sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Com inflação ancorada, BC foca na recessão - Claudia Safatle

- Valor Econômico

• Mercado propõe que Copom faça reunião extra para cortar juro

Avolumaram-se, nas últimas semanas, as críticas ao Banco Central, de pessoas do governo e de economistas do setor privado. O BC foi considerado tímido no corte de apenas 50 pontos base na taxa Selic - de 14,25% para 13,75% ao ano - em dois movimentos de 25 pontos. Um ritmo lento e visto, mesmo por economistas conservadores, como incompatível com a fraqueza da atividade econômica.

Em um ambiente onde crescem as pressões para que o governo aja com mais pulso e celeridade para recuperar o crescimento e o emprego, poucos se levantaram para defender a estratégia do BC além do próprio presidente, Ilan Goldfajn, e do diretor de Política Econômica, Carlos Viana.

Do mercado surgiram sugestões de convocação de reunião extraordinária do Comitê de Política Monetária (Copom), para cortar mais a Selic antes da próxima reunião marcada para os dias 10 e 11 de janeiro, além de outras ideias como intensificar a queda na próxima reunião para 75 pontos base.

Luiz Fernando Figueiredo, da Mauá Investimentos e ex-diretor de Política Monetária do BC, disse ontem a esta coluna que se estivesse no BC teria defendido um corte de 100 pontos nos juros básicos de outubro para cá. Mas, contra a corrente, avaliou que a estratégia do Banco Central foi acertada: primeiro o Copom procurou garantir uma boa ancoragem das expectativas de inflação, o que só foi conquistado agora. De posse da recuperação de credibilidade perdida pela gestão anterior - refletida nas expectativas do mercado - o BC anunciou que vai acelerar a queda dos juros a partir da reunião de janeiro.

Priorizar a reversão da recessão antes de ancorar as expectativas de inflação na meta de 4,5% ou muito próximo dela, em 2017, seria uma atitude de alto risco e o BC teve, portanto, "uma visão correta", disse Figueiredo.

Nos pronunciamentos dos últimos dias, Ilan se defendeu das cobranças. "Recentemente, alguns têm afirmado, em tom de crítica, que estaríamos buscando o centro da meta com muito afinco. Nós realmente consideramos importante atingir as metas de inflação (...) após anos seguidos com a inflação acima do centro ou mesmo do teto da meta. Afinal de contas, postergar seu atingimento tem custos para a sociedade", disse ele no almoço anual da Febraban, esta semana. E prosseguiu: "Nesses últimos meses foi importante ancorar as expectativas e derrubar a inflação. Esse foi um investimento muito importante e não pode ser perdido. São esses resultados que permitem ter juros mais baixos no futuro".

Todos querem juros baixos de forma sustentável para que ajudem na retomada da economia. A experiência de outubro de 2012 até início de abril 2013, quando a Selic caiu para 7, 25% mas acabou tendo que subir para até 14,25% ao ano para conter a escalada dos preços, deixou claro que não basta uma caneta e muita vontade para reduzir o custo do dinheiro no país.

" O Banco Central é sensível ao nível de atividade", disse Ilan. A atividade é uma das variáveis nos modelos do BC e afeta as projeções de inflação. E a recessão é vista como custo da desinflação e levada em conta nas decisões do Copom. A flexibilidade é um princípio do regime de meta para inflação. "Mas esse é um princípio que requer a ancoragem das expectativas", salientou Ilan.

Para ter juros estruturais (de equilíbrio) mais baixos, não basta só o trabalho do BC. Envolve questões mais complexas e de outras áreas do governo para melhorar a produtividade, reduzir as incerteza, ter ordem nas contas públicas e fazer reformas microeconômicas que melhorem o ambiente de negócios no país. Nos moldes do pacote anunciado ontem pelo governo.

O crescimento decorre de investimentos e de aumento da produtividade e requer redução das incertezas, inclusive as incertezas políticas. Ao BC cabe gerar o melhor ambiente possível para o crescimento, garantindo a estabilidade da moeda e a solidez do sistema financeiro.

"É nesse contexto mais geral que a política monetária deve ser compreendida, e o debate sobre o nível de taxa de juros e sobre a retomada do crescimento econômico no Brasil deve ser colocado. Um alívio para a atividade econômica baseado somente na política monetária seria apenas temporário", insistiu Ilan. "Persistência, serenidade e foco nos fundamentos econômicos são a chave para obtenção de crescimento sustentável e de juros mais baixos no longo prazo", recomendou.

A taxa de ansiedade do governo, porém, aumenta a cada divulgação de dados que mostram o prolongamento da recessão. Ontem dois indicadores confirmaram que a recuperação ainda está distante. O índice de atividade do Banco Central (IBC-Br) teve queda de 0,48% em outubro frente a setembro (com ajuste sazonal) e de 5,29% em relação a igual mês de 2015 (também com ajuste).

O Monitor do PIB-FGV deste mês também apurou retração de 0,48% em outubro contra setembro e de 4,5% com relação ao mesmo mês de 2015. Foi a pior contração mensal dos últimos sete meses.

Figueiredo espera um ciclo de queda da Selic maior e não se surpreenderá se a taxa cair para um dígito em 2017. Isso mais um conjunto de medidas microeconômicas que o governo anunciou ontem e as que o BC vai anunciar na próxima semana podem dar oxigênio à economia.

Ele espera que sejam retiradas "areias da engrenagem" que desincentivam os bancos a rolarem as dívidas das empresas que estão com a corda no pescoço. Isso poderia ser feito flexibilizando, por exemplo, as regras de provisionamento e de classsificação de risco. Outro aspecto refere-se à redução do spread que aumentou muito. "Tem empresa que já está na terceira renegociação de dívida e o spread bancário só cresce", citou.

O BC está esquadrinhando a composição do spread para ver onde agir. Não será nada parecido com o embate criado pelo governo passado com os bancos.

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