Ao contrário da Digital Pólis, que atende empresas privadas e campanhas. Segundo fontes do mercado publicitário, costuma ocorrer de empresas privadas pagarem diretamente às agências por serviços ou prestadores de serviços que deveriam receber das campanhas por meio de simulação de contratos.

A Lava Jato descobriu que Mônica e João, por exemplo, aceitaram receber diretamente da Odebrecht por dívidas de campanha realizadas em Angola, Panamá e Venezuela por meio da offshore Shellbill. Extratos enviados pelos Estados Unidos sobre a conta no Citibank por onde a Shellbill movimentava dinheiro revelaram que outra filha de João Santana, Suria Santana, e seu genro Matthew Pacinelli receberam dinheiro dessa conta.

O nome de Alice aparece em e-mails apreendidos pela Lava Jato. Ela e sua mãe informam o endereço de um apartamento em Nova York ao fazer compras via internet. O imóvel foi comprado por uma offshore que seria do casal.

Questionada sobre os repasses à Digital Pólis, a Odebrecht informou que empresas de seu grupo “firmaram contratos pontuais de publicidade com empresas de João Santana” e que, “entre os serviços prestados, estão produção e edições de filmes, consultoria, criação visual e produção de apresentação institucional multimídia, gerenciamento de conteúdo digital, entre outros”. A empresa explicou ter feito pagamentos à Digital Pólis até dezembro de 2014.

A assessoria da Pólis Propaganda e Marketing, empresa de João Santana e Mônica Moura, informou que a empresa “não trabalha – e nunca trabalhou - com empresas privadas” e que “João Santana trabalha "rigorosamente dentro da legalidade.” A empresa reforçou que a Digital Pólis “não pertence a João Santana e Mônica” e que a Pólis “sempre funcionou exclusivamente como contratante da Digital”, sem “nunca receber qualquer repasse da Digital".

A Digital Pólis informou que nenhum dos serviços prestados “a empresas privadas teve a mínima influência ou participação de João Santana”. Um dos trabalhos, realizados para a Odebrecht Realizações Imobiliárias, teria sido indicação do então diretor de criação da Pólis Propaganda, Marcelo Kértész, irmão de um dirigente da empreiteira. A empresa apresentou notas fiscais de todos os serviços prestados para a empreiteira, que se referem a apresentações multimídia para eventos de fim de ano e produção de website.

Os primeiros questionamentos do Estado à Digital foram em maio do ano passado.

Procurada na sexta-feira novamente, a Digital informou que não comentaria mais sobre o assunto. Alexandre Padilha informou ter contratado os serviços da Digital Pólis na campanha de 2014 por R$ 4 milhões, mas que pagou somente R$ 1,4 milhão. Segundo a assessoria do petista, a diferença ficou inscrita como dívida e está sendo quitada aos poucos, mensalmente, pelo partido.

PMDB revê estratégia e sinaliza que aceita reaproximação de Dilma

Por Raymundo Costa – Valor Econômico

BRASÍLIA - Entre o PT e salvar mandato, a opção da presidente Dilma Rousseff é salvar o mandato. O sinal mais claro enviado por ela, nesse sentido, foi sua ausência na festa dos 36 anos do Partido dos Trabalhadores, no fim de semana. O mais efetivo é a aliança com o senador Renan Calheiros, presidente do Senado, em torno de uma agenda para melhorar o ambiente econômico, cujo item mais vistoso, até agora, foi a aprovação das mudanças das regras sobre a exclusividade de participação da Petrobras na exploração da camada pré-sal.

Os setores do PMDB mais próximos do vice-presidente Michel Temer também estão revendo sua estratégia em relação ao impeachment. Ontem o presidente da Fundação Ulysses Guimarães (FUG), Moreira Franco, disse ao Valor que o apoio de 60% da população ao afastamento da presidente não é suficiente para a deflagração do processo no Congresso. Franco acha que Dilma, em vez de gastar energia tentando combater o impeachment no Congresso, deveria propor uma agenda para o país sair da crise. O PMDB aceita conversar.

Com o PT se distanciando da presidente da República, o PMDB poderá ocupar o espaço vazio deixado pelo partido da presidente, segundo fontes pemedebistas. O senador Eunício Oliveira, líder do PMDB no Senado, chegou a sugerir que Dilma saia do PT para negociar uma agenda com os partidos, inclusive os de oposição. De concreto, há o entendimento entre Renan e Dilma e o acordo tácito entre Renan e os partidos para a votação de uma agenda de emergência, sem obstruções da pauta.

Dilma já apresentou suas prioridades: a CPMF e a reforma da Previdência. E mandou dois sinais entendidos pelos senadores como de aval para o acordo: não foi à festa do PT e orientou as bancadas governistas a votar o projeto que muda as regras de participação da Petrobras na exploração do pré-sal, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP). Dilma fala com Renan que fala com o PSDB - essa é a consertação. O PT ficou contra. Em sua estreia na função, o novo líder do governo, Humberto Costa (PT-PE), foi apanhado no contrapé

A pauta do PMDB combinada com a presidente inclui dois outros itens, além do pré-sal: a votação do projeto de autonomia do Banco Central, na prática a fixação da descontinuidade no mandato dos diretores, e um projeto que proíbe a alteração de contratos por meio de medida provisória. O acordo entre os partidos é votar e não necessariamente aprovar. O senador José Serra, por exemplo, é contra o projeto de autonomia do BC.

Até recentemente, era o PT quem dizia que entre Dilma e o partido a opção seria o partido. Já estratégia de Dilma para salvar o mandato passa por uma aliança pelo centro. As propostas do PT para a agenda de emergência têm poucas chances de êxito, como a cobrança de IPVA sobre barcos e aeronaves. O PT se isolou e preferiu se agarrar a suas bandeiras históricas, principalmente depois que as últimas pesquisas de opinião mostraram que o ex-presidente Lula da Silva continua a ser um candidato competitivo.

Os últimos revezes sofridos pelo deputado Eduardo Cunha, no conselho de ética e no Supremo Tribunal Federal, também animaram o Palácio do Planalto e seus aliados entre os senadores. Mesmo que o deputado não saia agora, já existe a expectativa de poder em torno do líder Leonardo Picciani (PMDB-RJ) - a rigor, se não perder o cargo ou o mandato, Cunha tem pouco mais de nove meses a cumprir na presidência da Câmara, cada dia mais desgastado por seu envolvimento na Operação Lava-Jato.

Na expectativa de Renan a presidente Dilma Rousseff cumpre o mandato até o fim. O presidente do Senado entendeu-se com o vice-presidente Michel Temer sobre a composição da executiva nacional, na convenção marcada para o dia 12. O impeachment esfriou, mas pode ser retomado na hipótese de surgirem fatos novos ou ganharem corpo as manifestações de rua, como as programadas para o dia 13.

