terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

"Engana-se a presidente ao imaginar que por estar convencida de que não se beneficiou de malfeitos está imune a ações de impeachment. Este abrange a responsabilidade político-administrativa, mesmo quando não se trata de 'crime' praticado pessoalmente.

O forte da Presidente Dilma não é seu conhecimento da história. O pedido de impeachment de Getúlio se deu em um contexto de alta radicalização política, exacerbada pela Guerra Fria, que envolveu na briga as Forças Armadas e mesmo setores internacionais. Fazia-se crer que haveria a repetição no Brasil da República sindicalista do peronismo."
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Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República, Folha de S. Paulo, 25.1.2016

Carvalho admite contato com lobista para edição de MP

• Ex-ministro do Governo Dilma admitiu que Mauro Marcondes, réu da Zelotes, o procurou demonstrando interesse na medida 627/2012 que prorrogaria incentivos fiscais para montadoras de veículos

Por Andreza Matais, Fábio Fabrini e Beatriz Bula – O Estado de S. Paulo

O ex-ministro Gilberto Carvalho admitiu nesta segunda-feira que o lobista Mauro Marcondes pediu que ele apoiasse no governo a edição de medida provisória que prorrogaria incentivos fiscais para montadoras de veículos com fábricas no Norte, Nordeste e Centro Oeste. O ministro afirmou ter respondido que não era sua atribuição esse tipo de demanda. Marcondes e a mulher, Cristina, estão presos acusados de participarem de suposto esquema de compra de medidas provisórias editadas nos governos Lula e Dilma.

“Disse que tinha outra função no governo, meu trabalho era cuidar dos movimentos sociais. Tinha agenda lotadíssima, não poderia ajudar, que me desculpasse. Mas fosse à Fazenda que, se fosse justo, iriam tocar”, afirmou em entrevista, após prestar depoimento como testemunha no inquérito que investiga suposta compra de MPs.

Segundo Carvalho, Marcondes tinha interesse na MP 627/2012 que foi editada e prorrogou os benefícios. O ex-ministro disse que não fez gestões na Fazenda para que Marcondes fosse atendido.

No governo Lula, Carvalho afirmou ter recebido de Marcondes uma carta de empresa multinacional automobilística, que não lembra o nome. Ele se recorda de ter agendado uma reunião entre Lula e Marcondes, este como representante da Anfavea, entre outros participantes, mas não o tema tratado. “Não participei.”

Marcondes foi tesoureiro e vice-presidente da Anfavea. Como sócio da Marcondes & Mautoni, o consultor contratou por R$ 2,5 milhões uma empresa do filho do ex-presidente Lula, Luís Claudio Lula da Silva. O empresário diz que prestou consultoria na área de esportes.

Carvalho negou que tenha recebido qualquer demanda envolvendo a compra de caças. “Nunca tive contato com esse tema.”

O ex-ministro citou várias vezes durante a entrevista que “o ex-governador Eduardo Campos fez puta pressão para que a Fiat fosse para Pernambuco”. Na busca e apreensão, a PF apreendeu documento que relacionou os nomes de Campos, da Fiat e de Lula a edição de MP que beneficiou a instalação da montadora no Estado. O ex-presidente disse que isso seria coisa de bandido. A Fiat negou qualquer acordo. O governo de Pernambuco disse que tem certeza de que Campos agiu com lisura.

Zika amplia desgaste de ministro do PMDB no Planalto

• Por causa de frases polêmicas e do avanço da epidemia, atuação de Marcelo Castro já desagrada a Dilma Rousseff; ele assumiu o cargo na mais recente reforma ministerial com objetivo de ampliar o espaço dos peemedebistas contrários ao impeachment

Tânia Monteiro e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo avalia que o ministro da Saúde, Marcelo Castro (PMDB), está desgastado e vem perdendo as condições políticas de permanecer no cargo em razão de suas declarações polêmicas e da ineficiência ao tratar do avanço da dengue e do zika. Nesta segunda-feira, 25, em uma visita à Sala de Situação do Distrito Federal para Controle da Dengue, em Brasília, o ministro voltou a dizer que o País está perdendo “feio” a guerra contra o Aedes aegypti.

A expressão, a mesma adotada na sexta-feira, 22, durante evento da Fundação Oswaldo Cruz, em Teresina, foi considerada infeliz pelo Planalto, sobretudo num momento em que integrantes do governo tentam traçar estratégia para mobilizar a população no combate ao mosquito. “Nós estamos há três décadas com o mosquito aqui no Brasil e estamos perdendo a batalha feio para o mosquito”, disse.

No governo, há quem avalie que Castro corre sério risco de “morrer pela boca”. Segundo um interlocutor do Planalto, o ministro já foi orientado a tomar mais cuidado com suas declarações. Algo que ele dá mostras de ter dificuldade em colocar em prática. À noite, após mais uma reunião no Planalto para debater um plano de combate ao mosquito, ele sugeriu que governos anteriores foram condescendentes na prevenção: “Nós temos 30 anos de convivência com o Aedes aegypti no Brasil. Sem querer culpar ninguém, acho que houve uma certa contemporização com o mosquito”.

A dificuldade em demiti-lo, porém, está associada ao risco de impeachment, uma vez que Castro é uma indicação do deputado Leonardo Picciani (RJ), líder do PMDB na Câmara que tem atuado em defesa do governo no Congresso e disputa a recondução ao cargo contra o deputado Hugo Motta (PB), aliado do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), responsável pela deflagração do processo de impeachment. Também pesa a seu favor o fato de que Castro, apesar de desastrado, é considerado aliado fiel da presidente e um auxiliar em batalhas travadas no Congresso.

Pressão. Mas a cada deslize, que começou tão logo o peemedebista foi indicado para o cargo, o cerco contra ele se fecha e nos bastidores discute-se sua saída. Na primeira declaração, antes mesmo de tomar posse, afirmou ser favorável a uma contribuição sobre movimentações financeiras. Ele sugeriu que ela deveria ser cobrada “no débito e no crédito”. Criticado, amenizou o discurso. Não voltou a falar em economia, mas passou a fazer comentários considerados de gosto duvidoso e com potencial de desgaste.

Questionado sobre planejamento familiar em tempos de zika e microcefalia, ele afirmou que “sexo era para amadores; gravidez, para profissionais”. Há poucas semanas, disse que “torcia” para que mulheres fossem infectadas pelo zika antes do período fértil, como forma de ganhar imunidade antes de a vacina ser desenvolvida.

A falta de freio do ministro nos comentários vem acompanhada do descontentamento no governo com a condução das medidas contra o avanço de dengue, chikungunya e zika. A maior preocupação é a ameaça do zika, vírus identificado no ano passado no País e associado à epidemia de microcefalia, má-formação que pode comprometer o desenvolvimento da criança. Castro já disse ser necessário trabalhar para evitar o surgimento de uma “geração de sequelados”.

Uma das estratégias usadas pelo governo foi criar uma Sala Nacional de Coordenação e Controle para combate ao mosquito e enfrentamento da microcefalia. A meta era visitar até o fim do mês “todos os domicílios” do País, um objetivo audacioso e que teve de ser adiado para o fim de fevereiro.

A presidente Dilma Rousseff já deu sinais de não estar satisfeita com o trabalho de Castro. Ao sair ontem da reunião com Dilma no Planalto, o ministro foi questionado se levou puxões de orelha por causa das declarações polêmicas. Castro respondeu que não. Segundo ele, a presidente está tão preocupada quanto ele em relação ao mosquito. “A situação é grave, a situação é gravíssima. E nossa obrigação, como agente público, é dizer, sem meias palavras, o que está acontecendo”, afirmou. / Colaborou Igor Gadelha

Após reunião com Lula, Delfim sugere que Dilma vá ao Congresso

• Ex- ministro da Fazenda propõe quatro reformas para evitar o ‘ caos’

Mariana Sanches, Thiago Herdye Maria Lima - O Globo

- SÃO PAULO e BRASÍLIA- O ex-ministro e ex-deputado Antonio Delfim Netto defendeu que a presidente Dilma Rousseff apresente em 2 de fevereiro projetos de reforma constitucional e infraconstitucional ao Congresso, como forma de reagir à crise e evitar maiores danos ao país. Em entrevista ao jornal “Valor Econômico”, disse que se não tomar atitude semelhante, o país viverá um “caos”, com dois ou três anos de recessão e um longo período de “crescimento muito baixo”.

Delfim levou seu posicionamento ao ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em almoço que contou com a presença do economista e aliado Luiz Gonzaga Belluzzo e do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT). Para Delfim, “o presidencialismo não funciona sem presidente”, por isso, em sua avaliação, “é tempo de a gente entender ( que) não tem mais impeachment”, devido ao fato de caber ao Senado — onde Dilma tem maioria — dar a palavra final sobre eventual impedimento.

