quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Economia derrete e crescem pressões por corte de juros

Por Tainara Machado, Sérgio Lamucci, Camilla Veras Mota e Alex Ribeiro - Valor Econômico

SÃO PAULO E RIO - A economia brasileira registrou, entre julho e setembro, o sétimo trimestre consecutivo de queda, tornando ainda mais evidente a dificuldade de o país sair da atual recessão, uma das mais longas da história. O Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, divulgado ontem pelo IBGE, encolheu 0,8% em relação ao segundo, o dobro do recuo observado entre abril e junho.

Desde o primeiro trimestre de 2014, o PIB acumula retração de 8,4% e não há sinais de que a crise tenha arrefecido. Os primeiros indicadores disponíveis apontam continuidade da tendência de retração da indústria, o que faz com que bancos e consultorias passem a considerar otimista uma alta de 1% do PIB no ano que vem, projeção oficial do governo. O Bradesco, por exemplo, cortou sua estimativa de alta de 1% para 0,3%.

Diante do quadro recessivo e do recuo da inflação nos últimos meses, analistas defendem que o Banco Central acelere o processo de redução da taxa básica de juros (Selic). Mas o Comitê de Política Monetária (Copom) optou, na reunião de ontem, mais uma vez pela cautela, ao fazer novo corte de 0,25 ponto percentual, fixando a Selic em 13,75% ao ano. Apesar disso, sinalizou que deve ampliar o ritmo na próxima reunião, em janeiro.

No comunicado do Copom divulgado ontem, a projeção de inflação para 2018 está em torno de 4,6% no cenário de mercado. Isto significa que, pela primeira vez em muito tempo, a trajetória dos juros esperada pelos analistas é compatível com o cumprimento da meta em 2018. Os economistas do mercado esperam cinco cortes consecutivos de 0,5 ponto percentual na taxa Selic a partir de janeiro, seguidos de outras duas reduções de 0,25 ponto. Com isso, a taxa básica encerraria 2017 em 10,75% ao ano.

Condições monetárias mais frouxas contribuiriam para agilizar o processo de redução do endividamento do setor privado, apontado como uma das razões para a lentidão na recuperação da atividade. "Acredito, com os dados disponíveis sobre as expectativas, que existiria espaço para queda mais veloz da taxa. Isso significaria redução do custo de capital, de um lado, e uma facilitação desse processo de renegociação de dívidas e de desalavancagem de famílias e empresas", diz o economista Carlos Antonio Rocca, diretor do Centro de Estudos do Ibmec.

PIB cai 0,8% no 3º tri e analistas já veem 1% como 'teto' em 2017
O Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, divulgado ontem pelo IBGE, mostrou que o país continua em recessão. Desde o início de 2014, a economia já acumula retração de 8,4%, mas não há sinais de que a crise tenha se abrandado. Pelo contrário. O PIB encolheu 0,8% entre julho e setembro, o dobro da queda de 0,4% registrada no trimestre anterior, na série com ajuste sazonal.

Não há sinal de que a história tenha mudado no quarto trimestre. Os primeiros indicadores disponíveis apontam continuidade da tendência de retração do setor industrial, o que faz com que bancos e consultorias passem a considerar "otimista" uma alta de 1% do PIB em 2017, projeção do governo.

O Bradesco, por exemplo, ampliou a projeção de queda da atividade para -3,6% em 2016 e reduziu a estimativa de expansão para 2017, de 1% para 0,3%. No mesmo sentido, a GO Associados cortou a projeção para o ano que vem de 1% para 0,8%, enquanto a 4E Consultoria revisou a estimativa para apenas 0,2%.

Diante de um cenário em que o terceiro ano de recessão passa a ser considerado possibilidade real, cresce a avaliação de que sobra espaço para o Banco Central acelerar o corte dos juros, para além do ritmo de 0,25 ponto por reunião em curso.

Condições monetárias mais frouxas contribuíriam para acelerar o processo de desalavancagem do setor privado, que tem sido apontado como culpado pela lentidão da recuperação da atividade.

Raphael Ornellas, economista do banco Brasil Plural, aponta a indústria e os investimentos como principais surpresas negativas no terceiro trimestre. Em relação ao segundo trimestre, o PIB industrial caiu 1,3%, enquanto a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) diminuiu 3,1%. O desempenho desses dois componentes, diz, está interligado e é muito dependente de crédito. As concessões precisam voltar a crescer para que o nível de atividade melhore, afirma ele.

Para Ricardo Denadai, economista-chefe da Santander Asset Management, o processo de desalavancagem de famílias, empresas e governo é um dos fatores que está alongando a recessão. Para ele, o resultado ruim do terceiro trimestre não joga por água abaixo as avaliações de retomada da economia, mas com certeza tornam o processo mais longo e mais distante.

Para ele, o quarto trimestre deve ser o oitavo período consecutivo de queda da atividade, com crescimento de 0,3% apenas nos três primeiros meses de 2017. Neste cenário, o PIB do ano que vem deve crescer 0,5%, depois de um tombo de 3,5% estimado para 2016.