Renan é alvo da Lava-Jato, mas segundo seus aliados nada de concreto até agora foi apresentado contra o senador alagoano. A rigor - dizem - somente foi encontrado dinheiro da Lava-Jato nas contas de diretores da Petrobras, de Eduardo Cunha e do senador Fernando Collor (PTB-AL). O Ministério Público ainda terá que provar para os tribunais que o dinheiro recebido oficialmente pelas campanhas eleitorais pode ser identificado como tendo origem na corrupção.

"O impeachment não é consequência de iniciativa de uma pessoa, mesmo que ela seja o presidente da Câmara" disse Moreira Franco. "O impeachment é obra da opinião pública, não é obra de nenhuma das instituições. Nem do Tribunal Superior Eleitoral, nem da Câmara nem do Senado. Elas dão a forma. Elas dão a solução legal, definem os processos, mas politicamente é na sociedade que isso se conforma".

Segundo Franco, a convenção nacional do partido, a ser realizada no dia 12, não vai discutir o rompimento com o governo. "O partido está dividido e nós não somos aventureiros. Partido faz política e política se trabalha com maioria, não se trabalha com consensos", disse o presidente da FUG. "Consenso é uma utopia autoritária. A maioria é o método democrático para você tomar uma decisão - isso é uma coisa essencial que no Brasil está se perdendo pela intolerância".

Levantamentos feitos pela FUG indicam que 80% dos dirigentes e militantes do PMDB querem o fim da aliança com o PT, mas em relação ao impeachment a relação é a mesma verificada nas pesquisas de opinião, de 60 a 40, o que Moreira Franco diz ser ainda pouco para justificar um pedido de impeachment.

Maioria do STF decide que Cunha deve virar réu

• Após votação, PT e oposição exigem afastamento imediato do cargo

Seis ministros consideram que há indícios suficientes para abertura de processo; julgamento será concluído hoje

A maioria dos ministros do STF decidiu transformar em réu o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, deflagrando pedidos de partidos de oposição e do PT para que ele se afaste imediatamente do cargo. Os seis ministros que votaram aceitaram a denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que falou em “propinolândia” para resumir a atuação do deputado. Acusado de corrupção e lavagem de dinheiro por supostamente ter exigido propina de uma empresa que fechou contratos com a Petrobras, Cunha disse que não sairá do cargo. Pelo celular, ele recebeu mensagem da mulher, Cláudia Cruz: “Calma. Deus sempre no controle. Ele põe. Ele tira. Ele faz.” O julgamento deve ser concluído hoje.

Rumo ao banco dos réus

• Maioria dos ministros do STF aceita denúncia contra Cunha, e líderes exigem sua saída do cargo

Carolina Brígido, André de Souza e Isabel Braga - O Globo


- BRASÍLIA- A formação de maioria no Supremo Tribunal Federal ( STF), com seis votos favoráveis à abertura de processo penal contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), provocou reação imediata na Casa ontem à noite, sinalizando que a situação política do deputado também pode se agravar. Um a um, líderes de partidos que agora se opõem a Cunha subiram na tribuna para pedir seu afastamento imediato do comando da Câmara. Adversários nas urnas, PSDB e PT se juntaram a PPS, PSOL, PPS e Rede.

Hoje, a sessão do STF continua, e Cunha poderá virar o primeiro dos acusados na Operação Lava- Jato com foro privilegiado a se tornar réu. Ele ainda é investigado em outros dois inquéritos, entre eles o que investiga a movimentação de milhões de dólares atribuídos ao deputado por contas na Suíça.

O líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA), criticou a demora do Conselho de Ética em abrir o processo contra Cunha — o que só ocorreu anteontem à noite — destacando que houve uma série de manobras protelatórias. Cunha ouviu o discurso impassível, sentado na cadeira da presidência, olhando para o orador. Quando o discurso terminou, continuou presidindo a sessão, sem dar qualquer resposta. E repetiu o gesto nos demais discursos contra sua permanência no cargo.

— É um grande constrangimento que todos nós estamos vivendo. Para o PSDB e para a maioria da população, chegou- se ao limite, não resta outra alternativa senão o afastamento. Em benefício da democracia, da economia, solicito de maneira clara que o presidente Cunha renuncie. Será gesto de grande importância para a nação e poderá impulsionar o afastamento da presidente Dilma — afirmou Imbassahy.

“Levante dessa cadeira”
O petista Henrique Fontana endossou o pedido, falando em nome da bancada do partido:

— Levante dessa cadeira, se reúna com seus advogados e faça sua defesa, mas deixe o Parlamento trabalhar. Vivemos um momento que temos um presidente que aposta no quanto pior melhor. O papel de Cunha hoje na presidência da Casa é simplesmente usar a presidência em seu próprio benefício. Faço um apelo aos ministros (do STF), que analisem o mais rapidamente possível o pedido de afastamento de Cunha.

O líder da Rede, Alessandro Molon ( RJ), disse que Cunha não tem mais condições morais e políticas de presidir a Câmara. Apenas Laerte Bessa (PR- DF) defendeu Cunha:

— Senhor presidente, estão prejulgando o senhor. Está cheio de juiz nesta Casa. Vossa excelência foi apenas denunciado, não está condenado. Peço respeito.

Também investigado na Operação Lava- Jato, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), já foi logo avisando a jornalistas que não falaria do assunto.

— Me inclua fora dessa! Não me ponha nessa confusão — pediu Renan.

O julgamento de Cunha no STF termina hoje. Seis dos 11 ministros já votaram pela abertura de ação penal contra o peemedebista, suspeito de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no esquema de desvios de dinheiro da Petrobras. Segundo a denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, Cunha exigiu propina de pelo menos US$ 5 milhões de um estaleiro em troca de contrato de navios- sonda pela Petrobras.

O STF também deve abrir ação penal contra a ex- deputada Solange Almeida (PMDB- RJ), atual prefeita de Rio Bonito, por corrupção passiva. Ela é acusada de ter apresentado requerimentos de informação à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle, em 2011, sobre os contratos de aquisição dos navios- sonda, conforme revelou O GLOBO. Os requerimentos teriam sido apresentados a pedido de Cunha, para pressionar o lobista Julio Camargo a retomar os pagamentos de propina. A operação funcionou e Cunha teria voltado a receber o dinheiro.

O primeiro a votar na sessão foi o relator do inquérito, ministro Teori Zavascki. Ele afirmou que há indícios suficientes contra Cunha e Solange para justificar a abertura de ação penal, iniciando uma nova fase das investigações.

— Há indícios robustos para receber parcialmente a denúncia — declarou Teori.

Para o ministro, Cunha “incorporou- se à engrenagem espúria protagonizada pelo então diretor da Petrobras Nestor Cerveró, por Julio Camargo e por Fernando Soares, bem como dela se fazendo beneficiário”. Na denúncia, Janot acusou o deputado de ter participado do esquema a partir de 2006, quando começaram a ser firmados os contratos para a aquisição dos navios- sonda. No entanto, Teori ressaltou que não há elementos concretos para sustentar esse trecho da acusação, e recebeu apenas parte da denúncia feita pelo MPF.