“Só tem uma saída: é a Dilma assumir de volta a Presidência ou é o caos e vamos ter que esperar mais três anos”, disse Delfim.

O ex-ministro sugeriu que a presidente apresente quatro reformas para o país: da Previdência Social, da flexibilização do mercado de trabalho, da desindexação e da desvinculação das verbas do Orçamento. “Com isso, abre- se o espaço para o setor privado operar”, afirmou.

“Em algum momento temos que saber quem é o responsável pelo Brasil. São os dois ( Dilma e o Congresso). Mas como podemos fazer um experimento fundamental? Apresentando as reformas para o Congresso e vamos ver se ele tem coragem de dizer não”, sugeriu Delfim.

Delfim não foi localizado ontem. Um dos presentes no almoço entre Delfim e Lula onde as propostas do ex-ministro foram apresentadas, Luiz Gonzaga Belluzo disse ontem, ao GLOBO, considerar “impróprio o relato de um encontro privado” e criticou o fato de o teor das conversas ter “vazado”.

Segundo ele, a pauta da conversa foi a economia “em geral” e tudo o que Delfim menciona em sua entrevista foi realmente discutido pelo grupo, “com convergências e divergências”:

— A gente dá opinião livremente — afirmou.

Segundo Belluzzo, a proposta para que Dilma tome a frente e leve ao Congresso já no primeiro dia de atividades de 2016 as reformas foi “colocada ( na mesa), mas não com essa ênfase”:

— Dissemos que de fato era preciso uma reforma a ser conversada com as forças políticas e econômicas brasileiras. Mas a opinião do Delfim não foi unânime. O presidente ( Lula) acha que é preciso algumas reformas estruturais, mas não essa coisa tecnocrata, de cima para baixo.

Parlamentares divergem
Nem líderes oposicionistas nem governistas acreditam que Dilma terá condições de atender ao conselho do ex-ministro e ex-deputado. A dúvida é em relação à viabilidade de Dilma levar ao Congresso um pacote de reformas, já que suas bases sindicais e de movimentos sociais já se posicionaram contra, principalmente, em relação à da Previdência.

Vice- líder do governo, o deputado Paulo Teixeira ( PT- SP) confirma que Dilma não tem condições no dia 2 de fevereiro de apresentar um pacote de reformas, sem antes ter um consenso no foro sindical e em suas bases:

— A presidente não pode cair nessa conversa de pacote do exministro Delfim Netto. Não se resolve isso com uma varinha mágica, tirando a solução de uma cartola. No caso da reforma da previdência, ela precisa construir consensos no foro apropriado, com as centrais sindicais. Qualquer passo em falso nessa área pode voltar como um bumerangue contra o povo e o governo.

Líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho ( PE) diz não acreditar que Dilma seja capaz de confrontar suas bases.

— Acho a receita da defesa das reformas contraditória com a postura do governo, que todos os dias desmente a necessidade de reformas. Se a presidente quer negociar com a oposição uma reforma da Previdência, quero conhecer direito essa proposta. Ela não tem credibilidade para enfrentar os interesses dos movimentos sociais, que é o que existe de mais anacrônico no país.

Líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB) diz que não há reforma constitucional que impeça o caos, se não houver troca de governo.

— Já estamos no caos. Quem precisa de reforma é o governo como um todo que perdeu a credibilidade, não tem a confiança da sociedade. A primeira reforma é a troca do governo.

Já o senador Blairo Maggi (PR- MT) defendeu a posição de Delfim:

— Foi uma entrevista muito lúcida e está em linha com o quadro que os senadores constaram no recesso. Dilma deve ir ao Congresso se tiver o que dizer para tirar o Brasil do marasmo.

Ministro da Saúde acumula falas polêmicas e se desgasta

Natália Cancian – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Na guerra contra o "danado" do mosquito Aedes aegypti, que "é tímido, mas gosta das extremidades", as mulheres se protegem menos que os homens, porque "ficam com as pernas de fora". "E quando usam calça, usam sandália".

As expressões acima fazem parte do repertório de observações e conselhos do atual ministro da Saúde, o médico psiquiatra e deputado federal licenciado Marcelo Castro, desgastado no governo por causa de suas declarações.

Nesta segunda-feira (25), ele gerou insatisfação novamente no Planalto ao afirmar que o Brasil estava perdendo "feio" no combate ao mosquito transmissor de dengue, zika e chikungunya.

"Nós estamos há três décadas com o mosquito aqui no Brasil e estamos perdendo feio a batalha para o mosquito", afirmou, ao lembrar que o país registrou recorde de casos de dengue em 2015, com mais de 1,6 milhão de casos.

Não foi a primeira vez que o ministro fez críticas à falta de ações contra o Aedes. Em dezembro, ele afirmou ver uma certa "contemporização" do governo e sociedade no combate ao mosquito. "Ficamos sempre na loteria."

Deslizes
Psiquiatra, Castro passou a se dedicar à política em 1982. Atuava como deputado federal pelo PMDB quando assumiu o ministério, em outubro, em um gesto da presidente Dilma Rousseff para ampliar o espaço do partido no governo.

Desde então, Castro colecionou falas polêmicas. Em uma delas, disse que iria"torcer para que as mulheres peguem zika" antes da idade fértil, "aí ficariam imunizadas pelo próprio mosquito" e não precisariam de vacina.

Em outra ocasião, ao comentar a articulação e apoio do Exército no combate ao Aedes, Castro sugeriu como piada, em reunião interna, usar também a Marinha, "porque o mosquito se reproduz na água", e a Aeronáutica, "porque ele voa".

Não à toa, o ministro tem sido figura ausente na maioria das coletivas de imprensa da Saúde. A maioria dos anúncios fica a cargo de diretores e secretários -o ministro optou por falar em viagens ou após encontros oficiais.

Nessas ocasiões, o discurso se repete. Tentando estimular o uso de roupas compridas, uma das estratégias recomendadas contra o Aedes, diz notar que "os homens se protegem mais que as mulheres" no vestuário.

Já mulheres com intenção de engravidar precisam saber que, diante da microcefalia, "sexo é para amador, gravidez é para profissional", diz.

'Mal interpretado'
Indagado pela Folha na semana passada, Castro negou ter sofrido pressão por suas falas. E disse que se expressou mal ao citar uma "torcida" para que pegassem zika.

"Se a pessoa está fadada a adquirir zika, melhor seria antes da gravidez para que fique imune." A frase, segundo ele, tem fundamento técnico: enquanto o vírus da dengue tem quatro sorotipos, o da zika tem só um. A repercussão, diz, foi "absurda". "Toda pessoa tem direito de um dia se expressar mal".

Castro afirmou que repetiria o conselho de que "gravidez é para profissional".

Já sobre a fala sobre a roupa das mulheres, apontada como machista em redes sociais, disse: "Me dá uma recomendação melhor que essa?"

"Tenho o direito de recomendar isso para proteger as pessoas", afirmou. "Imagina o drama da microcefalia. Agora botar que é sexismo, é machismo? Pelo amor de Deus". A Folha tentou questioná-lo sobre as outras frases, mas o ministro encerrou a ligação.

Picciani ganha apoio de Newton Cardoso Jr e pressiona Planalto para que nomeie ministro

• Atual líder da bancada do PMDB na Câmara quer o mineiro Mauro Lopes na Aviação Civil

Júnia Gama - O Globo

- BRASÍLIA- Em meio ao acirramento da disputa para o comando da bancada do PMDB, o grupo do atual líder Leonardo Picciani (PMDB- RJ) pretende resolver o mais breve possível a nomeação do ministro da Secretaria de Aviação Civil e quer que Picciani pressione nos próximos dias por uma decisão do governo. O Palácio do Planalto, porém, já sinalizou não ter pressa em fechar a questão. Segundo auxiliares do governo, a intenção da presidente Dilma Rousseff era esperar a eleição do novo líder para tomar uma decisão sobre o caso.

Ontem, no entanto, Picciani conseguiu um trunfo para pressionar o Planalto. O deputado Newton Cardoso Junior (PMDB- MG) decidiu fechar apoio à recondução de Picciani à liderança do partido na Câmara. Com a adesão, nas contas dos aliados de Picciani, o líder já tem seis dos sete votos da bancada de Minas. A união dos mineiros em torno do nome de Picciani era a condição imposta pelo Palácio do Planalto para entregar a Secretaria de Aviação Civil para o deputado Mauro Lopes (PMDB- MG).

