quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Temer adota cautela sobre retomada do crescimento

Por Alex Ribeiro, Murillo Camarotto e Daniel Rittner – Valor Econômico

BRASÍLIA - O presidente Michel Temer disse ontem acreditar que o país poderá retomar a criação de empregos apenas no segundo semestre do ano que vem. O tom cauteloso foi adotado depois da divulgação de uma safra de dados desanimadores, que estão levando o governo a reavaliar as suas projeções sobre o retorno do crescimento da economia.

"Querem que o governo assuma e, dois meses depois, o céu esteja azul. Não é assim, leva tempo", disse Temer, que participou do seminário "Infraestrutura e Desenvolvimento no Brasil", realizado ontem pelo Valor e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). "Retomada do emprego demora, mas a nossa esperança é que no segundo semestre de 2017 já tenhamos emprego sendo retomado", afirmou o presidente.

Na mesma linha, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, destacou que o padrão da recessão atual é diferente dos anteriores, porque as medidas corretivas de ajuste nas contas públicas foram tomadas há poucos meses, em maio, quando Temer assumiu interinamente o Planalto.

"A boa notícia é que devemos crescer em 2017. Não será um crescimento exuberante, mas será sólido", disse Meirelles, que também participou do seminário. "Há vários indicadores antecedentes [da volta do crescimento]. É um processo que demora, mas vem", completou o ministro.

As declarações mais cautelosas sobre as perspectivas de retomada da economia ocorrem depois de uma série de dados econômicos divulgados nas últimas semanas - incluindo a queda nas vendas do comércio e no Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) - sugerirem que a atividade viveu um novo período de contração no terceiro trimestre, colocando dúvidas sobre a possibilidade de a recuperação começar ainda em 2016.

Ainda assim, Meirelles renovou a aposta na adoção de medidas fiscais de médio e longo prazos, como o teto para o crescimento dos gasto públicos e a reforma da Previdência, para recuperar de forma mais consistente os níveis de confiança na economia e a trajetória de retomada da atividade. "A causa central da crise que vivemos hoje é o crescimento das despesas primárias do governo central", disse ele.

Um dos principais conselheiros de Temer, o secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco, também deixou claro durante o seminário que o governo colocou todos os seus ovos na cesta do ajuste fiscal proposto.

"A questão fiscal é central. É monótono, é repetitivo, mas só assim se resolve o problema", afirmou Moreira, que tem o desafio de repassar à iniciativa privada dezenas de empreendimentos de aeroportos, rodovias, ferrovias, portos, empresas de saneamento, blocos de petróleo, usinas e linhas de transmissão de energia elétrica, entre outros.

Segundo o secretário, somente o equilíbrio das contas públicas será capaz de proporcionar um ambiente com taxas de juros mais "civilizadas", no qual poderá prosperar o financiamento privado das obras de infraestrutura. "Estamos apostando tudo nisso [ajuste fiscal]. Economia é 80% confiança e é isso que estamos construindo", disse Moreira.

Num painel do seminário que discutiu financiamento à infraestrutura, o presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setúbal, disse que a retomada da confiança é fundamental para a retomada do setor. "Na economia, temos pela primeira vez um horizonte de longo prazo. A ideia de um teto para o gasto público por 20 anos chega a ser brilhante porque oferece um horizonte de estabilidade que nunca tivemos."

Setúbal demonstrou otimismo com a condução da economia na gestão Temer. A seu ver, o governo acerta ao atacar não mais as consequências, mas as causas de problemas como a falta de investimentos. Ele se referia aos bilhões de reais injetados pelo governo no BNDES para a oferta de um crédito subsidiado que não se materializou em novos investimentos no setor produtivo.

Instantes depois, a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos, concordou com Setúbal. Historicamente, segundo ela, o banco nunca trabalhou com tamanho volume de recursos do Tesouro, o que não impediu que atuasse normalmente no financiamento dos projetos de investimento.

Na mesma linha de Temer e Meirelles, a presidente do BNDES afirmou que a prioridade do governo é o ajuste fiscal, motivo pelo qual ela defendeu enfaticamente a operação pela qual o banco quer devolver R$ 100 bilhões ao Tesouro Nacional. Os recursos serão utilizados para reduzir a dívida bruta do governo, que atualmente representa 70,7% do Produto Interno Bruto.

Maria Silvia garantiu que a devolução dos R$ 100 bilhões ao Tesouro não afeta o fluxo de operações do BNDES. Ela afirmou ainda que está discutindo com o governo uma mudança na política de dividendos da instituição.

Enquanto Temer e Meirelles optaram pela cautela, o CEO do Bank of America para a América Latina, Alexandre Bettamio, admitiu estar bastante otimista com a retomada do crescimento. Segundo ele, a volta da confiança na economia brasileira vai resultar na atração de investidores internacionais. "O Brasil voltou a ser atraente. Há hoje US$ 13 trilhões por aí recebendo juros negativos", afirmou o executivo.

Bettamio disse ter notado nos últimos meses uma mudança relevante no humor dos investidores em relação ao Brasil. Segundo ele, nesse período foram realizadas 17 operações de emissão de dívida por empresas brasileiras, que levantaram US$ 18 bilhões.

Também foram mencionadas pelo executivo do BofA cinco ofertas iniciais de ações de empresas brasileiras nos últimos dois meses, com captação de US$ 1,6 bilhão. "Boa parte dos recursos foi para infraestrutura", disse ele, citando abertura de capital da Energisa e da Taesa.

Bettamio mencionou ainda fusões e aquisições no setor de energia: a compra de usinas hidrelétricas e distribuidoras por investidores chineses, a aquisição de ativos da Petrobras pela norueguesa Statoil e pela australiana Karoon, além de investimentos da canadense Brookfield. "Isso demonstra que a infraestrutura está em pauta e atrai o investidor estrangeiro. Tudo começa com a credibilidade", afirmou o executivo do BofA.

O maior entrosamento entre Executivo e Legislativo, segundo ele, ajuda na construção de um cenário de maior confiança. "O governo está trabalhando em sintonia com o Congresso, o que leva a crer que as mudanças serão estruturais. Depois que a taxa de juros cair, ela continuará baixa", completou Bettamio.

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