Para Teori, Cunha entrou no esquema a partir de 2010, quando foi procurado pelo lobista Fernando Baiano. O ministro disse que o único indício de que Cunha recebeu dinheiro desviado antes de 2010 vem de delações premiadas. E, para ele, delações não podem ser usadas isoladamente.

Teori comentou a operação de busca e apreensão feita no gabinete de Cunha ano passado. Os advogados reclamaram que não puderam se manifestar no processo depois da medida e, por isso, a denúncia não poderia ser julgada agora. Teori explicou que o resultado da operação não está nessas investigações. Disse que o correto teria sido pedir autorização ao presidente da Casa para a busca. Mas que teve que pedi- la ao diretor- geral da Câmara porque presidente era o investigado.

— A que ponto nós chegamos! — comentou, indignado, o ministro Marco Aurélio Mello.

Depois do relator, votaram da mesma forma os ministros Cármen Lúcia, Marco Aurélio Mello, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber. Para hoje, são aguardados os votos de Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente da Corte, Ricardo Lewandowski.

Perguntado se o julgamento era um recado contra a corrupção, Marco Aurélio respondeu:

— Sim, sem dúvida alguma. O que está havendo no Paraná ( onde tramita parte dos processos da Lava- Jato) e também na órbita do Supremo revela que a impunidade não pode mais prevalecer.

Cunha foi representado por Antonio Fernando, que foi procurador- geral da República e, no cargo, denunciou o esquema do mensalão ao STF.

Maioria do STF vota por tornar Cunha réu da Lava Jato

• Decisão será definitiva se não houver mudança de votos na retomada do julgamento, marcada para esta quinta-feira

Beatriz Bulla, Gustavo Aguiar e Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A maioria do Supremo Tribunal Federal entendeu nesta quarta-feira, 2, haver indícios suficientes para tornar o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), réu na Operação Lava Jato pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Seis ministros acolheram a acusação do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de que o parlamentar usou o cargo para pressionar pelo recebimento de US$ 5 milhões em propina. Ao plenário do Supremo, Janot acusou Cunha de atuar no reino da “propinolândia” e receber recursos do “propinoduto” instalado na Petrobrás.

O fim do julgamento está previsto para ocorrer nesta quinta-feira, 3, e, se nenhum ministro mudar o seu voto, o peemedebista será alvo da primeira ação penal aberta contra um dos 38 parlamentares investigados por participar do esquema de corrupção na estatal.

O julgamento era considerado um teste de consistência do trabalho feito pela Procuradoria-Geral da República na apuração do envolvimento de políticos no esquema alvo da Lava Jato. A cúpula de investigadores ligada a Janot acompanhou a sessão na plateia do STF. “Esse foi um caso espetacular de investigação”, afirmou Janot ao Estado, ao deixar a sessão.

O ministro Teori Zavascki, relator do caso, apontou em seu voto a existência de “indícios robustos” para o recebimento parcial da denúncia contra Cunha e também contra a ex-deputada federal Solange Almeida (PMDB-RJ), atual prefeita de Rio Bonito. O entendimento foi seguido pelos ministros Cármen Lúcia, Marco Aurélio Mello, Luiz Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber. Os demais ministros vão se manifestar na sessão desta quinta.

A previsão era adiar o julgamento após a manifestação de Teori, mas cinco ministros decidiram adiantar o voto numa tentativa de evitar pedidos de vista que pudessem prolongar o caso. No dia anterior ao julgamento, advogados do peemedebista contavam nos bastidores com uma paralisação da sessão.

O Ministério Público acusa Cunha e Solange de se valerem de requerimentos perante comissão da Câmara, em 2011, para pressionar o lobista Júlio Camargo a realizar o pagamento de US$ 5 milhões em propina. O dinheiro é oriundo, segundo a investigação, de contratos de aluguel de navios-sonda da Petrobrás firmados pela Diretoria Internacional da estatal, considerada cota do PMDB no esquema.

Apesar de os requerimentos terem sido apresentados por Solange, a Procuradoria está convencida de que o peemedebista é o real autor dos documentos. “Os elementos colhidos confortam o possível cometimento de crime de corrupção passiva ao menos na qualidade de partícipe, por parte do deputado Eduardo Cunha, ao incorporar-se à engrenagem espúria protagonizada pelo então diretor da Petrobrás Nestor Cerveró”, disse Teori em seu voto. Cerveró e os lobistas Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, e Camargo foram condenados pela Justiça Federal no Paraná no caso dos navios-sonda.

Parcial. O relator rejeitou parte da denúncia apresentada por Janot quanto à participação de Cunha na elaboração do esquema em sua fase inicial, a partir de 2006. Para Teori, embora haja elementos “mais que suficientes” da prática de ilícitos durante a contratação de navios-sonda, não ficou demonstrada a participação de Cunha e de Solange na fase inicial de negociação dos contratos da Petrobrás para a aquisição de navios-sonda.

Segundo o ministro, com base nas informações contidas nas delações de Baiano, Camargo e Cerveró, não era possível acatar as acusações de crimes atribuídos à dupla durante essa primeira fase das negociações. “As informações dos três delatores convergem que a participação dos acusados só viria a ser identificada a em 2011”, afirmou o ministro-relator.

Defesa. O advogado de Cunha, o ex-procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza – resp0nsável pela denúncia do mensalão –, alegou em plenário a inexistência de prova documental do recebimento de propina por Cunha. “Não há nesses autos um único documento ou uma única indicação de pessoa que refira que Cunha participou dos crimes de corrupção passiva que teriam sido praticados em 2006”, disse ele.

O advogado Cláudio Oraindi, responsável pela defesa de Solange Almeida, reforçou que a ex-deputada não recebeu “um vintém” oriundo do esquema.

Se confirmada a abertura da ação penal, Cunha passa a responder ao processo no Supremo e só depois será julgado pela Corte. Para procuradores, a decisão de ontem reforça a tese de que Cunha usou o cargo em benefício próprio, fundamento usado para pedir a saída do peemedebista do comando da Câmara. Ele é alvo de pedido de afastamento feito pela Procuradoria e de outros dois inquéritos no âmbito da Lava Jato.

Maioria do STF vota para transformar Cunha em réu na Lava Jato

Márcio Falcão, Aguirre Talento – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) votou nesta quarta-feira (2) para abrir a primeira ação penal da Operação Lava Jato no tribunal e tornar réu o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sob acusação dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

O acolhimento da denúncia foi puxada pelo relator da Lava Jato, ministro Teori Zavascki, que foi seguido por outros cinco ministros. O julgamento foi suspenso e será retomado nesta quinta (3). Relator da Lava Jato, Teori acolheu parte dadenúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República contra Cunha e a ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), que teriam atuado num esquema de pagamento de propina de contratos de navios-sonda da Petrobras.