“Unir o partido”
A preocupação dos mineiros que apoiam Picciani é garantir a vaga antes da eleição para evitar que uma eventual vitória de Hugo Motta (PMDB- PB) altere a combinação. O adversário de Picciani — cuja candidatura foi gestada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB- RJ) — viajou a Minas Gerais no último domingo para se encontrar com Newton Cardoso Junior e pedir seu apoio. A empreitada, no entanto, não prosperou.

Antes indeciso, Newton pretendia disputar a vaga, mas como não conseguiu unir a bancada de Minas Gerais em torno de seu nome, recuou e ficou semanas sem declarar seu voto.

— Conversei com o Picciani sobre algumas mudanças que ele deve exercer na liderança, como se abrir mais ao diálogo e aceitar opiniões divergentes e ele concordou. Entendo que a candidatura dele é a que tem mais condições de unir o partido — afirmou Newton Cardoso Junior ao GLOBO.

Newton é o primeiro vice-líder de Picciani, mas perderá o posto, que foi prometido a Leonardo Quintão (PMDBMG). Quintão retirou sua candidatura na última sexta-feira em troca do apoio do líder para sucedê-lo em 2017. Segundo relatos, Picciani ofereceu a Newton “valorizar” seu mandato com, por exemplo, indicações para relatorias de projetos importantes durante o ano.

PMDB-RJ mantém aval a secretário de Paes

• Jorge Picciani disse que Pedro Paulo, acusado de agredir ex-mulher, vai concorrer à prefeitura do Rio na eleição deste ano

Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

O presidente do PMDB-RJ, Jorge Picciani, afirmou ontem que o secretário municipal de Coordenação de Governo, Pedro Paulo Carvalho, será o candidato à sucessão do prefeito Eduardo Paes. Desde que, em outubro passado, se tornaram públicas agressões físicas e ameaças de Pedro Paulo à ex-mulher Alexandra Marcondes, denunciadas por ela em registros policiais, a candidatura do secretário estava em xeque. Padrinho político de Pedro Paulo, o prefeito sempre disse que não haveria mudanças nos planos de lançá-lo candidato, o que foi confirmado por Picciani.

“A decisão sobre a candidatura de Pedro Paulo não é só do Eduardo Paes, mas de todo o partido. Pedro Paulo vai enfrentar e submeter o nome ao julgamento popular”, afirmou o presidente peemedebista.

A primeira queixa de Alexandra contra Pedro Paulo foi registrada em fevereiro de 2010, às vésperas da separação do casal. Ela disse ter sido agredida com socos e chutes e um laudo do Instituto Médico Legal (IML) constatou que Alexandra teve um dente quebrado. O casal havia brigado porque Alexandra descobriu uma traição de Pedro Paulo. O segundo registro aconteceu em agosto de 2010, quando a ex-mulher disse que Pedro Paulo a importunava em casa, havia chutado a porta do apartamento e ameaçado “sumir” com a filha do casal.

Quando a primeira agressão foi revelada pela revista Veja, em outubro, Alexandra inicialmente disse que havia mentido e que não tinha sido agredida. Depois, confirmou as agressões. Em entrevista ao lado da ex-mulher, em novembro, Pedro Paulo disse que era um problema de família já superado. O segundo registro policial feito por Alexandra foi noticiado pela revista Época.

‘Preparado’. “A gente não tira a gravidade nem a importância do fato, cabe a ele (Pedro Paulo) responder. As pessoas podem sair de uma situação adversa para um exemplo. O perdão é bíblico. O homem público está sempre sujeito ao julgamento popular. Pedro está plenamente preparado para governar a cidade. Com humildade aceitaremos o julgamento da população”, afirmou Picciani.

Além de Pedro Paulo, estão entre os pré-candidatos à prefeitura da capital o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), o deputado federal Alessandro Molon (Rede) e o senador Marcelo Crivella (PRB). O PSD poderá disputar com o deputado Indio da Costa. O PSDB defende candidatura própria na capital e está em busca de um nome.

Mercado piora projeção para inflação em 2016 e 2017

Analistas ouvidos pelo BC também veem retração maior do PIB este ano

Gabriela Valente - O Globo

- BRASÍLIA- Após o Banco Central ( BC) ter surpreendido o mercado financeiro na última quarta- feira, ao manter a taxa básica de juros ( Selic) inalterada em 14,25% ao ano, os especialistas revisaram — para pior — as projeções para a inflação este ano e em 2017. Com a avaliação de que a estratégia do BC não será suficiente para controlar os preços, os analistas aumentaram a previsão para a inflação para este ano de 7% para 7,23%, de acordo com a pesquisa semanal Focus, que a autoridade monetária faz com as maiores instituições financeiras do país.

A projeção ficou ainda mais distante do teto da meta determinado pelo governo, de 6,5%. Para 2017, as instituições de mercado elevaram a estimativa de 5,40% para 5,65%.

A promessa do BC é fazer o Índice de Preços ao Consumidor Amplo ( IPCA) ficar dentro dos limites permitidos e levar a inflação ao centro da meta, que é de 4,5%, no ano que vem. No entanto, cumprir essa tarefa se mostra um trabalho cada vez mais complicado, segundo os analistas.

— É um ajuste do mercado com a postura do Banco Central na gestão de Nelson Barbosa (ministro da Fazenda). O mercado reagiu aos sinais de um BC mais flexível às pressões políticas e a uma posição de política monetária que não era esperada pelo mercado — avaliou o professor do Ibmec Gilberto Braga.

Os economistas também alteraram a expectativa para a taxa básica de juros. A previsão para o fim de 2016 caiu de 15,25% para 14,64% ao ano. Mesmo com o indicativo de manutenção dos juros, os economistas apostam em uma alta de 0,75 ponto percentual na reunião do Comitê de Política Monetária ( Copom) de março. Com isso, a Taxa Selic passaria dos atuais 14,25% para 15% ao ano.

Há ainda a perspectiva de outra alta de 0,25 ponto percentual em abril. De acordo com as projeções do Focus, os juros só vão começar a cair em setembro.

Uma avaliação melhor dos rumos da política de combate à inflação deve ser feita na semana que vem, após o Copom publicar a ata de sua última reunião, quando, dividido e sob pressão política para não aprofundar ainda mais a recessão econômica, decidiu contrariar toda a comunicação que tinha feito anteriormente e manter os juros em 14,25% ao ano.

Sinais contraditórios
A decisão foi tumultuada por uma nota publicada no dia 19 — o primeiro dia da reunião — pelo presidente do BC, Alexandre Tombini. No texto, ele classificou de “significativas” as mudanças nas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) em relação à economia brasileira. Na ocasião, o Fundo revisou a expectativa de retração deste ano de 1% para 3,5%. E o crescimento do Brasil em 2017 seria zero, deixando apenas para 2018 a tão esperada retomada da economia.

O presidente do BC usou as estimativas do Fundo para justificar o fato de não aumentar os juros, coisa que o banco indicava que iria fazer.

— Na última ata do Copom, o BC sinalizava que ia aumentar os juros. De lá para cá, não houve acontecimento que pudesse mudar o rumo da política monetária — observou Braga.

Os analistas ouvidos pelo BC também reviram suas estimativas para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB). Para 2016, a previsão agora é de recessão de 3%, ante 2,99% na pesquisa anterior. Para 2017, o crescimento estimado foi reduzido de 1% para 0,80%.

Eles também mostraram pessimismo em relação ao dólar, que deve continuar a forçar os preços. Para o fim deste ano, a previsão subiu de R$ 4,25 para R$ 4,30. Para o fim de 2017, passou de R$ 4,30 para R$ 4,40.

Dívida pública tem alta recorde e chega a R$ 2,793 trilhões em 2015

• Ritmo de crescimento da dívida foi quase três vezes maior do que o verificado em 2014; Tesouro diz que a dívida só vai começar a melhorar daqui a três anos

Lorenna Rodrigues, Adriana Fernandes, Bernardo Caram e Rachel Gamarski - O Estado de S. Paulo

Na esteira da alta de juros e da inflação, a dívida do governo federal aumentou R$ 497 bilhões e atingiu R$ 2,79 trilhões em 2015. A expansão do endividamento do governo, que inclui a dívida em títulos do Tesouro Nacional vendidos no mercado doméstico e internacional, chegou a 21,65% - o maior valor da série iniciada em 2006.

O resultado do ano passado revelou uma forte deterioração e uma reversão, em um único ano, do processo de melhoria dos principais indicadores da dívida que vinha ocorrendo desde 2003, no primeiro ano do governo Lula. Para agravar o cenário, o Tesouro avisou que a dívida só vai começar a melhorar daqui a três anos.

O ritmo de crescimento da dívida foi quase três vezes maior que o verificado em 2014. O resultado negativo do ano passado foi puxado pelo aumento de R$ 367,67 bilhões nas despesas com juros, que provocou o aumento do estoque. Para 2016, o Tesouro previu que a dívida pode aumentar R$ 507 bilhões e chegar a R$ 3,3 bilhões.

