quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Pequena indústria sofre para pagar 13º salário

• Com queda no faturamento, quase sete em cada dez fabricantes de menor porte dizem ter dificuldades para bancar benefício de fim de ano

Douglas Gavras - O Estado de S. Paulo

Como reflexo da queda do consumo e a retração do faturamento, quase sete em cada dez micro e pequenas indústrias paulistas enfrentam dificuldades para pagar o 13º salário dos funcionários neste ano. Para 17% delas, a situação é ainda mais grave e já se trabalha com a perspectiva de atrasar o repasse do benefício. Os dados são de um levantamento do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi). As empresas paulistas correspondem a cerca de 40% do total de micro e pequenos fabricantes do País, segundo o Simpi.

A fabricante de parafusos Tec Stam é uma das que terá de postergar o pagamento de fim de ano dos empregados. “É uma situação muito constrangedora. A segunda parcela, que deveríamos repassar para a equipe até dezembro, só vamos conseguir pagar em fevereiro, com recursos próprios”, diz Humberto Gonçalves, sócio da firma.

Com os negócios em baixa, a empresa atrasou o cumprimento de contratos, o que a fez perder credibilidade com bancos e dificultou o acesso a crédito. “Fornecemos para diferentes segmentos, de máquinas e equipamentos a fabricantes de carrocerias para ônibus e caminhões, mas o capital fugiu, quem há dois anos tinha planos de investir teve de se preocupar em sobreviver, e diminuímos também.” Hoje, a empresa opera com 30% de ociosidade.

Na indústria de cutelaria La Lupe, a queda estimada no faturamento em 12 meses até novembro é de 15%, o que também dificultará o pagamento do 13.º salário, segundo Sérgio Luiz Kyrillos, sócio da fabricante. “Estamos fazendo um esforço para não atrasar o pagamento, mas o ano está sendo cruel, sobretudo para quem faz artigos que não são de primeira necessidade.”

Caso uma parte significativa dos micro e pequenos fabricantes atrase o 13.º, o impacto poderá ser grande nas vendas de Natal, lembra José Luis Oreiro, economista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“Os comerciantes já esperam vendas natalinas mais fracas para este ano, mas um consumidor com menos dinheiro no bolso e mais receoso de gastar pode fazer com que o nível de estoque nas lojas aumente e a indústria já começaria o ano que vem tendo de contrair a produção e demitir mais gente. É um cenário alarmante para todos.”

Segundo Oreiro, a retração do mercado interno é ainda mais impactante para os fabricantes de menor porte, que não têm condições de exportar seus produtos, mesmo em um cenário de dólar mais valorizado. “Fica cada dia mais difícil reverter essa situação, em que as empresas operam com capacidade ociosa e sem perspectiva de melhora no consumo interno. Se nada for feito, pode chegar um momento em que a economia atinja um ponto de ruptura, caso a recessão se aprofunde.”

Ele lembra que muitos Estados em crise já atrasam pagamentos de servidores e, caso a iniciativa privada tenha de fazer o mesmo, não haverá como evitar um Natal mais magro.

Conta atrasada. O cenário atual do mercado interno é negativo para qualquer lado que se olhe, mas os pequenos industriais têm uma fragilidade maior do que as empresas grandes quando precisam recorrer aos bancos em busca de crédito, lembra Gustavo Loyola, da Tendências Consultoria.

Nesse contexto, a maior restrição a empréstimos, que afeta a todos, acaba sendo mais perversa com os menores, o que também reduz as suas possibilidades de defesa durante a recessão econômica, avalia.

Em outubro, 11% dos empresários disseram ter deixado de pagar seus fornecedores no mês anterior e 19% admitiram não conseguir honrar dívidas com bancos ou financeiras, ainda de acordo com o levantamento do Simpi.

“É como uma bola de neve. A receita diminuiu e, sem recursos para arcar com seus custos operacionais, as empresas se tornam inadimplentes. O passo seguinte é cortar na carne e atrasar os benefícios dos funcionários”, diz Joseph Couri, presidente do sindicato.

“Outubro e novembro são meses em que a produção nessas empresas costuma estar em alta, para atender às demandas de Natal do comércio, mas não é o que se vê neste ano. As máquinas estão paradas. Sem facilitar o acesso ao crédito para os micro e pequenos, não há muito o que o empresário possa fazer para tentar se reerguer.”

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