quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O difícil caminho para a retomada do crescimento – Editorial/Valor Econômico

A economia brasileira enfrenta um momento extremamente delicado. O Produto Interno Bruto (PIB) deve ter nova retração nos últimos três meses do ano, adiando a tão esperada recuperação da atividade para o ano que vem. Ainda assim, o ritmo de crescimento em 2017 tende a ser bastante lento. As projeções dos analistas ouvidos pelo Banco Central (BC) apontam para um crescimento de apenas 0,58% no ano que vem, um resultado muito fraco, depois da contração de 3,8% registrada em 2015 e da queda de 3,5% estimada para 2016.

As perspectivas para os componentes da demanda são desanimadoras. Famílias e empresas buscam reduzir o nível de endividamento, indicando que o consumo e o investimento não terão um 2017 dos mais favoráveis. União, Estados e municípios, por sua vez, vivem uma crise fiscal gravíssima, e terão de conter gastos. Para completar, as exportações representam pouco menos de 11% do PIB, e o comércio global tem crescido a taxas modestas. O setor externo não vai puxar a economia.

Para completar, o cenário externo ficou mais incerto com a vitória de Donald Trump nos EUA. A expectativa de que o futuro presidente adote uma política fiscal mais expansionista, por meio de corte de impostos e mais gastos em infraestrutura, levou os analistas a projetar aumentos mais fortes dos juros americanos. Taxas mais altas nos EUA tendem a reduzir o fluxo de capitais para países emergentes, com possíveis impactos sobre as moedas dessas economias. Um real desvalorizado em excesso pode se traduzir em pressões inflacionárias, justamente num momento em que o BC parece ter espaço para reduzir os juros com força.

A expectativa dominante, porém, é de que o BC poderá baixar expressivamente a Selic, hoje em 13,75% ao ano. Há quem acredite que os juros vão cair abaixo de dois dígitos em 2017, seguindo em queda em 2018. O Santander, por exemplo, projeta uma Selic de 9,75% no fim de 2017 e de 8,5% no fim do ano seguinte. A inflação enfim dá mostras de que pode convergir para a meta perseguida pela autoridade monetária, de 4,5%, num quadro de ampla ociosidade. Nesse ambiente, há espaço para a atividade crescer por um tempo considerável sem pressionar a inflação.

Os juros mais baixos ajudarão a aliviar a delicada situação financeira de empresas e consumidores. Anunciadas na semana passada, a possibilidade de as empresas renegociarem dívidas com o BNDES e o Programa de Regularização Tributária (PRT) devem contribuir para melhorar a liquidez das companhias. Essa combinação pode abrir espaço para o setor privado investir, ainda que a elevada ociosidade indique que não haverá grande ampliação da capacidade produtiva.

De qualquer modo, a expectativa é de que a recuperação terá que ser puxada pelo investimento. O consumo vai demorar mais para reagir. Além de endividados, os consumidores estão cautelosos, devido às dificuldades no mercado de trabalho, que deve continuar a piorar durante uma boa parte do ano que vem.

O sucesso da retomada em 2017 também dependerá de avanços no front fiscal. Depois de aprovado o projeto que limita o crescimento dos gastos da União, é importante que o governo consiga aprovar uma reforma da Previdência sem grandes mudanças no Congresso. Isso é vital para que o teto de gastos seja respeitado e para indicar uma maior sustentabilidade das contas públicas no longo prazo. No entanto, se a arrecadação demorar a se recuperar, é possível que o governo tenha de tomar medidas com impacto de curto prazo, como algum aumento de impostos e mais redução de gastos. Sem isso, o déficit primário (que não inclui despesas com juros) pode ficar alto demais. A estratégia do governo é de promover um ajuste gradual, com a dívida bruta como proporção do PIB começando a se estabilizar dentro de alguns anos, mas um déficit muito elevado pode causar desconforto.

A percepção de que as contas públicas estão bem encaminhadas pode ajudar a consolidar o processo de redução dos juros. Para alguns analistas, o país tem a oportunidade de promover de fato uma redução sustentada das taxas. A política fiscal deverá ser restritiva nos próximos anos, dada a necessidade de União, Estados e municípios acertarem as suas contas, não pressionando a atividade. Juros estruturalmente menores serão um avanço importante que, com medidas voltadas para aumentar a produtividade, abrirão o caminho para o país crescer a um ritmo mais elevado, sem desequilíbrios.

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