A piora acelerada da dívida já havia sido captada pelas agências internacionais de classificação de risco - Standard & Poor’s e Fitch - que retiraram o grau de investimento do Brasil no passado.

As dificuldades já esperadas também para 2016 devem agora alimentar o risco de novos rebaixamentos e a piora da percepção dos investidores sobre a economia brasileira. Os indicadores de capacidade de pagamento da dívida, como tipo de correção dos papéis e prazo de vencimento, são os mais observados pelas agências na hora de avaliar a nota de um País. O governo precisa melhorar a confiança para garantir investimentos e a retomada do crescimento.

O presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Júlio Miragaya, avaliou que o crescimento da dívida em 2015 a torna "explosiva". Para ele, com o atual nível do custo de financiamento, em cerca de 8,5% do Produto Interno Bruto (PIB), a discussão sobre a entrega de um superávit primário de 0,5% do PIB "se torna secundária". "Com um custo da dívida desta ordem, você abate uma parcela pequena com o superávit. Se o custo fosse mais perto de 4% ou 5% do PIB, o impacto do esforço fiscal poderia ser muito maior", afirmou.

Em 2015, três das seis metas fixadas para os principais indicadores da dívida não foram cumpridas: parcela de títulos atrelados à taxa Selic, inflação e prefixados (papéis que têm taxa fixada na hora da venda). Com o descumprimento, ficou comprometida a estratégia do governo de reduzir os títulos com correção pela Selic, que têm taxa flutuante a depender da decisão do Banco Central e trazem maior risco de financiamento, e aumentar os papéis atrelados ao IPCA e os prefixados.

O maior desvio ocorreu com os títulos vinculados a Selic, as LFTs. A parcela desses papéis fechou ano passado em 22,8% do total da dívida, acima da meta que previa um intervalo de 17% e 22%. Para 2016, o Plano Anual de Financiamento (PAF), que contém a estratégia de gestão da dívida, prevê um aumento ainda maior destes papéis, que podem chegar a 34%. Um valor bem longe do patamar de 15% considerado confortável para a gestão da dívida.

“Não nos incomoda o fato de estarmos avançando na ampliação das LFTs”, minimizou o secretário interino do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira de Medeiros. No passado, o Tesouro chegou a ter como meta reduzir a zero a parcela vinculada à Selic. Ele rebateu a avaliação de que o aumento desses papéis diminui a potência da política monetária do BC. Segundo ele, em momento de alta de juros, os LFTs são um instrumento de redução de custo.

Mesmo com redução de prefixados e aumento de títulos indexados à Selic, o secretário disse que a composição da dívida ainda está melhor do que o período de 2003 a 2011 e que houve agora um “pequeno recuo "em um período complexo". "Não vejo retrocesso no conjunto da dívida", completou. 

Ele citou o fato de a dívida de curto prazo, a vencer em 12 meses, continuará em queda, devendo ficar abaixo de 20% em 2016.

Ele informou que o chamado “colchão de liquidez”, que são os recursos que o Tesouro tem em caixa para pagar os títulos que estão vencendo, soma hoje cerca de R$ 250 bilhões, montante suficiente para honrar os compromissos da dívida nos próximos seis meses. Com esse colchão, o Tesouro pode ficar sem vender títulos em momentos de turbulência no mercado.

Na mensagem em texto do apresentação do PAF, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, fez uma defesa do ajuste fiscal. O ministro reafirmou o compromisso com solidez fiscal permanente para a retomada do crescimento econômico sustentável, guiada pelo retorno do investimento e da produtividade.

“Por meio de resultados fiscais perenes, devolveremos aos agentes econômicos a previsibilidade e a confiança necessárias para o retorno dos investimentos privados, vetor principal de dinamização da economia brasileira", escreveu Barbosa. (Colaborou Mário Braga)

Desaprenderam de Pensar, diz Cristovam Buarque

• Ex-ministro da Educação do governo Lula, o senador diz que a academia brasileira é intelectualmente despreparada, afastou-se da realidade e foi cooptada pelo PT

Entrevista de Cristovam Buarque ao repórter Robson Bonin

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) é um tipo de político cada vez mais raro no país. Doutor em Economia pela Sorbonne, ele usa o mandato como instrumento de defesa de interesses coletivos, como uma reforma profunda na área da educação, e não para obtenção de certos benefícios tão consagrados no mensalão e no petrolão. Considerado quixotesco pelos colegas, Cristovam, ex-petista, faz jus à fama nesta entrevista à VEJA, em que, entre desiludido e esperançoso, defende a extinção dos atuais partidos, exorta governistas e oposicionistas a conversar pelo bem do Brasil e cobra o fim da promiscuidade entre empresários e agentes públicos.

Como o senhor avalia a situação política da presidente Dilma Rousseff ?

- Um dos grandes problemas é que ela está rodeada por aduladores e apoiadores que têm medo de dizer a verdade. Talvez isso seja culpa dela, que reage mal ao que lhe é dito. O fato é que a presidente não é capaz de apresentar ao Brasil uma agenda para o futuro. A agenda dela hoje é o impeachment. Ela passa os dias distribuindo cargos em troca de votos contra o impedimento. O país não aguenta isso.

O senhor já conversou com a presidente sobre a crise?

- Em agosto do ano passado, eu e outros cinco senadores tivemos uma conversa com ela. Como achava.que a Dilma nem iria nos ouvir, levei uma carta, lida na frente dela, que dizia: "Presidente, o país tem três situações adiante que são extremamente ruins para o futuro. O seu impeacbment, a sua cassação e a continuidade do seu governo não são bons para o país'”. A carta sugeria alguns passos. Que a presidente fosse ao Congresso para fazer um discurso ao Brasil pedindo desculpas pelos erros cometidos. Que afirmasse que usaria os próximos três anos para acertar o rumo do país. E que anunciasse que não era mais do PT, que o seu partido a partir dali seria o Brasil.

A presidente não acolheu as sugestões. Hoje, o senhor é favor do impeachment?

- Impeachment não é golpe, está na Constituição e até já fizemos um. Se for
discutir golpe no Brasil, talvez ele tenha ocorrido em outubro de 2014, com todo aquele estelionato eleitoral. A Constituição não prevê o impedimento por incompetência ou por mentiras durante a campanha, mas por um crime de responsabilidade. Não direi como vou votar porque, como serei um dos juízes, não posso antecipar o voto.

Agrava a situação de Dilma o fato de ela estar cercada de ministros investigados por corrupção?

- O pior é que a presidente está dentro de tudo isso. O nome dela não aparece, mas ela é chefe desse pessoal investigado por corrupção e foi beneficiada por todas essas coisas.
Como é ser crítico ao governo e, ao mesmo tempo, integrante de um partido da base governista?

Pago um preço muito alto por isso. Em 2007, em troca do Ministério do Trabalho, o presidente do meu partido, Carlos Lupi, fez a opção de se atrelar ao PT e transformar o PDT num puxadinho do PT. A verdade é esta: o PDT virou um puxadinho do PT. Fui critico disso, desde o começo. Como é que a gente critica a corrupção se o PDT está no governo que tem corrupção? A corrupção não é só do PT. É do PDT, do PMDB e dos outros partidos que estão se escondendo debaixo das asas do PT.

A política partidária está em crise?

- Os partidos perderam o prazo de validade. Era preciso acabar com todos os partidos que estão aí, declarar uma moratória partidária de seis meses e criar novos partidos com outros quadros, que prezem a ética e a ideologia partidária. Tanto o PT quanto o PSDB representam um modelo fracassado de país. O PT é culpado por ter cometido tantos erros no governo. E o PSDB tem responsabilidade por não ter feito uma oposição a favor do país. Os tucanos dizem que não é papel da oposição oferecer alternativas. Estão errados. A oposição tem de oferecer alternativas tão radicais que o próprio governo aceite implementá-las para ganhar o eleitor.

Por que o senhor deixou o PT em 2005, quando o mensalão já estava descoberto?

- Antes de sair, escrevi uma carta de análise do governo. Eu alertava no texto que a gente estava perdendo o rumo, se acomodando, se viciando. Alertava também para o horror ao mérito na administração petista. O PT loteou o governo de incompetentes e perdeu a capacidade de transformar a sociedade. Ê um partido desmoralizado politicamente por ter abandonado todos os sonhos que pregou. Isso matou o PT.

O cantor Chico Buarque foi hostilizado no Rio por defender o PT. O país está mais intolerante politicamente?