Se Cunha virar réu, o STF deverá deliberar sobre outro pedido feito pela Procuradoria, pelo afastamento de Cunha da presidência da Câmara, acusado de usar o cargo para atrapalhar as investigações contra ele.

Para Teori, a acusação de Janot conseguiu apresentar indícios mínimos de que Cunha e a ex-colega teriam utilizado o mandato para pressionar pelo pagamento de propina dos contratos.

"O aditamento da denúncia trouxe um reforço narrativo lógico e elementos sólidos que apontam ter ambos denunciados, Eduardo Cunha e sua correligionária Solange Almeida, aderido à exigência dos recursos ilícitos neste segundo momento, entre 2010 e 2011", afirmou o ministro.

Segundo o ministro, Cunha "incorporou-se à engrenagem criminosa". "Há indícios robustos para nesses termos receber parcialmente a denúncia pois a narrativa em seu segundo momento dá conta que Eduardo Cunha, procurado por Fernando Baiano, aderiu para recebimento para si e concorrendo para recebimento de Fernando, oriunda da propina destinada a diretores da estatal. [...] Elementos confortam sobejamento do crime de corrupção passiva, majorado ao menos na qualidade de partícipe por parte do deputado Eduardo Cunha para se incorporar a engrenagem espúria de Nestor Cerveró", afirmou o ministro

A cobrança pelos recursos desviados teria ocorrido por meio derequerimentos apresentados para pressionar empresas envolvidas na contratação a não interromper a liberação da propina.

Dois requerimentos foram apresentados na Câmara em 2011 por Solange. Eles pediam às autoridades informações sobre contratos da Petrobras com a Mitsui. A Folha revelou em abril de 2015 que o nome "dep. Eduardo Cunha"aparece como autor dos arquivos de computador em que eles foram redigidos.

O ministro afirmou que os indícios são "consistentes" de que os requerimentos eram para pressionar o pagamento de propina pelo lobista Julio Camargo.

Teori, no entanto, rejeitou a parte da denúncia que apontava que os dois políticos participaram do acerto inicial para os desvios nos contratos de navios-sonda, que teriam ocorrido entre 2006 e 2007. Na prática, o relator diminuiu as imputações do crime de lavagem de dinheiro apontadas pela Procuradoria.

O ministro entendeu que, no caso da celebração dos contratos, não ficou comprovado que Cunha participou do acerto inicial da propina, já que os próprios delatores afirmaram só tê-lo conhecido depois desse período, por volta de 2010. Teori afirmou que nesse caso os indícios de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro seriam apenas contra o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, e os lobistas Julio Camargo e Fernando Soares, o Baiano.

Segundo a acusação da Procuradoria, os dois contratos de navios-sonda somam US$1 bilhão e envolveram o acerto de uma propina de US$ 40 milhões para políticos e ex-funcionários da Petrobras. Cunha teria recebido US$ 5 milhões.

Outro indício de ato criminoso seria o fato de que parte dos pagamentos destinados ao deputado teria sigo paga à Igreja Evangélica Assembleia de Deus do Rio. Duas empresas de Júlio Camargo, Piemonte e Treviso, fizeram transferências para as contas da igreja no valor total de R$ 250 mil em 31 de agosto de 2012.

Em seu voto, Teori rebateu o peso das delações premiadas, que permitiram ao Ministério Público avançar no amplo esquema da Lava Jato. "De qualquer modo, é sempre bom lembrar que a palavra do colaborador por si só não representa em nada como prova. Representa o início de caminho para busca de uma prova. Não tem nenhum valor, está expresso na lei."

O ministro afirmou ainda que não foi comprovada que houve qualquer coação para a mudança de versão no depoimento de Júlio Camargo, que em sua primeira delação não envolveu Cunha.

Outros ministros
A intenção do presidente do STF, Ricardo Lewandowski, era suspender o julgamento logo ao fim do voto de Teori.

Mas a ministra Cármen Lúcia pediu a palavra para dizer que seguia o voto do relator e, com isso, outros quatro ministros fizeram o mesmo, totalizando seis votos –a maioria mínima necessária para abertura da ação penal.

Também votaram favoráveis os ministros Marco Aurélio Mello, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber.

Barroso afirmou que as informações apresentadas no voto de Teori "nos permitiram com muita segurança reconhecer que há indícios muito suficientes tanto de materialidade como de autoria".

Já Marco Aurélio disse que "a fase não é de definição da culpa ou não dos denunciados. É apenas de outorgar ao Ministério Público a atuação e a atuação em nome da sociedade. Por isso, já tendo feito a ideia sobre a espécie é que eu me permito também antecipar o voto, recebendo a denúncia".

Na continuação do julgamento, nesta quinta (3), ainda pode haver uma interrupção caso algum dos ministros peça vista. Se não, deve se confirmar a abertura da ação penal.

Outro lado
Em sua sustentação, o advogado de Cunha, Antônio Fernando de Souza, afirmou que não existem documentos que comprovem o pagamento de propina ao deputado.

Antônio Fernando, que já foi procurador-geral da República, também disse que não há evidências de que o deputado tenha participado do acerto de propina no contrato de navios-sonda da Petrobras entre 2006 e 2007.

A defesa da ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ) afirmou que a própria acusação não descreve que ela tenha recebido propina. "Não é dito que ela recebeu e não se diz que ela recebeu um vintém só dessa história toda", afirmou o advogado Cláudio Rodrigues Neto.

Cunha deve virar réu, mas diz que não deixará cargo

Por Letícia Casado, Carolina Oms, Raphael Di Cunto e Thiago Resende – Valor Econômico

BRASÍLIA - O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deve virar réu hoje em ação penal da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, o relator da operação, Teori Zavascki, e outros cinco ministros votaram pelo acolhimento parcial da denúncia contra Cunha, o que já configura maioria dos votos da Corte. Para Teori, há indícios de que Cunha teria utilizado o mandato para pressionar pelo pagamento de propina em contratos da Petrobras. Teori rejeitou, no entanto, a parte da denúncia que apontava participação no acerto inicial para os desvios nos contratos de navios-sonda, que teriam ocorrido entre 2006 e 2007, recomendando que a denúncia seja acolhida parcialmente.

A sessão segue nesta tarde. Os ministros ainda podem mudar seus votos ou pode haver interrupção, caso algum deles peça vista do processo. No entanto, o STF deve confirmar a abertura da ação penal, tornando o presidente da Câmara réu e abrindo espaço para o debate do pedido de afastamento de Cunha feito pela Procuradoria-Geral da República, que o acusa de usar o cargo para atrapalhar as investigações contra ele.
1.
O voto de Teori foi seguido pelos ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Roberto Barroso, Edson Fachin e Marco Aurélio. Devem votar hoje Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello, além do presidente da Corte, Ricardo Lewandowski. Luiz Fux está fora do país.

