sexta-feira, 25 de novembro de 2016

O Brasil no embalo do Rio de Janeiro - César Felício

- Valor Econômico

• Fraqueza política impede solução de desastre econômico

Esta semana o governador do Paraná, Beto Richa, conseguiu aprovar na Assembleia Legislativa do Estado nada menos que a suspensão de um reajuste acertado por ele mesmo no passado com o funcionalismo. Passou a proposta, obviamente impopular, por 34 votos a favor e 18 contrários. No caso do Rio Grande do Sul o teste legislativo do governador José Ivo Sartori será nas próximas dias, com a tramitação de seu draconiano pacote que extingue diversos órgãos do Estado. Em Tocantins, o governador Marcelo Miranda tenta resolver por decreto: dispensou dois mil servidores e reduziu em duas horas o expediente no Estado.

De norte a sul, de leste a oeste, os governadores tocam a vida como se já existisse, na prática, o limite de gastos que Temer deve implantar nos gastos federais a partir do próximo ano. O que acontece nos Estados, de certo modo, é o prenúncio do que virá no país como um todo, não apenas no que resta de governo Temer, mas nos próximos anos.

O caso do Rio de Janeiro, em que a Assembleia Legislativa está desmantelando o pacote de ajuste fiscal de Luiz Fernando Pezão, mostra o que pode ocorrer se a uma crise fiscal aguda se junta uma crise política de vulto.

Há um problema de densidade política no Rio de Janeiro que não começou agora. O mentor do governador está preso, assim como aquele que foi o parlamentar mais influente da história recente do Estado. A esperança eleitoral do PMDB fluminense em 2018 acaba de ser derrotada nas urnas e Pezão teve que se licenciar a maior parte do ano para tratar da saúde.

A fraqueza política não explica o desastre econômico, mas impede a sua solução. Em medida menor, foi o que o Brasil vivenciou em 2015. Convencida da necessidade de algum ajuste, Dilma nomeou Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. O ministro nunca teve apoio no Congresso e na Esplanada porque o custo político de se aprovar um pacote recessivo em um momento de convulsão era insuportável.

Temer tem grande base no Congresso, montou o governo como se monta um gabinete parlamentarista e conseguiu a façanha de aprovar com uma maioria avassaladora a PEC do gasto público. No entanto, é um presidente frágil. Pela conjuntura econômica que administra, pelas circunstâncias em que assumiu o cargo e pela origem de onde deriva seu poder: está toda assentada na estrutura partidária e política enredada na Lava-Jato e a história deste ano mostra como é frágil uma estrutura parlamentar de apoio, que o diga os 450 votos a 10 do placar da cassação de Eduardo Cunha na Câmara.

No plano estadual, os governadores se aproximam dos seus limites para gerenciar seus problemas dentro de suas autonomias e sabem disso. No processo de negociação com o governo federal, avança a discussão para federalizar parte substancial do ajuste, com uma versão mitigada da PEC dos gastos na versão regional, aumentos de contribuição previdenciária, barreiras na guerra fiscal e assim por diante.

O retorno para Temer seria a solidariedade dos governadores para a aprovação da reforma da Previdência e trabalhista e a estabilização da base em meio aos voos rasantes da Lava-Jato. É uma manobra arriscada, em todos os sentidos.

Filho do presidente do Senado, o governador de Alagoas Renan Filho adverte que transferir o foro de discussão da esfera estadual para a federal não necessariamente torna a aprovação de um ajuste mais fácil. "Os deputados, tanto os estaduais quanto os federais, são muito mais sensíveis aos interesses das carreiras estaduais do funcionalismo do que das federais. Os lobbies estaduais agem com muita força em Brasília", disse o governador.

Para Renan Filho, o funcionalismo estadual tem mais capacidade de pressão sobre a Câmara dos Deputados porque podem afetar de maneira direta a recondução dos parlamentares de modo que nenhuma outra corporação consegue fazer.

O alagoano não menciona, mas possivelmente mais de uma dezena de governadores poderão ficar comprometidos pela megadelação da Odebrecht, meteoro que promete bater na terra desde março. Renan Filho não aposta no travamento geral do sistema de decisão política. Acredita que a urgência da situação econômica se imporá. Mas do ponto de vista de conjuntura as circunstâncias do drama do Rio de Janeiro podem se desenhar no cenário nacional e nos Estados. A ofensiva do judiciário contra o meio político e a contra-ofensiva que se desenrola por ora apenas no Legislativo, a pauta de ajuste e o ambiente glacial da economia ajudam a desenhar uma profusão de estímulos para que o ciclo de manifestações de rua que vêm desde 2013 seja retomado.

De olho em 2018
A eleição até certo ponto surpreendente de João Doria e o evento Donald Trump animou os candidatos a 'outsider' em 2018. Daí porque não se deve encarar como uma piada a movimentação do empresário e apresentador de televisão Roberto Justus. O empresário de fato cogita tentar se candidatar e tenta entrar em um partido de grande porte. Não há muito mistério sobre de qual força política ele está próximo e que o colocou no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

Ainda no começo do mês, no mesmo dia da eleição de Trump, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, proclamou-se "um homem livre, muito livre" quando perguntado se poderia concorrer à sucessão de Temer, a quem critica.

Entre os interlocutores do presidente, há os que olham com atenção os movimentos da atual presidente do STF, a ministra Cármen Lúcia, em quem enxergam veleidades políticas. A simples especulação sobre estes nomes mostra que, mesmo no coração do sistema político, começa a crescer a suspeita de que os trincamentos devem crescer na arquitetura até 2018.

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