- Aquilo só ocorreu porque o próprio PT tem sido muito intolerante. As pessoas não estão se dando conta de que essa intolerância é um dos grandes riscos para o Brasil. Ela está saindo do limite. O Chico é um defensor dos erros petistas, mas não faz parte do grupo dos intolerantes que atacam quem pensa de modo diferente do PT. Não é como aquele ator Zé de Abreu. Mandei uma carta ao Chico solidarizando-me, mas cobrei que ele mobilizasse os artistas em um movimento de tolerância. Ele ainda não respondeu. Tucanos e petistas precisam ouvir uns aos outros.

Por que ninguém cobra o afastamento do Presidente do Senado, Renan Calheiros?

- Quando houve aquele caso anterior, do pagamento das despesas de uma filha dele por um lobista de empreiteira, cheguei a ir à casa do Renan para falar que ele deveria renunciar. Hoje, o processo dele está tão judicializado que talvez nem seja preciso cobrar isso - ou porque não chegou a hora ou porque vai passar da hora e a Justiça fará o seu trabalho.

O senhor acredita em um acórdão para salvar corruptos e corruptores?

- Uma das coisas ruins deste pais é a promiscuidade entre empresários e políticos e entre políticos e juízes. Nos EUA, ninguém vê ministro da Suprema Corte na rua. Lá, eles não dão entrevista. Aqui, ministro dá entrevista nos corredores. A promiscuidade é uma forma de corrupção não explícita. Ela não enriquece o bolso, mas corrói. Ê preciso quebrar isso. Juiz é juiz, politico é politico e empresário é empresário. Na hora de se encontrarem, que se encontrem nos autos, e não como é hoje.

A crise econômica vai piorar?

- Infelizmente, o cenário não é bom. As conquistas econômicas e sociais estão em risco. A estabilidade monetária deu lugar à inflação, enquanto a democracia segue quebrada, sem partidos nem políticos com espírito público e propostas de longo prazo. O Estado brasileiro está quebrado e deveria se concentrar em cuidar da educação, da saúde e da segurança e deixar as outras áreas para a iniciativa privada. Estamos muito atrasados.

Qual é o retrato da educação no governo Dilma?

- A Pátria Educadora não existe. O governo usa a educação como mero slogan para tentar enganar as pessoas. A revolução na educação passa por fazer a escola do mais pobre ser tão boa quanto à do mais rico. Isso é possível. Eu vi o prêmio da Fifa, de gol mais bonito do mundo, a este menino Wendell Lira, merecido, aliás. Ele só ganhou isso, mesmo sendo pobre, porque a bola é redonda para pobres e ricos. Se a bola fosse quadrada para o pobre, ele não faria aquele gol nem entraria em campo. Se a gente tivesse as escolas redondas, muitos Wendells seriam candidatos ao Prêmio Nobel.

Como o senhor, que já foi reitor da Universidade de Brasília, explica a omissão da academia em relação ao que se passa hoje no Brasil?

- A academia foi cooptada pelo PT. Na eleição passada, 54 reitores assinaram um manifesto de apoio à candidatura da presidente Dilma. Reitor não assina manifesto de apoio partidário. Ele pode até dizer em quem vota, porque representa uma comunidade, mas por que os reitores votaram? Porque teriam mais recursos para a universidade. Além disso, a academia está fragilizada por causa da má educação de base dos acadêmicos e do corporativismo. A universidade desconectou-se da realidade brasileira. Está subordinada aos sindicatos, fragmentada pelo corporativismo e pelo despreparo dos acadêmicos.

Como era_sua relação com o ex-presidente Lula, que o demitiu por telefone do cargo de Ministro da Educação?

- Sou um admirador daquele Lula histórico. Ele deu uma grande contribuição pelo simples fato de um operário ter chegado à Presidência em um país aristocrático como o Brasil. Poucos sabem, mas fui eu quem apresentou o Hugo Chávez ao Lula. O Chávez pedia, mas o Lula não queria conhecê-lo. Ele me dizia: "Isso é um milico golpista, não quero conhecer”. Eu respondia que esse milico tinha umas posições progressistas e seria presidente eleito. Marquei dois encontros que o Lula primeiro recusou para depois aceitar: com o Chávez e com o Fernando Henrique Cardoso.

O Bolsa família é um bom programa?

- O Bolsa Família deixou de ser um programa educador e se tornou um programa assistencialista, quando o Lula tirou a gestão do Ministério da Educação e a repassou ao Ministério do Desenvolvimento Social. O Lula misturou vários programas assistenciais ao Bolsa Escola e juntou tudo com a genialidade do Duda Mendonça (ex-marqueteiro do PT), que mudou o nome Bolsa Escola para Bolsa Família. Quando uma mãe recebe dinheiro de um programa que se chama Bolsa Escola, ela pensa: eu recebo esse dinheiro porque meu filho vai à escola e pela escola ele vai sair da pobreza. Já quando o nome é Bolsa Família, ela pensa que recebe porque a família é pobre e que, se sair da pobreza, vai parar de receber o dinheiro. Não há porta de saída.

O senhor se surpreende com a fortuna acumulada por Lula e sua família depois da chegada ao poder?

- Vejo com profunda tristeza que isso tenha acontecido. Ao mesmo tempo, vejo com satisfação que a gente esteja sabendo, que isso não está mais escondido. Espero que as investigações não fiquem só nele.

O senhor acredita na viabilidade da candidatura de Lula ao Planalto em 2018?

- Se o governo da Dilma for até o fim e se o juiz Sergio Moro e o Ministério Público levarem a Lava-Jato até o final, o Lula estará morto em 2018. Mas, se a Dilma cair, e o PT e o Lula forem para a oposição com o discurso de vítimas de um golpe e o governo que substituir o atual for incompetente... Vai depender de o Lula conseguir convencer o povo a lembrar só das coisas positivas dele e esquecer do resto. O Lula é um ilusionista.

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(Páginas Amarelas da Revista Veja, edição nº 2.461 – ano 49 – 20 de janeiro de 2016)

Merval Pereira: Reação previsível

- O Globo

A carta de advogados com críticas à Operação Lava- Jato e ao juiz Sérgio Moro — já identificada como estratégica saída da defesa de Marcelo Odebrecht, e uma possível “campanha de comunicação” para tentar influenciar a opinião pública contra os procuradores e melhorar a imagem dos envolvidos nos escândalos da Petrobras — são reações já esperadas à medida que as investigações avançam e chegam mais perto do momento da denúncia contra grandes empresários e políticos.

Na contabilidade do chefe da equipe de procuradores da Lava- Jato, Deltan Dallagnol, estão envolvidas “mais de 60 bancas de advogados que dominam o discurso jurídico, da melhor qualidade técnica, pessoas altamente influentes politicamente, poderosas economicamente, e é natural que em algum momento esse discurso ganhe volume”.

Eles têm em mente o que aconteceu na Itália durante a Operação Mãos Limpas, que teve um apoio popular grande durante os primeiros momentos e acabou sendo envolvida por diversas denúncias que, mesmo não tendo sido comprovadas, corroeram a confiança popular.

A reação do sistema político teve seu auge com a eleição de Silvio Berlusconi como primeiro-ministro em 1994. Os juízes Di Pietro — que mais tarde entraria na política — e Davigo foram convidados para serem seus ministros, mas recusaram diante da evidência de que o que Berlusconi queria mesmo era desmobilizar a Operação Mãos Limpas.

Tomou corpo, então, uma campanha de difamação contra as principais figuras da Mãos Limpas, em especial o juiz Di Pietro, e acusações de abuso de poder nas investigações. Não é novidade, portanto, a campanha que vem sendo desenvolvida pelos advogados de defesa contra os procuradores e a Polícia Federal, da mesma maneira que o Supremo Tribunal Federal (STF) sofreu críticas devido a decisões tomadas durante o julgamento do mensalão.

O conselho de ministros do novo governo italiano aprovou um decreto- lei impedindo prisão cautelar para a maioria dos crimes de corrupção, a partir do que grande parte dos presos foi solta. O decreto, que ficou conhecido como “salva ladrões”, causou tanta indignação popular que acabou sendo revogado poucos meses depois de editado, mas provocou retrocesso nas investigações.

Por isso o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos membros da Lava- Jato, já fez críticas ao STF quando decidiu pelo desmembramento de alguns processos, alertando que a decisão poderia significar “o fim da Lava- Jato”, e deu entrevistas identificando “dedo do governo” na edição de medidas que beneficiam investigados da operação, como as mudanças nas regras de leniência e a repatriação de recursos ilegais no exterior.