Após saber dos votos dos ministros, Eduardo Cunha afirmou que "tranquilamente" terminará o mandato e destacou o fato de o ministro Teori ter excluído algumas acusações feitas pelo Ministério Público. "Efetivamente, tudo que esta lá não tem condição nenhuma de ser provado. Temos material farto probatório para desmascarar esse tipo de situação", disse. O pemedebista descartou ainda a hipótese de deixar a presidência da Câmara. "Tornar-se réu não é sentença para ninguém", disse. Segundo Cunha, "não existe razão para afastamento de quem se torna réu. Essa matéria já foi vencida".

STF deve abrir ação penal contra Cunha
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deve virar réu hoje em ação penal da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, a maioria dos ministros, o relator da ação, Teori Zavascki, e outros cinco integrantes da corte votaram pelo acolhimento parcial da denúncia contra Cunha.

Para Teori, a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR) conseguiu apresentar indícios mínimos de que Cunha teria utilizado o mandato para pressionar empresas a pagar propina em dois contratos com a Petrobras. Ele rejeitou, no entanto, a parte da denúncia que apontava participação de Cunha no acerto inicial para os desvios nesses contratos entre 2006 e 2007.

A sessão será retomada hoje. Os ministros ainda podem mudar seus votos ou pedir vista. Se nada mudar, o STF deve confirmar a abertura da ação penal - tornando o presidente da Câmara réu e assim abrindo espaço para debater o pedido da PGR para afastar Cunha da presidência da Câmara. Para a procuradoria, ele usa o cargo para atrapalhar as investigações que correm no Conselho de Ética da Casa.

A decisão do STF também vale para a ex-deputada federal pelo PMDB, Solange Almeida, atual prefeita de Rio Bonito (RJ). Ela e Cunha são acusados pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Ambos negam as acusações.

Para Teori, "há indícios robustos para nesses termos receber parcialmente a denúncia". O ministro disse ainda que "elementos confortam sobejamento do crime de corrupção passiva, majorado ao menos na qualidade de partícipe por parte do deputado Eduardo Cunha para se incorporar a engrenagem espúria de Nestor Cerveró" ex-diretor de Internacional da Petrobras e já condenado por corrupção pelo Juiz Sergio Moro, responsável pela Lava-Jato no Paraná.

O voto de Teori foi seguido pelos ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Marco Aurélio Mello. Devem votar hoje à tarde Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello, além do presidente da Corte, Ricardo Lewandowski. O ministro Luiz Fux está fora do país.

Após a sessão, Marco Aurélio disse que "o que está havendo no Paraná e também na órbita do Supremo revela que a impunidade não pode mais prevalecer".

A PGR afirma que Cunha "recebeu vantagens indevidas para facilitar e viabilizar a contratação do estaleiro Samsung ", responsável pela construção dos navios-sondas sem licitação, por meio de contratos firmados em 2006 e 2007. Juntos, os dois contratos somam quase US$ 1,2 bilhão e, segundo a PGR, geraram propina de US$ 40 milhões, paga entre 2006 e 2012.

Outro indício de ato criminoso apontado pela PGR é o fato de que parte dos pagamentos destinados ao deputado teria sido paga à Igreja Evangélica Assembleia de Deus do Rio. Duas empresas de Júlio Camargo, a Piemonte e a Treviso, fizeram transferências para as contas da igreja no valor total de R$ 250 mil em 31 de agosto de 2012.

Esses contratos foram firmados entre a diretoria de Internacional da Petrobras -na época comandada por Nestor Cerveró - e a coreana Samsung Heavy Industries -, cujo representante no Brasil era o lobista Julio Camargo. Outro lobista, Fernando "Baiano" Soares, intermediou a negociação.

Segundo a investigação, Baiano fazia a cobrança da propina e repassava ao PMDB. Em 2009 a Samsung rompeu com Camargo e ele parou de repassar os valores a Baiano, que começou a lhe pressionar. Depois, Baiano lhe procurou dizendo que havia um saldo a pagar de US$ 5 milhões e disse que estava cobrando em nome de Cunha. Camargo disse que chegou a se reunir com Cunha para tratar do assunto.

Camargo disse que foi pressionado por Cunha a pagar a propina por meio de requerimentos para que ele prestasse informações em comissão na Câmara. Cunha não era presidente da Casa, mas atuava como parlamentar. Um dos requerimentos foi feito pela então deputada Solange Almeida. Mas os investigadores da Lava-Jato dizem que ela atuou em conluio com Cunha, inclusive usando o login do sistema dele na Câmara para fazer o requerimento.

O depoimento de Camargo que implicou Cunha foi um adendo às informações iniciais prestadas por ele. A defesa de Cunha alega que o lobista mudou a versão para prejudicar o presidente da Câmara e diz que ele pode ter sido coagido. Ontem, o ministro Teori refutou esse argumento: "Não há evidência de que tenha sido pressionado ou coagido a mudar de versão."

"Tudo ia bem na propinolândia quando surge uma dúvida jurídica no contrato firmado de condicionamento entre Julio Camargo e a Samsung", disse o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ontem ao sustentar perante os ministros que a denúncia deveria ser acatada. "Existiu em seguida um acerto a pedido de Baiano para que Cunha promovesse a cobrança e auxiliasse no restabelecimento do propinoduto. Cunha engendrou a fórmula através da qual ele restabeleceu o propinoduto."

Deputado descarta deixar presidência da Câmara
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) afirmou ontem que "tranquilamente" terminará o mandato, ao comentar o início do julgamento da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deve ser acolhida hoje. Cunha ressaltou que o relator do caso, ministro Teori Zavascki, excluiu algumas acusações feitas pelo Ministério Público.
"Efetivamente tudo que esta lá não tem condição nenhuma de ser provado. Temos material farto probatório para desmascarar esse tipo de situação", disse. O pemedebista descartou ainda a hipótese de deixar a presidência da Câmara. "Tornar-se réu não é sentença para ninguém", disse. Segundo Cunha, " não existe razão para afastamento de quem se torna réu. Essa matéria já foi vencida".

Com a decisão do Conselho de Ética na madrugada de ontem de aceitar a representação contra Cunha por quebra de decoro e a tendência apresentada pelo STF, líderes na Câmara pediram a renúncia de Cunha. "Para a maioria da população brasileira, chegou o limite. Não resta outra alternativa que não o afastamento. Em benefício da democracia. Em benefício da recuperação da nossa economia", discursou Antonio Imbassahy (BA), que comanda a bancada do PSDB. O tucano disse que a saída do pemedebista deverá inclusive "impulsionar" o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Líder do Rede, Alessandro Molon (RJ) também afirmou que Cunha deveria se "afastar voluntariamente" para responder ao processo no Supremo e o que tramita no Conselho de Ética da Casa.

