quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Manifestantes de direita promovem quebra-quebra e invadem a Câmara

Daniel Carvalho, Ranier Bragon, Paulo Gama – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Cerca de 50 manifestantes que se diziam de direita e favoráveis a uma intervenção militar no Brasil invadiram o plenário da Câmara dos Deputados na tarde desta quarta-feira (16).

Pouco depois das 15h30, eles quebraram a porta de vidro que dá acesso ao plenário, onde o primeiro vice-presidente da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), presidia a sessão e tomaram a Mesa. Nesse instante, havia menos de dez deputados em plenário.

A bandeira do Brasil foi arrancada e jogada no chão. Houve tumulto com os policiais legislativos, que usaram armas de choque, segundo servidores que estavam no local.

De acordo com o deputado Marcos Rogério (DEM-RO), no momento em que os manifestantes entraram, o tablet de um parlamentar caiu no chão e o servidor que se abaixou para pegá-lo foi chutado. "É uma situação absurda, que nunca vi no Parlamento", afirmou.

Com uma pauta de reivindicação difusa e sem líderes claramente definidos, os manifestantes gritavam "viva Sergio Moro", juiz responsável pela Operação Lava Jato, e pediam a presença de um general e do presidente Michel Temer.

"Viemos para tomar a casa do povo. Estamos aqui pelos milhares de brasileiros mortos pelo país. Estamos sendo governados pelo crime político organizado, que tomou conta do Brasil", disse uma manifestante que não quis se identificar.

Afirmando protestar também contra o governo "comunista" de Temer, alguns disseram ter se articulado pelas redes sociais e que participaram das manifestações pela saída da então presidente Dilma Rousseff.

"Eles estão todos loucos. E tem gente armada aí dentro", afirmou o deputado Beto Mansur (PRB-SP), primeiro-secretário da Câmara, que estava negociando com os manifestantes. "Tem muita gente drogada e tem gente armada sim", acrescentou o deputado Julio Delgado (PSB-MG).

Deputados foram orientados a deixar o plenário por causa da suspeita de manifestantes armados. Os jornalistas também foram impedidos de acompanhar a operação da Polícia Legislativa.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que acompanhava a movimentação de seu gabinete, disse ter determinado a prisão de todos os manifestantes. Ele disse que este era o único caminho a ser tomado em relação aos "baderneiros irresponsáveis e bandalheiros".

"A partir do momento que pessoas resolveram invadir o Parlamento, resolveram quebrar dependências do Parlamento, entrar no plenário sem autorização, subir na Mesa do presidente da Câmara, a ordem que dei ao diretor do Depol [departamento de polícia] é que todos saiam daqui presos e que sejam levados para a Polícia Federal", afirmou Maia. "Não vamos aceitar este tipo de abuso, de agressão ao parlamento brasileiro. Não haverá negociação", disse o presidente da Câmara.

Os manifestantes começaram a deixar o plenário às 17h20. Alguns saíram pelo cafezinho do plenário na companhia de deputados. Outros foram conduzidos por policiais legislativos.

Uma hora depois, o plenário estava liberado e Maia realizou sessão da Câmara, dominada por comentários sobre a invasão. Do lado de fora, houve confusão entre manifestantes e policiais.

A assessoria da Câmara afirmou que a determinação de Maia seria cumprida e que os que participaram do ato seriam identificados e levados à Polícia Federal para serem indiciados. A base da acusação seria o artigo 18 da Lei de Segurança Nacional (Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados), cuja pena é de reclusão de 2 a 6 anos.

Dois seriam indicados ainda por lesão corporal e dano qualificado. A Câmara disse que um policial legislativo e um assessor parlamentar ficaram feridos. Pelo menos uma manifestante também se feriu, mas não havia informações oficiais sobre isso.

COMUNISMO
A Folha conversou com algumas das pessoas que participaram do ato durante a liberação do plenário e no momento em que alguns eram identificados pelos policiais.

"Temos o direito de entrar na casa do povo, a casa é do povo", afirmou Mariele D'Ottaviano, que se identificou como advogada do Movimento Patriótico Popular. "Vim de Curitiba defender o juiz Sérgio Moro e a Lava Jato", disse Luciana Fontana, 48, "desempregada graças à roubalheira que esse governo fez com esse país". Ao lado dela, Ivan Cunha, 61, que se diz "empresário falido", afirmava que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), busca enterrar as investigações contra a corrupção e que o governo roubou as estatais.

Questionado sobre a qual governo se referia, pensou um pouco e disse que a "todos." "Eles "sempre estiveram juntos."

Outra manifestante, a também desempregada Leonice Neves, 59, dizia estar ali para defender os policiais mortos todos os dias em São Paulo e no Rio de Janeiro. "Pelo direito dos 'manos', ficam soltando os bandidos", afirmou, também se dizendo do Movimento Patriótico Militar. "Não existe líder entre nós, entre nós cada um é líder."

Ao lado dela, uma mulher que se identificou como Simone afirmou que o objetivo do grupo é acabar com esse "governo comunista." "Somos patriotas, estamos lutando pelo nosso país, contra o comunismo."

Mais cedo, o manifestante Fernando Melo, 61, que se disse engenheiro civil e estudante de filosofia, afirmou defender "a ordem, o progresso, a família, a igreja e as Forças Armadas".

Após a confusão, a reação dos deputados no plenário contra o ato uniu esquerda e direita. Pastor Feliciano (PSC-SP) chamou os manifestantes de "meliantes". O esquerdista Chico Alencar (PSOL-RJ) afirmou que o preocupa o "discurso do autoritarismo, da intervenção militar, que é uma semente do fascismo".

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