Assim como o juiz Di Pietro abandonou a Operação Mãos Limpas, fragilizando- a politicamente, há boatos de que o procurador Carlos Fernando ameaça deixar a Lava- Jato “por cansaço”. Seja verdade ou simples “guerra na internet”, como classificam os procuradores, sua exasperação é visível nas entrevistas, e a maneira desabrida com que trata as questões tem provocado mal-estar entre alguns companheiros de investigação, que não querem dar pretexto para os que objetivam boicotar a Operação Lava- Jato.

A Mãos Limpas durou dez anos, mas foi nos três primeiros que teve ação mais efetiva, condenando, inclusive, políticos importantes como Bettino Craxi, do Partido Socialista Italiano, que acabou se asilando na Tunísia, onde morreu, para não ir para a cadeia.

Em vez de terem aprovado reformas que evitariam a corrupção, na Itália acabou se assistindo a uma reação do sistema, dos próprios investigados, pessoas poderosas e influentes, e foram aprovadas leis para garantir a impunidade. Por isso os procuradores da Operação Lava- Jato propuseram as “10 medidas contra a corrupção”, que pretendem apresentar como projeto de iniciativa popular ao Congresso ainda no primeiro semestre deste ano.

Já tem nos primeiros dias de janeiro 1,2 milhão de assinaturas, e para tanto precisa de 1,5 milhão.

Bernardo Mello Franco: O ministro sincero

- Folha de S. Paulo

O Brasil está "perdendo feio" a batalha para o Aedes aegypti. O diagnóstico foi feito ontem pelo ministro da Saúde, Marcelo Castro. A declaração irritou a presidente Dilma Rousseff, que o convocou para uma conversa a sós no Planalto.

A rigor, não houve novidade nas palavras do ministro. Ele apenas repetiu o que dissera na sexta passada, no Piauí. Na ocasião, a chefe parece não ter ouvido. Agora que ouviu, não gostou. Castro foi ao palácio com a certeza de que levaria um sabão.

O ministro está no cargo há menos de quatro meses. Ainda não disse a que veio, mas já se notabilizou pelas frases desastradas. Há duas semanas, afirmou que o vírus zika pode produzir uma "geração de sequelados". É difícil imaginar uma insensibilidade maior com os pais de bebês que nasceram com microcefalia.

Castro também disse "torcer" para que as mulheres em idade fértil peguem a doença antes de engravidar. Completou a frase com uma risada, em outra atitude imprópria para o cargo e a gravidade da situação.

Deputado do chamado baixo clero, o peemedebista nunca havia sonhado a sério em virar ministro da Saúde. Foi alçado ao posto em uma barganha explícita por votos contra o impeachment. Ninguém precisava ter doutorado em epidemiologia para saber que não poderia dar certo.

A avaliação geral em Brasília é que Castro está aquém do cargo. Sua equipe demorou demais a reagir ao surto do zika, que se espalha em velocidade alarmante. De quebra, o país acaba de bater o recorde anual de casos de dengue, também também transmitida pelo Aedes. Em 2015, a doença atingiu a marca de 1,6 milhão de registros, com 863 mortes.

Apesar da nova demonstração de inabilidade política, o ministro não errou ao dizer que estamos perdendo a batalha para o mosquito. Ele apenas admitiu uma verdade incômoda para o governo e triste para todo o Brasil. Diante da emergência do zika, a sinceridade que irritou Dilma é o menor dos problemas.

Luiz Carlos Azedo: Caixa dois e pé no barro

• O modelo de financiamento adotado não é compatível com o sistema eleitoral vigente — as eleições proporcionais — devido ao número de candidatos e ao tamanho dos colégios eleitorais

- Correio Braziliense

Há uma desorientação geral nos partidos políticos quanto ao financiamento das campanhas eleitorais, em razão das novas regras estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu o financiamento privado de pessoas jurídicas, e do Tribunal Superior Eleitoral, que estabeleceu os limites das doações individuais para cada partido, município por município, com base nos gastos declarados pelas legendas nas eleições passadas.

Como quase tudo o que acontece quanto às relações entre a União e os demais entes federados, a fórmula seguiu os preceitos positivistas que fundaram a República: partiu-se do princípio de que todos os políticos defenderão o bem comum. Na prática, a maioria defende as respectivas corporações ou os grupos econômicos aos quais estão ligados, por razões geográficas ou ramos de negócio. Raros são aqueles que ainda se elegem pelo voto de opinião. Quando isso acontece, muitas vezes, o voto é uma forma de protesto contra a política e os políticos.

Criou-se, porém, um “buraco negro” na legislação: partidos e candidatos não sabem como vão financiar a próxima campanha eleitoral. A cúpula dos partidos políticos lava as mãos. Como as eleições são municipais, os caciques vão determinar suas prioridades e ver o que vai acontecer, para depois mudar a legislação, como sempre fazem, quando estiverem em jogo os mandatos estaduais e federais. Mesmo com a elevação dos valores do Fundo Partidário, que foram triplicados, as verbas disponíveis para o financiamento público, via as direções nacionais dos partidos, são consideradas insuficientes para bancar os custos da campanha nos municípios.

Marqueteiros e dirigentes partidários avaliam que as campanhas terão que se redimensionar, com mais peso às redes sociais e ao corpo a corpo com os eleitores, o chamado pé no barro. Os programas de televisão, porém, continuarão a fazer a diferença junto à grande massa de eleitores que só se interessa pela política às vésperas da eleição. E continuarão sendo como um vestido de noiva, isto é, quanto mais caro, mais bonito. Além disso, houve a “mercantilização” absoluta das campanhas eleitorais, mesmo em pequenos municípios do interior. São raros os militantes que ainda fazem campanha sem receber algum dinheiro em troca.

Essa “profissionalização” de cabos eleitorais e equipes de campanha é uma espécie de dependência química. Um verdadeiro exército mercenário vive agora uma crise de abstinência, pois as eleições se aproximam e o dinheiro que costumava circular nas campanhas eleitorais até agora não apareceu. Haja vista que, segundo a ONG Transparência Brasil, as campanhas municipais custaram R$ 4,6 bilhões há quatro anos; em 2014, nas eleições nacionais e estaduais, o financiamento superou R$ 5 bilhões.

O Fundo Partidário, a ser repartido entre todas as legendas, será de R$ 819 milhões. É quase três vezes maior do que o de 2014 (R$ 289,5 milhões), porém, menor do que o liberado no ano passado: R$ 867,5 milhões. Diante disso, avalia-se que os prefeitos candidatos à reeleição e candidatos apoiados pelas máquinas municipal, estaduais e federal terão maiores chances. Contarão com os funcionários contratados pelas administrações, além da ajuda de fornecedores, para estruturar suas campanhas. Mas isso, é bom lembrar, também implica em risco de cassação por abuso do poder econômico.

Remendos
A proibição do financiamento de empresas às campanhas eleitorais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) teve amplo apoio da opinião pública, mas nem por isso deixou de ser uma intervenção errática e intempestiva no processo político, como outras decisões da Corte. Como o STF e o TSE só decidem sobre assunto provocado pelos partidos políticos ou terceiros, o que explica essas decisões, o Judiciário não tem a prerrogativa de propor uma reforma política, o que caberia ao Executivo, muito menos de aprová-la, o que cabe ao Congresso. Faz apenas remendos.

O grande problema é que o modelo de financiamento adotado não é compatível com o sistema eleitoral vigente — as eleições proporcionais — que implicam em campanhas dispendiosas devido ao número de candidatos e ao tamanho dos colégios eleitorais. Seria mais coerente a adoção do voto distrital ou distrital misto, o que poderia ter sido feito como experiência nessas eleições municipais, por lei ordinária, ou seja, sem necessidade de emendas à Constituição. Ocorre que a maioria dos partidos e dos políticos, principalmente os deputados, desacostumados às disputas majoritárias, são contra a mudança.

Em tese, o novo sistema de financiamento estimula pequenas doações de pessoas físicas, o que contribuiria para resgatar a militância partidária e democratizar as campanhas eleitorais, inibindo o poder econômico. Entretanto, a desmoralização da política e dos partidos, devido aos escândalos e à corrupção, afasta os cidadãos da política e inibe as doações. Na prática, quem já tem um caixa dois de campanha fará uso dele nas eleições de forma dissimulada. O forte da Justiça Eleitoral não é impedir que isso ocorra, é evitar fraudes na votação e na apuração. Caso também o fosse, não haveria Operação Lava-Jato.

Miriam Leitão: Custo imediato

- O Globo

A conta chegou rapidamente. A tibieza do Banco Central na semana passada fez saltar as expectativas de inflação. A pesquisa Focus mostrou isso. As projeções já vinham aumentando, mas não é comum uma alta tão forte em apenas uma semana: saiu de 7% para 7,23%. Pior do que a mediana do mercado é a visão dos cinco que mais acertam. O grupo prevê perto de 8% em 2016 e mais de 7% em 2017.