No entanto, se tem um lado positivo nessa história, diz, "é que temos um ambiente muito propício para maior desinflação da economia. Isso, combinado com consolidação fiscal, que até agora está indo bem, vai abrir um espaço muito grande para corte de juros", afirma. Não fosse a crescente volatilidade do mercado de câmbio por fatores externos, entende o economista, o Banco Central já poderia ter acelerado o ritmo de corte de juros, o que deve acontecer em janeiro.

Juan Jensen, economista-chefe da 4E Consultoria, avalia que não é só a política monetária que está emperrando a atividade. "Não é simplesmente que a retomada tenha sido postergada. A avaliação é que não há ainda um contexto de retomada econômica", diz ele, que aponta a crise política como a principal responsável pela incerteza. O risco de eventual cassação do presidente Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a delação dos executivos da Odebrecht são citadas por ele como os principais fatores que podem aumentar a instabilidade política e, consequentemente, atrapalhar a retomada da confiança, dos investimentos e da economia.

Jensen avalia que os indicadores antecedentes de outubro e novembro deixam pouco espaço para otimismo e que o PIB do quarto trimestre terá nova retração. A 4E revisou para 0,2% a estimativa para a atividade no ano que vem, de uma alta de 1%.

Ele estima que o carregamento estatístico - o quanto a economia recuaria em 2017 se ficasse estacionada no mesmo patamar do último trimestre deste ano - será negativo em 0,5%, no mínimo.

Daniel Silva, economista da Modal Asset, também calcula que a herança estatística deixada por 2016 é de recuo de 0,5%. "Isso mostra a ladeira que a economia tem que subir mesmo antes de chegar à estabilidade no ano que vem". Por isso, diz, sua estimativa atual de expansão de 1% do PIB no próximo ano já pode ser considerada "razoavelmente otimista", enquanto previsões mais altas estão descartadas.

Para Denadai, a crise atual surpreende pela duração e pela intensidade, sem comparação com outros períodos recessivos. O país só deve recuperar o nível de PIB observado em 2010, pico recente, em 2020 - isso se as projeções de crescimento de 3% em 2018 se confirmarem, ressalta.

No cálculos do Goldman Sachs, o PIB per capita no Brasil encolheu 10,3% nos dez trimestres que já duram a recessão, mais do que a queda observada durante a década perdida. Mesmo assim, o banco estima que a recuperação cíclica deve começar no segundo semestre de 2017, com alta de 1,1% do PIB no ano que vem.

Para o Bradesco, que reduziu para apenas 0,3% a estimativa de expansão do PIB no ano que vem, mais do que indústria ou investimentos, é o consumo das famílias que tem motivado revisões de cenário. "O consumo das famílias continua apresentando contração, refletindo o esfriamento maior do que o esperado no mercado de trabalho", diz o banco. No terceiro trimestre, esse componente do PIB caiu 0,6% em relação aos três meses imediatamente anteriores.

Os últimos resultados da Pnad Contínua, de acordo com o Bradesco, chamam atenção tanto pela velocidade de alta do desemprego, entre 3,5 e 4 pontos percentuais em termos anualizados, quanto pela composição desse aumento: hoje uma parcela maior do desemprego é explicado pela queda da ocupação. "Diferentemente de 2015, quando parte relevante da queda do consumo se deveu a um aumento precaucional da poupança, é o mercado de trabalho, hoje, que tem mais pesado sobre as decisões dos consumidores".

Bráulio Borges, da LCA Consultores, por outro lado, observa que o consumo das famílias vem mostrando quedas cada vez menos intensas. No primeiro trimestre, por exemplo, a retração foi de 1,5%, ritmo que caiu para -1% e agora para -0,6%. Seriam sinais de que, apesar do desemprego em alta, a estabilização da renda e o início do ciclo de queda de juros podem fazer com que o consumo volte a subir nos próximos trimestres.

Para o IBGE, porém, a perda de força da queda do consumo tem muito mais a ver com a base de comparação do que com melhora desse componente. "Continuamos com queda, embora menor. Entretanto, indicadores do mercado de trabalho continuam ruins e os juros continuam altos. E isso continua a afetar negativamente o consumo das famílias", afirmou Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais.

Borges também comenta que alguns fatores pontuais atrapalharam o desempenho da economia no período recente, entre eles a paralisação na Volkswagen em agosto e a greve dos bancários, mais longa do que em outros anos. Por isso, manteve projeção de crescimento "um pouco acima de 1%".

A MB Associados também manteve a projeção de crescimento de 1% da economia em 2017, mesmo com o resultado ruim registrado no terceiro trimestre e a avaliação de que a retomada é mais vagarosa do que se pensava há alguns meses. "Estamos aqui falando de mudanças de magnitude, mas não mudança de trajetória. A piora no curto prazo não significa que o longo prazo esteja comprometido", escreveu o economista-chefe da MB, Sergio Vale. "O que os números têm mostrado é que a recuperação será um pouco mais lenta, mas ela inexoravelmente está acontecendo."

Um primeiro sinal, destacado pelo IBGE na apresentação do resultado, foi a evolução do PIB no acumulado em quatro trimestres, que parou de aprofundar a queda pela primeira vez desde o primeiro trimestre de 2014. De um recuo de 4,8% até junho, o PIB passou a acumular queda de 4,4% nos 12 meses encerrados em setembro, o que foi considerado um "alívio" por Rebeca, do IBGE. (Colaborou Sergio Lamucci, de São Paulo)

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