Deputados de pelo menos outros cinco partidos - PT, DEM, PPS, Rede e PSOL - manifestaram-se a favor da saída do pemedebista. O líder do PSD, Rogério Rosso (DF), no entanto, avaliou que Cunha tem condições de permanecer: "A tensão política deve se acirrar, mas do ponto de vista jurídico, todo mundo tem o direito ao contraditório e a presunção de inocência." Maurício Quintella Lessa (AL), que lidera o PR, afirmou que a situação de Cunha "não é boa para a imagem da Câmara, mas é ele que terá que avaliar o que fazer".

Cunha afirmou que recorrerá da decisão do Conselho de Ética "Tem muito recurso, muita coisa errada feita ali. Os meus recursos serão feitos e meus advogados tratarão do jeito que tem que tratar", afirmou o pemedebista, citando como exemplo questionamentos à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e ao plenário da Casa.

Um dos argumentos de Cunha é que o presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PSD-BA), desempatou a votação, decidindo a favor da continuidade das investigações, mesmo após uma questão de ordem que poderia considera-lo suspeito para opinar nesse caso por ter "atuado de forma imparcial". Araújo não colocou o assunto para análise no colegiado, frisou.

A representação acusa Cunha de mentir à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras ao negar ter contas no exterior e, segundo a PGR, também ter participado de irregularidades em contratos da estatal. Apenas a primeira parte foi mantida no relatório do deputado Marcos Rogério (PDT-RO).

"Ficou restrito àquilo que tem que ser. Aquilo que cabe ao próprio Conselho. Não tratar de processo judicial nem de coisas antigas", afirmou o pemedebista. Aliado do presidente da Câmara, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) afirmou que a alteração do parecer deve abrandar a pena, "como censura ou suspensão do mandato, mas não em cassação".

O relator e outros integrantes do Conselho entendem, porém, que, se a investigação do Conselho recolher provas de que houve corrupção, haverá punição mais grave. Rogério espera que o processo chegue ao plenário da Câmara no fim de maio ou em junho.

Na madrugada, o parecer pela abertura de processo rachou o Conselho ao meio. O placar ficou empatado: 10 a 10. Votaram com o pemedebista os representantes do PR, PP, PTB, PSC, PMDB e SD. Foram favoráveis à abertura do processo PSDB, PRB, PSB, PT, PDT, DEM e PPS. Até que Araújo chancelou a continuidade do processo: "Minha intenção é investigar, saber a verdade, e que os por ventura acusados possam apresentar provas de que são inocentes." (Com agências noticiosas)

Planalto teme que Cunha faça retaliações por decisão do STF

Gustavo Uribe, Flávia Foreque – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto acompanhou com cautela e evitou comemorar nesta quarta-feira (2) decisão da maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) pela abertura de ação penal contra o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O receio é de que o peemedebista utilize a possibilidade de virar réu como pretexto para retaliar o governo federal em votações no Congresso Nacional, como fez anteriormente após o vazamento de informações contra ele no rastro da Operação Lava Jato.

A maior preocupação é de que, alegando perseguição por parte do procurador-geral Rodrigo Janot, o peemedebista acelere a votação de pautas-bomba que tramitam na Câmara dos Deputados, como a proposta que aumenta os gastos em saúde e decreto legislativo que altera o indexador dasdívidas dos Estados e municípios com a União.

A previsão é de que a primeira medida possa gerar um gasto adicional ao governo federal de R$ 140 bilhões nos próximos sete anos, enquanto a segunda pode causar uma perda de R$ 300 bilhões.

Para evitar uma retaliação, a ordem do Palácio do Planalto é evitar comentar sobre a decisão da Suprema Corte e adotar o discurso sobre a separação dos poderes e a soberania do STF.

"É uma questão judicial e o governo federal não tem desde o começo desse processo que envolve o deputado federal feito qualquer observação de caráter político em relação a isso. A Câmara dos Deputados é soberana para tomar suas decisões", disse o ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini.

STF
O julgamento foi suspenso e será retomado nesta quinta-feira (3). Relator da Operação Lava Jato, o ministro Teori Zavascki acolheu parte da da denúncia oferecida por Janot contra Cunha e a ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), que teriam atuado num esquema de pagamento de propina de contratos de navios-sonda da Petrobras.

Se Cunha virar réu, o STF deverá deliberar sobre outro pedido feito pela Procuradoria: o afastamento de Cunha da presidência da Câmara dos Deputados sob a acusação de usar o cargo para atrapalhar as investigações contra ele.

Para Teori, a acusação contra Cunha conseguiu apresentar indícios mínimos de que o peemedebista e a ex-colega teriam utilizado o mandato para pressionar pelo pagamento de propina dos contratos.

Delcídio faz acordo de delação premiada e acusa Dilma de interferir na Lava Jato

• Ex-líder do governo citou Lula e bastidores da compra da refinaria de Pasadena

Por Andreza Matais, Vera Rosa e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

O senador Delcídio Amaral (sem partido-MS) fez acordo de delação premiada perante o grupo de trabalho da Procuradoria-Geral da República na Operação Lava Jato. Ele citou vários nomes, entre eles o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e detalhou os bastidores da compra da refinaria de Pasadena pela Petrobrás, entre outros assuntos. As primeiras revelações do ex-líder do governo fazem parte de um documento preliminar da colaboração.

Nesta fase, o delator indica temas e nomes que pretende citar em seus futuros depoimentos após a homologação do acordo. Delcídio foi preso no dia 25 de novembro do ano passado acusado de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato e solto no dia 19 de fevereiro. Desde que saiu da prisão, Delcídio nega ter feito delação premiada.

A revista IstoÉ divulgou mais cedo detalhes da delação de Delcídio que teria 400 páginas. O senador acusou a presidente Dilma Rousseff de atuar três vezes para interferir na Operação Lava Jato por meio do Judiciário. “É indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de promover a soltura de réus presos na operação”, afirmou Delcídio na delação, segundo a revista.

Cardozo deixou esta semana o ministério alegando sofrer pressões do PT para interferir na Lava Jato. Ele foi nomeado por Dilma para a Advocacia Geral da União (AGU).

Uma das investidas da presidente Dilma, segundo a IstoÉ, passava pela nomeação do desembargador Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Tal nomeação seria relevante para o governo”, pois o nomeado cuidaria dos “habeas corpus e recursos da Lava Jato no STJ”. Delcídio contou aos procuradores, ainda conforme a revista, que a estratégia foi discutida com Dilma no Palácio da Alvorada e que sua tarefa era conversar “com o desembargador Marcelo Navarro, a fim de que ele confirmasse o compromisso de soltura de Marcelo Odebrecht e Otávio Marques de Azevedo”, da Andrade Gutierrez.