Oque eleva a expectativa de inflação não é apenas a política monetária, mas o conjunto. Como se pode ver no gráfico, a previsão para 2016 estava em um nível dentro do intervalo de flutuação da meta, até agosto do ano passado. Quando o governo mandou o orçamento deficitário para o Congresso, em 31 de agosto, o país entrou numa crise de confiança que só se agravou até agora.

Logo depois, vieram o rebaixamento e a perda do grau de investimento. Por causa disso, o dólar disparou, e o câmbio ajudou a realimentar a inflação. O desequilíbrio fiscal, exibido na decisão insensata de mandar o Orçamento deficitário, fez as expectativas piorarem e iniciou uma fase ruim. O BC não é responsável pela deterioração de todo o quadro, mas na semana passada, ao conduzir a reunião do Copom que decidiu pela manutenção dos juros, passou a ideia de que estivesse cedendo à pressão política. Há uma convicção de que houve erro na comunicação. Haverá chance de diminuir o estrago com a divulgação da ata esta semana.

Diante desse quadro de inflação, o governo ainda não tem resposta. Ele também demonstra não saber como lidar com a recessão. Tudo o que disseram até agora sobre medidas que vêm sendo pensadas pelo ministro da Fazenda não parece muito viável. Tentar estimular o crédito quando está claro que não falta oferta de crédito, mas sim demanda por empréstimos, ou seja, pessoas e empresas não estão muito interessadas em se endividar no atual contexto. Essa falta de noção do que fazer atinge muitas vezes o setor privado. O presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, dias depois de dizer que a procura por novos empréstimos estava muito baixa, propôs que houvesse liberação de compulsório. Medida expansionista no meio da inflação alta e expectativas se elevando não é recomendável. Quando a demanda por crédito é baixa, a medida é inútil.

O Tesouro divulgou ontem outra notícia ruim. O aumento na dívida pública de um ano para o outro. O governo está mais endividado e com um perfil pior. A dívida pública federal saltou 21,7% em termos nominais, ou seja, sem descontar a inflação, e chegou a R$ 2,8 trilhões. Já o custo para rolar os papéis disparou com o aumento da Selic e com a piora da percepção de risco. O custo médio da dívida chegou a 16,07% em 2015.

A participação de títulos pré- fixados diminuiu, de 41,6% para 39,4%, e aumentou a de papéis com taxas flutuantes, de 18,7% para 22,8%. Isso quer dizer que diminuiu a previsibilidade sobre os custos da dívida, porque eles vão oscilar dependendo da inflação, da Selic e do dólar. Ainda esta semana o Banco Central vai divulgar os números finais do setor público consolidado. O país fechará o ano de 2015 com déficit primário, déficit nominal e um forte aumento do endividamento bruto.


O ano de 2016 começou com as expectativas de inflação bem acima do teto da meta e já se projeta inclusive aumento para 2017. Os cinco que mais acertam as previsões deram um grande aumento nas projeções de inflação para o ano que vem, de 5,50% para 7,19%. O cenário previsto pelo mercado é de que o país terá mais dois anos de recessão com inflação alta.

Celso Ming: A volta do Conselhão

• A escolha do governo de reconvocar o Conselhão parte do fato de estar isolado e com sua base política fragilizada; como se para baixar mais um pacote fosse preciso esse aparato

- O Estado de S. Paulo

Nesta quinta-feira, o governo pretende retirar do baú o Conselhão, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, um agrupamento de cerca de 90 empresários, sindicalistas e notáveis da vida artística e literária.

Trata-se de uma invenção do então presidente Lula em 2003 que pretendia manter com a sociedade um diálogo informal. É uma instituição esquisita na medida em que o diálogo deveria ser feito por meio dos canais institucionais, ou seja, por meio do Congresso e dos partidos políticos.

Durante o governo Lula, o Conselhão produziu mais espuma do que consequências práticas. A presidente Dilma o desativou em julho de 2014, aparentemente porque não o julgou um sistema funcional num momento em que pretendia impor sua Nova Matriz Macroeconômica sobre a qual não convinham palpites. Mas seu governo está agora tão isolado e sua base política tão fragilizada que a escolha foi reconvocar o Conselhão com nova composição (a convite do próprio governo), na tentativa de buscar apoio para mudanças.

O risco maior dessa nova fase do Conselhão é o de que não passe de um teatro armado para passar a impressão de que o governo tem um projeto, o que de fato não tem. O objetivo mais importante no momento é arrancar do Congresso a aprovação da nova CPMF. O resto está muito vago.

Diante da inércia do governo Dilma, o PT e o presidente Lula avisaram que querem a ampliação do crédito e a derrubada dos juros. São proposições disparatadas porque, apesar da política monetária apertada, não falta crédito. Falta renda, como se vê pela alta proporção de desistência dos financiamentos habitacionais. E falta disposição de tomar empréstimos na rede bancária por parte das empresas e do consumidor. Essas pressões pela derrubada unilateral dos juros só fariam sentido se deixassem de existir as razões que levaram o Banco Central a puxar os juros básicos para os atuais 14,25% ao ano.

A presidente Dilma e o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, vêm garantindo que pretendem um ajuste fiscal que não comprometa nem o crescimento econômico nem os programas sociais. Mas não dizem como isso se faz. De quebra, para indignação das centrais sindicais e das lideranças dos movimentos sociais, avisam que é preciso avançar nas reformas, especialmente nas da Previdência e na das leis trabalhistas.

Na prática, o governo está dividido entre tomar as decisões duras destinadas a fazer o ajuste fiscal e a adoção das propostas expansionistas e antirreformistas do PT e das lideranças sindicais. Como não se define, fica ciscando aí com iniciativas pouco convincentes, como essa, da convocação do Conselhão, como se para baixar mais um pacote fosse preciso esse aparato.

O governo opera (ou, simplesmente, não opera) com alto déficit de confiança. Nessas condições, fica difícil esperar algo de promissor com essa reconvocação do Conselhão. Os fundamentos da economia deverão continuar a se deteriorar, como tanto as projeções do governo quanto as do mercado vão demonstrando.

Enquanto isso, o fim do recesso do Congresso deve reativar a crise política e a Operação Lava Jato seguirá produzindo efeitos dentro e fora dos tribunais. E, do governo, ninguém sabe o que esperar.

Vinicius Torres Freire: Os debutantes de Dilma

- Folha de S. Paulo

A primeira reação dos porta-vozes do "mercado" à reviravolta do Banco Central na semana passada foi, como previsível, chutar para cima as previsões de inflação para este e para os próximos anos. Chutaram bem.

As reações ao desgoverno da economia não vão parar por aí, a não ser que os economistas de Dilma Rousseff tomem tento. Além da ruína deixada por 2015, a finança mundial está uma muvuca e, por enquanto, não há política econômica no Brasil (metas e instrumentos críveis para administrar pelo menos gasto e dívida públicos, juros e inflação, grosso modo).

A semana até poderia ter a cara de reestreia dos economistas de Dilma. Mas pode ser o começo do fim.

Nesta semana, o BC solta a exposição de motivos de sua decisão ("Ata do Copom"). Também nesta semana, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, faz um discurso no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, no qual vai debutar, vai ser apresentado à sociedade, digamos assim, um tanto mas não muito ironicamente.

Ninguém espera grande novidade de Barbosa no Conselhão (composto de empresários, representantes de organizações sociais etc. convidados pelo governo). Ou seja, seria uma surpresa se viesse algo diferente da linha "manter o ajuste fiscal" (que ora não há, nem na realidade nem em planos de papel), um plano de reformas (vagas e poucas, se tanto), implementação do plano de concessões (obras de infraestrutura), grandioso de metas e pífio na prática, e algum estímulo menor no crédito.

Pois bem, se não houver surpresa, não vai prestar. Quase ninguém, pelo menos na praça do mercado, acredita que essa política econômica feijão com arroz com um torresminho de crédito vá tirar o país do atoleiro (nem acredita, nem vai).

Quanto às expectativas de inflação, a coisa está feia, a julgar pela primeira resposta "oficial" dos povos dos mercados.

Espera-se inflação de 7,23% em 2016, na mediana dos chutes informados pela centena de instituições financeiras e consultorias ouvidas semanalmente pelo BC, dados de sexta-feira, divulgados ontem. Sim, inflação de sete é menor que inflação de quase onze, como em 2015. Mas é bom lembrar que, bem entrado 2015, o BC ainda dizia que o IPCA terminaria 2016 em 4,5%.

Agora, além do mais, os povos dos mercados esperam inflação de 5,65% em 2017. Longe da meta de 4,5%. A caminho do teto da meta para o ano que vem, de 6%.