Conforme a IstoÉ, o senador se reuniu com Navarro no próprio Palácio do Planalto, no andar térreo, em uma pequena sala de espera. Fato que poderia ser comprovado pelas câmeras de segurança. No STJ, Navarro cumpriu a orientação, mas foi voto vencido.

PIB: Economia despenca 3,8% em 2015 e Brasil tem a pior recessão desde 1990 • IBGE aponta que PIB encolheu 1,4% no 4º tri ante período anterior e 5,9% na comparação com 2014

• IBGE aponta que PIB encolheu 1,4% no 4º tri ante período anterior e 5,9% na comparação com 2014

Investimentos despencam e PIB cai 3,8% em 2015, na maior recessão desde 1990

• Indústria encolheu 6,2% no ano passado, puxada pela construção, o que levou a uma queda de 14,1% nos investimentos; dentre os setores, apenas a agropecuária teve desempenho positivo em 2015

- O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - A economia brasileira encolheu 3,8% em 2015, na maior recessão desde 1990, quando o Produto Interno Bruto (PIB) despencou 4,35% no governo de Fernando Collor. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que a crise econômica continuou se aprofundando no quarto trimestre do ano passado, período em que o PIB caiu 1,4% ante o trimestre anterior e 5,9% na comparação com o mesmo período de 2014.

O destaque negativo foi a queda de 14,1% dos investimentos, chamados de formação bruta de capital fixo. Segundo o IBGE, o recuo se deve à queda da produção interna e da importação de bens de capital, sendo influenciado pelo desempenho negativo do setor de construção. Em 2014, os investimentos já haviam registrado queda de 4,5%.

O resultado veio dentro do intervalo das estimativas dos analistas consultados peloAE Projeções, que esperavam uma queda entre 3,70% e 4%, com mediana de -3,9%. Em 2015, o PIB totalizou R$ 5,9 trilhões, enquanto o PIB per capita ficou em R$ 28.876, uma queda de 4,6% ante 2014.

Dentre os setores, apenas a agropecuária (1,8%) apresentou expansão em 2015. Indústria (-6,2%) e serviços (-2,7%) recuaram ante 2014. No setor industrial, as quedas foram generalizadas: construção sofreu contração de 7,6%, enquanto a indústria de transformação teve queda de 9,7%. O único destaque positivo foi o desempenho da extrativa mineral, que acumulou crescimento de 4,9% no ano.

Já dentre as atividades que compõem os serviços, o IBGE destaca que o comércio sofreu queda de 8,9%, seguido por transporte, armazenagem e correio, que recuou 6,5%.

Autonomia dos poderes em xeque - Merval Pereira

- O Globo

A discussão sobre a legalidade da nomeação do novo ministro da Justiça, membro do Ministério Público, traz à tona um tema de maior profundidade, que é o papel dos poderes da República numa democracia presidencialista. Assim como deputados e senadores não deveriam poder se licenciar de seus mandatos para assumir cargos em governos estaduais ou municipais, ou mesmo no Executivo Federal, também os procuradores do Ministério Público deveriam ser obrigados a se exonerar para assumir outras funções no Executivo, seja estadual ou federal.

Nos Estados Unidos é assim. A então senadora Hillary Clinton teve que abrir mão de seu mandato para assumir a Secretaria de Estado no primeiro governo de Obama. Aqui no Brasil, vemos diariamente uma briga quase física no Congresso para deputados e senadores tornarem- se ministros.

Mais vexaminoso ainda, temos visto nos últimos dias ministros e secretários de estado reassumirem seus cargos na Câmara por poucas horas, apenas para aumentar o poder de fogo da base aliada do governo para eleger o líder do PMDB mais ligado ao Palácio do Planalto.

O ministro da Saúde chegou ao cúmulo de abandonar seu cargo em meio à crise da zika para prestar favores ao Executivo. Ninguém parece saber que, no presidencialismo, deputados e senadores não deveriam poder ser ministros, teriam de renunciar quando aceitassem um ministério. No presidencialismo, eles governam o país através do Congresso.

Temos aqui um parlamentarismo que não se completa e um presidencialismo distorcido. Portanto, na essência, está correta a decisão do Supremo Tribunal Federal de proibir que um membro do Ministério Público assuma um cargo em outro poder. Em várias ocasiões, o Supremo se pronunciou sobre o assunto, sempre confirmando que o disposto no artigo 128, § 5 º , II, d, da Constituição Federal, veda aos membros do Ministério Público “exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério".

O ministro Ricardo Lewandowski, hoje presidindo o STF, pronunciou- se sobre o tema em 2007, em uma ação direta de inconstitucionalidade, tocando na questão central da discussão, que é a autonomia dos poderes. Disse ele na ocasião: “os cargos de Ministro, Secretário de Estado ou do Distrito Federal, Secretário de Município da Capital ou Chefe de Missão Diplomática, enumerados nos dispositivos ora impugnados, evidentemente não dizem respeito à administração do Ministério Público, ensejando, inclusive, se efetivamente exercidos, indesejável vínculo de subordinação de seus ocupantes com o Executivo, colocando em risco um dos mais importantes avanços da Constituição Federal de 1988, que é precisamente a autonomia do Ministério Público”.

O Supremo também, em outra ocasião, decidiu que, de acordo com a Constituição, o art. 170, parágrafo único, da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo, que permite “o exercício de cargo ou função de confiança na Administração Superior”, pelos membros do Ministério Público, seja entendido como se referindo “apenas à administração do próprio Ministério Público.”

Vários estados, no entanto, usam uma interpretação da Lei Orgânica do Ministério Público dos Estados para nomear membros do Ministério Público para seu secretariado. A base legal da nomeação tem apoio no parágrafo único do artigo 44: “Aos membros do Ministério Público se aplicam as seguintes vedações; IV – exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de Magistério; Parágrafo único. Não constituem acumulação, para os efeitos do inciso IV deste artigo, as atividades exercidas em organismos estatais afetos à área de atuação do Ministério Público (...)”.

O Conselho Nacional do Ministério Público endossa essa interpretação, apesar da vedação expressa da Constituição. O Supremo Tribunal Federal poderá analisar essa situação caso os partidos de oposição recorram da decisão do Conselho Nacional, que não concedeu a liminar para sustar a posse do novo ministro, que será hoje.

Essa seria, em tese, uma questão menor se não expusesse o ponto nevrálgico de nosso sistema presidencialista de coalizão, a subordinação dos demais Poderes ao Executivo.

Operação salva lula – Rogério Gentile

- Folha de S. Paulo

A demissão do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, deixou claro que Lula –com medo de ser preso e sem apresentar até agora argumentos convincentes para justificar os presentes que recebeu de empreiteiras, bem como para os R$ 2,4 milhões pagos ao seu filho– está disposto a fazer qualquer coisa para frear a Lava Jato.