Como se sabe, na semana passada, o BC trocou de roupa em público, de modo inopinado, escandalizou os mais puritanos e suscitou chacota ao mudar de opinião sobre a taxa de juros, de um dia para o outro, depois de meses dizendo que pegaria pesado com a inflação.

Por mais descrente que uma criatura seja a respeito de metas e expectativas de inflação, é difícil negar que, pelo menos, expectativas mais altas vão dificultar a tarefa de conter os preços. Ainda mais grave, não se sabe agora quais instrumentos o BC vai empregar a fim de evitar inflação mais alta, se algum.

Pode até ser que a inflação de fato "surpreenda", caindo mais que o previsto pelos economistas "do mercado". Talvez não seja uma alegria. Pode ser só que os salários estejam sendo destroçados devido a uma alta mais rápida do desemprego.

Cegueira e irresponsabilidade – Editorial / O Estado de S. Paulo

O drama social e econômico causado pelo fechamento de 1,542 milhão de postos de trabalho no mercado formal no ano passado não parece suficiente para comover os integrantes do governo Dilma Rousseff nem para convencê-los da intensidade e extensão da crise provocada por seus erros e sua irresponsabilidade. Ao divulgar o pior resultado da série de registros do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) desde sua criação em 1992, o Ministério do Trabalho e Previdência Social destacou, em sua página na internet, que, a despeito da imensa perda de vagas, “o estoque de empregos é o terceiro melhor da série”.

Pior fez o ministro Miguel Rossetto ao afirmar que o péssimo resultado do Caged em 2015, abaixo do esperado pelo governo, não foi ruim para o trabalhador. “A crise não foi capaz de destruir as conquistas dos trabalhadores nos últimos anos”, afirmou. Não será fácil convencer disso os milhões de trabalhadores demitidos – que passaram a fazer parte da lista dos 9 milhões de brasileiros que procuram emprego, segundo dados mais amplos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – e suas famílias.

Os números do emprego formal – o de melhor qualidade no mercado de trabalho brasileiro, pois oferece remuneração mais alta e assegura aos empregados garantias legais, como férias e direito de acesso à previdência social, além de melhores ambientes de trabalho – são apenas os mais recentes que demonstram a rápida deterioração das condições da economia brasileira.

A piora do cenário vem sendo notada desde meados do primeiro mandato de Dilma Rousseff, mas o desastre político, administrativo e fiscal que marcou o início do segundo mandato impulsionou o processo. No ano passado, a economia deve ter encolhido de 3,5% a 4%, a inflação oficial foi de 10,71% (mais do dobro da meta de 4,5%) e o déficit público nominal no fim de novembro equivalia a 9,3% do PIB (muito superior à media dos resultados dos países em desenvolvimento).

Embora seja por si só impressionante, o número de postos de trabalho formais fechados no ano passado não é a única informação negativa do Caged. O mercado de trabalho perdeu qualidade, pois, por setor da economia, a maior perda de vagas ocorreu na indústria de transformação. Trata-se do segmento que, por suas especificidades, exige profissionais mais qualificados e, por isso, oferece salários mais altos. No ano passado, a indústria de transformação fechou 608.878 vagas com carteira assinada. Entre os setores que mais empregam, a construção civil fechou 416.959 postos; o setor de serviços, 276.054; e o comércio, 218.650.

Consequência previsível da rápida deterioração do mercado de trabalho, a remuneração real média encolheu. No ano passado, os salários médios de admissão tiveram queda real de 1,63% em relação ao ano anterior: caíram de R$ 1.291,86 para R$ 1.270,74, de acordo com o Caged. Outras pesquisas indicam que em 2016 a renda média continuará a cair, entre elas a feita pela Fipe-USP, mostrando que os acordos de negociação salarial concluídos em dezembro não conseguiram corrigir integralmente os salários. Ou seja, a renda dos trabalhadores abrangidos por esses acordos terá queda real.

É surpreendente que, decerto dispondo de informações como essas – pois elas são essenciais para o desempenho de sua função pública –, o ministro do Trabalho e Previdência ainda afirme que o mercado formal de trabalho “mostra resistência, porque preserva o poder de compra muito próximo à inflação”. Otimista diante do cenário desastroso que afeta a vida de milhões de brasileiros, Miguel Rossetto fala em possível “reversão do cenário negativo”, pois a prioridade do governo, como garante, é a recuperação do crescimento e da geração de empregos, “com mais crédito, exportação, investimentos nas concessões, especialmente na infraestrutura, redução da inflação e retomada da atividade do mercado interno”.

Com um governo que se alimenta de sonhos será mais difícil para o País retomar o caminho do crescimento e da geração de empregos.

Realiza- se o projeto de se equiparar Brasil à Venezuela – Editorial / O Globo

• FMI responsabiliza os dois países pela recessão nos indicadores da América Latina, e assim une chavismo e lulopetismo, ideologias aparentadas

Com sólidos motivos, o Brasil se firma, na América Latina, como um dos casos mais graves na onda de desaceleração econômica que atinge a região. Dado o tamanho do país, a média da evolução do PIB do continente é negativa: de acordo com o Fundo Monetário Internacional, há uma retração prevista para este ano de 0,3%, idêntica à verificada em 2015. Os 3,5% negativos do Brasil em 2015 e a repetição de dose semelhante neste ano são muito responsáveis pelo mau desempenho.

Além do Brasil, contribui para o resultado negativo latino- americano a Venezuela, pela exuberância de sua recessão: de 10% no ano passado, e 8% em 2016. Se os dois países forem retirados dos cálculos, o continente não aparece em recessão. Cai a média do crescimento, mas ele não fica negativo.

Realiza- se, então, por ironia, o sonho de bolivarianos que trabalham em Brasília: Venezuela e Brasil, enfim, juntos. Como exemplos a não serem seguidos. Juntos num desastre econômico, político e com impiedosos reflexos sociais. É certo que há diferenças marcantes entre os dois países, e a favor do Brasil. A principal delas é a solidez das instituições republicanas. Estas foram destroçadas pelo chavismo bolivariano. Haja vista a enorme crise político- institucional em que se encontra a Venezuela de Nicolás Maduro, ungido pelo próprio Hugo Chávez seu sucessor: o governo se recusa a aceitar a vitória da aliança oposicionista nas eleições parlamentares, e para isso usa os aparelhos chavistas que foram instalados no Judiciário e em todo o Estado.

O aparelhamento do setor público, incluindo estatais, é lição da cartilha chavista de tomada do poder sob um simulacro de democracia. O lulopetismo tentou aplicar a mesma tática no Brasil, mas foi em parte frustrado pelas instituições.

A Petrobras é o mais dramático exemplo deste aparelhamento. Executado, inclusive, com funcionários de carreira cooptados. Saqueada para sustentar o projeto de poder lulopetista e de aliados, e usada para projetos megalomaníacos no estilo do “Brasil Grande” da ditadura militar, a estatal passa pela maior crise de sua história.

A Operação Lava- Jato, de combate ao esquema de corrupção montado na estatal, mas não só nela, em que atuam o Ministério Público, a Polícia Federal e a Justiça, não aconteceria na Venezuela.

Outra diferença é que Chávez, vitorioso nas eleições de 1999, aproveitou a popularidade e conseguiu convocar uma Constituinte, pela qual moldou um Estado autoritário, com um regime de democracia direta populista, a base da tragédia política venezuelana. Já no Brasil as instituições barram toda vez que lulopetistas tentam avançar com o Cavalo de Troia das “Constituintes exclusivas”. O mesmo ocorre quando tentam controlar a imprensa profissional. Sorte do Brasil.

Mas os dois países, sob o chavismo e o lulopetismo, comungam ações intervencionistas na economia. E por isso dividem a responsabilidade em jogar a América Latina na recessão.

João Cabral de Melo Neto: Imitação da água

De flanco sobre o lençol,
paisagem já tão marinha,
a uma onda deitada,
na praia, te parecias.

Uma onda que parava,
ou melhor:que se continha;
que contivesse um momento
seu rumor de folhas líquidas.

Uma onda que parava
naquela hora precisa
em que a pálpebra da onda
cai sobre a própria pupila.

Uma onda que parara
ao dobrar-se, interrompida,
que imóvel se interrompesse
no alto de sua crista

e se fizesse montanha
(por horizontal e fixa),
mas que ao se fazer montanha
continuasse água ainda.

Uma onda que guardasse
na praia cama, finita,
a natureza sem fim
do mar de que participa,

e em sua imobilidade,
que precária se adivinha,
o dom de se derramar
que as águas faz femininas

mais o clima de águas fundas,
a intimidade sombria
e certo abraçar completo
que do líquido copias.

Teresa Cristina - Sala de Recepção (Cartola)