O primeiro ato de sua guerra particular foi avisar a presidente que, se não entregasse a cabeça do ministro, a quem responsabiliza pelo "descontrole" da PF, deixaria a defesa do governo "em segundo plano".

O recado foi entendido como uma ameaça de entregá-la à própria sorte na luta contra o impeachment. Lula, evidentemente, não tem como garantir a sobrevivência do governo. Mas é certo também que o governo não sobrevive sem ele e os votos do PT.

Compreendendo que o tal fim da "fase paz e amor", anunciado por Lula no aniversário do PT, não se tratava de uma bravata de palanque, Dilma trocou o ministro. Colocou no lugar um procurador desconhecido, que ascendeu pelas mãos de Jaques Wagner, o chefe da Casa Civil que, em seguida, declarou considerar "injustas" as denúncias contra Lula.

Dilma fez ainda mais. Em jantar com deputados, prestou solidariedade ao antecessor, argumentando que "todo mundo comete erros" (todo mundo quem?), e afirmou que o governo não pode deixar a ofensiva da PF contra Lula "passar dos limites".

Sejam quais forem os limites imaginados pela presidente, no entanto, não basta enquadrar a PF, se é que isso é realmente possível –há quem entenda que toda essa situação levará a PF a reafirmar a sua independência, o que também é algo indesejado, se feito a fórceps.

De qualquer modo, para frear a Lava Jato, a operação Salva Lula teria de, mediante um jogo pesado de pressão, envolver o Ministério Público e, sobretudo, o Judiciário, o que é improvável, mas não custa prestar atenção. No fundo, o que está sob teste é a maturidade das instituições.

O “Bom Burguês” - Luiz Carlos Azedo

• De todos os executivos presos, Léo Pinheiro era considerado pelos políticos o mais “boa praça” no trato. Não é à toa que se relacionava pessoalmente com o ex-presidente Lula

- Correio Braziliense

Jorge Medeiros Valle, bancário carioca, é um dos personagens mais controvertidos da esquerda que optou pela luta armada durante o regime militar. Sua história virou filme, cujo nome intitula a coluna, estrelado pelo falecido ator José Wilker, uma versão glamourizada de sua vida, que mais tarde foi desnudada na dissertação de mestrado da professora Valesca de Souza Almeida. Funcionário do Banco do Brasil, Valle foi preso em julho de 1969, quando os órgãos de segurança do regime militar descobriram que ele havia desviado 2 milhões de cruzeiros novos da agência em que trabalhava, para financiar organizações clandestinas dedicadas à luta armada contra a ditadura militar.

O “Bom Burguês”, como ficaria conhecido, cumpriu pena de seis anos na Ilha das Flores. Foi condenado novamente em 1975, mas exilou-se no México com a sua família, a fim de escapar de uma nova temporada no cárcere. Embora a sua trajetória tenha pontos em comum com a de outros militantes da luta armada, tinha um perfil completamente distinto dos jovens que haviam optado por pegar em armas na clandestinidade.
Manteve a aparência de vida normal para um burocrata. A partir da sua entrada para o Banco do Brasil, em 1952, atuou como sindicalista, chegando a pensar em se candidatar a presidente do Sindicato. Depois do golpe militar de 1964, porém, afastou-se do sindicato e ligou-se ao PCBR, uma dissidência do antigo PCB liderada pelos dirigentes comunistas Mario Alves, assassinado na prisão em janeiro de 1970, e Apolônio de Carvalho, que mais tarde viria a ser um dos fundadores do PT.

Como exercia uma função subalterna no banco, mas de confiança dos gerentes na compensação bancária, arquitetou um plano simples para desviar dinheiro para a guerrilha urbana. Abria contas em pequenos bancos e emitia cheques na agência em que trabalhava para essas contas. Quando o cheque chegava na compensação, ele não debitava a agência, mas trocava o cheque falso, que destruía, por uma ordem de pagamento, que ele mesmo recebia. Ou seja, através da ordem de pagamento que substituía o cheque falso, fornecia um crédito a ele mesmo, recebido em outro banco, fazendo com que a operação gerasse uma dívida para o Banco do Brasil.

O “Bom Burguês” é uma referência para analisar o caso de outro personagem, o empresário José Adelmário Pinheiro, o Léo Pinheiro, dono da OAS, que negocia delação premiada com investigadores da Procuradoria-Geral da República (PGR) responsáveis pela Operação Lava Jato. Um dos empresários mais próximos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele deve contar detalhes sobre o esquema de corrupção na Petrobras e sobre as obras feitas pela empreiteira em imóveis de Atibaia e do Guarujá para a família do petista. Ou seja, é um homem-bomba.

A Polícia Federal apreendeu mensagens de celular trocadas por Léo Pinheiro com outros executivos e dezenas de políticos. Condenado a 16 anos e quatro meses de prisão por envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras, Pinheiro aguarda decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) a respeito. A Corte tem confirmado decisões tomadas pelo juiz Sérgio Moro no primeiro grau. Preso preventivamente na Lava-Jato em novembro de 2014, com outros empreiteiros do país, foi solto no ano passado, por ordem do Supremo Tribunal Federal, sem concretizar a colaboração, mas agora corre o risco de voltar para a cadeia após a decisão do TRF-4.

De todos os executivos presos, Léo Pinheiro era considerado pelos políticos o mais “boa praça” no trato. Não é à toa que se relacionava pessoalmente com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de maneira diferenciada. Ao lado de Marcelo Odebrecht, Otávio Andrade e Ricardo Pessoa, era um dos comandantes do cartel de empreiteiras que desviava recursos da Petrobras por meio de contratos superfaturados, em troca de polpudas doações eleitorais para o PT e outros partidos da base do governo. Mas o que tem a ver a história de Jorge Medeiro do Valle, que amargou prisão e exílio, com a de Léo Pinheiro, que fez carreira à sombra do regime militar? Pessoalmente, nada. A concepção das organizações políticas envolvidas nos dois casos, porém, é a mesma. O desvio de recursos do Banco do Brasil para a luta armada foi considerado tão legítimo quando as doações eleitorais alimentadas pela corrupção na Petrobras. Em ambos os casos, porém, trata-se do desvio de dinheiro público.

Esse é o xis da questão da Operação Lava-Jato, que agora investiga o financiamento das campanhas eleitorais de 2006, quando Lula se reelegeu, e de 2010 e 2014, que levaram Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto. Otávio Azevedo, ex-presidente da empreiteira Andrade Gutierrez, por exemplo, afirmou à Lava-Jato que negociou com o ex-ministro Antônio Palocci o pagamento de R$ 6 milhões para o caixa dois da campanha de Dilma em 2010. No acordo de delação, Azevedo disse que o repasse foi feito via contrato fictício com uma agência de comunicação que atendia ao PT. Mais cedo ou mais tarde, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Supremo Tribunal Federal (STF) terão que se pronunciar sobre a verdadeira natureza das doações.